Acórdão Nº 08466131620218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 18-05-2023

Data de Julgamento18 Maio 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08466131620218205001
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0846613-16.2021.8.20.5001
Polo ativo
LENILDA GOMES DO AMARANTE
Advogado(s): TALES ROCHA BARBALHO
Polo passivo
MUNICIPIO DE NATAL
Advogado(s):

RECURSO CÍVEL Nº 0846613-16.2021.8.20.5001

RECORRENTE: LENILDA GOMES DO AMARANTE

RECORRIDA: MUNICÍPIO DE NATAL

RELATOR: JUIZ RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA QUE EXTINGUIU PRECOCEMENTE O FEITO. CAUSA MADURA. ENFRENTAMENTO DO MÉRITO. PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO AUTORAL. NUTRICIONISTA DA REDE MUNICIPAL DE SAÚDE. AÇÃO QUE RECLAMA PROGRESSÃO E PROMOÇÃO FUNCIONAL. SERVIDOR QUE ALEGA ILEGALIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM NÃO IMPLEMENTAR BENEFÍCIO LEGALMENTE PREVISTO QUE LHE É FAVORÁVEL. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO. EXTINÇÃO PREMATURA DO FEITO QUE CONFIGURA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO ACESSO À JUSTIÇA. SENTENÇA ANULADA. PETIÇÃO INICIAL INSTRUÍDA COM OS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS AO PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DA AÇÃO. CAUSA QUE SE ENCONTRA MADURA PARA JULGAMENTO. SATISFEITOS OS REQUISITOS PREVISTOS NA LEI DE REGÊNCIA. DEVIDA A REALIZAÇÃO DAS PROMOÇÕES E PROGRESSÕES À LUZ DA LCM º 120/2010. RECURSO PROVIDO.

1. A parte autora, ora recorrente, reclama à inicial de violação concreta a direito seu, ante a inércia do ente estatal em implementar, no tempo devido, vantagem legalmente prevista em lei. Ora, o caso é de direito subjetivo do servidor, que, segundo a lei de regência, reclama apenas o requisito temporal para a sua concreta implementação.

2. A rigor, ao vir a juízo, a recorrente alega ter preenchido os requisitos legais para a obtenção da vantagem que a Administração Pública lhe deveria ter assegurado, mas não o fez. Evidente, pois, a lesão reclamada à inicial, a depender apenas da apreciação das provas quanto à real satisfação ou não dos requisitos legais pertinentes ao direito alegado, o que se insere no juízo de mérito, não da admissibilidade da ação.

3. Sendo o princípio da legalidade pilastra-mor do direito administrativo, a impor a estrita observância da lei pelo administradora cada passo do seu proceder, a simples omissão administrativa, consistente em não implementar vantagem legalmente prevista para o servidor, configura a lesão que o habilita a socorrer-se da jurisdição, a teor da franquia garantida pelo art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Tanto é assim, que, uma vez vitorioso na demanda judicial, será assegurado ao servidor o pagamento dos valores retroativos, desde a data em que tenha satisfeito os requisitos legais para a obtenção da vantagem, não da data do requerimento, caso este tenha sido formulado.

4. Portanto, a recorrente, pelo só fato de alegar o não cumprimento da lei pela Administração Pública, suprimindo direito seu enquanto servidor, já configura, cristalinamente, a condição da ação do interesse de agir (CPC, arts. 17, 330, III, e 485, VI). No caso, a extinção do processo sem julgamento do mérito, porque a parte não esgotou a via administrativa, representa clara afronta ao princípio do acesso à justiça, pois impõe ao cidadão condição não prevista em lei para demandar em juízo.

5. Causa madura para julgamento. Progressões e promoção deferidas à luz da ÇCM nº 120/2010, considerado o implemento dos requisitos objetivos previstos da lei.

6. Recurso provido.

ACÓRDÃO

ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, reconhecendo a nulidade da sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito e, considerando a causa madura para o julgamento, reconhecer o direito da autora/recorrida à ascensão funcional na carreira ao nível II, Classe A, em 27.03.2014; ao Nível II, Classe B, em 27.03.2016; à ao Nível II, Classe C, em 27.03.2018; e ao Nível II, Classe D em 27.03.2020, bem como ao recebimento das diferenças salariais decorrentes da mora administrativa, nos termos do voto do relator.

Sem condenação em custas processuais e em honorários advocatícios ante o provimento do recurso.

Participaram do julgamento, além do relator, a juíza Sandra Simões de Souza Dantas Elali e o juiz Madson Ottoni de Almeida Rodrigues.

Natal/RN, data do sistema.

RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

Juiz relator

RELATÓRIO

1. Recurso Inominado interposto por LENILDA GOMES DO AMARANTE contra sentença que julgou extinto sem resolução de mérito seu pleito inicial em face do MUNICÍPIO DE NATAL, através do qual pretendia que o ente público fosse compelido a realizar o correto enquadramento da autora para a Classe II, Nível A, a partir de 27.03.2014; para o Nível B, Classe II, a partir de 27.03.2016; para o Nível C, Classe II, a partir de 27.03.2018; e Classe II, nível D, a partir de 27.03.2020. Pretendia, também, a condenação ao pagamento das diferenças salariais havidas em razão da demora das progressões funcionais.

