Acórdão Nº 08724114220228205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 27-07-2023

Data de Julgamento27 Julho 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08724114220228205001
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0872411-42.2022.8.20.5001
Polo ativo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):
Polo passivo
GENILSON SOARES DA SILVA
Advogado(s): MONIELLY SOUSA NUNES

RECURSO INOMINADO Nº: 0872411-42.2022.8.20.5001

ORIGEM: 5º Juizado especial DA Fazenda Pública dA COMARCA DE NATAL

RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

ADVOGADO: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO

RECORRIDO: GENILSON SOARES DA SILVA

ADVOGADA: MONIELLY SOUSA NUNES

RELATORA: JUÍzA SABRINA SMITH CHAVES

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. POLICIAL MILITAR APOSENTADO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. CONVERSÃO DE LICENÇA ESPECIAL NÃO USUFRUÍDA EM PECÚNIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO ENTE PÚBLICO DEMANDADO. CONVERSÃO EM PECÚNIA DE LICENÇA ESPECIAL NÃO GOZADA. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO NOS AUTOS. ALEGAÇÃO DE FALTA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA NÃO PODE SERVIR COMO FORMA DE NÃO EFETIVAÇÃO DE DIREITOS PREVISTOS EM LEI. VEDAÇÃO DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TESE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE JÁ DECIDIU SOBRE A POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO EM PECÚNIA OS DIREITOS DE NATUREZA REMUNERATÓRIA PELO SERVIDOR, PELO REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS – TEMA 635. SENTENÇA MANTIDA EM TODOS OS SEUS TERMOS. RECURSO INOMINADO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes que integram a Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Fazendários e Criminais do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer deste recurso inominado interposto e negar-lhe provimento, mantendo na íntegra a sentença recorrida. O ente estadual é isento do pagamento das custas processuais. Com condenação do recorrente em honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, ante o resultado do julgamento do recurso.

Natal, 18 de julho de 2023.

SABRINA SMITH CHAVES

Juíza Relatora

RELATÓRIO

Sentença que se adota:

PROJETO DE SENTENÇA

01.GENILSON SOARES DA SILVA, Subtenente da Reserva Remunerada do Corpo de Bombeiros Militar, desde 04 de Janeiro de 2018, matrícula: 014.707-9, conforme Identidade Funcional (Id. nº88355280), ajuizou a presente ação, neste Juizado Fazendário, em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, pleiteando a condenação do Demandado ao pagamento relativo as licenças especiais não gozadas, no importe de R$ 72.720,00 (setenta e dois mil setecentos e vinte reais), correspondente a 60 (sessenta) salários-mínimos, referente à conversão em pecuniária dos 18 (dezoito) meses de licença especial não gozados após a renúncia dos valores, calculadas com base na remuneração (subsídio de Subtenente BM - Nível IX) do autor no mês anterior a sua passagem para a inatividade (reserva remunerada), haja vista que os meses foram trabalhados normalmente e ensejaram no enriquecimento ilícito do Estado, renunciando-se ao valor que ultrapassar 60 (sessenta) salários mínimos.

02. O ente demandado devidamente citado, apresentou Contestação, preliminarmente alegou ausência de interesse de agir e a prescrição das parcelas anteriores aos cinco anos contados da data da propositura da demanda. No mérito, requereu a improcedência integral da pretensão autoral. Subsidiariamente, na hipótese de procedência, requereu a compensação dos valores já pagos e que, porventura, venham a ser adimplidos antes do encerramento da execução do feito, autorizando-se ainda as deduções fiscal e previdenciária e que a contabilização dos juros devidos seja feita a partir da citação válida.

03. A parte autora apresentou Réplica á Contestação no ID. nº 91911731, rechaçando os argumentos apresentados em sede Contestatória e reiterando os pedidos da exordial.

04. É o que basta relatar. Decido.

05. Ademais, não há falar em falta de interesse processual uma vez que não há, no presente caso, exigência de prévio requerimento administrativo para se ingressar em juízo a fim de obter pagamento pecuniário concernente a licença prêmio não gozada, tendo em vista os ditames que emergem do Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, insculpido este no inciso XXXV, da Constituição Federal, logo rejeito a preliminar suscitada.

06. No tocante a prejudicial de prescrição das parcelas anteriores a cinco anos contados da data da propositura da ação, o requerido aduziu que todas as parcelas anteriores a 24/04/2016 estão abrangidas pela prescrição quinquenal em razão da presente ação ter sido proposta em 22/04/2021. Esclareça-se, desde logo, que o prazo prescricional para obter indenização por licença-prêmio não gozada, não deve ter por termo inicial a data em que o servidor atingiu os requisitos necessários à fruição. A rigor, até o dia da publicação do ato de sua aposentadoria ou exoneração pode o servidor gozar do benefício da licença-prêmio, que consiste, justamente, no afastamento remunerado do serviço ao seu cargo. Então, enquanto não há a passagem da ativa para a inativa não se pode falar em prescrição, o que também se aplica ao pleito de indenização por demora na concessão de aposentadoria.

