Acórdão Nº 08323816720198205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 05-09-2021

Data de Julgamento05 Setembro 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08323816720198205001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0832381-67.2019.8.20.5001
Polo ativo
ELIZANGELA MARIA DA SILVA
Advogado(s): EDGAR FERREIRA DE SOUSA, DANILO CRUZ ALVES SILVA
Polo passivo
FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS NPL I
Advogado(s): THIAGO MAHFUZ VEZZI

EMENTA: PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. ACERVO PROBATÓRIO QUE COMPROVA A EXISTÊNCIA DE VÍNCULO JURÍDICO ENTRE A AUTORA E A NATURA COSMÉTICOS S.A.. FICHA CADASTRAL DA AUTORA. NOTAS FISCAIS DE COMPRA DE PRODUTOS. COMPROVANTE DE RECEBIMENTO/ENTREGA DAS MERCADORIAS. CESSÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO RECEBIMENTO DA NOTIFICAÇÃO PELO DEVEDOR QUE NÃO IMPLICA NA INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA E NEM IMPEDE O NOVO CREDOR DE PRATICAR OS ATOS NECESSÁRIOS À PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS CEDIDOS. LEGITIMIDADE DA INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao apelo, para julgar improcedentes os pedidos iniciais, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS NPL I em face de sentença proferida pelo juízo da 18ª Vara Cível da Comarca de Natal, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito, proposta por ELIZANGELA MARIA DA SILVA, que julgou procedentes os pedidos iniciais para declarar a inexistência do débito, no valor de R$ 309,87, com vencimento em 14.04.2015, data de inclusão 30.11.2017, contrato 16036913121 proveniente do contrato acostado sob o ID de nº 015051217; determinar a exclusão do nome da autora de todo e qualquer cadastro de restrição ao crédito, quanto à dívida em comento; condenar o banco a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescida de e correção monetária, com base no INPC, a partir da data da inscrição indevida, e de juros moratórios de 1% ao mês, igualmente contados a partir do evento danoso citado. E, ainda, condenou o banco ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor corrigido da condenação.

Nas suas razões, o apelante alega que o crédito em que se funda a ação, foi objeto de cessão de crédito entre a empresa NATURA COSMÉTICOS S.A. e a cessionária FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS NPL I, e a regular notificação da operação de cessão à apelada ocorreu por intermédio do Serasa, na qual consta expressa menção ao contrato cobrado.

Alega que ainda que o devedor não houvesse sido notificado da cessão de crédito ocorrida, o dever de pagamento e a respectiva possibilidade de cobrança permanecem.

Defende que não cometeu ato ilícito, pois a negativação da apelada foi respaldada pelo exercício regular do direito de credora, em razão da cessão de crédito da empresa NATURA COSMÉTICOS S.A. para a empresa FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS NPL I..

Sustenta que não há dano moral a ser indenizado.

Ao final, requer o conhecimento e provimento do apelo.

O apelado apresentou contrarrazões, pugnando, em suma, pelo desprovimento do apelo.

O Ministério Público deixou de opinar, ante a ausência de interesse público primário no caso em questão.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade conheço do recurso.

Cuidam os autos de Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais em decorrência da inclusão do nome da apelada em cadastros de proteção ao crédito, em virtude de um débito, que alega desconhecer.

No caso dos autos, o juiz a quo reconheceu a inexistência do débito discutido nos autos, tão somente por considerar que a apelante não comprovou a ciência da autora da notificação da cessão, tornando sem eficácia a cessão perante o devedor. Vejamos:

“(...)

Atendendo ao imperativo da inversão do ônus da prova aplicável à espécie, tem-se que a parte demandada trouxe aos autos os documentos que correspondem a ficha cadastral da autora perante a cedente assinada (Id. 57101388), termo de cessão de créditos (Id. 48895389) e a notificação da cessão do crédito (Id. 48895387). No entanto, não comprovou a ciência da autora da notificação da cessão, conforme preconiza o art. 290 do Código Civil, restando, portanto, sem eficácia a referida cessão perante o devedor.

Deste modo, resta evidente a ausência de legitimidade da inscrição da dívida pela ré no valor de R$ 309,87, com vencimento em 14.04.2015, data de inclusão 30.11.2017, contrato 16036913121, imputada à parte autora, que ensejou a inscrição do seu nome em cadastro de serviço de proteção ao crédito.

(...)”

