Acórdão Nº 08413968920218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 11-05-2023

Data de Julgamento11 Maio 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08413968920218205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0841396-89.2021.8.20.5001
Polo ativo
NATALIA MARCELINO ARAUJO
Advogado(s): NATASHA HELENA BENIGNO DE AZEVEDO, JOSE DE SOUZA NETO
Polo passivo
APEC - SOCIEDADE POTIGUAR DE EDUCACAO E CULTURA LTDA
Advogado(s): ARICIA CARLYELI DIAS DE OLIVEIRA, LUANNA GRACIELE MACIEL

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA C/C RESOLUÇÃO DE CONTRATO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. CUMPRIMENTO DE MAIS DE 75% DA CARGA HORÁRIA DO INTERNATO DO CURSO DE MEDICINA. REALIZADA COLAÇÃO DE GRAU ANTECIPADA À LUZ DA MP 934/2020 E PORTARIA N. 383 DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. DESNECESSIDADE DE CUMPRIMENTO DAS DEMAIS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS. INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO REMANESCENTE, HAJA VISTA O ENCERRAMENTO DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 32 DO TJRN. PRECEDENTES DESTA CORTE. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. APELO CONHECIDO E PROVIDO.

1. Considerando que a parte autora se enquadra na previsão contida na Medida Provisória nº 934/2020 e na Portaria nº 383, de 9 de abril de 2020, do Ministério da Educação, autorizada, portanto, a sua colação de grau antecipada, devendo-se levar em consideração o pagamento das mensalidades de forma correspondente ao número de disciplinas efetivamente cursadas, nos termos da Súmula nº 32 do TJRN, não implicando em ofensa ao pacta sunt servanda.

2. Assim, tendo em vista o encerramento da prestação dos serviços educacionais, decorrente da colação de grau antecipada, impende-se reconhecer a rescisão do respectivo contrato, bem como a nulidade do termo de confissão de dívida, eis que foi imputada à estudante/apelante a obrigação de pagar integralmente o valor correspondente ao semestre antecipado e que sequer foi cursado, além de ser devida a restituição à autora do valor de R$ 8.270,41 (oito mil, duzentos e setenta reais e quarenta e um centavos), correspondente aos danos materiais sofridos em razão da retenção da primeira mensalidade quando do pedido de cancelamento da matrícula.

3. Reconhecendo-se o acolhimento do pleito recursal, com autorização contida na Medida Provisória nº 934/2020 e na Portaria nº 383, de 9 de abril de 2020, do Ministério da Educação, não há que se falar na incidência de encargos rescisórios decorrentes do contrato de prestação de serviços, assim como do termo de confissão de dívida.

4. Precedentes do TJRN (Agravo de Instrumento, 0811162-92.2021.8.20.0000, Des. Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, assinado em 29/11/2022; Agravo de Instrumento, 0810801-75.2021.8.20.0000, Des. Expedito Ferreira, Primeira Câmara Cível, assinado em 06/05/2022 e Apelação Cível, 0858076-52.2021.8.20.5001, Des. João Rebouças, Terceira Câmara Cível, assinado em 06/10/2022).

5. Apelo conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em turma, à unanimidade de votos, conhecer e dar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Apelação Cível interposta por NATALIA MARCELINO ARAUJO em face da sentença proferida pelo Juízo da 8ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN (Id 17664061), que, nos autos da Ação de Anulação de Termo de Confissão de Dívida c/c Resolução de Contrato e Indenização por Danos Morais (Proc. nº 0841396-89.2021.8.20.5001), promovida em desfavor da APEC - SOCIEDADE POTIGUAR DE EDUCAÇÃO E CULTURA LTDA., julgou improcedente a pretensão autoral.

2. No mesmo dispositivo, condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, cuja exigibilidade resta suspensa por ser beneficiária da gratuidade judiciária.

3. Em suas razões recursais (Id 17664072), a apelante pugnou pelo provimento do recurso com a reforma da sentença, a fim de que seja declarada a nulidade do instrumento de confissão de dívida, desobrigando-a do pagamento correspondente, com a declaração de rescisão do contrato de prestação dos serviços educacionais e condenação da parte apelada ao pagamento de danos morais em seu favor, além de buscar a alteração da multa por rescisão contratual para o patamar de 10% (dez por cento).

4. Em sede de contrarrazões, a parte apelada refutou os argumentos deduzidos no apelo e, ao final, requereu o seu desprovimento (Id 17664077).

5. Com vista dos autos, Dr. Raimundo Sílvio Dantas Filho, Décimo Terceiro Procurador de Justiça, declinou de sua atuação no feito por entender que não se trata de hipótese de intervenção ministerial (Id. 17805572).

6. É o relatório.

VOTO


7. Conheço do recurso.

8. Pretende a apelante a reforma da sentença, a fim de que seja declarada a nulidade do instrumento de confissão de dívida, desobrigando-a do pagamento correspondente, com a declaração de rescisão do contrato de prestação dos serviços educacionais, além de buscar a alteração da multa por rescisão contratual para o patamar de 10% (dez por cento).