07. Feitas essas considerações, observa-se, no caso destes autos, que a parte requerente passou para Reserva Militar em 04 de Janeiro de 2018 (Id.88355282), sendo este o marco inicial da contagem do prazo da prescrição das pretensões da parte autora. Consequentemente, como a presente demanda foi ajuizada somente em 10/09/2022, resta claro que o direito da autora não foi fulminado pela prescrição.

08. Ingressando na discussão do mérito, verifica-se que o cerne desta ação consiste em saber se a parte demandante tem direito a receber indenização pela não fruição de licença-prêmio, apurando-se, assim a responsabilidade civil da Administração Pública pelo suposto dano material sofrido.

09. Segundo a Lei Complementar n° 122, de 30 de junho de 1994 (Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Estado do Rio Grande do Norte), o servidor fará jus à licença-prêmio, consistente em 3 (três) meses de afastamento remunerado, a cada 5 (cinco) anos ininterruptos de exercício (art. 102). Especificamente quanto à carreira de policial militar, a forma de contagem se dá de maneira diferente, de acordo com a Lei n. 4.630/76 (Estatuto dos Policiais Militares do Estado do Rio Grande do Norte), senão vejamos:

Art. 64 - Licença é a autorização para o afastamento total do serviço, em caráter temporário, concedida ao policial-militar, obedecidas as disposições legais e regulamentares.

1º - A licença pode ser:

a) especial;

Art. 65 - A licença especial é a autorização para afastamento total do serviço, relativa a cada decênio de tempo de efetivo serviço prestado, concedida ao policial-militar que a requerer, sem que implique em qualquer restrição para a sua carreira.

§ 1º- A licença especial tem a duração de 6 (seis) meses podendo ser parcelada em 2 (dois) ou 3 (três) meses por ano civil, quando solicitado pelo interessado e julgado conveniente pelo Comandante-Geral da Corporação.

10. No caso em análise, a parte requerente, de acordo com a Certidão de Tempo de Serviço (Id. nº88355282), deixou de usufruir de 02 (duas) licenças-prêmio, referente ao 1º e 2º Decênio, do período aquisitivo de 04.01.1988 à 04.01.1998 e o 2º Decênio de 04.01.1998 à 04.01.2008.

11. Consta na Declaração de Id. nº 88355282, pág. 6, que a terceira licença especial, referente ao terceiro decênio, não consta pedido do militar interessado, durante seu tempo de serviço ativo, para gozo desta, vez que, ao completar exatos 30 (trinta) anos de serviço, preencheu os requisitos da reserva remunerada ex-officio. Ora, o militar em questão integralizou mais um decênio, completando período aquisitivo para o 3º decênio de licença especial. Assim, se não pode usufruir do afastamento remunerado quando em atividade por ter preenchido no mesmo dia os requisitos para a inatividade de forma ex officio, tem o direito à conversão em pecúnia respectiva.

12. Diante do quadro descortinado, mostra-se cabível a condenação a indenizar, a fim de evitar o enriquecimento indevido do ente estatal demandado, mesmo não havendo dispositivo legal autorizando ou proibindo o pagamento de indenização por licença-prêmio.

13. Realmente, de acordo com o que consta dos artigos 884 a 886, do Código Civil, vedado está o enriquecimento ilícito, ou seja, aquele obtido sem justa causa, o que também se aplica às relações regidas pelo Direito Administrativo, pois a ninguém é concedido o direito de auferir vantagem indevida, tratando-se, a rigor, de um daqueles princípios que estariam implícitos em nosso ordenamento jurídico, podendo ser aplicado independentemente de qualquer previsão legal. Portanto, em sendo constatada situação caracterizadora do princípio em tela, autorizado está o magistrado a condenar quem se beneficiou a indenizar pelo proveito ilegitimamente obtido.

14. Sobre a aplicabilidade do princípio que veda o enriquecimento sem causa contra a Administração Pública, no caso de esta não indenizar o servidor aposentado por licença-prêmio não gozadas, já houve manifestação do Superior Tribunal de Justiça (STJ. REsp nº 1.662.749/SE. Órgão julgador: 2ª Turma; Rel. Min. Herman Benjamin. Data do julgamento: 16/05/2017).

15. Tendo ficado demonstrado que a parte demandante, ao ser transferido para a reserva remunerada, não havia gozado todas as licenças-prêmio a que fazia jus, já que satisfeitos os requisitos necessários à obtenção, configurada está a vantagem indevida obtida pela Administração Pública, na medida em que se beneficiou do trabalho do servidor quando este deveria estar afastado, com remuneração, conforme assegurado pela legislação desta unidade federativa. Ressalte-se, apenas, para não deixar lacunas na motivação, que a ausência de requerimento administrativo para o gozo de licença-prêmio não obsta o direito de o servidor obter indenização pelos serviços prestados, conforme já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, e que a...

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