Acórdão nº 50000436420178210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Cível, 01-03-2023

Data de Julgamento01 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50000436420178210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003182644
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000043-64.2017.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Espécies de títulos de crédito

RELATORA: Desembargadora ISABEL DIAS ALMEIDA

APELANTE: HUMANA SAUDE SUL LTDA (RÉU)

APELADO: IVONE COMERLATO SIRTOLI (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por HUMANA SAÚDE SUL LTDA contra a sentença (evento 2, SENT4) que, nos autos da ação revisional de contrato ajuizada por IVONE COMERLATO SIRTOLI, julgou a demanda nos seguintes termos:

Diante de todo o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO REVISIONAL DE CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE ajuizado pela autora IVONE COMERLATO SIRTOLI contra o requerido PRO SALUTE SERVIÇOS PARA SAÚDE – PLANO FÁTIMA, para o fim de declarar nulo o reajuste, em razão de troca de faixa etária, aplicado na mensalidade do plano de saúde, em maio de 2008, no percentual de 53,08%, e condenar o requerido a restituir à autora, de forma simples, os valores indevidamente cobrados, corrigidos monetariamente pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, e acrescidos de juros de mora, no percentual de 1% ao mês, a partir da citação, observada a prescrição trienal, contada do ajuizamento, ou seja, 27/01/2017.

Sucumbente, condeno o requerido ao pagamento das custas processuais, e de honorários advocatícios aos procuradores da autora, que fixo em 15% sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, §2.º, do CPC.

Em suas razões (evento 2, APELAÇÃO6), elabora relato dos fatos e defende a legitimidade do reajuste decorrente da troca de faixa etária, conforme art. 15 da LPS, Resolução Consu 06/98 e Tema 952 do STJ. Pontua que o reajuste aplicado aos 60 anos de idade foi de 53,08%, passando o valor de R$1198,22 para R$182,50. Conclui pela necessidade de manutenção do equilíbrio econômico e financeiro do contrato. Colaciona jurisprudência. Requer o provimento do apelo.

Apresentadas contrarrazões no sentido do desprovimento do recurso, (evento 2, CONTRAZAP9), subiram os autos a esta Corte.

Determinado o sobrestamento do feito até julgamento dos Temas 952 e 1016 do STJ (evento 5, DESPADEC1).

Noticiado o trânsito em julgado dos recursos paradigmas no c. STJ e intimadas as partes a esse respeito (evento 18, DESPADEC1), as partes reiteraram os argumentos (evento 23, PET1 e evento 25, PET1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

Foram observados os dispositivos legais, considerando a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

O apelo é adequado, tempestivo e está dispensado de preparo, por litigar a recorrente ao abrigo da gratuidade da justiça (evento 2, OUT - INST PROC2). Assim, passo ao seu enfrentamento.

Melhor situando o objeto da controvérsia, adoto o relato da sentença, vertido nos seguintes termos:

Vistos os autos do processo.

IVONE COMERLATO SIRTOLI, qualificada na petição inicial, ajuizou Ação Revisional de Contrato de Plano de Saúde contra PRO SALUTE SERVIÇOS PARA SAÚDE – PLANO FÁTIMA, também, identificado na petição inicial, noticiando a autora que é beneficiária do plano de saúde requerido, que contratou, em convênio com o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Fiação e Tecelagem do Distrito de Galópolis, e que, ao completar 60 anos, sua mensalidade sofreu reajuste abusivo, passando de R$119,22 para R$182,50, num percentual de 53,08%. Discorreu sobre a incidência do CDC e do Estatuto do Idoso ao caso dos autos do processo. Postulou que os valores pagos, indevidamente, sejam restituídos, com atualização monetária, desde cada desembolso. Requereu, em sede de antecipação de tutela, a suspensão da cobrança do valor com o reajuste de faixa etária, adequando-se o valor da mensalidade para o mesmo que era cobrado anteriormente, com a manutenção da prestação dos serviços de saúde. Pleiteou o julgamento de procedência dos pedidos para que fosse declarada a nulidade das cláusulas contratuais que preveem o reajuste das mensalidades, por faixa etária, a condenação do requerido à restituição de todos os valores cobrados indevidamente, com correção monetária, desde cada desembolso, a concessão da gratuidade da Justiça e a inversão do ônus da prova. Juntou documentos, fls.10-33.

Pela decisão de fl.34, recebida a petição inicial, foi deferido o benefício da gratuidade da Justiça à autora, bem como foi deferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela.