9. De início, sabe-se que, no contexto da pandemia de Covid-19 foi editada a Medida Provisória nº 934, de 1º de abril de 2020, que estabelece normas excepcionais sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior, a qual autoriza que seja abreviada a duração dos cursos de Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia, nos seguintes termos:

“Art. 2º As instituições de educação superior ficam dispensadas, em caráter excepcional, da obrigatoriedade de observância ao mínimo de dias de efetivo trabalho acadêmico, nos termos do disposto no caput e no § 3º do art. 47 da Lei nº 9.394, de 1996, para o ano letivo afetado pelas medidas para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública de que trata a Lei nº 13.979, de 2020, observadas as normas a serem editadas pelos respectivos sistemas de ensino.

Parágrafo único. Na hipótese de que trata o caput, a instituição de educação superior poderá abreviar a duração dos cursos de Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia, desde que o aluno, observadas as regras a serem editadas pelo respectivo sistema de ensino, cumpra, no mínimo:

I - setenta e cinco por cento da carga horária do internato do curso de medicina; ou

II - setenta e cinco por cento da carga horária do estágio curricular obrigatório dos cursos de enfermagem, farmácia e fisioterapia.”

10. De mais a mais, o Ministério da Educação regulamentou a matéria, através da Portaria nº 383, de 9 de abril de 2020, in verbis:

“Art. 1º Ficam autorizadas as instituições de ensino pertencentes ao sistema federal de ensino, definidas no art. 2º do Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017, em caráter excepcional, a anteciparem a colação de grau dos alunos regularmente matriculados no último período dos cursos de Medicina, Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia, desde que completada setenta e cinco por cento da carga horária prevista para o período de internato médico ou estágio supervisionado, enquanto durar a situação de emergência em saúde pública decorrente da pandemia do novo coronavírus - Covid-19, na forma especificada nesta Portaria.

§ 1º Considera-se o internato médico o período de dois anos de estágio curricular obrigatório de formação em serviço dos estudantes de Medicina.

§ 2º Considera-se estágio obrigatório para os cursos de Enfermagem, Farmácia e Fisioterapia a atividade supervisionada equivalente a vinte por cento da carga horária total do curso.

Art. 2º Os certificados de conclusão de curso e diplomas, emitidos em razão desta Portaria, terão o mesmo valor daqueles emitidos em rito ordinário.”

11. Como visto, a Medida Provisória nº 934, posteriormente convertida na Lei nº 14.040/2020, admitiu a antecipação da colação de grau caso o aluno possua uma carga horária mínima de 75% (setenta e cinco por cento) do internato médico e esteja matriculado no último período do curso.

12. Com efeito, analisando os autos, verifico que existe Instrumento de Confissão de Dívida celebrado entre a apelante e a apelada, em que a aluna se compromete ao pagamento de todo o valor semestral contratado junto à IES, reconhecendo o montante total previsto no item “a” do Quadro III, conforme descrito na Cláusula Primeira do referido termo.

13. Em que pese a apelada sustente a inexistência de coação quando da assinatura do termo de confissão de dívida, deve-se observar a aplicação da Súmula nº 32 desta Corte de Justiça ao caso. Vejamos:

“SÚMULA Nº 32 - A cobrança de mensalidade de serviço educacional deve ser proporcional à quantidade de matérias cursadas, sendo inadmissível a adoção do sistema de valor fixo.”

(Precedentes: AI 2017.001195-7, Primeira Câmara Cível, Rel. Des. Cornélio Alves, julgado em 16.08.2018. AI 2017.002349-5, Segunda Câmara Cível, Rel. Des. Virgílio Macêdo Jr, julgado em 04.07.2017. AI 20170116422 RN)


14. Ademais, imperativo consignar que, à hipótese, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, com subsunção à previsão contida em seu art. 3º, § 2º, pois se trata de relação de consumo em que a APEC - SOCIEDADE POTIGUAR DE EDUCAÇÃO E CULTURA LTDA. é instituição de ensino fornecedora de serviço de educação superior e a apelada é destinatária final desses serviços.

15. Nesse contexto, com amparo nos arts. 39, inciso V, e 51, incisos II e XV, do CDC, configura prática abusiva a cobrança de mensalidade em injustificada desproporcionalidade à carga horária efetivamente cursada, que é a contraprestação oferecida pela instituição de ensino.

16. Ressalte-se que, em casos semelhantes, esta Corte de Justiça tem considerado abusiva a previsão contratual de cobrança do valor integral da mensalidade, independentemente do número de disciplinas que o aluno irá cursar, por ferir o equilíbrio contratual e a boa-fé objetiva. Veja-se:

EMENTA: CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. ESTUDANTE DE MEDICINA. PANDEMIA DO...

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