Acórdão nº 50000950620188210049 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Primeira Câmara Cível, 22-02-2023

Data de Julgamento22 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50000950620188210049
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003175943
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

11ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000095-06.2018.8.21.0049/RS

TIPO DE AÇÃO: Prestação de serviços

RELATOR: Desembargador GUINTHER SPODE

APELANTE: GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA (RÉU)

APELADO: CARMEN VIVIANE BORGES MULLER (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação cível interposto por GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA., porque inconformada com a sentença que julgou procedente a ação de reparação de danos que litiga em face de CARMEN VIVIANE BORGES MÜLLER.

Adoto o relatório do decisum, exarado nos seguintes termos:

Vistos, para sentença.

CARMEN VIVIANE BORGES MÜLLER, qualificada na inicial, propôs AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS contra GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA, igualmente identificado, narrando que adquiriu da concessionária Carazinho Veículos Ltda, o veículo Onix 1.4 MT LTZ, zero quilômetro, chassi nº 9BGKT48L0DG218525, cor branca, ano/modelo 2013, Renavam nº 149574, pelo valor de R$ 43.000,00.

Disse que compra foi realizada em 14/01/2013 e foi lhe informada a garantia de três anos, caso realizasse revisões regulares descritas no manual do proprietário, o que ocorreu rigorosamente em dia.

Referiu que no dia 04 de setembro de 2015 o automóvel começou a apresentar grave perda de força no motor, chegando ao ponto de parar completamente na estrada, colocando em risco a vida dos ocupantes.

Mencionou que a concessionária informou que havia grave problema no motor, tendo sido reconhecido pela concessionária o problema próprio do veículo e não de mau uso ou falta de manutenção por parte da autora, sendo que o conserto seria coberto pela garantia.

Pontuou que a empresa ré ficou na posse do veículo por 42 dias, de 04/09/2015 até 14/10/2015, aduzindo que os problemas continuaram e retornou até a concessionária com respostas em 26/10/2015, totalizando 54 dias em posse do veículo para reparo.

Argumentou que o reparo não atingiu o objetivo, pois o veículo seguiu apresentando os mesmos defeitos, o automóvel nunca mais foi o mesmo, passando a ter ruídos internos e perceptíveis nas engrenagens, tendo a concessionária informado que não havia mais nada que ser feito.

Afirmou que ocorreu a desvalorização do automóvel. Disse que a troca do motor além de trazer insegurança a parte autora, lhe traz inegável dificuldade em vender o bem.

Disse ter experimentado dano material e moral, que devem ser indenizados.

Efetuou os requerimentos de estilo, valorou a causa e juntou documentos.

Citada, a demandada apresentou contestação suscitando, preliminarmente, a decadência e a falta de interesse de agir. No mérito, alegou, em síntese, a ausência de conduta ilícita e o reparo do veículo. Discorreu sobre os danos materiais e morais. Inaplicabilidade da inversão do ônus da prova. Requereu a improcedência dos pedidos. Juntou documentos.

O processo foi digitalizado, passando a tramitar eletronicamente.

Houve réplica.

Realizada prova pericial e homologado o laudo.

Tomado depoimento pessoal da parte autora, ouvido informante e, encerrada a instrução, as partes apresentaram alegações finais.

É o relatório. Decido.

Acrescento que o dispositivo da sentença possui o seguinte teor:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos contidos na propôs AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS proposta por CARMEN VIVIANE BORGES MÜLLER contra GENERAL MOTORS DO BRASIL LTDA, para o fim de condenar a demandada ao pagamento de dano material no valor de R$ 11.057,40, a ser corrigido pelo IGP-M desde a data do conserto do veículo, bem como ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$10.000,00, corrigido pelo IGP-M a contar desta data, sendo ambas as condenações acrescidas de juros de mora de 1% ao mês, contados da citação.

Condeno a parte demandada a pagar as despesas processuais e honorários ao procurador da parte adversa, fixados em 10% sobre o valor da condenação atualizado, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Ficam as partes intimadas.

Fica resolvido o processo com base no artigo 487, I, do Código de Processo Civil.

Transitada em julgado, baixe-se.