Citado, o requerido apresentou contestação, fls.37-44, informando que a autora possui vínculo, por meio de contrato coletivo empresarial, firmado entre o requerido e o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria e Tecelagem de Galópolis (Plano Coletivo Referência Padrão), desde 01/11/1999, sendo que o reajuste questionado ocorreu em julho de 2008. Sustentou que o reajuste etário ocorreu quando a beneficiária do plano de saúde completou 60 anos de idade, com observância, na época, das regras da Resolução CONSU n.º 06/98, artigos 1.º e 2.º, respeitando-se as sete faixas etárias para o reajuste das mensalidades e o percentual aplicado entre elas. Defendeu, assim, a legalidade do aumento implementado. Esclareceu que o reajuste aplicado nas mensalidades ocorreu nos exatos termos do contrato firmado com o sindicato da autora, não havendo que se falar em qualquer abusividade, uma vez que a autora foi incluída na faixa etária correspondente. Impugnou o pedido de restituição de valores, ao qual, em caso de procedência, deve ser aplicada a prescrição trienal, requerendo, ao final, a improcedência da ação. Subsidiariamente, afirmou que, no caso de procedência, deverá ser permitido à operadora do plano de saúde requerido, reajustar em, no mínimo, 30% o valor da mensalidade. Juntou documentos, fls.45-49.

Réplica à contestação, fls.53-55. Determinada a intimação das partes para manifestarem o interesse na dilação probatória, fl.56. Veio manifestação do requerido postulando a suspensão do processo enquanto não julgado IRDR 70073362725, e a autora, o julgamento antecipado do feito. Decisão à fl.61 deferindo a suspensão. Manifestação da autora, informando acerca do julgamento do IRDR e postulando o julgamento do processo. Vieram os autos do processo conclusos para a sentença.

Sobreveio sentença de procedência, razão da interposição do presente recurso pela ré.

A controvérsia recursal diz basicamente com a alegada ilegalidade do reajuste etário previsto no contrato de plano de saúde coletivo entabulado entre a ré e o estipulante Sindicato dos Trabalhadores da Indústria e Tecelagem de Galópolis.

Pois bem. Os contratos de plano de saúde estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos do artigo 35 da Lei 9.656/98 e da Súmula 608 do STJ, pois envolvem típica relação de consumo. Assim, incide na espécie o artigo 47 do CDC, que determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor.

Quanto à cláusula de reajuste com base na faixa etária do beneficiário do plano de saúde coletivo, a Segunda Seção do colendo Superior Tribunal de Justiça firmou a seguinte tese no Tema 1016:

(a) Aplicabilidade das teses firmadas no Tema 952/STJ aos planos coletivos, ressalvando-se, quanto às entidades de autogestão, a inaplicabilidade do CDC;
(b) A melhor interpretação do enunciado normativo do art. 3°, II, da Resolução n. 63/2003, da ANS, é aquela que observa o sentido matemático da expressão 'variação acumulada', referente ao aumento real de preço verificado em cada intervalo, devendo-se aplicar, para sua apuração, a respectiva fórmula matemática, estando incorreta a simples soma aritmética de percentuais de reajuste ou o cálculo de média dos percentuais aplicados em todas as faixas etárias.

Já por ocasião do julgamento do REsp 1568244/RJ (Tema 952), a Corte Superior assim definiu:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. MODALIDADE INDIVIDUAL OU FAMILIAR. CLÁUSULA DE REAJUSTE DE MENSALIDADE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. LEGALIDADE. ÚLTIMO GRUPO DE RISCO. PERCENTUAL DE REAJUSTE. DEFINIÇÃO DE PARÂMETROS. ABUSIVIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EQUILÍBRIO FINANCEIRO-ATUARIAL DO CONTRATO.

1. A variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário deverá estar prevista no contrato, de forma clara, bem como todos os grupos etários e os percentuais de reajuste correspondentes, sob pena de não ser aplicada (arts. 15, caput, e 16, IV, da Lei nº 9.656/1998).

2. A cláusula de aumento de mensalidade de plano de saúde conforme a mudança de faixa etária do beneficiário encontra fundamento no mutualismo (regime de repartição simples) e na solidariedade intergeracional, além de ser regra atuarial e asseguradora de riscos.

3. Os gastos de tratamento médico-hospitalar de pessoas idosas são geralmente mais altos do que os de pessoas mais jovens, isto é, o risco assistencial varia consideravelmente em função da idade. Com vistas a obter maior equilíbrio financeiro ao plano de saúde, foram estabelecidos preços fracionados em grupos etários a fim de que tanto os jovens quanto os de idade mais avançada paguem um valor compatível com os seus perfis de utilização dos serviços de atenção à saúde.

4. Para que as contraprestações financeiras dos idosos não ficassem extremamente dispendiosas, o ordenamento jurídico pátrio acolheu o princípio da solidariedade intergeracional, a forçar que os de mais tenra idade suportassem parte dos custos gerados pelos mais velhos, originando, assim, subsídios cruzados (mecanismo do community rating modificado).

5. As mensalidades dos mais jovens, apesar de proporcionalmente mais caras, não podem ser majoradas demasiadamente, sob pena de o negócio perder a atratividade para eles, o que colocaria em colapso todo o sistema de saúde suplementar em...

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