Acórdão Nº 08336179320158205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 15-05-2019
Data de Julgamento | 15 Maio 2019 |
Classe processual | APELAÇÃO CÍVEL |
Número do processo | 08336179320158205001 |
Órgão | Segunda Câmara Cível |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL
Processo: | APELAÇÃO CÍVEL - 0833617-93.2015.8.20.5001 |
APELANTE: | JOSE NETO DE SOUZA |
Advogado(s): | CAMILA ARRUDA DE PAULA |
APELADO: | BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. |
Advogado(s): | LIEGE MARIA ZAFFARI |
EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS DECISÃO PROFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.107-36/2001 (RE 529.377; TEMA 33 DA REPERCUSSÃO GERAL). MUDANÇA DE POSICIONAMENTO DO PLENO DO TJRN A FIM DE SE ALINHAR AO ENTENDIMENTO DA CORTE SUPREMA. CONSONÂNCIA COM O STJ (RESP 973.827/RS). REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PREJUDICADA. RECURSO DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade, em desprover o recurso, nos termos do voto do relator.
Apelação Cível interposta por JOSE NETO DE SOUZA em face da sentença que, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, ficando tal condenação suspensa por ser beneficiaria da justiça gratuita.
Em suas razões o apelante aduziu, em síntese, que: não é possível a capitalização de juros ante a inconstitucionalidade da Medida Provisória n° 2.170-36/2001 e o entendimento firmado no Enunciado n° 121 da Súmula do STJ; faz jus à repetição de indébito, na forma dobrada, dos valores cobrados indevidamente pelo recorrido. Requereu, ao final, o provimento do apelo nos termos da inicial.
A parte apelada apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do apelo.
Esclareço que o Código de Defesa do Consumidor se aplica às relações de consumo envolvendo instituições financeiras, conforme entendimento consolidado pelos Tribunais Superiores: no Superior Tribunal de Justiça, por meio do Enunciado n° 297 de sua Súmula[1]; no Supremo Tribunal Federal, pelo julgamento da ADI n° 2591/DF[2] (“ADI dos Bancos”).
Sendo assim, há plena possibilidade de revisão judicial das cláusulas contratuais consideradas abusivas previstas em contratos bancários, incompatíveis com a boa-fé ou equidade, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou estabeleçam prestações desproporcionais (art. 6º, V e art. 51, IV do CDC[3]).
Em processos discutindo a matéria ora analisada, este relator vinha declarando a nulidade das cláusulas que previam a capitalização de juros, com fundamento na decisão proferida pelo Plenário deste Tribunal na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n° 2008.004025-9/0002.00, que declarou a inconstitucionalidade formal do art. 5º da Medida Provisória n° 1.963/2000 (atual MP n° 2.107-36/2001), que admite a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. Como o referido julgamento foi à unanimidade de votos, passou a vincular os demais órgãos do Tribunal por força do art. 243, caput, do Regimento Interno[4].
Em 04/02/2015, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, por maioria de votos, a constitucionalidade formal da Medida Provisória nº 2.170-36/2001, nos termos do acórdão adiante transcrito:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO.
1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência.
2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país.
3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados.
4. Recurso extraordinário provido.
(RE n° 592.377/RS. Tribunal Pleno. Relator: Min. Marco Aurélio. Relator p/ Acórdão: Min. Teori Zavascki. DJe de 20/03/2015).
Transcrevo, por oportuno, a proclamação do julgamento:
O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, rejeitou a preliminar de prejudicialidade apontada pelo Ministério Público. No mérito, o Tribunal, decidindo o tema 33 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso, vencido o Ministro Marco Aurélio (Relator), que lhe negava provimento e declarava inconstitucional o art. 5º, cabeça, da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001. (...)
Na mesma direção, o Superior Tribunal de Justiça já havia pacificado seu posicionamento no julgamento do REsp nº 973.827/RS, o qual foi analisado sob a sistemática dos recursos repetitivos e fixou as seguintes teses para os efeitos do art. 543-C do CPC:
É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.
Como se trata de matéria constitucional, este Tribunal não estava vinculado aos efeitos do REsp nº 973.827-RS, mas, por outro lado, deve seguir o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, em respeito ao art. 243, II e § 1º, do RITJRN, senão veja-se:
Art. 243. A decisão declaratória ou denegatória da inconstitucionalidade, quando unânime, terá aplicação obrigatória para o futuro aos casos análogos, ressalvadas as seguintes hipóteses:
I - se houver alteração do texto constitucional em que se fundamentou a decisão;
II - se o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidir contrariamente sobre a mesma lei ou ato idêntico inquinado de inconstitucional, mesmo que não conste ainda de súmula;
III - se houver possibilidade de modificação do pronunciamento do Tribunal Pleno, pela mudança de sua composição ou apresentação de novos fundamentos jurídicos, a critério da Câmara julgadora.
§ 1º Ocorrendo a circunstância prevista no inciso II, aplica-se a jurisprudência do Excelso Pretório.
§ 2º Poderá a Câmara deixar de remeter os autos ao Tribunal Pleno,quando este, embora por maioria de votos, houver firmado jurisprudência uniforme sobre a mesma matéria constitucional. (grifos acrescidos)
Nesse cenário, o Plenário deste Tribunal de Justiça rediscutiu a matéria em Embargos Infringentes e alinhou-se à recente decisão da Corte Suprema, conforme se verifica nas decisões adiante transcritas:
EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE ANTE O DECIDIDO NO RECURSO ESPECIAL Nº 973.827 (ART. 543-C) E A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170-36/2001 AFIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N.º 592.377 EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL (ART. 543-B DO CPC). NECESSIDADE DE ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO DO STF POR ESTA CORTE. ART. 243, II, § 1º, DO RITJRN. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.
- O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 973.827, com base no art. 543-C do CPC (sistemática de recurso repetitivo), decidiu ser permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.
- O Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 592.377 em regime de repercussão geral (art. 543-B do CPC), considerou constitucional o art. 5º da MP 2.170-36/2001, inviabilizando a manutenção do entendimento desta Corte de Justiça exarado na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, ante o disposto no art. 243, II, § 1º, do RITJRN.
(Embargos Infringentes n° 2014.026005-6. Relator: Des. Amílcar Maia. Julgamento: 25/02/2015).
EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. DECLARAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001 PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NORMA JURÍDICA QUE PERMANECE VIGENTE ATÉ JULGAMENTO DA ADI 2.316. EVOLUÇÃO DO ENTENDIMENTO DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANTO À CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. ADMISSÃO DA COBRANÇA DE JUROS CAPITALIZADOS EM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO QUANDO EXISTENTE A PACTUAÇÃO CONTRATUAL, NOS TERMOS DO RESP 973.827/RS. PRECEDENTE DO STJ. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES.
1. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 592.377, decidindo o Tema 33 da Repercussão Geral, declarou a constitucionalidade formal da MP 2.170-36/2001, de modo que a medida provisória, por certo, permanece vigente até o julgamento da ADI 2316.
2. Diante da admissão da cobrança de juros capitalizados, em periodicidade inferior a um ano, pelo Superior Tribunal de Justiça, nos autos do REsp 973.827/RS, há de se evoluir o entendimento pretérito, proferido contrariamente acerca da matéria, na Arguição de Inconstitucionalidade nº 2008.004025-9/0002.00 pelo Pleno desta Corte.
3. Embargos infringentes...
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