Acórdão Nº 08645299720208205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 03-05-2023

Data de Julgamento03 Maio 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08645299720208205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0864529-97.2020.8.20.5001
Polo ativo
VENTOS DE SANTO ARTUR ENERGIAS RENOVAVEIS S/A
Advogado(s): MARCIO SILVA PEREIRA, JOSE GUILHERME BERMAN CORREA PINTO, FELIPE LIMA ARAUJO ROMERO
Polo passivo
IDEMA - INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E MEIO AMBIENTE DO RN e outros
Advogado(s):

EMENTA: DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. REJEIÇÃO. DECISUM SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO AUTORAL PARA SUPRESSÃO VEGETAL DE APROXIMADAMENTE 0,62% (ZERO VÍRGULA SESSENTA E DOIS POR CENTO) DA ÁREA TOTAL DO IMÓVEL, MEDIANTE CONSTITUIÇÃO DE RESERVA LEGAL CORRESPONDENTE EXATAMENTE À MESMA ÁREA, DENTRO DO RESTANTE DA PROPRIEDADE DE MAIS DE 310 HECTARES, OU PERMITIDA MEDIDA COMPENSATÓRIA QUE O IDEMA ENTENDA SER MAIS ADEQUADA. FUNDAMENTAÇÃO QUE BUSCA ATENDER A LEGISLAÇÃO CORRELATA (CÓDIGO FLORESTAL), SEM DEIXAR DE LADO A NECESSIDADE DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. AMPLIAÇÃO DO USO DE ENERGIA EÓLICA (RENOVÁVEL) – LINHA DE TRANSMISSÃO - QUE VISA PRESTIGIAR O INTERESSE COLETIVO JÁ QUE VOLTADA PARA UMA MELHOR QUALIDADE DE VIDA DAS GERAÇÕES FUTURAS. MEDIDA RECOMENDADA PELAS CONFERÊNCIAS MUNDIAIS DO CLIMA NO SENTIDO DE MINIMIZAR OS EFEITOS DO AQUECIMENTO GLOBAL FORTEMENTE IMPACTADOS PELO USO DE ENERGIA GERADAS POR MEIO DO USO DE COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS. ENTENDIMENTO QUE CONVERGE COM A NOÇÃO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ASSENTADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE Nº 42 E NA ADI DE Nº 4901. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 16ª Procuradoria de Justiça, em rejeitar a preliminar de nulidade da sentença suscitada pelo apelante. Pela mesma votação, em consonância parcial com o parecer da 16ª Procuradoria de Justiça, em conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

Trata-se de apelação cível interposta pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte – IDEMA, em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN que nos autos da Ação Ordinária com pedido de tutela de urgência n° 0864529-97.2020.8.8.20.5001, ajuizada pela empresa Ventos de Santo Artur Energias Renováveis S/A, julgou procedente o pedido autoral “ratificando a Decisão Interlocutória do ID n° 62169413, para que seja concedida a Autorização de Supressão da Vegetação ao autor, sob a condição da constituição de Reserva Legal em área remanescente do imóvel não ocupada pela construção do Bay ou por medida compensatória que o IDEMA entenda ser mais adequada.”

Condenou a parte promovida ao pagamento de custas e honorários advocatícios de sucumbência de 10% sobre o valor da causa.

Em suas razões recursais (id 16900328), o instituto apelante, de início, defende a nulidade da sentença por ausência de fundamentação.

Alega que: “o entendimento adotado pelo Juízo de Primeiro Grau não deve prosperar, pois não se coaduna com o ordenamento jurídico em vigor e, notadamente, porque o dispositivo legal e os precedentes indicados não se amoldam ao caso sob análise.”

Aduz que: “A partir deste dispositivo legal se depreende que é o órgão ambiental, no caso o IDEMA, quem deve aprovar a localização da Reserva Legal proposta pelo empreendedor e, mesmo sendo possível a compensação ambiental, a escolha da área deve se pautar pelos critérios legalmente estabelecidos.”

Assevera que: “Tais ressalvas são necessárias para que não ocorra um desvirtuamento da compensação da Reserva Legal e que esta modalidade de Regularização Ambiental não se torne um instrumento contrário ao espírito da Lei, permitindo a ampliação do desmatamento ao invés de promover a conservação da vegetação nativa.”

Finalmente, pede a decretação da nulidade da sentença por falta de fundamentação. Subsidiariamente, a reforma desta para julgar improcedentes o pedidos contidos na inicial.

Intimada, a parte apelada ofertou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso. (id 16900333)

A 16ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento parcial do recurso (id 17654274).

É o relatório.

PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO, SUSCITADA PELO APELANTE

A apelante suscita a preliminar de nulidade da sentença apontando que esta não está devidamente fundamentada, não sendo possível aplicar fundamentação genérica.