Compulsando os autos, verifico que a apelante juntou aos autos da ficha cadastral feita pela apelada junto à empresa Natura (ID 9331687 - Pág. 2), cuja assinatura na citada ficha não foi rechaçada pela apelada/autora. Trouxe, ainda, nota fiscal referentes às mercadorias adquiridas pela apelada junto à Natura (Id. 9331676 - Pág. 1), bem como comprovante de recebimento/entrega das mercadorias, assinado pelo sogro da apelada (Id. 9331677 - Pág. 1). Por fim, observa-se, ainda, que a apelante celebrou contrato de cessão de crédito com a empresa Natura, em 15.12.2016, conforme comprovam os documentos acostados (ID 9331675 - Pág. 1), através do qual adquiriu os créditos que eram devidos à Natura pela apelada.

Assim, entendo que restou comprovado o negócio jurídico realizado entre o apelante e a Natura Cosméticos S.A., situação que não foi afastada pela autora/apelada em Réplica ou Contrarrazões, tendo se limitado a alegar nestas que não contratou nenhum serviço do apelante”, e que “os números de contrato são diferentes”, bem como foi demonstrada a cessão de crédito efetivada pela mencionada empresa à apelante.

A cessão de crédito, prevista nos arts. 286 e seguintes do Código Civil, trata da substituição do polo ativo da relação obrigacional, onde o credor cede seu crédito a terceiro, chamado de cessionário, que passa a assumir a posição do credor originário, como todos os seus direitos.

No que atine à prévia notificação do devedor acerca da cessão da dívida, o Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a ausência de notificação do devedor acerca da cessão do crédito (art. 290 do CC/2002) não torna a dívida inexigível, tampouco impede o novo credor de praticar os atos necessários à preservação dos direitos cedidos, bem como não exime o devedor da obrigação de arcar com a dívida contraída.

Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CESSÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO NÃO IMPLICA NA INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA. PROVA DE EXISTÊNCIA DA DÍVIDA. SÚMULA N. 83/STJ. DISPOSITIVOS SUPOSTAMENTE VIOLADOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA. SÚMULA N. 5/STJ. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA N. 283/STF. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS QUE JUSTIFIQUEM A ALTERAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

(AgInt no AREsp 1234069/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 24/09/2020)

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO FIXO COM REPASSE FINAME. LEGITIMIDADE DA PARTE AUTORA. CESSÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DA CESSÃO DE CRÉDITO. NÃO INTERFERÊNCIA NA EXIGÊNCIA OU EXISTÊNCIA DA DÍVIDA. CONSONÂNCIA DO ACÓRDÃO RECORRIDO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83/STJ. ALTERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. NATUREZA DA GARANTIA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a ausência de notificação do devedor acerca da cessão do crédito (art. 290 do CC/2002) não torna a dívida inexigível, tampouco impede o novo credor de praticar os atos necessários à preservação dos direitos cedidos, bem como não exime o devedor da obrigação de arcar com a dívida contraída.

2. A orientação do STJ é de que, caso a parte tenha se obrigado como devedora solidária, e não como fiadora, torna-se impertinente a exigência de outorga uxória para se alcançar a eficácia plena da garantia.

3. A análise acerca da natureza da garantia prestada pelos agravantes demanda o reexame de fatos e provas, bem como a interpretação de cláusulas contratuais, o que é vedado em recurso especial pelo óbice disposto nas Súmulas 5 e 7/STJ.

4. A revisão do julgado recorrido, a respeito do tipo de contrato acordado entre as partes para se apurar o percentual a ser fixado, exigiria o revolvimento das cláusulas pactuadas entre as partes e das circunstâncias de fato pertinentes ao caso, o que não se admite em recurso especial, diante da aplicação das Súmulas n. 5 e 7 desta Corte.

5. Agravo interno improvido.

(AgInt no AREsp 1637202/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2020, DJe 01/09/2020)

Nesse contexto, não há que se falar em inexistência do débito em razão da não comprovação da ciência/notificação da autora acerca da cessão de crédito.

Ademais, comprovado o negócio jurídico originário realizado entre a apelada/autora e a Natura Cosméticos S.A., a regularidade da cessão de crédito à apelante, e não tendo a dívida sido adimplida, é legítima a inscrição do nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito, não havendo que falar em danos morais.

Neste mesmo sentido a jurisprudência em casos semelhantes:

PROCESSO...

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