Acórdão Nº 08508670820168205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 06-06-2022

Data de Julgamento06 Junho 2022
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08508670820168205001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0850867-08.2016.8.20.5001
Polo ativo
UNIMED NATAL e outros
Advogado(s): MURILO MARIZ DE FARIA NETO
Polo passivo
MUNICIPIO DE NATAL e outros
Advogado(s):

EMENTA: TRIBUTÁRIO, ADMINISTRATIVO, CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. JULGAMENTO DE PROCEDÊNCIA NA ORIGEM PARA PERMITIR O GOZO DE BENEFÍCIO FISCAL. APELAÇÃO CÍVEL. INSURGÊNCIA DO ENTE MUNICIPAL. SUPOSTO EXERCÍCIO REGULAR DO PODER REGULAMENTAR. NOVO DECRETO EXPEDIDO PELO ENTE RECORRENTE PARA IMPEDIR O GOZO DE BENEFÍCIOS FISCAIS POR BENEFICIÁRIOS QUE SE ENCONTREM COM DÉBITOS TRIBUTÁRIOS COM EXIGIBILIDADE SUSPENSA. VIOLAÇÃO DA NORMA GERAL PREVISTA NO ART. 206 DO CTN QUE EXTRAPOLA O PODER REGULAMENTAR. LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA QUE CONCEDE EFEITOS PRÁTICOS À SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO DE FORMA A NÃO MITIGAR OU RESTRINGIR DIREITOS DO CONTRIBUINTE. INEXISTÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE NA LEI CONCESSIVA DOS INCENTIVOS. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por Turma e à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Município de Natal/RN em face de sentença proferida pela Juíza de Direito da 1ª Vara de Execução Fiscal e Tributária de Natal que, nos autos da Ação Ordinária n.º 0850867-08.2016.8.20.5001, ajuizada em seu desfavor pela Unimed Natal – Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico, julgou procedente a pretensão inicial, nos seguintes termos:

“Diante do exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, julgo procedente o pedido, para declarar a ilegalidade do inciso I, do Decreto Municipal nº 11.072/2016, e por conseguinte, assegurar a Parte Autora, o usufruto dos benefícios concedidos pela Lei Municipal nº 4.838/97, na condição de incentivador do projeto Djalma Maranhão, mesmo se existentes débitos lançados em seu nome perante o Fisco Município com a exigibilidade suspensa.

Condenação do Município Réu em custas processuais e honorários advocatícios, estes a razão de 8% (oito por cento) sobre o valor da causa, nos termos do § 3º, inciso II, do artigo 85, do CPC e em atenção aos requisitos do §2º do mesmo dispositivo”. [ID 12789918]

Em suas razões recursais (ID 12789924), o Município Apelante alega, em síntese, que “O Decreto de que ora se trata está em total pertinência com o art. 206 do CTN e com a lei municipal, pois que os contribuintes detentores da certidão do art. 206 do CTN estão inadimplentes para com a Municipalidade, razão pela qual estão excluídos do benefício legal, não pelo Decreto n. 11.072/2016, apenas, mas pelo próprio texto legal (CTN 206)”.

Defende que não há ilegalidade no Decreto em debate, sustentando que o este apenas deixaria claro que o referido benefício fiscal não alcançaria os créditos tributários com exigibilidade suspensa, eis que pendentes de débitos.

Afirma que “estando a recorrida em débito para com o Município, não há erro no art. 18, inciso I, do Decreto n. 11.072/2016, estando em perfeita harmonia com o disposto nos arts. 205 e 206 do CTN e com a Lei n. 4.838, 97 (alterada pela L. 5.323/2001), requerendo assim a reforma de sentença vergastada”.

Alega ainda que os artigos 9º e 10 da Lei n.º 4.838/97 estariam eivados de vício de inconstitucionalidade, pois conferiria ao Poder Executivo o poder de definir os limites orçamentários e os requisitos a serem preenchidos pelos incentivadores para perceberem os incentivos discais, aduzindo ser imprescindível a existência de lei em sentido formal emanada do Poder Legislativo do Município de Natal para definir quais os requisitos para se conceder os incentivos fiscais, o que afirma não ter ocorrido no presente caso.

Ao final, requer o conhecimento e provimento da Apelação Cível para reformar a sentença guerreada e julgar improcedente a pretensão inicial.

Devidamente intimada, a parte Apelada apresentou contrarrazões (ID 12789928), pugnando, em suma, pela manutenção do decisum.

Instado a se pronunciar, o Ministério Público, por intermédio do 13º Procurador de Justiça, em Parecer (ID 13196115), declinou de sua intervenção no feito.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço da Apelação Cível.