2. Na sentença, o juiz Reynaldo Odilo Martins Soares entendeu que a autora não demonstrou que sua pretensão encontrou resistência na seara administrativa. Considerando inexistir interesse de agir neste contexto, concluiu haver carência de ação.

3. Nas razões do recurso, a recorrente sustentou que, consoante consolidada jurisprudência do Tribunal de Justiça e das Turmas Recursais, não há necessidade de prévio requerimento administrativo para propor a ação judicial. Adiante, sustentou que a mora administrativa é patente, pois a autora ficou mais de 10 anos no serviço público no enquadramento que foi inicialmente lhe dado da carreira, qual seja, Nível C, classe I (pois contava com 17 anos de serviço público anterior). Considerando que o enquadramento inicial, com base no art. 34 da Lei Complementar nº 120/2010, se deu em 27.03.2011 e existe o interstício mínimo de 24 meses até a próxima progressão, afirmou que deveria ter ascendido na carreira da seguinte forma: para a Classe II, Nível A, a partir de 27.03.2014 para o Nível B, Classe II, a partir de 27.03.2016, para o Nível C, Classe II, a partir de 27.03.2018, e Classe II, nível D, a partir de 27.03.2020. Sustentou que o ente público deve, ainda, pagar-lhe as diferenças salariais decorrentes de sua omissão. Pediu a reforma da sentença para que seja reconhecido o interesse de agir e julgados procedentes os pleitos formulados na inicial.

4. Nas contrarrazões, o Município de Natal impugnou o pedido de gratuidade judiciária formulado, afirmando que a autora aufere renda mensal líquida no importe de R$ 4.017,77 (quatro mil e dezessete reais e setenta e sete centavos), não sendo possível concluir que não pode arcar com as custas do processo. Adiante, disse que falta, de fato, interesse de agir, devendo ser mantida a sentença por seus próprios fundamentos. Subsidiariamente, sustentou que qualquer pretensão anterior a 27/09/2016 está prescrita e que, para que o servidor tenha direito às progressões requeridas, além do cumprimento do requisito temporal, deve passar na avaliação de desempenho, o que não foi satisfeito.

5. É o relatório.

VOTO

6. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

7. DEFIRO o pedido de justiça gratuita formulado pela parte recorrente, vez que estão presentes os requisitos que autorizam a concessão do benefício, a teor do que dispõe o art. 99, §§ 3º e 7º, do CPC.

8. A impugnação feita nas contrarrazões não prospera, pois o valor recebido mensalmente pela postulante da gratuidade, por si só, não é suficiente para determinar a capacidade de arcar com as despesas processuais. O valor de R$ 4.017,77 (quatro mil e dezessete reais e setenta e sete centavos) não é manifestação evidente de riqueza. O §3º do art. 99 do CPC dispõe presumir-se verdadeira declaração de insuficiência de recursos deduzida exclusivamente de pessoa natural, o que implica dizer que sem elementos concretos que permitam concluir inverídica a declaração de hipossuficiência financeira, não há razão para indeferir o benefício requerido.

9. As razões do recurso merecem amparo.

10. Da análise dos autos, resta claro que a parte autora é ocupante do cargo efetivo de nutricionista junto ao Município de Natal e pleiteia, nesta demanda, sua ascensão na carreira, conforme regramento da Lei Complementar nº 120/2010. É possível inferir a desnecessidade de requerimento administrativo prévio nos processos de progressão horizontal, ante ausência de previsão legal para tanto.

11. Com todo respeito ao entendimento que fundamentou a sentença recorrida, mas o caso sob exame não configura carência de ação.

12. A parte autora, ora recorrente, reclama à inicial violação concreta a direito seu, ante a inércia do ente estatal em implementar, no tempo devido, vantagem legalmente prevista em lei. Ora, o caso é de direito subjetivo do servidor, que, segundo a lei de regência, depende apenas do requisito temporal para a sua concreta implementação e do requisito de avaliação de desempenho que, por depender inteiramente da administração pública, não pode constituir ônus ao administrado.

13. A rigor, ao vir a juízo, a recorrente alega ter preenchido os requisitos legais para a obtenção da vantagem que a Administração Pública lhe deveria ter assegurado, mas não o fez. Evidente, pois, que a lesão reclamada à inicial depende apenas da apreciação das provas quanto à real satisfação ou não dos requisitos legais pertinentes ao direito alegado, o que se insere no juízo de mérito, não da admissibilidade da ação. No caso, a extinção do processo sem julgamento do mérito, porque a parte não esgotou a via administrativa, representa clara afronta ao princípio do acesso à justiça, pois impõe ao cidadão condição não prevista em lei para demandar em juízo.

14. Com efeito, sendo o princípio da legalidade pilastra-mor do direito administrativo,...

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