Do exame da sentença em comento, observo que o Julgador a quo expôs de forma clara as razões de sua convicção jurídica em torno das circunstâncias do caso concreto, sobretudo em relação à supressão vegetal, a correspondente adequação à pretensão e a legislação correlata, bem como levando em conta os argumentos e as intervenções técnicas apontadas pelo Instituto de Desenvolvimento apelante, sem falar na compatibilização com orientação do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.

A exposição sucinta e objetiva das razões de decidir não se confundem com ausência ou deficiência de fundamentação, sendo este o entendimento assente no âmbito do Supremo Tribunal Federal (AI 749008 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, j. 20/08/2013, DJe 03/09/2013).

Outrossim, é firme a orientação jurisprudencial dos tribunais pátrios bem como do Superior Tribunal de Justiça de que o julgador não é obrigado a se manifestar sobre todos os pontos suscitados pelas partes, quando tiver encontrado fundamento suficiente para decidir.

Dessa forma, no caso concreto, impõe-se a rejeição da preliminar de nulidade da sentença.

É como voto.

VOTO


Inicialmente, devo consignar que este Relator já apreciou monocraticamente esta controvérsia ao analisar tutela de urgência recursal, bem como esta 3ª Câmara Cível igualmente analisou o caso concreto ao julgar o mérito do Agravo de Instrumento nº 0800243-44.2021.8.20.0000, que restou assim ementado. Vejamos:

EMENTA: DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. DECISÃO QUE DEFERIU PARCIALMENTE A TUTELA DE URGÊNCIA. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, POR INTEMPESTIVIDADE RECURSAL SUSCITADA NAS CONTRARRAZÕES. REJEIÇÃO. SUSPENSÃO DE PRAZOS. TEMPESTIVIDADE CONFIGURADA. MÉRITO: ENERGIA EÓLICA. LICENÇA RELATIVA À EXPANSÃO DE LINHAS DE TRANSMISSÃO. SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO. CONSTITUIÇÃO DE RESERVA LEGAL EM ÁREA REMANESCENTE DO IMÓVEL NÃO OCUPADA PELA ESTRUTURA DE CONEXÃO - “BAY”. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 66 DO CÓDIGO FLORESTAL. MEDIDA COMPENSATÓRIA EM CONSONÂNCIA COM O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. INTERESSE PÚBLICO NA EXPANSÃO DA OFERTA DE ENERGIA ELÉTRICA PROVENIENTE DE FONTES RENOVÁVEIS. PRESENÇA DOS REQUISITOS CONSTANTES NO ART. 300 DO CPC. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0800243-44.2021.8.20.0000, Magistrado(a) AMAURY DE SOUZA MOURA SOBRINHO, Tribunal Pleno, ASSINADO em 29/09/2021) (grifos)

Naquela ocasião, acertadamente o Colegiado entendeu que:

Conforme relatado, deferida em parte a tutela de urgência postulada pela parte ora recorrida, constata-se, como bem delimitado pelo recorrente, ser objeto deste recurso analisar os seguintes argumentos: o art. 66, do Código Florestal, prevê a possibilidade de realocação da área de Reserva Legal e a adoção de medidas compensatórias para preservação da vegetação nativa; a concessionária necessita cumprir os prazos contratuais referentes à outorga do serviço público; e, haverá prejuízo à sociedade se a obra não for concluída em virtude da diminuição da oferta de energia, uma vez que as demais linhas argumentativas vertidas na petição inicial foram afastadas pelo decisum atacado.

Feito este destaque, constata-se que “Reserva Legal” são áreas, dentro de uma propriedade ou posse rural, que por determinação legislativa devem permanecer intactas.

O artigo 3º, inciso III, da Lei Federal nº 12.651/2012, conhecida como “Novo Código Florestal”, conceitua o instituto nos seguintes termos:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:

[...]

III - Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa;

Por seu turno, o artigo 12 do mesmo texto normativo dispõe:

Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:

I - localizado na Amazônia Legal:

a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;

b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;

c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;

II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).

Logo, assentada a localização rural da propriedade na qual se pretende a instalação da estrutura de conexão elétrica denominda “Bay de Conexão”, assente o dever da empresa recorrida de cumprir a determinação de instituição de área de Reserva Legal.

Contudo, a discussão vertida nestes autos diz respeito a possibilidade de indicação, pela recorrida, de área diversa daquela na qual será construída a estrutura de conexão elétrica, uma vez que esta, consoante o projeto apresentado, ocupará parte da área de vegetação nativa existente no imóvel.

Ao examinar os autos, observa-se que, obtida a Licença de Instalação junto ao...

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