Acórdão Nº 09054970420228205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 04-10-2023

Data de Julgamento04 Outubro 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo09054970420228205001
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0905497-04.2022.8.20.5001
Polo ativo
ANA MARIA DAMASCENO
Advogado(s): WALESKA MARIA DANTAS RODRIGUES
Polo passivo
DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO
Advogado(s):

PODER JUDICIÁRIO

ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

PRIMEIRA TURMA RECURSAL

RECURSO CÍVEL Nº 0905497-04.2022.8.20.5001

RECORRENTE: ANA MARIA DAMASCENO

ADVOGADA: WALESKA MARIA DANTAS RODRIGUES

RECORRIDO: DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO RIO GRANDE DO NORTE – DETRAN/RN

RELATORA: JUÍZA SANDRA SIMÕES DE SOUZA DANTAS ELALI


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do recurso acima identificado, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, confirmando a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Condenação em custas processuais e em honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, ficando suspensa a exigibilidade, conforme o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil.

Esta súmula de julgamento servirá de acórdão, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto por ANA MARIA DAMASCENO contra a sentença que julgou improcedente o seu pedido contido na inicial da ação promovida em desfavor do DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO RIO GRANDE DO NORTE – DETRAN/RN.

Em suas razões recursais, a recorrente requereu os benefícios da gratuidade da justiça e aduziu que “a estabilidade excepcional prevista no art. 19 do ADCT, contemplou os servidores que preencheram os requisitos, garantindo um direito excepcional já previsto nas constituições anteriores, consagrando e valorizando seus serviços prestados até então”.

Ressaltou que “o constituinte estendeu o direito à estabilidade aos servidores contratados sem concurso para os cargos que não previam tal condição para o provimento, visando assegurar e prestigiar seus serviços à Administração. Concluir de outra forma seria um verdadeiro ato ilegítimo e carente de equidade e legitimidade para com aqueles trabalhadores, com nítida afronta ao direito da pessoa humana, pois a criação de uma nova categoria de servidor (estável, mas não efetivo), estabelece uma nova relação jurídica incompatível com a nova sistemática constitucional”.

Registrou que, “a real finalidade do art. 19 do ADCT, uma vez aplicada às técnicas de interpretação da norma jurídica, como a histórica, sistemática e a teleológica, nos conduz a exegese de que não fora criada uma nova categoria de servidor público quando da promulgação da Carta de 1988, e sim uma estabilização e unificação dos regimes que regulariam as carreiras dos servidores públicos que à época da entrada em vigor da nova ordem constitucional se enquadravam ou tinham sido contratados por outra forma que não o concurso público, mas que ao tempo era constitucional devido à natureza do cargo e expressa previsão nesse sentido”.

Afirmou que “a previsão transitória da constituição é uma forma de contemplar e enquadrar os servidores a nova ordem instituída, os quais deveriam ter seus direitos assegurados assim como aqueles que passaram por um concurso, pois esta, sem dúvida, é a interpretação que garante a máxima efetividade do texto constitucional como um todo não apenas atendo-se a literalidade disposta no art. 19 do ADCT”.

Argumentou que, “quando da transformação do Detran/RN em autarquia, todos os servidores eram abarcados pela CLT e, consequentemente, empregados públicos admitidos através de seleção, conforme dispositivo legal acima mencionado. Portanto, todos os contratos de admissão foram registrados e aprovados pelo TCE/RN, sendo esses empregos transformados em cargos públicos conforme disciplina o Art. 238, da Lei Complementar 122/94, ou seja, todos os servidores do Detran, inclusive a recorrente, foram submetidos a testes de seleção de caráter público e de provas e títulos, condição para registro dos contratos pelo Tribunal de Contas do Estado”.

Destacou, ainda, que a sentença deve ser modificada no intuito de que seja implantado no contracheque da recorrente a progressão funcional horizontal da letra “T”, que faz jus conforme Anexos III e VI da Lei Complementar nº 696/2022, e que seja assegurado o direito de ascender às classes superiores nos moldes do Anexo III e VI da LCE nº 696/2022 caso seja complementado o tempo de serviço prestado ao Detran/RN enquanto tramitar a presente demanda”.

Afinal, requereu que o recurso seja conhecido e provido para que seja reformada a sentença recorrida, julgando-se procedente o seu pleito inicial.

Intimado, o DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO (DETRAN/RN) não apresentou contrarrazões ao recurso inominado.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente, defiro o pedido de gratuidade da justiça, formulado pela recorrente, nos termos dos arts. 98, §1º, inciso VIII, e 99, § 7º, todos do Código de Processo Civil.

