Acórdão Nº 08605205820218205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 07-07-2023

Data de Julgamento07 Julho 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08605205820218205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0860520-58.2021.8.20.5001
Polo ativo
GILSON BRAGA DOS ANJOS JUNIOR
Advogado(s): GILSON BRAGA DOS ANJOS JUNIOR
Polo passivo
MRV ENGENHARIA E PARTICIPACOES SA e outros
Advogado(s): IVAN ISAAC FERREIRA FILHO

EMENTA: CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. EXTRAPOLAÇÃO DO PRAZO DE TOLERÂNCIA DE 180 (CENTO E OITENTA) DIAS. CULPA EXCLUSIVA DA CONSTRUTORA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. RESTITUIÇÃO DA TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA. RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE EM DOBRO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Impende-se ressaltar a inocorrência de prescrição no caso dos autos, eis que, quanto à pretensão de indenização em casos de inadimplemento contratual, deve ser observado o prazo decenal, conforme entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça.

2. A construtora extrapolou o prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias previsto contratualmente e aceito, de forma pacífica, pela jurisprudência, não cumprindo com a obrigação contratual de entregar o imóvel no prazo acordado.

3. Em consequência, é da construtora e não do consumidor, a obrigação de pagar a taxa de evolução da obra após o prazo estipulado no contrato para a entrega do imóvel, como avençado na Súmula 996 do STJ.

4. Quanto à restituição dos valores, não merece reforma a sentença, pois está consonante com o entendimento recente da Corte Especial do STJ, no EREsp 1.413.542/RS, que fixou a seguinte tese: "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo".

5. Precedentes do STJ (EREsp: 1281594 SP 2011/0211890-7, Relator: Ministro Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 15/05/2019, CE - Corte Especial, Data de Publicação: DJe 23/05/2019 e EREsp 1.413.542/RS, Rel. Ministra Maria Thereza De Assis Moura, Rel. p/ acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/03/2021) e do TJRN (AC nº 0807688-43.2016.8.20.5124, Rel.ª Desembargadora Judite Nunes, 2ª Câmara Cível, j. 21/10/2021).

6. Apelo conhecido e desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, por unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao apelo interposto, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO


1. Trata-se de apelação cível interposta por MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A e ANCONA ENGENHARIA LTDA em face de sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN (Id 18588027), que, em sede Ação Indenizatória (Proc. nº 0860520-58.2021.8.20.5001), ajuizada por GILSON BRAGA DOS ANJOS JUNIOR, julgou procedentes em parte os pedidos formulados na inicial, condenando solidariamente as rés ao pagamento de R$ 1.800,00 (mil e oitocentos reais) a título de lucros cessantes e de R$ 1.053,82 (mil e cinquenta três reais e oitenta e dois centavos), em dobro, a título de repetição do indébito atinente aos juros de obra, em ambas as condenações incidindo atualização monetária pelo índice INPC a partir do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do primeiro dia de atraso na entrega do imóvel (art. 397, CC), extinguindo o processo com resolução de mérito na forma do art. 487, inciso I, do CPC.

2. No mesmo dispositivo, condenou ambas as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, na proporção de 50% (cinquenta por cento), sendo estes fixados em 10% (dez por cento) do valor do proveito econômico obtido, ficando suspensa a cobrança em relação ao autor em virtude da concessão do benefício da justiça gratuita.

3. Em suas razões recursais (Id 18588036), a parte apelante requereu o provimento do apelo no sentido de reformar a sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais.

4. A parte recorrida apresentou as contrarrazões no Id 18588049, refutando os argumentos recursais e, ao final, pleiteou pelo desprovimento da apelação cível.

5. Instado a se manifestar, Dr. José Braz Paulo Neto, Nono Procurador de Justiça, deixou de opinar no processo por não ser hipótese de intervenção do Ministério Público (Id 18847863).

6. É o relatório.

VOTO

7. Conheço do recurso.

8. A questão trazida ao debate nos autos concerne à rescisão contratual sob a alegação de descumprimento no prazo de entrega de unidade imobiliária, com a consequente restituição integral dos valores pagos.

9. Inicialmente, impende-se ressaltar a inocorrência de prescrição no caso dos autos, eis que, quanto à pretensão de indenização em casos de inadimplemento contratual, deve ser observado o prazo decenal, conforme entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça. Vejamos:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual. II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador. III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual. IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico. V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado. VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do Código Civil). Embargos de divergência providos.

(STJ - EREsp: 1281594 SP 2011/0211890-7, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 15/05/2019, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 23/05/2019)

10. Com efeito, as partes celebraram, em 05/08/2010, contrato de promessa de compra e venda de imóvel localizado na Rua das Embarcações nº 142, unidade 204, do empreendimento Condomínio Residencial Veleiros, bloco 01, no bairro de Nova Parnamirim, em Parnamirim/RN.

11. Em que pese o entendimento exarado por esta Corte de Justiça, por ocasião da edição da Súmula nº 36, que dispõe que “é abusiva a cláusula de contrato de promessa de compra e venda de imóvel que condiciona o início da contagem do prazo de entrega do bem à assinatura de contrato de financiamento bancário”, o magistrado a quo, considerando as disposições contratuais firmadas entre as partes, entendeu que a estipulação do termo inicial de contagem do prazo de entrega do imóvel deveria incidir da data da assinatura do instrumento de alienação fiduciária junto ao agente financeiro e, dessa forma, o marco seria em 29/10/2010.

12. Nesse passo, contabilizados os 14 (quatorze) meses previstos contratualmente acrescidos dos 180 (cento e oitenta) dias de tolerância, o prazo final para a entrega do imóvel seria dia 26/06/2012, todavia, a entrega das chaves ocorreu na data de 05/07/2012, ou seja, com 09 (nove) dias de atraso.

13. In casu, constata-se que a construtora extrapolou o prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias previsto contratualmente e aceito, de forma pacífica, pela jurisprudência, não cumprindo com a obrigação contratual de entregar o imóvel no prazo acordado.

14. Em consequência, é da construtora e não do consumidor, a obrigação de pagar a taxa de evolução da obra após o prazo estipulado no contrato para a entrega do imóvel, como avençado na Súmula 996 do STJ:

Súmula 996/STJ: “É ilícito cobrar do adquirente juros de obra, ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância".

15. Sobre o assunto, é o precedente desta Segunda Câmara Cível:

“EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. INADIMPLÊNCIA CONTRATUAL. MULTA DEVIDA PELA CONSTRUTORA. PREVISÃO CONTRATUAL. TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRA COBRADA PELO AGENTE FINANCEIRO. ILICITUDE DA COBRANÇA AO ADQUIRENTE APÓS O PRAZO AJUSTADO PARA ENTREGA DAS CHAVES, CONTADO O PERÍODO DE TOLERÂNCIA (TEMA 996 DO STJ). PREJUÍZO QUE...

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