Acórdão Nº 08558590220228205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 20-10-2023

Data de Julgamento20 Outubro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08558590220228205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0855859-02.2022.8.20.5001
Polo ativo
IBFC - INSTITUTO BRASILEIRO DE FORMACAO E CAPACITACAO e outros
Advogado(s):
Polo passivo
JULIO CESAR PRIMEIRO OLIVEIRA TEIXEIRA
Advogado(s): VIVIANE CARLOS MARTINS

Apelação Cível nº 0855859-02.2022.8.20.5001.

Recorrente: Estado do Rio Grande do Norte.

Recorrido: Júlio César Primeiro Oliveira Teixeira.

Advogada: Viviane Carlos Martins.

Relatora: Desembargadora Berenice Capuxu.

EMENTA: DIREITOS ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO CÍVEL. INSCRIÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO PARA OFICIAL DA POLÍCIA MILITAR. AFASTAMENTO DO LIMITE DE IDADE. ACOLHIMENTO. ATRIBUIÇÕES DO CARGO QUE NÃO JUSTIFICAM A RESTRIÇÃO ETÁRIA. CARACTERIZAÇÃO DE ATO INCONSTITUCIONAL. PREVISÃO DO ART. 7º, INCISO XXX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em harmonia com o parecer do 12º Procurador de Justiça, Dr. Fernando Batista de Vasconcelos, conhecer e negar provimento ao apelo interposto, nos termos do voto da Relatora.

RELATÓRIO

Mandado de Segurança impetrado por Júlio César Primeiro Oliveira Teixeira em face de ato supostamente ilegal da Banca Examinadora IBFC – Instituto Brasileiro de Formação e Capacitação, constando como ente público o Estado do Rio Grande do Norte.

Em sentença (Id. 19871484), o Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte concedeu a ordem nos seguintes termos:

POSTO ISSO, e por tudo que nos autos consta, JULGO por sentença, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, e CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada no Mandado de Segurança nº 0855859-02.2022.8.20.5001, por JULIO CESAR PRIMEIRO OLIVEIRA TEIXEIRA, para reconhecendo a ilegalidade dos itens 3.1, inciso VII, e 6.1.1.1. do Edital nº 02/2022, DETERMINAR ao PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ORGANIZAÇÃO DO CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NO CURSO DE FORMAÇÃO DE OFICIAIS DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e ao INSTITUTO BRASILEIRO DE FORMACAO E CAPACITACAO - IBFC, regularmente qualificado, que permita a realização da inscrição de JULIO CESAR PRIMEIRO OLIVEIRA TEIXEIRA no concurso público para provimento de vagas para o ingresso no Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar (CFOPMRN), regido pelo Edital nº 02/2022-PMRN, de 1º de julho de 2022, afastando-se a limitação de idade máxima prevista no inciso VII, do item 3.1 do edital..

Irresignado, o Estado do Rio Grande do Norte apresentou recurso de apelação e requereu o provimento do mesmo, aduzindo que a previsão do referido limite de idade não foi uma mera opção de quem elaborou o edital, tratando-se de norma legal em vigor e eficaz, instituída pela Lei Complementar Estadual nº 163/2018 (art. 2º), nas alterações proporcionadas à Lei Estadual nº 4.630/1973 (Estatuto dos Policiais Militares do RN), sendo a conduta administrativa absolutamente legítima e não ofende qualquer primado ou garantia constitucional, devendo o recurso ser provido para reformar a sentença.

Ausentes contrarrazões (Id. 19871496).

Com vistas dos autos, o 12º Procurador de Justiça, Dr. Fernando Batista de Vasconcelos, opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo (Id. 20063101).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso.

O cerne do presente mandamus consiste em aferir se o Impetrante possui ou não direito líquido e certo a se inscrever no certame por ter 31 anos de idade e, para isso, alegou que a exigência da idade máxima para a participação no processo seletivo é totalmente desarrazoada.