Por oportuno, registro que a gratuidade da justiça é corolário do princípio constitucional do acesso à justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição da República. E o colendo Supremo Tribunal Federal já consolidou o entendimento de que, para a obtenção da gratuidade da justiça, é prescindível a declaração formal de hipossuficiência, tendo em vista que a simples alegação do interessado de que não dispõe de recursos financeiros suficientes para arcar com as despesas processuais é suficiente para comprová-la.

Ademais, há de se observar que, para a concessão do benefício, não se exige o estado de penúria ou de miserabilidade, mas tão somente a pobreza na acepção jurídica do termo, a carência de recursos suficientes para suportar o pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, não se admitindo que as custas processuais constituam óbice ao direito de ação, nem ao acesso ao Judiciário. E somente se admite o indeferimento do pedido de gratuidade da justiça na hipótese prevista no art. 99, § 2º do Código de Processo Civil.

Feitos esses registros, há de se observar que estão presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade do recurso, dele conheço, registrando que se evidenciam o cabimento do recurso, a legitimação para recorrer, o interesse recursal, a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, bem como a tempestividade e a regularidade formal, tratando-se de recorrente beneficiária da gratuidade da justiça.

Pelo exame dos autos, verifica-se que se impõe o desprovimento do recurso. É que as questões postas foram bem analisadas na sentença recorrida, da qual consta o seguinte:

[...] ANA MARIA DAMASCENO DE SOUZA ajuizou a presente ação, neste Juizado Fazendário, em desfavor do DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, requerendo, em apertada síntese, progressão funcional em sua carreira, respectivamente, com base na Lei Complementar de n.º 424/2010.

[...] No mérito, o cerne da demanda consiste em saber se a parte autora faz jus à progressão funcional com base na legislação que rege o plano de cargos e salários dos servidores do DETRAN/RN.

Nada obstante, verifico que o objeto mediato da causa perpassa pela análise do vínculo funcional estabelecido entre a Requerente e o Demandado.

Isso porque, em consulta ao documento de Id 90352113, p. 1 e 2, verificou-se que a parte autora ingressou nos quadros da autarquia estadual em 30 de abril de 1984, por meio de contrato de trabalho, posteriormente convertido em cargo público estatutário, por força do art. 238, § 1o, da Lei Complementar no 122/94.

Nesta senda, certo afirmar, desde logo, que a Requerente, que ingressou no serviço público estadual antes da promulgação da Constituição de 1988, não detém sequer estabilidade, já que fora da regra excepcional do art. 19, do ADCT.

Com efeito, nos moldes do citado dispositivo, os contratados antes da Constituição Federal, pelo regime celetista, e que na data da publicação da CF/88 contassem com cinco anos ou mais de efetivo exercício na função pública, passaram a gozar da garantia da estabilidade, o que convencionou-se chamar de estabilidade especial ou excepcional.

A estabilidade especial, diferentemente da efetividade, consiste unicamente em direito à aderência ao cargo, ou seja, à integração ao serviço público caso cumpridas as condições fixadas em lei (art.19 ADTC). Enquanto a efetividade, por sua vez, trata-se de atributo do cargo público, sendo imprescindível a aprovação em concurso público, única forma regular de provimento de cargo público efetivo (art. 37, II, CF).

Ora, a estabilidade, tida como “especial”, se dá em relação à função pública que o servidor contratado estável passou a gozar, somente possuindo direito de permanência no referido cargo, não significando que o mesmo passou a ocupar cargo público, vez que, como visto, para preenchimento deste, necessária a aprovação em concurso público. E, o servidor contratado, que permaneceu no serviço público sem atender sequer aos requisitos do art. 19 ADTC, não detém qualquer tipo de estabilidade, configurando vínculo precário com a Administração Pública.

Sobre a celeuma, em recente decisão, o Supremo Tribunal Federal firmou, para fins de repercussão geral, a seguinte tese ao Tema 1157:

É vedado o reenquadramento, em novo Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração, de servidor admitido sem concurso público antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, mesmo que beneficiado pela estabilidade excepcional do artigo 19 do ADCT, haja à vista que esta regra transitória não prevê o direito à efetividade, nos termos do artigo 37, II, da Constituição Federal e decisão proferida na ADI 3609 (Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, DJe. 30/10/2014).

Vejamos a ementa da decisão:

TEMA 1157 DA REPERCUSSÃO GERAL. SERVIDOR ADMITIDO SEM CONCURSO...

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