Acórdão nº 50001022220138210130 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 09-02-2022

Data de Julgamento09 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001022220138210130
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001657838
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000102-22.2013.8.21.0130/RS

TIPO DE AÇÃO: Oncológico

RELATOR: Desembargador MARCO AURELIO HEINZ

APELANTE: MARIA EMA LEITE DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

MINISTÉRIO PÚBLICO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por MARIA EMA LEITE DA SILVA porquanto inconformada com a sentença que, nos autos da ação ordinária com pedido de tutela antecipada, ajuizada pela recorrente contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, na forma do art. 485, IV, do CPC, extinguiu o feito sem resolução do mérito. Sem custas e honorários, nos termos do art. 55, da Lei nº 9.099/95, aplicável por força do art. 27, da Lei nº 12.153/09.

Em suas razões recursais, a apelante, de início, faz uma síntese do processo e pede a reforma da decisão. Salienta que não existe razão para que seja obrigatória a inclusão da União no polo passivo da demanda. Pondera que se trata de ação na qual se pleiteia direito consagrado na Constituição Federal, em que são solidários a prestá-lo todos os entes federativos: União, Estados e Municípios. Frisa que cabe à autora, quando do ingresso da ação, estabelecer contra quem deseja demandar. Observa que não se trata de litisconsórcio necessário. Cita o Tema 793, do STF. Destaca, ainda, a gravidade da situação em que se encontra a demandante e o dano irreparável que ocorrerá ante a ausência ou irregularidade do fornecimento dos medicamentos pleiteados, ao passo que o processo foi extinto. Assinala, por fim, quanto ao amparo e pretensão da tutela provisória de urgência, eis que imperiosa sua concessão imediata na lide. Pugna, ao final, pelo integral provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões.

Nesta instância, opina o Ministério Público pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Com efeito, o direito à saúde é direito fundamental do ser humano, corolário do direito à vida. As disposições constitucionais neste sentido são autoaplicáveis, dada a importância dos referidos direitos.

Compete à União, aos Estados e aos Municípios o resguardo dos direitos fundamentais relativos à saúde e à vida dos cidadãos, conforme regra expressa do art. 196 da Constituição Federal. Da mesma forma, dispõe claramente a Constituição Estadual, em seu art. 241, que a saúde é direito de todos e dever do Estado e dos Municípios.

O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar na Primeira Seção o REsp 1657156/RJ, recurso repetitivo (Tema 106), assentou as premissas válidas para fornecimento de remédios fora da lista do Sistema Único de Saúde, quais sejam: a) comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; b) incapacidade financeira do paciente de arcar com o custo do medicamento prescrito; c) existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e d) a não configuração de tratamento experimental.

Tais determinações aplicam-se somente às ações ajuizadas a partir de 04 de maio de 2018, de forma que os supracitados requisitos acima elencados sejam exigidos de forma cumulativa somente quanto aos processos distribuídos a partir da data da publicação do acórdão embargado.

Cumpre firmar o entendimento exarado através do Tema 500 da Suprema Corte, RE 657.718/MG, a respeito dos medicamentos com eficácia e segurança comprovadas e testes concluídos, mas ainda sem registro na ANVISA, cuja tese restou assim fixada :

1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido de registro (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão necessariamente ser propostas em face da União”.

Mais recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal retomou a discussão a respeito dos limites da atuação do Poder Judiciário na concretização do direito fundamental à saúde quando do julgamento do Recurso Extraordinário 855.178/RG, com repercussão geral conhecida.

O Plenário, por maioria de votos, fixou a seguinte tese para efeito de aplicação da repercussão geral (Tema 793):

“Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro", nos termos do voto do Ministro Edson Fachin, Redator para o acórdão, vencido o Ministro Marco Aurélio, que não fixava tese. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 23.05.2019.

Em sede de embargos de declaração, o mesmo sodalício expressou compreensão, através do voto do Ministro Edson Fachin, no sentido de que:

“(...)

v) Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas suas hipóteses), a União necessariamente comporá o pólo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90) de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão, nos termos da fundamentação;

vi) A dispensa judicial de medicamentos, materiais, procedimentos e tratamentos pressupõe ausência ou ineficácia da prestação administrativa e comprovada necessidade, observado, para tanto, os parâmetros definidos no art. 28 do Decreto Federal n. 7.508/11”.

Importa colacionar o que regra o referido artigo 19-Q, da Lei 8.080/90, a qual dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências:

Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

§ 1º A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, cuja composição e regimento são definidos em regulamento, contará com a participação de 1 (um) representante indicado pelo Conselho Nacional de Saúde e de 1 (um) representante, especialista na área, indicado pelo Conselho Federal de Medicina. (Incluído pela Lei nº 12.401, de 2011)

§ 2º O relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS levará em consideração, necessariamente:(Incluído pela Lei nº 12.401, de...

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