Acórdão Nº 08479215820198205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 18-03-2021

Data de Julgamento18 Março 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08479215820198205001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0847921-58.2019.8.20.5001
Polo ativo
JOSIVAN CAETANO DA SILVA JUNIOR
Advogado(s): DAYVISSON CABRAL FERREIRA, LIDJANE CAVALCANTE DOS SANTOS
Polo passivo
BANCO BONSUCESSO S.A.
Advogado(s): CARLOS FERNANDO DE SIQUEIRA CASTRO

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. DECISUM DE PRIMEIRO GRAU QUE JULGOU PROCEDENTE O PLEITO AUTORAL. PREJUDICIAL DE MÉRITO DA PRESCRIÇÃO, SUSCITADA PELO RECORRENTE. REJEIÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 205 DO CC. EM AÇÕES REVISIONAIS DE CONTRATOS BANCÁRIOS A PRETENSÃO SÓ É FULMINADA PELA MARCHA PRESCRICIONAL APÓS O TRANSCURSO DO PRAZO DECENAL. MÉRITO. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO E CARTÃO DE CRÉDITO. CONSUMIDOR QUE TINHA CONHECIMENTO PRÉVIO DO PACTO FIRMADO. EXCESSO DE COBRANÇA NÃO VERIFICADO. INEXISTÊNCIA DE LESÕES PATRIMONIAIS E EXTRAPATRIMONIAIS PASSÍVEIS DE SEREM INDENIZADAS. REFORMA DO JULGADO VERGASTADO QUE SE IMPÕE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas. Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer do recurso e rejeitar a prejudicial de mérito suscitada pelo recorrente. Pela mesma votação, dar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Banco Olé Bonsucesso em face da sentença prolatada (id 8544533) pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Mossoró, nos autos da "Ação de Revisão Contratual Com Pedido Tutela”, julgou procedente a pretensão deduzida na exordial, nos seguintes termos:

(...) Diante do exposto, julgo procedentes os pedidos inicialmente formulados, para determinar I) determinar a revisão da dívida da parte autora, com restituição em dobro do montante indevidamente pago, considerando a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil, acrescido de correção monetária contada de cada desembolso, e juros de mora de um por cento ao mês desde a citação; II) caso a taxa apurada seja maior do que a cobrada, prevalecerá a do contrato.

Determino a suspensão definitiva dos descontos, fixando multa de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por mês em que forem descontados valores discutidos nos autos.

Condeno, por fim, o demandado, no pagamento das despesas do processo e em honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o montante da diferença em favor do autor.”

Em suas razões (id 8544544) aduz, em síntese, que: a) os pedidos autorais que abrangem os anos de 2010 a 2019 estão atingidos pela prescrição; b) não há indícios de prática comercial abusiva da instituição financeira, e, na mesma toada, não há que se falar em ilegalidade dos descontos ou do contrato, tendo em vista que os requisitos necessários ao negócio jurídico perfeito se fizeram presentes na celebração deste”; c) Não pode prosperar qualquer alegação de fraude, uma vez que não há como ter sido a parte induzida a erro, dada a falta de instrução, bem como, há de ressaltar que não há qualquer evidência de sua eventual incapacidade para os atos da vida civil; d) as faturas enviadas mensalmente ao apelado mostram de forma objetiva os encargos suportados; e) No contrato não informação de juros, pois o cartão de crédito é enviado bloqueado, logo, realmente não caberia juros caso o Recorrido não utilizasse o cartão”; f) a hipótese dos autos é de cartão de crédito consignado e não empréstimo consignado; g) Não havendo desconto indevido, não há que falar em devolução dos referidos valores de forma dobrada, uma vez que tal conduta caracterizaria enriquecimento ilícito”.

Por fim, requer o conhecimento e provimento do apelo, para que a sentença atacada seja reformada, julgando-se improcedente o pedido autoral. Alternativamente, pede que a repetição do indébito seja simples.

Contrarrazões ao id 8544553.

Desnecessária a intervenção do Ministério Público, nos termos do art. 178 do CPC.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do apelo.

Narram os autos que a sentença proferida pelo Juízo da 10ª Vara Cível da Comarca de Mossoró, nos autos da "Ação de Revisão Contratual Com Pedido Tutela”, julgou procedente a pretensão deduzida na exordial, para “determinar a revisão da dívida da parte autora, com restituição em dobro do montante indevidamente pago”, bem assim estabelecer a suspensão definitiva dos descontos, fixando multa de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por mês em que forem descontados valores discutidos nos autos”.

