Acórdão Nº 08347676520228205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 29-02-2024

Data de Julgamento29 Fevereiro 2024
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08347676520228205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0834767-65.2022.8.20.5001
Polo ativo
MARTINHO HERMESON DE MATOS FURTADO
Advogado(s): NATASHA HELENA BENIGNO DE AZEVEDO, JOSE DE SOUZA NETO
Polo passivo
APEC - SOCIEDADE POTIGUAR DE EDUCACAO E CULTURA LTDA
Advogado(s): LUANNA GRACIELE MACIEL, KALLINA GOMES FLOR DOS SANTOS

EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DE COLAÇÃO DE GRAU DE ESTUDANTE DE MEDICINA. PANDEMIA DO CORONAVÍRUS (COVID-19). DISPENSA DE OBSERVÂNCIA DE CARGA HORÁRIA TOTAL DO CURSO EM VIRTUDE DO ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA. INTELIGÊNCIA DO ART. 3º, § 2º, II, DA LEI N. 14.040/2020. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS ESTABELECIDOS PELO DIPLOMA LEGAL. COLAÇÃO DE GRAU ANTECIPADA CONDICIONADA À ASSINATURA DE TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE CUMPRIMENTO DAS DEMAIS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. ILEGALIDADE DA COBRANÇA DE PAGAMENTO DO SEMESTRE ANTECIPADO. PAGAMENTO QUE DEVE LEVAR EM CONSIDERAÇÃO O NÚMERO DE DISCIPLINAS CURSADAS. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 32 DO TJRN. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso interposto, nos termos do voto do relator, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por APEC – SOCIEDADE POTIGUAR DE EDUCAÇÃO E CULTURA LTDA, contra a sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Natal que, nos autos da Ação Anulatória com Pedido de Tutela de Urgência n° 0834767-65.2022.8.20.5001, ajuizada por MARTINHO HERMESON DE MATOS FURTADO, julgou procedente a pretensão autoral, “para declarar a nulidade do termo de confissão de dívida, relativo às parcelas correspondentes aos meses não cursados pelo demandante. Condeno, ainda, a ré à devolução de todas as quantias pagas pelo autor, decorrentes do aludido termo, acrescidas de correção monetária a contar desde o efetivo pagamento pela calculadora judicial aportada no sítio www.tjrn.jus.br, e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) a partir da citação”. Condenou ainda a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor constante no termo de confissão de dívida anulado.

Em suas razões recursais aduz a apelante que “O Contrato celebrado entre as partes prevê, em sua Cláusula 6ª, que o Contratante se obriga ao pagamento da quantia mensal fixada para o curso, conforme estabelecido no Edital, e que tais valores são revistos e reajustados nos termos da Lei n.º 9.870/99 e observam a regra da semestralidade, podendo ser divididos em 06 (seis) parcelas a fim de se obter a mensalidade devida pelo acadêmico”.

Alega que “a antecipação da colação de grau decorreu de requerimento formulado pelo próprio Apelado, que tinha ciência que, inobstante a sua opção pessoal de antecipar a colação de grau, a Universidade manteria a prestação dos serviços educacionais referentes ao 12º período letivo do curso de Medicina para todos os alunos que intentassem ter a sua formação acadêmica integral, sem precipitar a sua formação”.

Afirma que “inexistindo prova nos autos de que a manifestação de vontade emanada pelo Apelado teria sido viciada, a implicar na anulabilidade do negócio jurídico, e demonstrada a validade dos dois documentos pelos quais a parte se obriga ao adimplemento do montante integral inicialmente orçado para o curso, é indevida a anulação do Termo de Confissão de Dívida pretendida, devendo-se manter incólumes as obrigações nele insculpidas”.

Pede, ao fim, o conhecimento e provimento do recurso, para que seja reformada a fim de julgar totalmente improcedente as pretensões autorais.

O apelado apresentou contrarrazões pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos apelos interpostos.

O apelo interposto pretende reformar a sentença, buscando a total improcedência da demanda.

De acordo com o caderno processual, o autor buscou a prestação jurisdicional, alegando, em suma, que integrava o quadro de discentes da instituição ora demandada, tendo concluído a graduação em 09 de julho de 2021, através de colação antecipada de grau, com dispensa da carga horária do último período, contudo, a instituição de ensino condicionou a entrega do diploma à assinatura de um termo de confissão de dívida, embora não tenha sido prestado o serviço.

Com efeito, no contexto da pandemia de Covid-19 foi editada a Medida Provisória nº 934, de 1º de abril de 2020, que estabelece normas excepcionais sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior, a qual autoriza que seja abreviada a duração dos cursos de Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia, senão vejamos:


“Art. 2º. As instituições de educação superior ficam dispensadas, em caráter excepcional, da obrigatoriedade de observância ao mínimo de dias de efetivo trabalho acadêmico, nos termos do disposto no caput e no § 3º do art. 47 da Lei nº 9.394, de 1996, para o ano letivo afetado pelas medidas para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública de que trata a Lei nº 13.979, de 2020, observadas as normas a serem editadas pelos respectivos sistemas de ensino.

