Acórdão nº 50000370420218210144 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 31-03-2022

Data de Julgamento31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50000370420218210144
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001690275
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000037-04.2021.8.21.0144/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito Autoral

RELATORA: Desembargadora ELIZIANA DA SILVEIRA PEREZ

APELANTE: VANDERLEI CAMINI (AUTOR)

APELANTE: AMAZON SERVICOS DE VAREJO DO BRASIL LTDA. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de recursos de Apelação interpostos pelas partes contra a sentença que julgou procedente a Ação de Reparação de Danos Morais por Violação de Direitos Morais de Autor ajuizada por VANDERLEI CAMINI contra AMAZON SERVIÇOS DE VAREJO DO BRASIL LTDA.

Cita-se o dispositivo da sentença recorrida (evento 23):

Ante o exposto, com base no art. 487, inciso I, do CPC/15, julgo PROCEDENTE o pedido para condenar a ré a pagar ao autor a importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de indenização por danos morais, a ser corrigida pelo IGPM a partir da presente data (Súmula n.° 362 do STJ), com juros de mora a contar da citação.

Custas e honorários pela ré, estes fixados em 15% do valor da condenação, com base no art. 85, § 2º, do CPC, considerando a natureza da causa, o trabalho desenvolvido e o tempo necessário para tanto.

Nas razões recursais do autor (evento 27), disse que é compositor de diversas obras musicais, conforme o relatório analítico juntado aos autos (Evento 1 – OUT9), sendo que a ré, por sua vez, mantém uma plataforma chamada “Amazon Music” onde disponibiliza músicas para usuários mediante pagamento de serviço de streaming. Alegou que a ré disponibilizou 11 obras musicais que compôs (1.Calendário; 2. Cena de cinema; 3. Fica fica; 4. Jogado fora; 5. Minha pequena; 6. Mulher boemia; 7. Nao te quero mais; 8. Nosso filme; 9. Rolamos pelo chão; 10. Te amo te amo; 11. Você é linda) sem nenhuma menção de sua autoria, violando expressamente o disposto na Lei de Direitos Autorais. Sustentou que a ré em nenhum momento negou a utilização das 11 obras intelectuais, tendo inclusive, confessado a não creditação de 6 obras intelectuais (e não produzindo prova quanto às outras 5 obras). Embora procedente o seu pedido, busca a majoração dos danos morais, pois o fixado não reflete o que vem sendo adotado pela jurisprudência em casos semelhantes, tampouco serve como repressão a possível nova violação. Aduziu que em casos similares ao do apelante, há condenação de danos morais e o valor indenizatório é arbitrado em média de R$ 5.000,00 a R$10.000,00 por obra sem creditação autoral. Ao final, requereu a majoração da condenação da ré no valor de R$ 30.000,00, ou, alternativamente o valor de R$ 3.000,00 por obra executada sem menção da autoria ou, ainda, outro entendimento desta Egrégia Corte condizente com as violações apontadas (dano moral in re ipsa e responsabilidade objetiva), com a devida correção monetária pelo IGP-M e incidência de juros moratórios de 1% a.m.; bem como a majoração e fixação de verba honorária em grau recursal (art. 85, § 11, do CPC), atingindo o percentual de 20%.

