Acórdão Nº 08573857720178205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 25-03-2021

Data de Julgamento25 Março 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08573857720178205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0857385-77.2017.8.20.5001
Polo ativo
APEC - SOCIEDADE POTIGUAR DE EDUCACAO E CULTURA LTDA e outros
Advogado(s): RENATO LOPES DA ROCHA, HUMBERTO LUCAS MARINI
Polo passivo
MUNICIPIO DE NATAL e outros
Advogado(s): RENATO LOPES DA ROCHA, HUMBERTO LUCAS MARINI

Apelação Cível n° 0857385-77.2017.8.20.5001

Origem: 2ª Vara de Execução Fiscal e Tributária da Comarca de Natal

Apte/Apdo: Município de Natal

Procurador: Joaquim de Souza Rolim Júnior (OAB/PB 11146)

Apte/Apda: APEC – Sociedade Potiguar de Educação e Cultura

Advogados: Humberto Lucas Marini (OAB/RN 114123)

Relatora: Desembargadora Judite Nunes

EMENTA: CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DECLARATÓRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PRETENSÃO DE INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR DE MANTER OS DIREITOS PREVISTOS NA REDAÇÃO ORIGINAL DA LEI MUNICIPAL Nº 257/2008, QUE INSTITUIU O PROGRAMA MUNICIPAL DE INCENTIVO À EDUCAÇÃO UNIVERSITÁRIA – PROEDUC. NORMA QUE CRIOU, EM FAVOR DAS INSTITUIÇÕES ADERENTES, BENEFÍCIO FISCAL RELATIVO AO IMPOSTO SOBRE SERVIÇO DE QUALQUER NATUREZA – ISSQN. RESPEITO ÀS GARANTIAS DO DIREITO ADQUIRIDO E DO ATO JURÍDICO PERFEITO. INCIDÊNCIA DOS ARTS. 5º, INCISO XXXVI, E ARTIGO 6º, CAPUT, DA LEI Nº 4.657/42 (LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO). IMPOSSIBILIDADE DE REVOGAÇÃO UNILATERAL DA ISENÇÃO ONEROSA, CONFORME ARTIGO 178 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. NORMA EXTENSÍVEL A QUALQUER BENEFÍCIO FISCAL CONCEDIDO POR PRAZO CERTO E EM FUNÇÃO DE DETERMINADAS CONDIÇÕES. DOUTRINA E PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TERMO DE ADESÃO FIRMADO ENTRE AS PARTES QUE NÃO PODE SER ATINGIDO PELAS MODIFICAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 161/2016. DEVER DE ATUAÇÃO PRIORITÁRIA DOS MUNICÍPIOS NO ENSINO FUNDAMENTAL E NA EDUCAÇÃO INFANTIL. IRRELEVÂNCIA. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 257/2008 CONFIRMADA PELO PLENÁRIO DESTA CORTE DE JUSTIÇA NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 2014.023541-7. DECISÃO DEFINITIVA. PRECEDENTE VINCULANTE. SENTENÇA REFORMADA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELA APEC. PREJUDICADO O RECURSO INTERPOSTO PELO MUNICÍPIO DE NATAL.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e dar provimento ao recurso interposto pela APEC, reformando a sentença recorrida e declarando, ainda, prejudicada análise do apelo interposto pelo Município de Natal, tudo nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.

R E L A T Ó R I O

Tratam os autos de apelações cíveis interpostas, sucessivamente, pelo Município de Natal e pela APEC – Sociedade Potiguar de Educação e Cultura em face da sentença proferida pelo Juízo da Segunda Vara de Execução Fiscal e Tributária da Comarca de Natal, que nos autos da ação declaratória nº 0857385-77.2017.8.20.5001 julgou improcedente o pedido formulado pela instituição de ensino autora em face do ente público réu, condenando aquela no pagamento de honorários sucumbenciais fixados em 1% (um por cento) sobre o valor da causa.

Em suas razões recursais o município apelante argumentou que, muito embora a sentença tenha sido proferida sob a égide do novo CPC, o juízo monocrático entendeu por bem fixar o valor dos honorários sucumbenciais em desacordo com os preceitos daquele diploma, contrariando, ainda, entendimento uniformizado e firmado pelo STJ.

Sustentou, em seguida, que o proveito econômico da causa, quando de seu ajuizamento, seria de R$ 17.260.971,02, o que corresponde a aproximadamente 17.000 salários mínimos, requerendo, assim, o provimento do recurso com a condenação da apelada em honorários advocatícios no percentual entre 5% e 8% sobre o proveito econômico obtido, sem prejuízo da respectiva majoração em razão da interposição do recurso.

