Acórdão Nº 08456793420168205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 20-03-2019

Data de Julgamento20 Março 2019
Classe processualREMESSA NECESSÁRIA CÍVEL
Número do processo08456793420168205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 0845679-34.2016.8.20.5001
JUÍZO RECORRENTE: IWN COMERCIO DE REFRIGERACAO EIRELI - ME e outros
Advogado(s): MAYRA ANDRADE MARINHO FARIAS
RECORRIDO: DIRETOR DA PRIMEIRA UNIDADE REGIONAL DE TRIBUTAÇÃO EM NATAL/RN
Advogado(s):

EMENTA: CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. APREENSÃO DE MERCADORIA COMO MEIO COERCITIVO AO PAGAMENTO DO TRIBUTO. INADMISSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 323 DO STF. PRECEDENTES DESTA CORTE. VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. EXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas:

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento à remessa necessária, mantendo a sentença a quo por seus próprios fundamentos, nos termos do voto do Relator, que passa a fazer parte integrante deste.

Trata-se de Remessa Necessária em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara de Execução Fiscal Estadual e Tributária da Comarca de Natal/RN em Mandado de impetrado por IWN COMÉRCIO DE REFRIGERAÇÃO EIRELI-ME e RB COMÉRCIO E REFRIGERAÇÃO LTDA em face do DIRETOR DA 1ª UNIDADE REGIONAL DE TRIBUTAÇÃO com o intuito de que liberar bem apreendido por parte do FISCO.

Aduzem as impetrantes em sua peça vestibular que algumas mercadorias suas foram apreendidas sob a alegação de que os produtos estavam desacompanhados de notas fiscais, que, contudo estão colacionadas na petição de impetração.

Insurgem-se tão somente contra o ato de apreensão das mercadorias, e não contra o direito de fiscalização e cobrança que exerce a Autoridade Coatora, motivo pelo qual se socorre do Poder Judiciário para fazer valer os seus direitos de ter liberadas as suas mercadorias.

Sustentam que o nosso ordenamento jurídico tem assegurado à Fazenda Pública, através de outros meios legais, o exercício ao seu direito de cobrar o imposto supostamente devido, que não a utilização de sanções de ordem administrativa.

Afirmam que o Fisco apreendeu os bens das Impetrantes, exercendo atos introdutórios da própria pena de perdimento dos bens, privando-a do livre exercício de suas atividades econômicas e asseveram que, de acordo com a Súmula 323 do STF, é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo de pagamento de tributos.

Pediram, ao final, a concessão de Medida Liminar determinando-se que, sejam liberadas as mercadorias contidas nas notas fiscais acostadas a este processo, bem como que se abstenha a autoridade coatora de apreender/bloquear mercadorias a serem recebidas pelas impetrantes no futuro e, no mérito, pugnam pela ratificação em sentença da liminar concedida.

Liminar parcialmente deferida na decisão de ID 2044346.

O Estado do Rio Grande do Norte apresenta Defesa ao ato apontado como coator, suscitando a preliminar de perda do objeto, sob a assertiva de que a IWN Comércio de Refrigeração Eireli impetrou o presente Writ requerendo a liberação das mercadorias que foram apreendidas por apresentarem indícios de irregularidade fiscal, no entanto, conforme informações apresentadas pela Secretaria Estadual de Tributação, já ocorreu a liberação das mercadorias em questão, motivo pelo qual requer a extinção do processo sem julgamento do mérito, com fulcro no artigo 485, VI do CPC.

Defende a inadequação da via eleita uma vez que a lide envolve controvérsia que somente poderia ser dirimida mediante instrução probatória, incompatível com o remédio heróico e sustenta a legalidade do ato que determinou o pagamento do ICMS. Pediu, ao final, a denegação da segurança.

Na sentença (ID 2044361), restou concedida parcialmente a segurança, confirmando a liminar, no sentido de determinar a liberação das mercadorias irregularmente apreendidas. Deixou de conceder a segurança para as apreensões futuras de mercadorias que porventura sejam recebidas pelas impetrantes, por se tratar fato jurídico que ainda não ocorreu e que, conforme entendimento citado, deve ser analisado caso a caso.

A teor da Certidão de ID 2044368, o transcorreu in albis o prazo para recorrer de ambas as partes, procedendo-se a remessa necessária para este Tribunal.

O Ministério Público de segunda instância, através da 8ª Procuradora de Justiça em substituição legal à 7ª Procuradoria de Justiça, declinou de opinar no feito.

É o relatório.

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço da Remessa Necessária.

