Acórdão Nº 08357798520208205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 16-06-2023

Data de Julgamento16 Junho 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08357798520208205001
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0835779-85.2020.8.20.5001
Polo ativo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):
Polo passivo
JOSE LUIZ VITOR NETO
Advogado(s): JOSE LUIZ VITOR NETO

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

TERCEIRA TURMA RECURSAL

RECURSO CÍVEL INOMINADO N° 0835779-85.2020.8.20.5001

ORIGEM: 5º JUIZADO DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE NATAL

PARTE RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

ADVOGADO(A): PROCURADORIA GERAL DO ESTADO

PARTE RECORRIDA: JOSÉ LUIZ VITOR NETO

ADVOGADO(A): JOSÉ LUIZ VITOR NETO

JUIZ RELATOR: JOÃO EDUARDO RIBEIRO DE OLIVEIRA

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS REFERENTES AO IPVA DE 2019 E 2020. ISENÇÃO DE PAGAMENTO DO IPVA. LEI ESTADUAL Nº 6.967/1996. POSTERIORES ALTERAÇÕES. LEI Nº 10.464/2018 E LEI Nº 10.632/2019. DEVIDO O IMPOSTO DO ANO 2019. ADI Nº 4.016/PR. NÃO-INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

ACORDAM os Juízes integrantes da Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para excluir a condenação relativa à devolução do IPVA e cotas do ano 2019, mantendo a sentença em seus demais termos. Sem condenação em honorários advocatícios, face ao provimento parcial do recurso.

Natal/RN, data da assinatura no sistema.

JOÃO EDUARDO RIBEIRO DE OLIVEIRA

Juiz Relator

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto pela parte demandada ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE contra a r. sentença de id. 10876525, proferida pelo 5º Juizado da Fazenda Pública da Comarca de Natal que julgou parcialmente procedente a pretensão autoral em face da parte recorrida JOSE LUIZ VITOR NETO.


Na sentença recorrida, o(a) MM. Juiz(a) ANDREO ALEKSANDRO NOBRE MARQUES proferiu o seguinte entendimento:


[...] Do Mérito

Inicialmente, é imperioso fazer uma breve evolução legislativa, dos últimos 4 (quatro) anos, quanto à Lei nº 6.967, de 30 de dezembro de 1996, mormente quanto ao art. 8º, inciso VI.

Em 2017, a Lei nº 10.170 alterou o referido dispositivo, prevendo a isenção de imposto aos: “veículos de passeio, adaptados para uso de deficientes físicos, enquanto for de sua propriedade, limitada a 1 (um) veículo por beneficiário”. No ano seguinte, em 2018, a Lei nº 10.464 alterou novamente o mesmo dispositivo, mantendo a previsão para deficiente físicos, entretanto, aumentado o rol de beneficiados, mas restringindo quanto a potência do carro, senão vejamos:

Art. 8º. (...) VI – os veículos de passeio, com motor até de 120 HP de potência bruta (SAE), adquiridos ou adaptados para uso de deficientes físicos, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente por intermédio de seu representante legal, limitado a 01 (um) veículo por beneficiário(...)

Neste sentido, observamos que a lei estadual prevê como unidade de potência o HP (“Horse-Power”). No entanto, como normalmente os veículos automotores no Brasil utilizam a unidade de potência CV (Cavalo-Vapor), é necessário fazer a conversão. Vale salientar, a priori, que as referidas unidades não são sinônimas. Todavia, são bem similares, de forma que 1 CV = 0,9863 HP [1]. Assim sendo, 120 HP é igual a 121,44 CV.

Pois bem, seguindo com a evolução legislativa, o art. 8º, VI, da Lei Estadual nº 6.967/96, foi alterado pela última vez, até então, em 2019, pela Lei nº 10.632, retirando a restrição quanto à potência do motor para o benefício da isenção tributária. Vejamos:

Art.8º. (...) VI - os veículos de passeio, adquiridos ou adaptados para uso de pessoas com deficiência física, visual, auditiva ou mental severa ou profunda, ou com Transtorno do Espectro Autista, diretamente ou por intermédio de seu representante legal, limitado a 01 (um) veículo por beneficiário(...)

Assim sendo, percebe-se que essa última alteração legislativa beneficiou os contribuintes isentos do pagamento do Imposto de Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, pois retirou o requisito relativo à potência, isto é, após a lei nº 10.632/19, qualquer carro pode ser adquirido pelos deficientes físicos, visuais, auditivos, mentais ou com Transtorno do Espectro Autista.

Pois bem, feitas essas considerações iniciais, passa-se a discorrer sobre qual lei deve ser aplicada ao caso concreto, isto é, em relação aos exercícios de 2019 e 2020.

O autor alega tanto na exordial desta demanda judicial, quanto no requerimento administrativo deferido pelo DETRAN/RN (id. 58875829) que pretende obter a isenção do IPVA referente aos exercícios de 2019 e 2020, com a restituição em dobro dos valores pagos.