Havendo recurso, determino a intimação da parte contrária para apresentação de contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias. Juntados os eventuais recursos e as respectivas contrarrazões apresentadas no prazo legal, devem os autos ser remetidos ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, independente de nova conclusão.

Em suas razões recursais a apelante alega, preliminarmente, a decadência, conforme art. 26 do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a ação foi distribuída após o decurso do prazo conferido pela lei consumerista. Alega ainda ausência de ato ilícito e de responsabilidade do fabricante, e caso de excludente de culpa prevista no artigo 12, parágrafo 3°, II, do CDC. Sustenta a ausência de cabimento de danos matérias, vez que sanaram o problema alegado. Alega ainda, inexistência de dano moral, vez que não houve prejuízo de ordem subjetiva, decorrente da entrega do automóvel em perfeitas condições de uso, confirmado em prova pericial. Requer seja recebido no duplo efeito, conhecido e provido o presente recurso, com a reforma da sentença prolatada pelo juízo a quo, julgando a ação improcedente, afastando da apelante o dever de efetuar o pagamento por danos matérias, assim como requer o mesmo para a condenação por danos morais, que seja julgada improcedente.

Sobreveio a comprovação do preparo. Evento 102 - COMP2 .

No prazo legal, o recorrido ofertou contrarrazões, pugnando pela manutenção da sentença. Evento 107 - CONTRAZAP1.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Inicialmente, destaco que a preliminar se confunde com o mérito da demanda, motivo pelo qual com ele será analisada.

Na hipótese, incontroverso que se trata de relação de consumo a havida entre as partes, aplicando-se, por consequência, as disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus prova como meio de facilitar a defesa dos direitos do consumidor (a parte hipossuficiente), conforme dispõe o artigo 6º, inciso VIII, do CDC.

Nesta senda em se tratando de ação de indenização de reparação de dano material e moral, correto o entendimento da MM. Juiz a quo de que o prazo prescricional a incidir no caso em comento é aquele previsto no artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor, pois a reclamação a ser discutida aqui não é por vício no produto, mas por fato do produto ou serviço, pois trocado o antigo motor pela fornecedora, outros defeitos apareceram.

Sendo assim, não se está diante de vício do produto, mas de fato do produto ou serviço, pois o motor original já apresentava problemas, dado que a autora adquiriu um automóvel novo e com menos de dois anos de uso, este apresentou defeitos mecânicos, razão pela qual a própria concessionária realizou a substituição do motor. Ademais, restou constatado nos autos que o veículo era submetido a revisões periódicas e sucessivas diretamente na concessionária autorizada.

Com efeito, como se sabe, quando trocado o motor de um veículo, deve haver alteração perante o órgão de trânsito, com vistoria, etc. A tudo isto a apelada se submeteu como decorrência do vício do produto inicialmente apresentado.

A partir do momento em que ocorreu a substituição do motor pela concessionária (reconhecendo o defeito naquele equipamento), trocado o motor e tendo o novo também apresentado problema, o que era vício passou a ser caso clássico de defeito.

Defeito porque ao vício inicial do motor se somaram vários problemas extras, começando por todos os transtornos e perda de tempo decorrentes da troca do motor, passando pela necessidade de alteração no registro do veículo perante o DETRAN, com vistoria e todo o demais exigido, culminando com mais um problema com o novo motor - que restou sanado posteriormente, mas que acarretou no fato de a autora novamente precisar se direcionar a concessionária para resolver o impasse.

Importante, para evitar a confusão entre vício e defeito, seja feita a distinção doutrinária entre um e outro nas relações de consumo.

Segundo leciona Rizzatto Nunes1, “o termo “vício”, especialmente relacionado a produto, lembra o vício redibitório, instituto de direito civil, e com ele tem alguma semelhança, na condição de vício oculto, mas com ele não se confunde”.

“O defeito, por sua vez, pressupõe vício. Há vício sem defeito, mas não há defeito sem vício. O vício é uma característica inerente, intrínseca do produto ou serviço em si.

Exemplifica o doutrinador para vício, o produto que não funcione adequadamente, como um liquidificador que não gire; o motor do automóvel que “morre” toda hora.

O defeito, segundo Rizzatto, é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa extrínseca ao produto,...

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