Consoante o art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, o mandado de segurança tem o escopo de “proteger direito líquido e certo” decorrente de “ilegalidade ou abuso de poder” contido em ato comissivo ou omissivo praticado por autoridade pública ou agente similar.

Repetindo o mencionado dispositivo constitucional, o art. 1º, caput, da Lei nº 12.016/2009 estabelece que “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.

O requisito do direito líquido e certo é assim descrito por HELY LOPES MEIRELLES (Mandado de Segurança. 25ª ed. São Paulo : Malheiros, 2003, pp. 36-37):

[…] se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais”. (sublinhei)

Pois bem. No caso dos autos, o Edital n.º 02/2022 – PMRN, no item 3.1, VII, impôs como condição para ingresso no cargo de Oficial, possuir o candidato a idade máxima de 30 (trinta) anos.

Sobre o tema a Constituição Federal, em seu artigo 42, § 1º, dispõe que:

Art. 42. Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

§ 1º Aplicam-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, além do que vier a ser fixado em lei, as disposições do art. 14, § 8º; do art. 40, § 9º; e do art. 142, §§ 2º e 3º, cabendo a lei estadual específica dispor sobre as matérias do art. 142, § 3º, inciso X, sendo as patentes dos oficiais conferidas pelos respectivos governadores. (...)” (grifos acrescidos)

Bem assim, o artigo 142, §§ 2º e 3º, inciso X, da Constituição Federal, assim estabelece:

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

(...)

§ 2º Não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares.

§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:

(...)

X - a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra. (...)” (grifos acrescidos)

Acontece que o Supremo Tribunal Federal entende que: “O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º,XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido” (Súmula nº 683)

Portanto, ao analisar melhor o caso em debate, vejo que as funções inerentes ao cargo almejado são compatíveis com as condições técnica, mental e física do candidato, logo, não parece razoável impedir o acesso do impetrante ao concurso apenas por fatores extrínsecos, que certamente não medem sua aptidão para o cargo pretendido, tampouco impõem óbice para que continue a sua carreira militar em situação mais favorável do ponto de vista financeiro e organizacional.

Deste modo, deve ser aplicado ao caso o entendimento alicerçado pelo STF, em sede de repercussão geral, (ARE 678.112-RG – Tema 646), ao afirmar, repito, que é possível a imposição de limite de idade para inscrição em concurso público, desde que haja anterior previsão legal e que a exigência seja razoável diante das atribuições do cargo público, evidencio:

EMENTA: AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. IMPOSIÇÃO DE LIMITE DE IDADE. RE 678.112-RG. COMPROVAÇÃO DA IDADE NO MOMENTO DA INSCRIÇÃO. 1. O Supremo Tribunal Federal entende possível a imposição de limite de idade para inscrição em concurso público, desde que haja anterior previsão legal e que a exigência seja razoável diante das atribuições do cargo público. Precedente: ARE 678.112-RG, Rel. Min. Luiz Fux (Tema 646). 2. O limite de idade, quando regularmente fixado em lei e no edital de determinado concurso público, há de ser comprovado no momento da inscrição do certame, tendo em vista a impossibilidade de se antever a data em que será realizada a fase fixada como parâmetro para aferição do requisito da idade. Precedentes. 3. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC/2015, uma vez que não é cabível, na hipótese, condenação em honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e Súmula 512/STF). 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (STF. ARE 1210221 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 08/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-156 DIVULG 22-06-2020 PUBLIC 23-06-2020). (Grifos acrescentados).

Nesse sentido, destaco julgados do STJ e desta Corte de Justiça. In verbis:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. CONCURSO PÚBLICO. CORPO DE BOMBEIRO MILITAR DO DISTRITO FEDERAL. LIMITAÇÃO DE IDADE FIXADA EM EDITAL. COMPROVAÇÃO DE IDADE NA DATA DA INSCRIÇÃO NO CONCURSO.

1. Na origem, trata-se de Mandado de Segurança impetrado com vistas à anulação de ato administrativo que excluiu o autor do concurso público para o cargo de Bombeiro Militar combatente do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT