Acórdão Nº 08344541220198205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 03-03-2022

Data de Julgamento03 Março 2022
Número do processo08344541220198205001
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0834454-12.2019.8.20.5001
Polo ativo
GIZELIA MARIA SOARES e outros
Advogado(s): BRUNO SANTOS DE ARRUDA
Polo passivo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s): BRUNO SANTOS DE ARRUDA

RECURSO CÍVEL INOMINADO VIRTUAL N° 0834454-12.2019.8.20.5001

5º JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE NATAL

RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

ADVOGADO: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO

RECORRIDA: GIZÉLIA MARIA SOARES

ADVOGADO: BRUNO SANTOS DE ARRUDA

RELATOR: JUIZ JOSÉ MARIA NASCIMENTO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA ESTADUAL APOSENTADA. PRETENSÃO DE CONVERSÃO DE FÉRIAS PROPORCIONAIS NÃO GOZADAS EM PECÚNIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO DO ENTE PÚBLICO DEMANDADO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE LEGAL. PRECEDENTES. COMPROVAÇÃO DA ANTECIPAÇÃO, PELO ENTE PÚBLICO, DO VALOR RELATVO AO TERÇO CONSTITUCIONAL. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes que integram a Primeira Turma Recursal Provisória dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, em face do provimento parcial do recurso.

Natal/RN, 15 de fevereiro de 2022

José maria nascimento

Juiz relator

RELATÓRIO

PROJETO DE SENTENÇA

Vistos...

Tratando-se de questão unicamente de direito, não sendo necessária a produção de provas em audiência, passa-se ao julgamento antecipado da lide, na forma do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

GIZÉLIA MARIA SOARES ajuizou a presente ação, em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, alegando ser servidora público estadual aposentada desde 3 de janeiro de 2017 no cargo de Professor Permanente Nível III, Classe “E”, matrícula 99.927-0, vínculo 2, buscando provimento jurisdicional no sentido de obter a condenação do demandado ao pagamento de indenização referente às férias proporcionais ao último ano trabalhado, acrescidas do terço constitucional.

Com base no sustentado, pleiteou a parte autora a condenação do requerido a indenizá-la pelo não usufruto de férias, a fim de evitar o enriquecimento ilícito em seu detrimento.

Citado, o demandado ofertou contestação requerendo a improcedência do feito sustentando que além de não haver previsão legal para o pagamento de férias proporcionais, a parte autora já percebeu as verbas que pleiteia.

É o que importa relatar.

Passa-se a fundamentar e a decidir.

Do mérito.

Verifica-se que o cerne desta ação consiste em saber se a parte demandante tem direito a receber indenização pela não fruição de férias proporcionais não gozadas no último ano trabalhado, apurando-se, assim a responsabilidade civil da Administração Pública pelo suposto dano material sofrido.

Acerca das férias proporcionais, importa salientar que os períodos aquisitivos são contados da data de ingresso em ciclos de cômputo anuais e não do primeiro dia do calendário civil até o último dia do respectivo ano.

Em que pese a prática administrativa conceder o gozo das férias antes de completado o período aquisitivo, para fins de pagamento de férias proporcionais deve ser levado em consideração a data de ingresso do servidor.

No caso dos professores, em especial, verifica-se que o artigo 52 da LC 322/2006 e seus parágrafos dispõe que os professores gozam das férias durante o recesso escolar, senão vejamos:

Art. 52. O período de férias anuais dos Professores e Especialistas de Educação será de trinta dias ininterruptos.

§ 1º. O período de férias será acrescido de quinze dias para os Professores em efetivo exercício das atividades de docência, no período dos recessos escolares.

§ 2º. As férias dos Professores e Especialistas de Educação em exercício nas Unidades Escolares serão distribuídas nos períodos de recesso, conforme o interesse da Escola e o calendário letivo anual, para atender às necessidades didático-pedagógicas e administrativas das Escola.

Nesse cenário, vê-se que a parte autora teve sua aposentadoria publicada em 3 de janeiro de 2017 – ver id 47710737 – e que, em janeiro de 2016, relativo a janeiro de 2016 – ver id 47710739, p. 38 –, a professora recebeu o adicional de férias.

Dessa forma, a parte autora, em janeiro de 2016, com pagamento em janeiro de 2016, gozou de férias que seriam integralizadas em março de 2016, haja vista que entrou em exercício em 13 de março de 1990 (id 48520962 - Pág. 1).

Dito isso, vê-se que, de acordo com a data de entrada em exercício, a parte autora, em 14 de março de 2016, iniciou novo período aquisitivo de férias que só seria integralizado março de 2017. Tendo em vista que laborou de 14 de março de 2016, até a aposentadoria, é dizer, até 3 de janeiro de 2017, possui assim direito às férias proporcionais, considerando a data que entrou em exercício, entre 14 de março de 2016 e 3 de janeiro de 2017.