Parágrafo único. Na hipótese de que trata o caput, a instituição de educação superior poderá abreviar a duração dos cursos de Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia, desde que o aluno, observadas as regras a serem editadas pelo respectivo sistema de ensino, cumpra, no mínimo:

I - setenta e cinco por cento da carga horária do internato do curso de medicina; ou

II - setenta e cinco por cento da carga horária do estágio curricular obrigatório dos cursos de enfermagem, farmácia e fisioterapia.”

Por sua vez, o Ministério da Educação regulamentou a matéria, através da Portaria nº 383, de 9 de abril de 2020, in verbis:


“Art. 1º Ficam autorizadas as instituições de ensino pertencentes ao sistema federal de ensino, definidas no art. 2º do Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017, em caráter excepcional, a anteciparem a colação de grau dos alunos regularmente matriculados no último período dos cursos de Medicina, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia, desde que completada setenta e cinco por cento da carga horária prevista para o período de internato médico ou estágio supervisionado, enquanto durar a situação de emergência em saúde pública decorrente da pandemia do novo coronavírus - Covid-19, na forma especificada nesta Portaria.
§ 1º Considera-se o internato médico o período de dois anos de estágio curricular obrigatório de formação em serviço dos estudantes de Medicina.

§ 2º Considera-se estágio obrigatório para os cursos de Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia a atividade supervisionada equivalente a vinte por cento da carga horária total do curso.

Art. 2º Os certificados de conclusão de curso e diplomas, emitidos em razão desta Portaria, terão o mesmo valor daqueles emitidos em rito ordinário.”

Desta feita, verifico que a Medida Provisória nº 934, posteriormente convertida na Lei nº 14.040/2020, admitiu a antecipação da colação de grau caso o aluno possua uma carga horária mínima de 75% (setenta e cinco por cento) do internato médico e esteja matriculado no último período do curso.

Nesse caso, considerando que a parte autora se enquadra na situação previsto na Medida Provisória nº 934/2020 e na Portaria nº 383, de 9 de abril de 2020, do Ministério da Educação, autorizando-se, portanto, a sua colação de grau antecipada, é consequência lógica que não mais cursará o último semestre, diante da antecipação da colação de grau que, independentemente de ter sido requerida voluntariamente ou não, foi permitida pela instituição de ensino.

Assim, a prestação de serviços relativamente ao último semestre não vai mais ser realizada, mesmo que estas estejam à disposição do aluno, uma vez que a própria matrícula das recorrentes restou definitivamente cancelada.

Desta forma, qualquer valor que venha a ser pago posteriormente, referente ao semestre não cursado, será caracterizado como enriquecimento ilícito por parte do credor.

No mesmo sentido, vem decidindo esta Egrégia Corte:

EMENTA: DIREITOS CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO EM AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA C/C AÇÃO DE RESOLUÇÃO DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS C/C AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS C/C ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CUMPRIMENTO DE MAIS DE 75% DA CARGA HORÁRIA DO INTERNATO DO CURSO DE MEDICINA. REALIZADA COLAÇÃO DE GRAU ANTECIPADA À LUZ DA MP Nº 934/2020 E PORTARIA Nº 383 DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. DESNECESSIDADE DE CUMPRIMENTO DAS DEMAIS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO REMANESCENTE, HAJA VISTA O ENCERRAMENTO DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO Nº 32 DA SÚMULA DO TJRN. PRECEDENTES DESTA CORTE. APELO PROVIDO.

(APELAÇÃO CÍVEL, 0845295-95.2021.8.20.5001, Des. Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 26/09/2023, PUBLICADO em 27/09/2023)

EMENTA: CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. ESTUDANTE DE MEDICINA. PANDEMIA DO CORONAVÍRUS (COVID-19). ADVENTO DA LEI N. 14.040/2020. DISPENSA DE OBSERVÂNCIA DE CARGA HORÁRIA TOTAL DO CURSO EM VIRTUDE DO ESTADO DE CALAMIDADE PÚBLICA. COLAÇÃO DE GRAU ANTECIPADA CONDICIONADA À ASSINATURA DE TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DO SEMESTRE ANTECIPADO. IMPOSSIBILIDADE. COBRANÇA QUE DEVE LEVAR EM CONSIDERAÇÃO O NÚMERO DE DISCIPLINAS CURSADAS. SÚMULA 32 DO TJRN. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. IMPOSSIBILIDADE DE PAGAMENTO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES...

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