Cinge-se o mérito recursal em analisar a possibilidade de reforma da sentença que julgou procedente a pretensão inicial e declarou a ilegalidade do inciso I, do Decreto Municipal nº 11.072/2016, bem como assegurou à parte Autora, ora Apelada, o usufruto dos benefícios concedidos pela Lei Municipal nº 4.838/97, na condição de incentivador do projeto Djalma Maranhão, mesmo se existentes débitos lançados em seu nome perante o Fisco Municipal com a exigibilidade suspensa.

De início, entendo que as alegações do Município Apelante não merecem prosperar.

Isso porque, como se sabe, a Lei nº 4.838/1997 instituiu o Projeto Djalma Maranhão, que consiste em conceder incentivos fiscais para pessoas físicas e jurídicas realizarem projetos culturais no Município de Natal/RN.

Analisando a legislação em comento, observo que, o seu artigo 2º assim dispõe:

Art. 2º. O Projeto previsto no art. 1º concederá incentivo fiscal à pessoa física ou jurídica, com domicílio no Município de Natal, há pelo menos 03 (três) anos.

§ 1º - O incentivo fiscal a que se refere o "caput" deste artigo, corresponderá ao recebimento, por parte do empreendedor do projeto cultural do Município, através de doação, patrocínio, ou investimento de certificados expedidos pelo poder público, correspondentes ao valor do incentivo aprovado pela Comissão Normativa.

Em momento posterior, o Poder Executivo editou o Decreto nº 8.749/2009, alterando o Decreto nº 6.906/2002 que, ao tratar do incentivo fiscal a ser concedido aos incentivadores, estabeleceu como vedações ao deferimento da habilitação algumas situações de irregularidade do incentivador perante o Fisco. In verbis:

Art. 18 - É vedado o deferimento da habilitação quando o Incentivador se encontrar em situação irregular perante o fisco municipal.

Parágrafo único - Para os efeitos deste artigo, considera-se em situação irregular o Incentivador quando:

I - constar indicação, no Cadastro de Contribuintes do ISS e/ou IPTU de irregularidades fiscais, inclusive obrigações acessórias, na forma da legislação tributária;

II - constar parcelamento de débitos com interrupção de pagamento;

III - haver cometido ilícitos fiscais capitulados na legislação própria do ISS ou do IPTU, ou ter atentado contra a ordem econômica e tributária.

Por meio do Decreto n.º 11.072/2016, o Poder Executivo editou nova regulamentação da referida legislação, o qual teve por único objeto a alteração do supracitado art. 18 do Decreto n.º 8.749/2009, além do seu art. 18-A, acrescendo situações de vedação da concessão de habilitação para incentivadores, beneficiários do Programa Djalma Maranhão, nos seguintes termos:

Art. 1º – Ficam alterados os artigos 18 e 18A do Regulamento do Programa Municipal de Incentivos Fiscais a Projetos Culturais Djalma Maranhão, aprovado pelo Decreto nº 8.749, de 05 de junho de 2009, passando a vigorar com as seguintes redações:

"Art. 18 - …..............................

Parágrafo único - …...............

I – estiver com pendências que o impeçam de emitir a Certidão Negativa de Débitos municipais, ainda que tais débitos estejam com exigibilidade suspensa;

II – possuir pendências cadastrais ou no cumprimento de obrigações acessórias perante a Tributação Municipal;

III – houver cometido ilícitos fiscais capitulados na legislação própria, ou tiver atentado contra a ordem econômica e tributária, ainda que a exigibilidade dos créditos tributários apurados esteja suspensa.

Art. 18A – É vedado o benefício desta Lei ao empreendedor que se encontrar em qualquer das situações irregulares previstas no parágrafo único do artigo 18."

Nesse contesto, verifico que resta flagrante a ilegalidade do referido inciso I, do art. 18, do Decreto n.º 11.072/2016, na medida em que considera a distinção de efeitos em relação à emissão de Certidões Negativas de Débitos Tributários, ainda que se trate de débitos com exigibilidade suspensa, na medida em que, ao contrário do que alega o Apelante, vai de encontro à literalidade da norma geral prevista no Código Tributário Nacional, especificamente em seus artigos 205 e 206. Vejamos:

Art. 205. A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se refere o pedido.

(...)

Art. 206. Tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa.

Veja-se que a possibilidade prevista na norma geral, que deve nortear todas as demais normas tributárias dos demais entes, os quais não podem contrariá-la, de emissão de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa sempre que existir créditos do contribuinte com exigibilidade suspensa tem por escopo permitir ao contribuinte o exercício amplo de seus direitos como se não houvesse crédito algum, na medida em que, apesar de constituído o crédito tributário, ele não pode ser oposto ao contribuinte para restringir seus direitos e prerrogativas quando esteja desprovido de exigibilidade.

Nesse sentido, a sentença guerreada julgou procedente a pretensão...

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