A questão central diz respeito à segurança concedida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara de Execução Fiscal Estadual e Tributária da Comarca de Natal/RN, para determinar ao Fisco estadual que libere a mercadoria descrita nos autos.

Desde já, é oportuno consignar que a Constituição estabelece em seu artigo 150, inciso IV, o Princípio do Não-Confisco Tributário, assim redigido: “sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]; IV – Utilizar tributo com efeito de confisco.”

Esta vedação constitucional do confisco tributário nada mais representa senão a coibição de qualquer aspiração estatal que possa levar, na seara da fiscalidade, à injusta apropriação pelo Estado, no todo ou em parte, do patrimônio ou das rendas dos contribuintes, de forma a comprometer-lhes, em razão da insuportabilidade da carga tributária, o exercício do direito a uma existência digna, ou, também, a prática de atividade profissional lícita ou, ainda, a regular satisfação de suas necessidades vitais básicas.

Importante assinalar, por oportuno, que o Estado conta com meios administrativos e judiciais para a realização do crédito tributário relativo a mercadorias ou bens, não podendo valer-se da apreensão como meio indireto de coerção. Logo, se há previsão de um processo de execução fiscal, é ele o meio legal e adequado para realização do crédito por meio da invocação da responsabilidade patrimonial.

Bem por isso, a jurisprudência pátria é no sentido de que, ainda quando se admite a apreensão, ela deve ser limitada ao tempo exclusivamente necessário à lavratura do auto de infração. Perfectibilizado este ato, em que há documentação do fato gerador com a respectiva base de cálculo do tributo, há que se liberar a mercadoria ou bem, salvo hipótese de contrabando, ficando a concreta materialização do crédito relegada aos procedimentos administrativos e, eventualmente, judiciais.

No presente caso, entendo que não há qualquer reparo a realizar na sentença.

Isso porque, a apreensão de bens, sem o devido processo legal e por tempo superior ao necessário para a formalização do auto de infração fiscal, é ato absolutamente ilegal contra o qual se impõe a concessão da segurança.

Com efeito, embora o Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 13.640/97, em seu texto permita a apreensão de mercadorias nos casos ali especificados, há de ser entendido apenas pelo tempo necessário à coleta de elementos indispensáveis à caracterização de eventual ilícito tributário e identificação do sujeito responsável pela obrigação tributária ou contribuinte do imposto exigido, razão pela qual, não deve o bem no feito em discussão permanecer em poder do Estado.

Assim, mesmo diante da hipótese do contribuinte estar em situação irregular diante do fisco, deve este unicamente adotar as providências necessárias para a constituição do crédito tributário e posterior cobrança. Para tanto, basta apenas identificar o sujeito passivo da obrigação tributária e o valor devido, não se admitindo a retenção por tempo indefinido do produto pertencente ao contribuinte.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 323, que possui o seguinte teor: "É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.”

Não foi por outra razão que esta Egrégia Câmara já se posicionou no sentido de que não é tolerável a prática de retenção de mercadorias apreendidas com o fito de obtenção de pagamento de tributos, como se vê:

EMENTA: CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA QUE CONCEDEU O WRIT. APREENSÃO DE MERCADORIAS EM RAZÃO DE NÃO RECOLHIMENTO DE TRIBUTO. ILEGALIDADE. INADMISSIBILIDADE DO MEIO COERCITIVO. ENTENDIMENTO ALBERGADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS APTOS A DESCONSTITUIR O JULGADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

- Nos termos da Súmula número 323 do STF, é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.(RN nº 2016.016238-5, Primeira Câmara Cível, Relator: Desembargador Cornélio Alves, julgado em 18/12/2018)


EMENTA: TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. APREENSÃO DE MERCADORIAS. IMPOSSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO DA RETENÇÃO DE MERCADORIA COMO MEIO COERCITIVO DE PAGAMENTO DE TRIBUTOS. SÚMULA 323 DO STF. ILEGALIDADE CARACTERIZADA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. PRECEDENTES.

- De acordo com a Súmula 323 e com base em remansosa jurisprudência acerca do tema, é ilegal o uso da retenção de mercadoria pelo Fisco Estadual, como meio coercitivo de cobrança do imposto ou quando identificado o real proprietário dos bens transportados.(RN nº 2017.021487-6, Terceira Câmara Cível, Relator: Desembargador João Rebouças, julgado em 13/11/2018).

Nesses termos, em função dos princípios constitucionais do não-confisco (art. 150, IV, CF), da livre iniciativa (art. 1º, IV, CF) e da liberdade de exercício da atividade econômica (art. 170, parágrafo único, CF), afigura-se líquido e certo o direito das contribuintes de terem sua mercadoria...

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