Nas razões recursais da ré (evento 29), preliminarmente, arguiu a sua ilegitimidade passiva para figurar no polo passivo da presente demanda, uma vez que as obras musicais mencionadas pelo autor foram licenciadas a ela por empresas licenciantes, estas sim detentoras dos direitos e informações de autoria sobre as músicas. Alegou que a r. sentença desconsiderou que a AMAZON VAREJO é responsável pela disponibilização a clientes brasileiros do aplicativo Amazon Music, cuja música ou conteúdo de áudio já é licenciado finalizado e pronto para reprodução para o grupo Amazon, de acordo com o conteúdo que lhe é licenciado globalmente pelas licenciantes de músicas. A AMAZON VAREJO não tem qualquer ingerência ou contato com a produção das músicas mencionadas pelo autor, as quais foram produzidas e são de responsabilidade das empresas que as licenciaram. Informou que as músicas foram produzidas e licenciadas pelas empresas Symphonic Distribution LLC e Orchard Enterprises NY, Inc., estas sim as responsáveis pela indicação da autoria das músicas. Referiu que o autor não indicou de forma precisa as obras musicais que são objeto da presente ação. Na petição inicial, ele apenas indicou URLs de páginas gerais de busca por certos termos dentro do site do aplicativo Amazon Music, ou seja, links que redirecionam a diversas músicas, não tendo especificado, de forma concreta, as músicas em relação às quais reivindica o direito autoral, o que também não foi mencionado pela r. sentença. No mérito, asseverou que a r. sentença não apreciou seus argumentos que comprovam a ausência de qualquer ato ilícito apto a ensejar eventual responsabilização por eventual dano moral sofrido e não comprovado, em violação ao artigo 489, §1º, incisos III, IV e V1 do Código de Processo Civil. Aduziu, ainda, que a r. sentença também não enfrentou o fato de ser simplesmente impossível para a AMAZON VAREJO ou para qualquer empresa do grupo Amazon conferir se as informações de autoria ou composição prestadas pelas empresas licenciantes das músicas licenciadas para inclusão no serviço Amazon Music estão corretas ou completas. Por mais que a r. sentença tenha entendido que é “incontroversa a disponibilização pela ré, por meio dos serviços oferecidos via streaming, de 11 (onze) obras musicais de composição do autor, registradas no Escritório Central de Arrecadação de Direito Autorais - ECAD (Evento 1, OUT9 e OUT10)”, foi desconsiderado que tal cadastro no ECAD não constitui fonte oficial para checagem da autoria de uma obra musical. Mencionou que inexiste uma fonte oficial para checagem da autoria de uma obra musical, sendo impossível para AMAZON VAREJO ou para qualquer pessoa conferir, com precisão, se as informações que lhe foram fornecidas sobre a autoria de uma música estão corretas ou completas. Discorreu sobre os Contratos de Licenciamento de Conteúdo Musical firmados com as licenciantes das músicas. Relatou que o autor não apresentou qualquer exemplo do prejuízo moral que supostamente teria sofrido, muito menos a relação de eventual dano com qualquer ação ou omissão por parte da AMAZON VAREJO. Alegou que o autor não demonstrou o preenchimento de requisitos próprios da responsabilidade civil, quais sejam: (i) a conduta ilícita da AMAZON VAREJO; (ii) o efetivo dano causado; e (iii) o nexo de causalidade entre tal conduta e o resultado danoso. Impugnou o valor fixado a título de danos morais, no montante de R$ 10.000,00, por ser desproporcional e excessivo. Ao final, requereu o provimento do recurso para julgar improcedente a ação.

O autor apresentou contrarrazões (evento 34), arguindo preliminar de não conhecimento do recurso da ré por ausência de argumentação das matérias abordadas na sentença. No mérito, refutou as razões da ré. Enquanto que a ré apresentou contrarrazões no evento 34.

Apresentados Memoriais pelas partes (eventos 8 e 9).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos recursos de Apelação interpostos pelas partes, os quais serão examinados em conjunto.

Das Preliminares Recursal e Contrarrecursal

Da ilegitimidade passiva da ré

Desacolho a preliminar arguida pela ré de sua ilegitimidade passiva para figurar no polo passivo, eis que consoante jurisprudência do STJ, a reprodução de músicas pela internet nas modalidades simulcasting e broadcasting, modalidades do gênero streaming configura execução pública, através da tecnologia streaming que se enquadra na modalidade de exploração econômica das obras musicais, razão pela qual gera responsabilidade a quem se utiliza deste processo pela divulgação das obras em plataforma musical, independentemente de ter adquirido as músicas das distribuidoras de mídia e gravadoras com quem possui contrato.

Sobre o tema, por analogia, cita-se a jurisprudência abaixo:

APELAÇÃO CÍVEL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL E INTELECTUAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DA AUTORIA. FOTOGRAFIAS. DANOS MORAIS EVIDENCIADOS. QUANTUM MANTIDO. PUBLICAÇÃO DE ERRATA. CABIMENTO. ASTREINTES. MANTIDA. Da Ilegitimidade passiva 1. Postula o réu o acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva, haja vista que as publicações foram realizadas por veículos de comunicação sob os quais não teria ingerência. 2. Preambularmente, consigno que a legitimidade da parte é matéria de ordem pública e, como tal, pode ser conhecida até mesmo de ofício, não se operando os efeitos da preclusão quanto a esta questão, a teor do que estabelece o § 3º do artigo 267 do Código de Processo Civil. 3. A ré é parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, uma vez que as fotos foram produzidas pelo autor em decorrência do contrato de prestação de serviços avençado com a ré para utilização desta, sendo que a demandada foi responsável pelo encaminhamento das fotografias para diversos veículos de comunicação, os quais não indicaram a autoria das imagens veiculadas, violando o direito à autoria da obra fotográfica em questão. Do exame da prescrição do direito do autor 4. Prescrição trienal. Tratando-se de ação indenizatória por danos supostamente ocorridos em razão da alegada prática de ato ilícito pela parte requerida (disponibilização de materiais publicitários a terceiros com a utilização de fotografias do autor, sem o devido crédito nas imagens), tem incidência o prazo prescricional de 03 (três) anos, conforme art. 206, § 3º, V, do atual Código Civil. Vencido o Relator. Mérito do recurso em exame 5. O direito à autoria de obra tem proteção constitucional, visando estimular a criatividade e originalidade, considerando o interesse social e econômico do país. A par disso, em vista de uma maior proteção ao autor da criação, bem como a especificação e desenvolvimento da matéria, foi...

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