Acórdão Nº 08345011520218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 23-04-2023

Data de Julgamento23 Abril 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08345011520218205001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0834501-15.2021.8.20.5001
Polo ativo
UP BRASIL ADMINISTRACAO E SERVICOS LTDA. e outros
Advogado(s): JOAO CARLOS RIBEIRO AREOSA, THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE
Polo passivo
CRISTIANE GOIS SILVA e outros
Advogado(s): THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE, JOAO CARLOS RIBEIRO AREOSA

EMENTA: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. RECONHECIMENTO DA CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CONTRATO REALIZADO DE FORMA VERBAL. JUNTADA DE ÁUDIO COM LIGAÇÃO TELEFÔNICA. ESPECIFICAÇÃO PRÉVIA DAS TAXAS DE JUROS MENSAL E ANUAL. DEMONSTRAÇÃO DA PRÉVIA PACTUAÇÃO DOS JUROS. CÁLCULO DAS PARCELAS COM BASE NO CUSTO EFETIVO TOTAL – CET. ABRANGÊNCIA DE TODOS OS ENCARGOS INCIDENTES NA OPERAÇÃO. ADMISSIBILIDADE. PRECEDENTE DESTA CORTE DE JUSTIÇA. INFORMAÇÕES PRESTADAS ADEQUADAMENTE AO CONSUMIDOR. JUROS REMUNERATÓRIOS. PACTUAÇÃO BEM ACIMA DA MÉDIA DO MERCADO. ABUSIVIDADE CONSTATADA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. INCIDÊNCIA DO ART. 42 DO CDC. MÁ-FÉ VERIFICADA NO CASO. APELAÇÕES CÍVEIS CONHECIDAS E PARCIALMENTE PROVIDAS.


ACÓRDÃO

A Primeira Câmara Cível, nos termos do Art. 942 do CPC, por maioria de votos, conheceu e deu parcial provimento aos recursos, nos termos do voto do Relator. Vencidos parcialmente os Desembargadores Dilermando Mota e Cornélio Alves. Foi lido o acórdão e aprovado.

RELATÓRIO

Tratam-se de Apelações Cíveis interposta pelas partes, por seus respectivos advogados, em face a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 6ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN, que, nos autos da Ação Revisional de Contrato nº 0834501-15.2021.8.20.5001, proposta por CRISTIANE GOIS SILVA em desfavor da empresa UP BRASIL - POLICARD E SERVIÇOS S.A., julgou parcialmente procedente a pretensão inicial, nos seguintes termos:

"Isto posto, JULGO PROCEDENTE, em parte, o pedido para reconhecer a mácula na taxa de juros imposta nos contratos, devendo ser aplicada a taxa média de juros mercado, divulgada pelo BCB, praticada nas operações da mesma espécie – empréstimo consignado (Súmula nº 530 do STJ), bem como para declarar abusiva a capitalização dos juros praticada pelo réu, diante da ausência de pactuação das taxas de juros mensal e anual (Súmulas nº 539 e 541 – STJ), determinando o recálculo das parcelas com a incidência de juros simples.
Condeno a demandada a restituir, na forma simples, o valor pago a maior pela demandante a título de juros compostos superiores à média de mercado, devendo o cálculo ser realizado mediante a utilização do método GAUSS, condicionado o reembolso à ausência de saldo contratual em aberto.
Em relação ao valor a ser restituído, deverá incidir correção monetária pelo INPC, desde o desembolso até a citação, a partir da qual deverá incidir unicamente a taxa SELIC, a título de correção monetária e juros moratórios (Tema Repetitivo nº 176, REsp 1111119/PR).
Condeno a parte ré também a devolver os valores pagos a título de seguro compulsório indevidamente inserido nos descontos ora perpetrados.
Em todas as determinações devem ser apuradas somente as parcelas a partir de 21 de julho de 2011 em diante, respeitando-se a análise prescricional disposta e fundamentada na presente decisão.
Julgo improcedente o pedido de danos morais.
Em face de sua sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento das custas (rateada- 40% para a autora e 60% para a ré) e dos honorários advocatícios, os quais fixo no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, ficando a cobrança suspensa em relação a autora por ser ela beneficiária da justiça gratuita."

A parte ré apresentou recurso de apelação, na qual defendeu: i) existência da pactuação de inúmeros refinanciamentos, ensejando na novação da dívida; ii) legalidade das cobranças realizadas, ante a regularidade das cláusulas contratuais, por ser ato jurídico perfeito, insurgindo-se contra a não observância do princípio pacta sunt servanda; iii) prévia estipulação dos juros e da impossibilidade da fixação dos juros pela média do mercado; iv) inaplicabilidade do Método Gauss; v) inversão dos honorários sucumbenciais em desfavor da parte autora.

