Acórdão nº 50000125020138210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 03-02-2021

Data de Julgamento03 Fevereiro 2021
ÓrgãoVigésima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50000125020138210021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000492177
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000012-50.2013.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Usucapião Extraordinária

RELATOR: Desembargador GLENIO JOSE WASSERSTEIN HEKMAN

APELANTE: VALERIA TEIXEIRA MEDINA (RÉU)

APELADO: MARIA ELENIR MACCARINI (AUTOR)

APELADO: SALVADOR MOISES MAIA DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível (APELAÇÃO6) interposta por VALÉRIA TEIXEIRA MEDINA, inconformada com a sentença (SENT5), que julgou procedente o pedido deduzido na ação de usucapião extraordinário movida por MARIA ELENIR MACCARINI E SALVADOR MOISÉS MAIA DA SILVA.

Nas suas razões recursais (APELAÇÃO6), em síntese, alega preliminar de ocorrência de cerceamento de defesa, porquanto requereu fossem ouvidos, em audiência de instrução, os confinantes, no entanto o pedido foi indeferido pelo juiz. Sustenta a necessidade da produção da prova oral, posto que o depoimento dos confinantes (vizinhos) constitui a única prova por ela utilizada para demonstrar que os autores não detêm a posse do terreno pretendido usucapir (lote nº 16), na forma do art. 373, II, do CPC. No mérito, alega que não há prova da posse qualificada dos autores sobre o terreno, sendo insuficiente para provar a posse o pagamento de IPTU. Sustenta que não há provas no feito a sustentar o pedido de declaração de domínio. Requer a reforma da sentença.

Acostada ao feito, as contrarrazões (CONTRAZAP8).

Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou pelo provimento da apelação, reconhecendo o cerceamento de defesa. Em decorrência, aponta para desconstituição da sentença. O parecer está, assim, ementado:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. PROVA TESTEMUNHAL. OITIVA DOS CONFRONTANTES DO IMÓVEL. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. DESCONSTITUIÇÃO DA SENTENÇA. 1. Cerceamento de defesa pelo indeferimento do pedido de oitiva dos confrontantes do imóvel como testemunhas, visto haver liberdade da parte para arrolar as pessoas que entende possam contribuir para a prova. 2. Embora seja facultado ao magistrado indeferir as diligências inúteis ou protelatórias, tal não se verifica no caso, considerando a natureza da lide e a importância da prova testemunhal. Parecer pelo conhecimento e provimento do apelo, desconstituindo-se a sentença.

Vieram os autos conclusos a este Relator para julgamento.

É o breve relatório.

VOTO

Tempestiva e dispensada do preparo, em razão do deferimento de AJG à demandada, recebo a apelação nos seus efeitos legais.

Cuida-se de ação de usucapião proposta por MARIA ELENIR MACCARINI E SALVADOR MOISÉS MAIA DA SILVA contra VALÉRIA TEIXEIRA MEDINA, tendo em mira o terreno - lote 16 -, área com 360m², localizada de frente para rua Dolores, Vila Dona Júlia, Passo Fundo/RS, matrícula nº 90.236 do Ofício Imobiliário daquele Município. Para tanto alegam posse vintenária, acrescida dos requisitos do art. 1.238 do Código Civil brasileiro.

Conforme se extraí das razões recursais (APELAÇÃO6), a insurgência da apelante cinge-se, basicamente, a arguição de preliminar de cerceamento de defesa por indeferimento de prova oral (fl. 132 dos autos físicos) e, no mérito, sustenta a inexistência de provas a demonstrar os requisitos do art. 1.238 do Código Civil, necessários a declaração de domínio, conforme determina o art. 373, I, do Código de Processo Civil.

Analisei atentamente os autos e, ancorado na prova fotográfica de fls. 62, 121 e 157 (autos físicos), tenho que, merece guarida o inconformismo recursal da apelante no atinente a ocorrência de cerceamento de defesa (CF, art. 5º, LV e art. 369 do CPC).

Antes friso que, a aquisição da propriedade pelo modo originário resulta, basicamente, da harmonia de posse prolongada e de tempo. Maria Helena Diniz pela usucapião o legislador permite que uma determinada situação de fato, sem ser molestada, se alongou por um certo intervalo de tempo previsto em lei, se transforme em situação jurídica, atribuindo-se assim juridicidade a situações fáticas que amadureceram com o tempo. A usucapião tem por fundamento a consolidação da propriedade, dando juridicidade a uma situação de fato: a posse unida ao tempo. A posse é o fato objetivo, e o tempo, a força que opera a transformação do fato em direito, o que nos demonstra a afinidade existente entre os fenômenos jurídicos e físicos (Curso de Direito Civil Brasileiro, V.4, Direito das Coisas, 27ª edição, São Paulo, Editora Saraiva, 2012).

Por sua vez, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald lecionam que a usucapião extraordinária caracteriza-se pela longa duração da posse (quinze ou dez anos), dispensando os requisitos formais do justo título e a boa-fé. Basta a posse continua, com animus domini, sem interrupção nem oposição, acrescida de alguns casos de qualificação pela função social (Direitos Reais, 2ª edição, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006).

Nessa linha de entendimento, crucial mostra-se a prova inconteste da posse e do lapso temporal - acrescidos dos demais requisitos - na forma do artigo 373 do CPC. Assim, o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito e ao réu quanto a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

A respeito do ônus da prova ensina Benedito Silvério Ribeiro na sua obra de Usucapião, Volume II: Na ação de Usucapião, em especial, por servir a sentença de titulo de propriedade, para perfecção dominial, é mister que os requisitos básicos e indispensáveis estejam comprovados suficientemente, no referente a posse qualificada para tanto (continua, ininterrupta, mansa e pacífica, incontestada, etc,) e ao tempo estabelecido em lei (São Paulo: Editora Saraiva, 1992).

No caso, a parte demandada, ora apelante, atendendo a decisão do Magistrado da origem e aderindo o princípio geral da prova, tempestivamente declinou seu interesse na oitiva dos confrontantes, de forma justificada.

De modo que, na espécie, o indeferimento da prova (fl. 132 do processo físico), configurou cerceamento de defesa, nos termos da legislação pertinente, acarretando prejuízo a ré.

Dispõe o art. 5º. inc. LV, da Constituição Federal/88.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos...

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