Acórdão Nº 08471727020218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 02-03-2023

Data de Julgamento02 Março 2023
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Número do processo08471727020218205001
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0847172-70.2021.8.20.5001
Polo ativo
FRED AUGUSTO SEABRA DE MELO AZEVEDO CAMARA e outros
Advogado(s):
Polo passivo
MPRN - 75ª Promotoria Natal
Advogado(s):

Apelação Criminal nº 0847172-70.2021.8.20.5001

Origem: 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal

Apelante: Fred Augusto Seabra de Melo Azevedo Câmara

Defº. Público: Igor Melo Araújo

Apelado: Ministério Público

Relator: Desembargador Saraiva Sobrinho

Revisor: Desembargador Glauber Rêgo

EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL. APCRIM. RECEPTAÇÃO (ART. 180, CAPUT, C/C. ART. 71, AMBOS DO CP). ÉDITO PUNITIVO. NULIDADE PROCESSUAL ANTE A AUSÊNCIA DE OFERTA PRÉVIA DO ANPP. PROPOSITIVA ENTABULADA TEMPESTIVAMENTE PELO MP, SEM RESPOSTA DO INTERESSADO. PECHA INEXISTENTE. PLEITO ABSOLUTÓRIO/DESCLASSIFICATÓRIO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS QUANTUM SATIS. CENÁRIO FÁTICO REVELADOR DO ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO. DOLO COMPROVADO. TESE IMPRÓSPERA. DOSIMETRIA. IMPROFICUIDADE NO FUNDAMENTO UTILIZADO PARA DESVALORAR O VETOR “PERSONALIDADE DO AGENTE”. CIRCUNSTANTE PAUTADA EM RETÓRICA INIDÔNEA. REDIMENSIONAMENTO IMPOSITIVO. DECISUM MODIFICADO EM PARTE. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos e em consonância com a 2ª PJ, conhecer e prover parcialmente o Apelo, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

1. Apelo interposto por Fred Augusto Seabra de Melo Azevedo Camara em face da sentença da Juíza da 7ª VCrim da Capital, a qual, na AP 0847172-70.2021.8.20.5001-1, onde se acha incurso no art. 180 (receptação) c/c art.71 (2x) ambos do CP, lhe imputou 02 anos e 04 meses de reclusão em regime semiaberto (art. 33,§3º do CP), além de 35 dias-multa (ID 16992174).

2. Segundo a exordial, “… Em 22 de setembro de 2021, em horário não especificado, no Mercado da Av. 04, situado no bairro Alecrim, nesta Capital, o denunciado adquiriu, em proveito próprio, 01 (um) notebook Samsung, com maleta e carregador, tendo ciência da sua origem espúria. Depreende-se dos autos inclusos que, no dia mencionado, por volta das 16h, no estacionamento da Farmácia “Globo”, situada na Av. Prudente de Morais, nº 6428, bairro Candelária, nesta urbe, a vítima Tatiana Pinto teve subtraído do interior do seu veículo um notebook com o respectivo carregador, dentre outros objetos. Em razão disso, a ofendida passou a realizar pesquisa no site “OLX” com a ajuda do seu sobrinho e encontrou o anúncio feito pelo perfil de Sidney Sheldon da venda de um notebook com características semelhantes àquele furtado, pelo valor de R$ 1.950,00 (hum mil e novecentos e cinquenta reais). Deste modo, demonstrando interesse no produto, marcou encontro com o vendedor no dia seguinte à tarde, no Supermercado Carrefour, e acionou a Polícia Civil. Sidney Sheldon se dirigiu ao local acertado para a comercialização do produto, ocasião em que findou preso em flagrante delito. Interrogado pela autoridade policial, ele declarou estava vendendo o bem a pedido do seu cunhado ora acusado, sem conhecer a origem dele...". (ID 16991558)

3. Sustenta, em resumo: 3.1) nulidade processual por ausência de oferta do ANPP; 3.2) fragilidade de acervo a embasar a persecutio, maiormente por inexistir prova do dolo, havendo a imputação de ser desclassificada à modalidade culposa; e 3.3) redimensionamento da pena-base (ID 16992198).

4. Contrarrazões insertas no ID 16992201.

5. Parecer pelo provimento parcial no tangente ao pleito dosimétrico (ID 17094432).

6. É o relatório.

VOTO

7. Conheço do Recurso.

8. No mais, deve ser provido em parte.

9. Principiando pela tese de nulidade processual por ausência de oferta do Acordo de não persecução penal (subitem 3.1), tenho-a por inexitosa.

10. A uma, porque aludido benefício foi oportunizado por ocasião do oferecimento da denúncia, e mesmo assim, o Inculpado, após duas notificações, haver permanecido silente, como delineado pela 2ª PJ (ID 17094432):

“...Como bem argumenta o Parquet em sede de contrarrazões ao recurso, se faz oportuno frisar que “foi ofertado o benefício ao Apelante, porém, ele que não demonstrou interesse em firmá-lo”. Compulsando os autos, percebe-se que a afirmação da acusação procede, já que encontra amparo nas Certidões de ID nº 16991560 - Pág. 1, 16991561 - Pág. 1 e 16991562 - Pág. 1, as quais atestam o contato havido entre Promotoria e acusado, com a finalidade de realização de audiência para oferecimento do ANPP... Destarte, tendo sido oferecido o Acordo de Não Persecução Penal e não viabilizado por conduta do próprio apelante, mediante o não comparecimento à Promotoria de Justiça, não se vislumbra motivo para declaração da nulidade da sentença condenatória...”.