Por fim, requereu o conhecimento e provimento do recurso, com a reforma da sentença, para se julgar totalmente improcedente o pleito exordial.

De igual modo, recorreu a parte autora, sustentando: a) continuidade do contrato após estabelecimento de parâmetros para recálculo; b) incidência da repetição do indébito em dobro; c) inexistência de sucumbência recíproca.

Finalmente, requereu o conhecimento e provimento do recurso, reformando-se parcialmente a sentença.

Contrarrazões do réu, defendendo a rejeição do apelo da demandante.

Deixou-se de remeter os autos à Procuradoria de Justiça, eis que ausentes as hipóteses de intervenção ministerial.

É o relatório.

VOTO

Conheço dos recursos, pois atendem aos requisitos de admissibilidade.


O mérito recursal reside em aferir a legalidade, ou não, da capitalização dos juros e da limitação do percentual da taxa mensal e anual relativa aos juros remuneratórios, aferindo se cabível o Método Gauss e a incidência da repetição do indébito em dobro, assim como se escorreito o arbitramento dos honorários sucumbenciais.


É de se esclarecer que, no caso dos autos, tem-se por aplicável os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor – CDC, haja vista tratar-se de relação jurídico material em que de um lado a demandada figura como fornecedora de serviços, e do outro a demandante se apresenta como sua destinatária.

Ademais, cumpre ressaltar que, mesmo existindo pacto contratual livremente celebrado entre as partes, é assegurado ao Poder Judiciário intervir na relação jurídica, de modo a devolver ao negócio o equilíbrio determinado pela lei e a função social a ele inerente, sem que isso signifique interferência ilegal na autonomia da vontade das partes, ainda mais quando o negócio se encontra regido pelo CDC.

No que concerne à capitalização de juros, cabível elucidar que, não obstante o entendimento sedimentado na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n° 2008.004025-9, julgada em reserva de Plenário em 08/10/2008 por este Tribunal, em 04/02/2015, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n° 592.377/RS, reconheceu a constitucionalidade formal da Medida Provisória nº 2.170-36/2001 (Tribunal Pleno; Relator: Min. Marco Aurélio; Relator p/ Acórdão: Min. Teori Zavascki; DJe de 20/03/2015).

Visando adequar o entendimento a respeito da matéria ao que foi decidido pelo STF no recurso acima mencionado, o Pleno deste Tribunal de Justiça, em 25/02/2015, no julgamento dos Embargos Infringentes nº 2014.010443-5, evoluiu sua compreensão no sentido de declarar válida a prática da capitalização mensal dos juros remuneratórios pactuada nas operações de crédito realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, desde que conste expressamente dos contratos firmados a partir da entrada em vigor da Medida Provisória nº 2.170-36/2001.

Vejamos:

“EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE ANTE O DECIDIDO NO RECURSO ESPECIAL Nº 973.827 (ART. 543-C) E A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170-36/2001 AFIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N.º 592.377 EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL (ART. 543-B DO CPC). NECESSIDADE DE ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO DO STF POR ESTA CORTE. ART. 243, II, §1º, DO RITJRN. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. - O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 973.827, com base no art. 543-C do CPC (sistemática de recurso repetitivo), decidiu ser permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. - O Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 592.377 em regime de repercussão geral (art. 543-B do CPC), considerou constitucional o art. 5º da MP 2.170-36/2001, inviabilizando a manutenção do entendimento desta Corte de Justiça exarado na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, ante o disposto no art. 243, II, §1º, do RITJRN.” (TJRN; Embargos Infringentes nº 2014.026005-6; Relator: Desembargador Amílcar Maia, Tribunal Pleno, julgado em 25/02/2015).

Dessa forma, consoante o novo posicionamento deste Egrégio Tribunal, deve ser permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano, desde que esteja expressamente pactuada nos contratos firmados a partir da entrada em vigor da Medida Provisória nº 2.170-36/2001.

Ainda, tal entendimento se mostra em harmonia com os enunciados do Superior Tribunal de Justiça abaixo transcritos:

“Súmula 541. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.”.

“Súmula 539. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.”

Com isso, desde que previamente pactuada, é possível a capitalização de juros nos contratos bancários.

Desse modo, seguindo o posicionamento recentemente adotado por este Tribunal de Justiça, é permitida a capitalização de juros de juros com periodicidade inferior a um ano, desde que expressamente pactuada ou quando a taxa de juros anual for superior ao duodécuplo da mensal, nos contratos celebrados a partir da edição da MP 1.963-17/20.

No presente caso, de acordo com o áudio...

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