Assim, faz jus a parte Autora a férias proporcionais alusivas ao período compreendido entre 14 de março de 2016 e 3 de janeiro de 2017.

Diante do quadro descortinado, mostra-se cabível a condenação a indenizar, a fim de evitar o enriquecimento indevido do ente estatal demandado, mesmo não havendo dispositivo legal autorizando ou proibindo o pagamento de indenização por licença-prêmio, como sustenta o demandado em sua peça de defesa.

Realmente, de acordo com o que consta dos artigos 884 a 886, do Código Civil, vedado está o enriquecimento ilícito, ou seja, aquele obtido sem justa causa, o que também se aplica às relações regidas pelo Direito Administrativo, pois a ninguém é concedido o direito de auferir vantagem indevida, tratando-se, a rigor, de um daqueles princípios que estariam implícitos em nosso ordenamento jurídico, podendo ser aplicado independentemente de qualquer previsão legal. Portanto, em sendo constatada situação caracterizadora do princípio em tela, autorizado está o magistrado a condenar quem se beneficiou a indenizar pelo proveito ilegitimamente obtido.

Sobre a aplicabilidade do princípio que veda o enriquecimento sem causa contra a Administração Pública, no caso de esta não indenizar o servidor aposentado por férias não gozadas, assim já se manifestaram o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, conforme se vê, respectivamente, a seguir:

EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Servidor público. Aposentadoria. Férias e licença-prêmio não gozadas na atividade. Indenização. Direito reconhecido. Vedação do enriquecimento sem causa e responsabilidade civil do Estado. Fundamentos autônomos infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição. Agravo regimental não provido. Precedentes. A questão de indenização, na aposentadoria de servidor público, por férias e licença-prêmio não gozadas na atividade, fundada na proibição do enriquecimento sem causa da Administração e na responsabilidade civil do Estado, é matéria infraconstitucional, insuscetível de conhecimento em recurso extraordinário. (STF; RE-AgR nº 239552/RJ, Órgão Julgador: 1ª Turma; Rel.: Min. Cezar Peluso; data do julgamento: 31.08.2004). (Grifos acrescidos).

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973 FEITA DE FORMA GENÉRICA. SÚMULA 284/STF. SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO EM PECÚNIA DA LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. PRINCÍPIO QUE VEDA O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO.

1. É deficiente a fundamentação do Recurso Especial em que a alegação de ofensa ao art. 535 do CPC/1973 se faz de forma genérica, sem a demonstração exata dos pontos pelos quais o acórdão se fez omisso, contraditório ou obscuro. Aplica-se na hipótese, o óbice da Súmula 284 do STF.

2. A orientação do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que é cabível a conversão em pecúnia da licença-prêmio e/ou férias não gozadas, independentemente de requerimento administrativo, sob pena de configuração do enriquecimento ilícito da Administração.

3. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido, para anular o acórdão recorrido e restabelecer a sentença de 1º grau. (STJ. REsp nº 1.662.749/SE. Órgão julgador: 2ª Turma; Rel. Min. Herman Benjamin. Data do julgamento: 16/05/2017. (Destacou-se).

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. LICENÇA-PRÊMIO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. EXPRESSA. PERÍODO NÃO GOZADO EM FACE DA NECESSIDADE DE SERVIÇO. PREVISÃO LEGAL. REQUERIMENTO. DESNECESSIDADE. PRINCÍPIO QUE VEDA O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Este Superior Tribunal, em diversos julgados, consolidou a orientação de que é cabível a conversão em pecúnia da licença-prêmio e/ou férias não gozadas, em razão do serviço público, sob pena de configuração do enriquecimento ilícito da Administração.

2. Agravo regimental não provido. (STJ. AgRg no RECURSO ESPECIAL n.º 1.360.642/RS. Órgão Julgador: 2ª Turma; Rel.: Min. Mauro Campbell Marques. data do julgamento: 16.05.2013). (Negritou-se).

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte na mesma linha tem entendido, senão vejamos:

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDORA PÚBLICA ESTADUAL APOSENTADA. OBSERVADO PELA DEMANDANTE O PRAZO PRESCRICIONAL PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO QUE TEM COMO TERMO INICIAL A DATA DE SUA APOSENTADORIA. PLEITO DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO EM PECÚNIA. DESNECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AOS ARTIGOS 5º, INCISO II, e 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SERVIDORA QUE COMPROVA O EXERCÍCIO DE SUAS ATIVIDADES NO PERÍODO EM QUE DEVERIA TER GOZADO LICENÇA-PRÊMIO. PROIBIÇÃO DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO EM...

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