Inicialmente, insta analisar a prejudicial de mérito da prescrição de direito.

Deveras, não assiste razão ao recorrente, posto que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o prazo prescricional é decenal em ações como a da espécie. Confira-se, nesse sentido (grifos acrescidos):

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. PRAZO PRESCRICIONAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO PROVIDO. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL 1. O prazo prescricional nas ações revisionais de contrato bancário em que se discute a legalidade das cláusulas pactuadas, a orientação jurisprudencial desta Corte Superior é clara, ao entender que "As ações revisionais de contrato bancário são fundadas em direito pessoal, motivo pelo qual o prazo prescricional, sob a égide do Código Civil de 1.916 era vintenário, e passou a ser decenal, a partir do Código Civil de 2.002" (REsp1.326.445/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/02/2014, DJe de 17/02/2014). 2. No caso concreto, o período da avença iniciou-se em setembro de 1996, data a partir da qual se iniciou o prazo prescricional, que se encerrou em 11 de janeiro de 2013 (dez anos, a contar da vigência do novo Código). Os autores ajuizaram a ação em maio de 2010, portanto sua pretensão não está alcançada pela prescrição. 3. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, na extensão, dar provimento ao recurso especial, no sentido de determinar o retorno dos autos à eg. Corte de origem a fim de que, afastada a prescrição, profira nova decisão, dando ao caso a solução que entender cabível. (AgInt no REsp 1653189/PR, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 21/08/2018, DJe 20/09/2018)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO BANCÁRIO. PRESCRIÇÃO. DIREITO PESSOAL. VINTENÁRIA SOB A ÉGIDE DO CC/16. DECENAL A PARTIR DO INÍCIO DA VIGÊNCIA DO CC/02. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 1. O acórdão recorrido que adota a orientação firmada pela jurisprudência do STJ não merece reforma. 2. Agravo interno no agravo em recurso especial não provido. (AgInt no AREsp 889.930/MS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 19/12/2017).

Assim, há de ser rejeitada a tese trazida no recurso quanto a prejudicial de mérito da prescrição.

Sob outra análise, tem-se como inviável a manutenção do julgamento de procedência realizado pelo magistrado sentenciante.

Isso porque, observo do arcabouço processual que o autor não nega a relação jurídica estabelecida com o banco réu, além do que afirma que contratou empréstimo com o mesmo.

Portanto, é necessário esclarecer se há irregularidade no negócio celebrado entre os litigantes, consistente no desconto em folha do valor correspondente ao mínimo da fatura do cartão de crédito do consumidor.

Impende salientar que consta do documento de id 8544348, item 5, a informação que haverá a dedução mensal em remuneração do requerente de valor correspondente à cobrança mínima dos gastos realizados em seu cartão.

Outrossim, o inciso III do art. 6ª do CDC dispõe que (grifos acrescidos):

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...);

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

Ainda preceitua o art. 46 do mesmo Diploma Consumerista:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Desse modo, os elementos informativos dos autos demonstram que é inconteste que o negócio firmado objeto desta demanda é válido, pois inexiste vício capaz de inquiná-lo, tendo em vista que o demandante tinha conhecimento acerca do que pactuou, bem assim da forma que devia se dar o pagamento do que contratou.

Ora, na medida em que o recorrido somente efetuou o pagamento do valor correspondente ao mínimo da fatura do cartão de crédito e realizou compras e saques, por óbvio, não houve a quitação completa do débito adquirido.

Sobre a licitude da cláusula contratual objeto da ação, vê-se existir recente pronunciamento oriundo do STJ em oposição ao que fora consignado na origem, como resta evidenciado a seguir (grifos acrescidos):

“RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. IRRESIGNAÇÃO SUBMETIDA AO CPC/73. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO POR APOSENTADOS E PENSIONISTAS. ALEGAÇÃO DE QUE A SISTEMÁTICA CONTRATUAL FAVORECE O SUPERENDIVIDAMENTO. TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO DISPENSADO AOS IDOSOS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Inaplicabilidade do NCPC ao caso conforme o Enunciado nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ na Sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem...

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