Acórdão Nº 08385086020158205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 22-07-2021

Data de Julgamento22 Julho 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08385086020158205001
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0838508-60.2015.8.20.5001
Polo ativo
RILIANE NASCIMENTO DE LIMA e outros
Advogado(s): MIELSON DOS SANTOS MENEZES, FRANCISCO MICHELL DO NASCIMENTO NETO
Polo passivo
BANCO ITAULEASING S.A. e outros
Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR registrado(a) civilmente como WILSON SALES BELCHIOR, MARINA BASTOS DA PORCIUNCULA BENGHI, URBANO VITALINO DE MELO NETO, ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL. QUITAÇÃO INTEGRAL DO CONTRATO. NÃO FORNECIMENTO DOS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS PARA A TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE DO VEÍCULO IDENTIFICADO NOS AUTOS. MÁ PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS EVIDENCIADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL DEMONSTRADO. QUANTUM FIXADO EM VALORES EXCESSIVOS. NECESSIDADE DE QUANTIFICAÇÃO DA PRESTAÇÃO INDENIZATÓRIA EM VALORES RAZOÁVEIS E PROPORCIONAIS AO ABALO ENSEJADO. RETIFICAÇÃO DA SENTENÇA NESTE CONTEXTO. MULTA COMINATÓRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE JUSTA RAZÃO PARA A INEXECUÇÃO DA ORDEM JUDICIAL. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DA SANÇÃO PROCESSUAL. PLEITO PARA REDUÇÃO DA MULTA. MODIFICAÇÃO NO VALOR E FORMA DE INCIDÊNCIA PELA SENTENÇA. MONTANTE JÁ REDUZIDO A VALORES CONDIZENTES COM OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE, BEM COMO ADEQUADO À NATUREZA E RELEVÂNCIA DA DETERMINAÇÃO. VALOR QUE APRESENTA RELAÇÃO DIRETA COM A CONTINUIDADE DA OMISSÃO INJUSTIFICADA DA PARTE OBRIGADA. MANUTENÇÃO DO VALOR DA MULTA QUE SE IMPÕE. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. APELO ADESIVO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima nominadas:

ACORDAM os Desembargadores da Segunda Turma da Primeira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, conhecer e julgar parcialmente provido o recurso de apelação interposto pela instituição financeira demandada. Pela mesma votação, conhecer e julgar desprovido o recurso adesivo, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposta pelo Banco Itauleasing S/A e recurso adesivo interposto por Riliane Nascimento de Lima, Carlos Magno Silva e Adão Tibúrcio Freire em face de sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara Cível da Comarca de Natal (ID 7057152), que julgou parcialmente procedente a pretensão inicial, para determinar o fornecimento do documento de transferência do veículo identificado na vestibular, bem como fixar a condenação da instituição financeira apelante ao pagamento de indenização por danos morais, fixada a prestação indenizatória no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

No mesmo dispositivo, foi mantida a multa cominatória arbitrada inicialmente, no valor fixo de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

Em suas razões (ID 7057155), a instituição financeira recorrente suscita circunstância excludente de responsabilidade civil, destacando que o fato seria decorrente de atuação exclusiva da parte autora.

Assegura que promoveu a baixa do gravame incidente sobre o bem em 29 de janeiro de 2013.

Reafirma que não foram apresentados os documentos necessários para a transferência de propriedade sobre o bem junto à autarquia de trânsito competente.

Reputa inexistente qualquer dano de ordem moral, sobretudo por não haver comprovação de ato ilícito que lhe seja imputável.

Argumenta que a prestação indenizatória foi fixada em valor exorbitante.

Registra a necessidade de afastamento da multa, discorrendo sobre sua natureza igualmente exorbitante.

Requer o conhecimento e provimento do recurso.

Intimados, os autores apresentaram contrarrazões (ID 7057159), reafirmando que encontraram diversas dificuldades para promover a baixa de gravame incidente sobre o veículo, com especial fim de propiciar a transferência de titularidade.

Esclarecem que a recorrente não forneceu documentação suficiente para possibilitar a transferência do automóvel identificado nos autos.

Comunicam que jamais foi enviado o necessário documento para transferência.

Defendem a regularidade da condenação fixada na sentença, com adequação do montante estabelecido no juízo de primeiro grau.

Ponderam sobre a necessidade de manutenção da multa pelo descumprimento de decisão judicial.

Pretendem o desprovimento do recurso.

Os autos apresentaram apelo adesivo (ID 7057161), discorrendo sobre a necessidade de majoração da multa cominatória.

Pugnam pelo provimento do recurso de adesivo.

