Acórdão nº 50000930520078210087 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50000930520078210087
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002983922
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000093-05.2007.8.21.0087/RS

TIPO DE AÇÃO: Adicional de Insalubridade

RELATORA: Desembargadora MATILDE CHABAR MAIA

APELANTE: MUNICÍPIO DE CAMPO BOM (RÉU)

APELADO: JOVAN EVERALDO ZANON PIUCO (AUTOR)

RELATÓRIO

O MUNICÍPIO DE CAMPO BOM interpõe recurso de apelação em face da sentença (Evento 3, PROCJUDIC13, fls. 04-16, da origem) que julgou parcialmente procedente a demanda ajuizada por JOVAN EVERALDO ZANON PIUCO, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com base no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação de cobrança intentada por JOVAN EVERALDO ZANON PIUCO em face do MUNICÍPIO DE CAMPO BOM, para:

(i.) reconhecer que o autor exerceu atividades laborativas exposto a agentes nocivos, de forma habitual e não intermitente, fazendo jus ao recebimento de adicional de insalubridade em grau máximo (24% - art. 43 da Lei Municipal nº 2.409/03), entre 09.07.2002 a dez/2007, nos termos da fundamentação suprarreferida;

(ii.) reconhecer que o autor exerceu atividades laborativas classificadas como periculosas, no período em que laborou na função de vigia, fazendo jus, portanto, ao adicional de periculosidade de 30% (art. 43, § 2º, da Lei Municipal nº 2.409/03), entre jan/2008 até dez/2016;

(iii.) condenar a parte ré ao pagamento das diferenças entre o adicional de insalubridade em grau máximo (24%) devido e o adicional de insalubridade em grau médio (12%) até então pago, durante o período compreendido entre 09.07.2002 a dez/2007, somente sobre o menor vencimento padrão do respectivo cargo, sem reflexo sobre as demais verbas; e

(iv.) condenar a parte ré ao pagamento do adicional de periculosidade durante o período compreendido entre jan/2008 até dez/2016, somente sobre o menor vencimento padrão do respectivo cargo, sem reflexo sobre as demais verbas.

Tais valores deverão ser corrigidos monetariamente pelo índice IGP-M em relação às parcelas vencidas antes de 30/06/2009, sem juros de mora e, a partir de 30.06.2009, a atualização do débito (correção monetária e juros) deve se dar na forma estabelecida no art. 1º-F da Lei 9494/97, que estabelece os índices aplicáveis à caderneta de poupança, a contar da citação (01.09.2008 – fl. 17v).

Por fim, saliento que devem ser excluídos da condenação os períodos em que o autor esteve de auxílio-doença.

Diante da sucumbência recíproca, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais remanescentes na proporção de 2/3 e condeno a parte autora ao pagamento de 1/3 das custas processuais remanescentes, suspendendo a exigibilidade em relação à parte autora, pois beneficiária da gratuidade de justiça (deferida à fl. 46).

Postergo a fixação dos honorários de sucumbência para após a liquidação do valor da condenação, fulcro art. 85, § 4º, inciso II, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Em suas razões (Evento 3, PROCJUDIC13, fls. 21-39, da origem), alega a necessidade de observância prescrição quinquenal, na medida em que o servidor ingressou com a demanda em 09-07-2007, não podendo o Município ser condenado no período compreendido entre o ajuizamento da demanda até 09-07-2002, o que não foi observado pelo juízo. Colaciona jurisprudência.

Argumenta que pelas Leis Municipais nº 2.045/2000, 2.049/2003 e 4.145/2014, o servidor que executar atividade insalubre fará jus ao pagamento de um percentual, mediante realização de laudo pericial técnico, o qual atestou, em maio/2001, que o cargo de lixeiro foi considerado insalubre em grau máximo, mas que a sentença deixou de considerar que ocorreu a terceirização dos serviços de coleta de lixo urbano, e que o cargo de lixeiro foi extinto pela Lei Municipal nº 2.046/2000, com aproveitamento dos servidores atuantes nesse cargo nas funções de serviços gerais e obras. Alega que mesmo que o servidor estivesse classificado como lixeiro, no setor de Secretaria de Obras, de 2003 até 2007, não executou tais tarefas, o que ficou demonstrado na perícia técnica realizada.

Sustenta a impossibilidade de pagamento dos adicionais no período anterior ao laudo técnico pericial, o qual ocorreu somente em outubro/2015, conforme PUIL nº 413-RS do Superior Tribunal de Justiça. Colaciona jurisprudência. Faz referência ao princípio da legalidade, alegando não ser devido o adicional de periculosidade por ausência de previsão legal. Salienta que o autor, durante vários períodos, esteve em licença para tratamento de saúde, excluindo da condenação tais períodos.

Requer o provimento do recurso.

Intimada, a parte autora não ofertou contrarrazões.

