Acórdão Nº 08381737020178205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 17-09-2021

Data de Julgamento17 Setembro 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08381737020178205001
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0838173-70.2017.8.20.5001
Polo ativo
NELSON BOEIRA JUNIOR e outros
Advogado(s): RENATO DE LIMA E SOUZA
Polo passivo
CONSTRUTORA RAMALHO MOREIRA LTDA
Advogado(s): LUCAS DUARTE DE MEDEIROS

EMENTA: CONSUMIDOR, RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE COBRANÇA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM SUSCITADA PELA RÉ. REJEIÇÃO. MÉRITO. PEDIDO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA. PAGAMENTO VOLUNTÁRIO DO PREPARO RECURSAL. PREJUDICADO. ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA E VÍCIOS CONSTRUTIVOS APÓS A ENTREGA DO IMÓVEL. CULPA DA CONSTRUTORA. DANO MORAL CONFIGURADO. ABALO PSICOLÓGICO SUPERIOR AO MERO ABORRECIMENTO. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. MINORAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO ARBITRADO. ADEQUAÇÃO AOS PRECEDENTES DESTA CORTE. CONHECIMENTO DOS RECURSOS. PROVIMENTO PARCIAL DO APELO DA DEMANDADA. DESPROVIMENTO DO RECURSO ADESIVO DOS DEMANDANTES.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Primeira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e dar parcial provimento ao apelo da parte demandada e negar provimento ao recurso adesivo dos demandantes, nos termos do voto do Relator, que integra o julgado.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível que tem como parte recorrente CONSTRUTORA RAMALHO MOREIRA LTDA. e recorridos NELSON BOEIRA JÚNIOR E RENATO DE LIMA SOUZA, interposta contra sentença proferida pelo Juízo de Direito da 17ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN (ID 9218875) que, nos autos da Ação de Cobrança c/c Indenização por Danos Materiais e Morais (proc. nº 0838173-70.2017.8.20.5001), promovida pelos ora Apelados, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral, nos seguintes termos:

“Pelo exposto, com fulcro no art. 487, inc. I, do CPC/15, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial para, (I) reconhecendo a mora da construtora ré em entregar o imóvel objeto da ação no prazo contratual estabelecido, condenar a parte ré a adimplir aos autores multa contratual de um salário-mínimo mensal (salário-mínimo vigente à época), no período de março de 2011 a julho de 2011, atualizado pelo índice do ENCOGE desde cada mês de inadimplência (de março a julho de 2011) e acrescido de juros de mora simples de 1% (um por cento) ao mês desde a constituição da mora (março de 2011); (II) condenar a parte ré a adimplir aos autores danos materiais no valor de R$ 19.779,94 (dezenove mil setecentos e setenta e nove reais e noventa e quatro centavos), atualizado pelo índice do ENCOGE desde o dispêndio (fevereiro de 2017 – ID nº 11999786, pg. 01) e acrescido de juros de mora simples de 1% (um por cento) ao mês desde a citação da ré (09/10/17 – ID nº 12717235) (art. 405 do CC/02); (III) condenar a parte ré a pagar aos autores indenização por danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) para cada, totalizando R$ 14.000,00 (quatorze mil reais), acrescido de correção monetária pelo índice do ENCOGE desde a presente sentença (súmula 362 do STJ) e acrescido de juros de mora simples de 1% (um por cento) ao mês desde a citação da ré (09/10/17 – ID nº 12717235) (art. 405 do CC/02).

Levando em conta a sucumbência mínima dos autores (só perderam em relação ao valor dos danos materiais pleiteados) e o princípio da causalidade (a parte ré deu causa ao ajuizamento da ação), condeno exclusivamente a parte ré ao pagamento das despesas processuais (custas processuais, honorários periciais, entre outras) e dos honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor final da condenação (somatório das condenações pecuniárias), acrescidos de juros simples de 1% (um por cento) ao mês a partir do trânsito em julgado da sentença (art. 85, § 16, do CPC/15), levando em conta a natureza ordinária da causa e o local habitual de prestação dos serviços advocatícios (art. 85, § 2º, do CPC).

Interposta(s) apelação(ões), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentar(em) contrarrazões ao(s) recurso(s), no prazo de 15 (quinze) dias. Em seguida, encaminhem-se os autos ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte para julgamento do(s) apelo(s).

Por fim, não havendo requerimento a ser apreciado ou diligência a ser cumprida, arquivem-se os autos.

Intimem-se as partes. Cumpra-se.”

Nas razões recursais (ID 9218877), a parte demandada suscitou, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva.

No mérito, postulou o conhecimento e provimento do apelo, para reformar a sentença, nos seguintes termos: a) concessão da gratuidade judiciária; b) afastar a responsabilidade da construtora pelo atraso de obra, bem como a multa contratual para esses casos; c) declarar a ausência de danos materiais na execução do projeto do imóvel; d) improcedência da pretensão indenizatória por danos morais, em razão de não ter sido cometido qualquer ato ilícito, tratando-se de mero aborrecimento. Subsidiariamente, que seja reformado o quantum indenizatório para evitar o enriquecimento ilícito da Apelada; e e) determinar a sucumbência recíproca.