Assim sendo, considerando que o art. 2º, da Lei nº 10.632/2019, previu que a referida lei entrou em vigor na data de sua publicação, qual seja, 16 de dezembro de 2019, esta é a normativa que vigora para o exercício de 2020. Explica-se.

É bem verdade que em 2018, quando a parte autora adquiriu o veículo com motor de de 170cv, não havia nenhuma restrição quanto à potência do motor, isto porque vigorava a Lei nº 10.170/2017. No entanto, apesar de em 27 de dezembro de 2018 começar a vigorar a Lei nº 10.464/2018, as regras estabelecidas em seu teor não puderam ser aplicadas durante o exercício de 2019, pois esbarravam em preceitos constitucionais.

É que o Estado do Rio Grande do Norte, com a alteração legal promovida (limitação quanto à potência do motor de veículos automotores), revogou expressamente uma isenção anteriormente concedida, de forma que, muito embora não tenha configurado uma majoração propriamente dita, afetou indiretamente o contribuinte que antes era agraciado pelo benefício fiscal, ampliando a carga tributária. Assim, para a cobrança do tributo aos contribuintes anteriormente abarcados pela isenção, deveria haver a observância dos princípios limitadores do poder de tributar – anterioridade do exercício e a noventena.

Assim, como a Lei n.º 10.464/2018 foi promulgada em 27 de dezembro de 2018, a cobrança do IPVA deveria respeitar tanto a anterioridade do exercício – a qual determina que o tributo não pode ser cobrado no mesmo exercício financeiro – quanto a anterioridade nonagesimal – que dispõe que o tributo apenas pode ser cobrado após 90 (noventa) dias da publicação da lei que o instituiu ou majorou.

Logo, considerando que a Lei n.º 10.464/2018 foi publicada em 27 de dezembro de 2018, e que esta revogou expressamente uma isenção concedida sob determinadas condições, se assemelhando, portanto, a uma criação de um tributo, a sua cobrança apenas poderia ocorrer em 27 de março de 2019.

Por outro lado, a Lei n.º 6.967/1996, que dispõe sobre o IPVA, estabeleceu em seu art. 2º, § 1º, que o fato gerador do imposto ocorre no dia 1º de janeiro de cada exercício.

Nesse sentido, a parte autora, no que se refere ao IPVA do ano de 2019, não deve ser cobrada. Todavia, quanto aos próximos exercícios, se não havendo outra lei que amplie a isenção concedida, a parte autora deverá pagar regularmente o IPVA de seu veículo.

Ocorre que, em 16 de dezembro de 2019, foi publicada a Lei nº 10.632, exatamente ampliando a isenção concedida, isto é, retirando a restrição anteriormente imposta quanto à vinculação à potência dos veículos, ou seja, beneficiando indiretamente o contribuinte agraciado pela isenção do IPVA. E, devido a isto, não precisa observar a regra da anterioridade do exercício, nem a regra da noventena. Veja-se o que o art. 150, III, b e c, CF, preveem:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...) III - cobrar tributos: (...)

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;

Percebe-se que os princípios constitucionais supracitados, somente precisam ser respeitados quando a norma tributária instituir ou aumentar um tributo, isto porque, o legislador atende ao princípio da não-surpresa tributária, isto é, não surpreender o contribuinte com o pagamento de uma MAIOR carga tributária.

Nessa linha de ideias, segue o entendimento de Eduardo SABBAG:

Por outro lado, se de algum modo a lei beneficiar o contribuinte, rechaçado estará o princípio da anterioridade pois tal postulado milita em favor do contribuinte, e nunca em seu detrimento, Vale dizer que, na esteira da doutrina majoritária, caso a lei extinga ou reduza o tributo, mitigue-lhe a alíquota, conceda uma isenção ou, até mesmo, dilate o prazo para pagamento do gravame, sem provocar qualquer onerosidade, deverá produzir efeitos imediatos, com pronta incidência[2].

Portanto, dito isso, entendo que a Lei nº 10.632, de 16 de dezembro de 2019, deve ser aplicada ao exercício de 2020.

Feitos esses esclarecimentos, passo a analisar o caso concreto.

Conforme dessume dos autos, a parte autora, segundo consta da Certidão emitida pela Secretaria de Estado e da Tributação (id. 58875252) obteve a isenção de IPVA a partir de 04 de junho de 2018, com validade da declaração indeterminada, enquanto perdurassem as condições necessárias para a concessão do benefício, em razão de sua deficiência física. A Lei nº 6.967/96 permite ao autor ser beneficiário da isenção do Imposto de Propriedade de Veículo Automotor - IPVA.

Ocorre que, em 1º de janeiro de 2019 ocorreu a baixa da isenção do IPVA para sua deficiência física, sob a justificativa de que o veículo ultrapassava a potência acima de 120HP, conforme documento anexo no id. 62404438 e Certidão emitida pela Secretaria de Estado da Tributação - id. 62404436.

Ainda, a parte autora alegou ter efetuado o pagamento das cotas do IPVA de 2019 e o pagamento...

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