11. A duas, em virtude da aludida proposição não configurar direito subjetivo do Acusado, mas sim uma faculdade do dominus littis, concorde entendimento assente no Tribunal da Cidadania:

PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. NÃO OFERECIMENTO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. PODER-DEVER DO MINISTÉRIO PÚBLICO. FUNDAMENTAÇÃO EXISTENTE. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PRECEDENTES DO STJ. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. "De acordo com entendimento já esposado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, a possibilidade de oferecimento do acordo de não persecução penal é conferida exclusivamente ao Ministério Público, não constituindo direito subjetivo do investigado" (RHC n. 161.251/PR, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 16/5/2022). 2. Ressalta-se, ainda, que "(...) não há ilegalidade na recusa do oferecimento de proposta de acordo de não persecução penal quando o representante do Ministério Público, de forma fundamentada, constata a ausência dos requisitos subjetivos legais necessários à elaboração do acordo, de modo que este não atenderia aos critérios de necessidade e suficiência em face do caso concreto" (RHC n. 161.251/PR, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe de 16/5/2022). 2.1. No caso dos autos, o Ministério Público Federal justificou o não oferecimento do ANPP, afirmando que a ré, além de não confessar o delito, deliberadamente aceitou participar do esquema fraudulento supostamente proposto por "Alex", aderindo voluntariamente ao plano criminoso dedicado à obtenção de vantagem pecuniária indevida em detrimento da Caixa Econômica Federal - CEF (Instituição gerenciadora do PIS), e sequer poderia ser beneficiada com a suspensão condicional do processo, de modo que o acordo não se mostraria necessário e suficiente para à reprovação do crime, e que caberia apenas ao caso o recebimento da denúncia com a regular tramitação da Ação Penal - ID 4058400.9415080 (AgRg no REsp 1998721 / RN, Rel. Min. JOEL ILAN PACIORNIK, j. em 12/12/2022, Dje 14/12/2022).

12. De mais a mais, além do prefalado impedimento, a hipótese não cuida de Acusado confesso, militando ainda em seu desfavor a reiteração delitiva, segundo asseverou a PJ em parece complementar (ID 17428734):

“... Ademais, não houve confissão formal e circunstanciada dos fatos por parte de FRED AUGUSTO SEABRA DE MELO AZEVEDO CÂMARA. Conforme constante nos autos, o denunciado afirmou perante a autoridade policial que desconhecia a natureza ilícita do objeto (ID 16991550 – Pág. 31)... Ademais, a recusa de ANPP também se justifica pela conduta criminosa reiterada do réu... Em consulta ao Pje 1º grau pelo nome do denunciado, verifica-se que ele responde, sem contar com esta, a mais três ações penais (0803793-30.2022.8.20.5103 - 2ª Vara da Comarca de Currais Novos; 0800819-11.2022.8.20.5300 - 2ª Vara da Comarca de Currais Novos; 0800062-87.2022.8.20.5600 - 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal), todas por crimes contra o patrimônio, sendo o ANPP inviável...”.

13. Esta é, gize-se, a linha intelectiva do STJ:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. NEGATIVA FUNDAMENTADA PELO MP LOCAL. DENÚNCIA RECEBIDA ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI 13.964/2019. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. 1. O acordo de não persecução penal foi negado pelo Tribunal de Justiça pois, apesar do agravante ser primário, responde por outra ação penal, o que foi considerado fundamento válido pelo Ministério Público local para a negativa. Nesse sentido, não há ilegalidade verificável, nos termos da jurisprudência desta Corte superior. Precedentes (AgRg no HC 736449 / SC, Rel. Min. OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), j. em 20/09/2022, Dje. 23/09/2022).

14. Por fim, tendo o órgão superior do MP negado o oferecimento da benesse em liça, resta-se inoperante a tentativa de viabilizá-lo neste momento.

15. No tocante ao pleito absolutório/desclassificatório (subitem 3.2), ressoa descabido.

16. Com efeito, restaram satisfatoriamente demonstradas materialidade e autoria em ambas as receptações, consoantes se veem do acervo probatório, notadamente pelos Boletins de Ocorrência 00127130/2021 e 00127745/2021 (IDs 16991546 - Págs. 19 e 20), Termo de Apreensão (ID16991546 - Pág. 08) e depoimentos colhidos.

17. Por oportuno, transcrevo fragmentos das oitivas dos policiais civis, relatando tanto os motivos ensejadores da persecutio bem como o instante da realização do flagrante efetuado (ID 17094432):

Jorge Fernandes de Oliveira

“... o depoente participou da condução do Sidney... vítima marcou com o Sidney no Carrefour e participou dessa primeira abordagem; que foi o depoente e o policial Cláudio Virgulino que conversaram com o Sidney sobre a origem do notebook... Sidney disse que estava vendendo para o cunhado... Cláudio teve o cuidado de conferir se o notebook era da vítima e era mesmo... levaram o Sidney para a delegacia... Sidney disse que estava só anunciando e vendendo para o cunhado... não se recorda se Sidney falou com o cunhado no local......

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