A parte adversa apresentou contrarrazões (ID 9218882), pleiteando o desprovimento do apelo.

Na mesma oportunidade os Autores interpuseram recurso adesivo (ID 9218889) pugnando que a) o marco inicial a ser computado para fins de cálculo do atraso na entrega da obra deverá ser setembro de 2010, findando em julho de 2011, quando efetivamente entraram na posse do bem; b) a ratificação dos valores apresentados pela perita, computados apenas com a redução relativa à marquise, à porta, à mão-de-obra e aos honorários do engenheiro responsável; c) a majoração dos danos morais frente ao poder econômico da recorrida/demandada.

A empresa demandada apresentou contrarrazões ao recurso adesivo (ID 9218897).

A 10ª Procuradoria de Justiça deixou de opinar por entender ausente o interesse público que justificaria sua intervenção (ID 9532293).

É o relatório.

VOTO

I - PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM SUSCITADA PELA APELANTE

A recorrente CONSTRUTORA RAMALHO MOREIRA LTDA. pretende o reconhecimento da sua ilegitimidade passiva ad causam, uma vez que as infiltrações e danos no apartamento foram decorrentes da má aplicação do piso

que não foi realizado por ela, mas sim por empresa terceirizada contratada pelos autores, bem como pela alteração do projeto original do imóvel, fatos que retirariam sua responsabilidade sobre os eventos ocorridos.

Como visto, a obra foi realizada pela ré-apelante que, desde o início assumiu a responsabilidade sobre os reparos necessários, logo, não há que, posteriormente, se imiscuir na solução dos problemas.

Desse modo, rejeito a preliminar suscitada, mantendo a apelante no polo passivo da demanda.

II – MÉRITO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão pela qual conheço da apelação cível e do recurso adesivo.

Inicialmente, a empresa apelante CONSTRUTORA RAMALHO MOREIRA LTDA. solicitou os benefícios da justiça gratuita, argumentando não ter condições de arcar com o preparo recursal. Contudo, ao ser interpelada para trazer aos autos a comprovação contábil de sua hipossuficiência financeira, adimpliu as custas recursais (ID 9924564, págs. 1/2).

O presente apelo objetiva reformar a sentença proferida pelo juízo a quo, que acolheu parcialmente a pretensão autoral, para reconhecer a mora da construtora ré em entregar o imóvel objeto da ação no prazo contratual estabelecido, condenar a parte ré a adimplir aos autores multa contratual de um salário-mínimo mensal (vigente à época), no período de março de 2011 a julho de 2011, bem como ao pagamento de danos materiais (R$ 19.779,94) e morais (R$ 14.000,00).

Entretanto, a parte autora interpôs recurso adesivo (ID 9218889) asseverando que “o marco inicial a ser computado para fins de cálculo do atraso na entrega da obra deverá ser setembro de 2010, findando em julho de 2011, quando os recorrentes, efetivamente, entraram na posse do bem”, como também se insurgiram quanto à redução da indenização por danos materiais solicitados e à fixação dos danos morais irrisórios.

No caso dos autos, tem-se por aplicável os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor, haja vista tratar-se de relação jurídico-material em que de um lado a Recorrente figura como fornecedora de produtos, e do outro os Recorridos se apresentam como seu destinatário.

Ademais, cumpre ressaltar que, mesmo existindo pacto contratual livremente celebrado entre as partes, é assegurado ao Poder Judiciário intervir na relação jurídica, de modo a devolver ao negócio o equilíbrio determinado pela lei e a função social a ele inerente, sem que isso signifique interferência ilegal na autonomia da vontade das partes, ainda mais quando o negócio se encontra regido pelo Código de Defesa do Consumidor.

Em análise dos autos, observa-se que a postulante contratou com a CONSTRUTORA RAMALHO MOREIRA LTDA. a aquisição de uma unidade imobiliária 1.900, bloco B, do Residencial Park View, situado em Natal/RN.

Consoante declinado na exordial, a unidade imobiliária deveria ter sido entregue, incluindo o prazo de tolerância, em março/2011, ao passo que a construtora Recorrente se restringe a afirmar, de forma genérica, que inexiste infração contratual, deixando de desincumbir-se do ônus de apresentar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito dos autores, a teor do que dispõe o art. 373, II, do CPC, mostrando-se incontroverso o inadimplemento contratual promovido pela parte demandada, ora Apelante.

Como bem alinhado pelo magistrado sentenciante, os argumentos utilizados pela ré para justificar o atraso na entrega da obra por culpa dos autores não são admissíveis, vejamos:

" A parte ré afirma, contudo, que a...

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