Nesta instância, o Ministério Público pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação (Evento 10).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

O autor é servidor público do Município de Campo Bom desde 21-06-1995 no cargo de Lixeiro (Evento 3, PROCJUDIC2, fl. 14, autos de origem), exercendo, de 2003 até 2007, o cargo para o qual nomeado, no setor da Secretaria de Obras; de 2008 até 2016, o cargo de vigia, nos setores da Secretaria de Educação, Secretaria de Administração e Secretaria de Obras; e de 2017 até 2019, o cargo de serviços gerais em mecânica de veículos, no setor da Secretaria de Obras, conforme informado pela própria municipalidade.

Na presente demanda, pretende o reconhecimento ao direito de percepção de adicional de insalubridade em grau máximo ou, alternativamente, adicional de periculosidade, com os respectivos reflexos patrimoniais correspondentes, durante o quinquênio que antecedeu a propositura da ação, além do reconhecimento ao direito de recebimento dos proventos do cargo de auxiliar de mecânico.

Em sentença, foi reconhecido o direito ao recebimento do adicional de insalubridade em grau máximo no período julho/2002 a dezembro/2007 e do adicional de periculosidade no período de janeiro/2008 a dezembro/2016, excluindo-se os períodos em que o autor esteve sob auxílio-doença.

De tal decisão, recorre o Município de Campo Bom.

Pois bem.

Inicialmente, quanto à necessidade de observância da prescrição quinquenal, equivoca-se o Município recorrente.

Ocorre que a alegação do Município é de que não pode ser condenado ao pagamento de valores no quinquênio anterior ao ajuizamento da demanda, mas, ao contrário, esse é justamente o período em que está autorizada a condenação.

Conforme bem elucidou o nobre Procurador de Justiça atuante no feito, Dr. Júlio César Pereira da Silva,

Ocorre que a sentença reconheceu a prescrição quinquenal (item 1 da fundamentação) e, considerando-se que a ação foi ajuizada em 09.07.2007, considerou prescritas as parcelas anteriores a 09.07.2002. Mas o ente público pede que sejam declaradas prescritas as parcelas vencidas durante esse quinquênio, ou seja, pretende excluir as parcelas vencidas durante os cinco anos que antecederam o ajuizamento da ação.
É que a prescrição quinquenal faz com que sejam devidas tão somente as parcelas pretéritas vencidas dentro do quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação, excluindo as parcelas anteriores, não havendo como acolher a pretensão do ente público de considerar que a prescrição atingiu a totalidade das parcelas anteriores ao ajuizamento, excluindo até mesmo aquelas vencidas dentro do quinquênio da retroação e fazendo com que sejam apuradas apenas as parcelas posteriores ao seu ajuizamento.

Logo, essa tese deve ser rejeitada.

Assim, vai rejeitada a alegação.

No mérito, destaco que a Administração Pública é regida a luz dos princípios constitucionais inscritos no caput do art. 37 da Carta Magna1.

O princípio da legalidade é base de todos os demais princípios que instruem, limitam e vinculam as atividades administrativas, sendo que a Administração só pode atuar conforme a lei2.

In casu, a relação entre a parte autora e o Estado não é contratual, mas sim estatutária, razão pela qual se impõe a vontade do ente público, que estabelece por lei o regime jurídico de seus servidores.

A Administração Pública está constantemente sob a égide da lei, pois o princípio da legalidade é basilar na construção do Direito Administrativo. Decorrência do Estado de Direito, esta submissão à lei é o que garante o exercício das liberdades individuais3.

O fato de a Emenda Constitucional nº 19/98 não ter incluído expressamente dentre os direitos dos servidores ocupantes de cargos públicos a percepção de adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (parágrafo 3º do art. 39 da Constituição Federal), não excluiu a possibilidade de o Ente Federado, na esfera de sua competência, prever e regulamentar a matéria.

Na autorizada lição de Hely Lopes Meirelles (In Direito Administrativo Brasileiro, 27ª ed., São Paulo: Malheiros, p. 400):

A competência para organizar o serviço público é da entidade estatal a que pertence o respectivo serviço. Sobre esta matéria as competências são estanques e incomunicáveis. As normas estatutárias federais não se aplicam aos servidores estaduais ou municipais, nem as do Estado-membro se estendem aos servidores dos Municípios.

Cada entidade estatal é autônoma para organizar seus serviços e compor seu pessoal. Atendidos os princípios constitucionais e os preceitos das leis nacionais de caráter complementar, a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios instituirão seus regimes jurídicos, segundo suas conveniências administrativas e as forças de seus erários (CF, arts. 39 e 169). [grifou-se]

Assim, compete aos Entes da Federação estabelecer o regime de trabalho e de pagamento de seus servidores.

O Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Município de Campo Bom – Lei Municipal nº 2.045/2000 – assim previa o pagamento do adicional de insalubridade, in...

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