Por sua vez, nas razões de apelo, a APEC alegou que a alteração unilateral dos termos do PROEDUC, previstos na Lei Municipal nº 257/2008, por meio da edição da Lei Municipal nº 161/2016, foi ilegal e sem razoabilidade, violando o princípio da segurança jurídica, bem como o direito adquirido e o ato jurídico perfeito garantidos quando da adesão ao PROEDUC na vigência da redação original da Lei Municipal nº 257/2008, demonstrada através do termo de adesão constante dos autos.

Defendeu, na sequência, que “o PROEDUC caracteriza isenção onerosa e por prazo determinado, tendo em vista, por exemplo, (i) a obrigatoriedade de manutenção das bolsas de estudos aos alunos e (ii) o prazo de vigência de 10 (dez) anos do benefício, inclusive como expresso no Termo de Adesão ao PROEDUC”, não se podendo admitir a revogação de todos os direitos concedidos à apelante quando da adesão ao programa.

Asseverou que a sentença apelada não expôs os fundamentos que desnaturariam a natureza contratual da relação jurídico tratada, limitando-se a afirmar que não se estaria diante de um contrato, mas sim de um regime jurídico tributário especial, apesar de as partes terem firmado termo de adesão com direitos e deveres para cada uma delas.

Requereu, ao final, o provimento do recurso com a reforma da sentença para “declarar o direito da Apelante gozar e exercer os direitos previstos na redação original da Lei nº 257/08, obtidos e incorporados ao seu patrimônio jurídico, quando da aceitação do Termo de Adesão ao PROEDUC, sem ser compelida às modificações introduzidas pela Lei nº 161/16, inclusive atinente à sistemática de compensação de débitos de ISS apurados no final de cada ano exercício com o saldo de bolsas de estudos concedidas”.

Contrarrazões apresentadas por ambas as partes.

Com vista dos autos, a Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito por entender ausente o interesse ministerial.

É o relatório.

V O T O

Analisando o que dos autos consta, depreende-se que a instituição de ensino recorrente ajuizou ação declaratória buscando a manutenção dos direitos previstos na redação originária da Lei Municipal nº 257/2008, sob a alegação de que aderiu ao Programa Municipal de Incentivo à Educação Universitária – PROEDUC, mediante a assinatura de termo de adesão com validade de 10 (dez) anos, renováveis por igual período.

Argumenta a apelante, nesse contexto, que a legislação vigente permite a compensação de valores equivalentes às bolsas de ensino concedidas com o Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza – ISS, a ser pago no final de cada exercício, respeitando o equivalente ao limite de 5% (cinco por cento) da receita anual decorrente de serviços de ensino.

A magistrada de primeiro grau, por sua vez, rejeitou o pedido autoral, ao argumento de que “as Cortes Superiores brasileiras posicionam-se no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico-tributário”, expondo em suas razões de decidir, da mesma forma, que “a natureza jurídica do referido termo não se consubstancia em um contrato, regido pelo direito privado, mas sim em um regime jurídico especial, regido pelo direito público, que confere benefícios fiscais atinentes ao ISS, qual seja, a compensação do valor das bolsas de estudos concedidas com o Imposto sobre Serviços (ISS)”.

Pois bem. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXXVI, prevê que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Semelhante disposição é encontrada na Lei nº 4.657/42 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), segundo a qual a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada (artigo 6º, caput).

Sobre a matéria em discussão, o Código Tributário Nacional, ao tratar da isenção, medida de exclusão do crédito tributário, estatui, em seus artigos 176 e 178, in verbis:

“Art. 176. A isenção, ainda quando prevista em contrato, é sempre decorrente de lei que especifique as condições e requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo caso, o prazo de sua duração”.

“Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104. (Redação dada pela Lei Complementar nº 24, de 1975)”.

À vista dos citados dispositivos constantes da norma geral tributária, tem-se que a isenção, desde que especificados os seus termos em lei, pode ser prevista em contrato, podendo, como regra, também por lei, ser revogada ou modificada, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições – hipótese de isenção onerosa.

Acerca da temática, é pertinente citar lição de Hugo de Brito Machado Segundo:

Isenção condicionada, onerosa e a prazo certo e direito adquirido – O Poder Público não pode revogar isenção, se esta for onerosa e por prazo certo. Como observa Pontes de Miranda, ‘se a concessão de isenção foi a prazo determinado, ou sob condição que tenha eficácia ex tunc, a lei – a fortiori, qualquer ato do Poder Executivo – não pode alterar o conteúdo, o tempo, o lugar e a extensão contenuística da isenção. Isso está, sem discussão possível, no art. 178 da Lei nº 5.172’ (Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1967, São Paulo: RT, 1967, t. 2, p. 420)” (in Código Tributário Nacional: anotações à Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 493).

Seguindo esse entendimento, tanto o Supremo Tribunal Federal como o Superior Tribunal de Justiça têm se pronunciado no sentido de que estender a impossibilidade de revogação unilateral da isenção onerosa a benefícios fiscais em geral, privilegiando, assim, o princípio constitucional da segurança jurídica. Veja-se:

“E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO – IPI –...

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