Acórdão nº 50000743220198210037 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Cível, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50000743220198210037
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002220320
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000074-32.2019.8.21.0037/RS

TIPO DE AÇÃO: Pagamento indevido

RELATOR: Desembargador NEWTON LUIS MEDEIROS FABRICIO

APELANTE: LUMATRI CONTABILIDADE E ASSESSORIA SC LTDA (AUTOR)

APELADO: MUNICÍPIO DE URUGUAIANA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por LUMATRI CONTABILIDADE E ASSESSORIA SC LTDA, em face da sentença prolatada nos autos da ação declaratória ajuizada contra o MUNICÍPIO DE URUGUAIANA, que julgou improcedentes os pedidos.

Em suas razões, assevera a apelante, em apertada síntese, ser sociedade uniprofissional, fazendo jus à tributação do ISS na forma fixa, privilegiada. Cita julgados. Sustenta não ter caráter empresarial. Requer o provimento da apelação.

Foram apresentadas as contrarrazões.

O Ministério Público opinou pelo desprovimento do apelo.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação interposta.

Adianto que prospera a irresignação.

A apelante insurge-se contra a sentença proferida, aduzindo ser merecedora de tratamento privilegiado na tributação do ISS, em atenção ao disposto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei nº 406/68, que foi recepcionado pela Constituição Federal como Lei Complementar, abaixo trazido:

Art. 9º - A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.

§ 1º - Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

[...]

§ 3º - Quando os serviços a que se referem os itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92 da lista anexa forem prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto na forma do § 1º, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável.

Os citados itens identificam os seguintes serviços: “1 – Médicos, inclusive análises clínicas, eletricidade médica, radioterapia, ultra-sonografia, radiologia, tomografia e congêneres; 4 – Enfermeiros, obstetras, ortópticos, fonoaudiólogos, protéticos (prótese dentária); 8 – Médicos veterinários; 25 – Contabilidade, auditoria, guarda-livros, técnicos em contabilidade e congêneres; 52 – Agentes de propriedade industrial; 88 – Advogados; 89 – Engenheiros, arquitetos, urbanistas, agrônomos; 90 – Dentistas; 91 – Economistas; 92 – Psicólogos.”

A insurgência encontra, portanto, amparo em lei, restando presente a probabilidade do direito.

Importante registrar que é cediça a jurisprudência no sentido de que a finalidade da norma, isto é, sua interpretação teleológica deve se sobrepor à forma. Ainda mais no Direito Tributário, que é um direito, essencialmente, de transposição.

Em outros termos, o caráter da pessoalidade pode ser aferido independentemente da forma adotada por determinada sociedade. É claro que seria difícil pensar que este elemento estivesse presente no caso de uma sociedade anônima, por exemplo, não sendo esta a hipótese dos autos, visto que se trata de Sociedade Limitada.

Tanto é que está registrada em Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, enquanto que atos empresariais tem registro na Junta Comercial. Ainda que este não fosse o caso, a similaridade das sociedades limitadas às sociedades simples resta visível ao prever, o próprio Código Civil, a aplicação subsidiária das normas relativas a esta última às sociedades de responsabilidade limitada, vide o disposto no art. 1053, caput do diploma, e, excepcionalmente – apenas caso previsto no contrato social -, a aplicação das normas aplicáveis às sociedades anônimas (art. 1053, parágrafo único, do Código Civil).

No caso, o objeto social é, exclusivamente, a prestação de serviços contábeis. Percebe-se, portanto, tratar-se de atividade científica; logo, objeto não empresarial.

De qualquer forma, creio que o ponto já tenha sido suficientemente analisado no julgado de nº 70069861416, proferido por esta Câmara Cível, sob a relatoria do Des. Irineu Mariani, conforme excerto abaixo transcrito:

"1.2 – Forma social ou modelo. Às sociedades empresariais vigora o princípio da tipicidade (CC, art. 983, parte), quer dizer, se o objeto for atividade empresarial, só pode adotar um dos modelos de sociedade previstos na legislação, por exemplo, sociedade limitada, anônima, em nome coletivo, etc.

Já em relação às sociedades simples, que é o caso dos autos, não vigora o princípio da tipicidade (CC, art. 983, parte), quer dizer, tanto pode adotar a forma ou modelo próprio da sociedade simples, quanto pode adotar a forma ou modelo de uma sociedade empresária, salvo da anônima, pois esta é sempre empresarial, independentemente do objeto (Lei 6.404/76, art. 2º, § 1º).

É por isso que vimos com muita frequência uma sociedade simples (antiga civil) com a expressão final Limitada ou abreviadamente Ltda. Ressalvo a sociedade de advogados, face ao disposto no art. 16, caput, e § 3º, da Lei 8.906/94.

Isso, porém, não torna sociedade não empresarial em sociedade empresarial se o objeto não é empresarial, como é o caso da sociedade de serviços médicos, atividade científica (CC/02, parágrafo único do art. 966), que fazendo uso de uma faculdade legal adota o modelo de uma sociedade limitada, na qual cada sócio responde individualmente pela sua quota e coletiva e solidariamente pelo total do capital social (CC, art. 1.052)."

Sem adentrar na questão da objetividade ou não do critério, isto é, de que o fato das sociedades terem por objeto a prestação dos serviços especificados seria suficiente para fazerem jus à tributação privilegiada, registro que da análise dos autos percebe-se, facilmente, que a apelante obedece aos critérios: a) de uniprofissionalidade, pois todos os sócios são contadores e exercem atividades na sociedade (conforme se afere do contrato social e suas respectivas alterações); b) e de pessoalidade, tendo em vista sua atividade-afim, prestada, individualmente, por cada um de seus membros.

Nesse sentido:

TRIBUTÁRIO. ISS. SOCIEDADE UNIPROFISSIONAL DE MÉDICOS. OBJETO SOCIAL E COMPATIBILIDADE. EXERCÍCIO PESSOAL E NÃO EMPRESARIAL. ART. 9º, §§ 1º E 3º, DECRETO-LEI Nº 406/68. TRIBUTAÇÃO PRIVILEGIADA. CABIMENTO. A sociedade uniprofissional constituída por dois médicos, um deles detentor de 95% do capital social, cujo objeto social apresenta-se compatível com a sua qualificação profissional, e em que os sócios desempenham suas atividades em caráter pessoal, sem qualquer engajamento empresarial, tal como estampa a prova documental, enquadra-se na benesse do art. 9º, §§ 1º e 3º, Decreto-Lei nº 406/68, irrelevante na definição de ser a sociedade empresarial ou não o fato de a pessoa jurídica ter se constituído sob a forma de responsabilidade limitada, assim como não obsta incidência do regime privilegiado a eventual...

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