A instituição financeira apresentou contrarrazões (ID 7057165), pontuando sobre a desnecessidade de majoração da multa processual.

Finaliza requerendo o desprovimento do apelo adesivo.

Instado a se manifestar, o Ministério Público, por sua 12ª Procuradoria de Justiça (ID 7105952), declinou de participar do feito por ausência de interesse público.

É o relatório.

VOTO

Atendidos os pressupostos de admissibilidade, voto pelo conhecimento da apelação e do recurso adesivo, promovendo seu exame conjuntamente em razão da similitude nos temas de interesse.

Conforme relatado, buscam os autores o reconhecimento da má prestação dos serviços pela apelante, de sorte a ensejar sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais.

Preambularmente, mister fixar que a relação entre os litigantes apresenta nítida natureza consumerista, razão pela qual, deverá ser aplicada, para efeitos de composição da presente lide, a teoria da responsabilidade objetiva encartada no Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 14, caput, que assim prescreve:

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

Segundo a teoria da responsabilidade objetiva, o ofendido, ao buscar ser ressarcido pelos possíveis danos que lhe advieram, não precisa demonstrar a culpa do seu causador, sendo suficiente a comprovação do prejuízo suportado e o liame de causalidade entre a atividade do agente e o dano ensejado.

Baseia-se tal espécie de responsabilidade em um princípio de equidade, pelo qual aquele que se beneficia com uma determinada situação deve responder pelos riscos ou pelas desvantagens dela provenientes.

Na situação dos autos, observa-se que a parte autora informa que teve impossibilitada a transferência do veículo identificado nos autos em razão de omissão inescusável da empresa demandada.

Analisando os registros disponíveis, resta possível verificar que a requerente Riliane Nascimento de Lima promoveu a quitação dos valores relativos ao financiamento do automóvel descrito nos autos, não sendo referida circunstância sequer impugnada, tendo incidência para a espécie a regra do artigo 374, II e III, do Código de Processo Civil:

Art. 374. Não dependem de prova os fatos:

(...)

II - afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária;

III - admitidos no processo como incontroversos;

Portanto, tendo havido a integral quitação do contrato, seria devida o envio do documento apto à promoção da transferência de propriedade do veículo, na forma do artigo 1º da Lei n.º 11.649/2008:

Art. 1º Nos contratos de arrendamento mercantil de veículos automotivos, após a quitação de todas as parcelas vencidas e vincendas, das obrigações pecuniárias previstas em contrato, e do envio ao arrendador de comprovante de pagamento dos IPVAs e dos DPVATs, bem como das multas pagas nas esferas Federal, Estaduais e Municipais, documentos esses acompanhados de carta na qual a arrendatária manifesta formalmente sua opção pela compra do bem, exigida pela Lei nº 6.099, de 12 de setembro de 1974, a sociedade de arrendamento mercantil, na qualidade de arrendadora, deverá, no prazo de até trinta dias úteis, após recebimento destes documentos, remeter ao arrendatário:

I - o documento único de transferência (DUT) do veículo devidamente assinado pela arrendadora, a fim de possibilitar que o arrendatário providencie a respectiva transferência de propriedade do veículo junto ao departamento de trânsito do Estado;

II - a nota promissória vinculada ao contrato e emitida pelo arrendatário, se houver, com o devido carimbo de "liquidada" ou "sem efeito", bem como o termo de quitação do respectivo contrato de arrendamento mercantil (leasing).

Parágrafo único. Considerar-se-á como nula de pleno direito qualquer cláusula contratual relativa à operação de arrendamento mercantil de veículo automotivo que disponha de modo contrário ao disposto neste artigo.

Desta feita, inexiste qualquer comprovação de que a empresa demandada tenha remetido aos autores os documentos necessários para a transmissão da propriedade, havendo demonstração da má prestação dos serviços neste contexto.

Resta evidente, assim, a falha na prestação do serviço, na medida em que, em razão da omissão da instituição financeira em fornecer os documentos necessários, restou impossibilitada a transferência de propriedade do bem descrito nos autos, com patente repercussão negativa sobre a tranquilidade moral dos requerentes.

Assim, também se verifica presente o nexo de causalidade, estando patente no corpo dos autos que fora o defeito do serviço prestado pela requerida o fator responsável pelos danos imateriais suportados pelos autores.

Neste diapasão, em situação correlata, já foi assentada a responsabilidade da instituição financeira pelo atraso na retirada do gravame e fornecimento dos documentos necessários à transferência de propriedade de veículo:

EMENTA: CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. DEMORA NA BAIXA DO GRAVAME. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO DO VEÍCULO DEMONSTRADA. COMPROVAÇÃO DE FATO OFENSIVO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM QUE DEVE...

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