Acórdão nº 50001062020198210075 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 09-12-2022

Data de Julgamento09 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001062020198210075
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003044458
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000106-20.2019.8.21.0075/RS

TIPO DE AÇÃO: Prestação de serviços

RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO

APELANTE: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO - UPF (AUTOR)

APELANTE: POLYANA CHRISTENSEN (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO - UPF e por POLYANA CHRISTENSEN, respectivamente, em face da sentença prolatada na ação de cobrança que o preimeiro move contra segundo, com o seguinte dispositivo (Evento 46 do processo de origem):

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo procedente os pedidos formulados pela parte autora para condenar a parte ré ao pagamento de R$ 12.363,45 (doze mil trezentos e sessenta e três reais e quarenta e cinco centavos), valor referente às mensalidades do curso de odontologia inadimplidas, relativas aos meses de abril a junho de 2017, já considerada a correção monetária pelo índice IGP-M, a incidência de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês e aplicação de multa contratual de 2% (dois por cento) ao mês.

Considerando a sucumbência da parte ré, condeno-a a arcar com as custas e despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios da autora, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação. Anoto ainda que, por se tratar a ré de beneficiária da justiça gratuita, as obrigações decorrentes de sua sucumbência deverão permanecer sob condição suspensiva de exigibilidade, nos termos em que previsto no art. 98, §3º, do Código de Processo Civil.

Publique-se.

Registre-se.

Intime-se.

Por fim, face aos princípios da instrumentalidade, celeridade e economia processual, em caso de eventuais apelações interpostas e, considerando que não há mais juízo de admissibilidade por parte do primeiro grau, caberá ao Cartório, mediante ato ordinatório, abrir vista à parte contrária para oferecimento das contrarrazões. Na sequência, deverá remeter os autos ao e. Tribunal de Justiça do Estado. Ressalva-se, entretanto, a hipótese de embargos de declaração, quando os autos deverão vir conclusos.

Transcorrido o prazo recursal sem a interposição de recursos, certifique-se o trânsito em julgado e arquive-se com baixa.

A parte-autora FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO - UPF, por suas razões de apelação (Evento 50 do processo de origem), insurge-se contra a ausência de fixação de termo final da incidência de correção monetária e de juros moratórios sobre o valor cobrado. Ao final, pugna pela reforma da sentença para que conste que o valor objeto de cobrança seja atualizado monetariamente e sofra a incidência de juros até a data do efetivo pagamento.

A parte-ré POLYANA CHRISTENSEN, por suas razões de apelação (Evento 51 do processo de origem), insurge-se contra a procedência dos pedidos. Aduz que a inexistência notificação impossibilita conhecer da existência dos débitos. Refere que a mensalidade de março de 2017 foi totalmente coberta pela bolsa estudantil, mas que as mensalidades dos meses de abril, maio e junho foram calculadas com valor superior ao benefício da bolsa ProUni por parte da instituição de ensino. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para o fim de julgar improcedentes os pedidos.

Não foram apresentadas contrarrazões.

Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC.

É o relatório.

VOTO

APELAÇÃO DA PARTE-RÉ. AÇÃO DE COBRANÇA. MORA EX RE. DESNECESSIDADE DE INTERPELAÇÃO.

O contrato de prestação de serviços educacionais está sujeito às normas protetivas da Lei n. 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor – CDC, na medida em que o estudante é consumidor dos serviços e a instituição de ensino é prestadora desses serviços educacionais.

Transcrevo:

RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. ENSINO SUPERIOR. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS POR INSTITUIÇÃO PRIVADA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - CDC. EXTINÇÃO ANTECIPADA DE CURSO. AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA. CONDUTA DESLEAL OU ABUSIVA. AUSÊNCIA. 1. O contrato de prestação de serviços educacionais está sujeito às disposições contidas no Código de Defesa do Consumidor - CDC. O estudante é um consumidor de serviços educacionais. A universidade, por sua vez, deve prestar seus serviços na forma contratada, oferecendo salas de aula, professores e conteúdo didático- científico adequados ao bom desenvolvimento do curso universitário. [...] 4. Recurso especial não provido. (REsp 1155866/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/02/2015, DJe 18/02/2015).

No entanto, a efetiva aplicação do CDC depende da comprovação de eventual abusividade no caso concreto.

Veja-se que o art. 373 do CPC reza o seguinte:

Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Determinam os §§1º e 2º do art. 373 do CPC:

§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
§ 2o A decisão prevista no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil.

Consoante Luiz Guilherme Marinoni1:

“[...] o ônus da prova visa estimular as partes a bem desempenharem os seus encargos probatórios, e adverti-las dos riscos inerentes à ausência de prova de suas alegações. Serve para a boa formação do material probatório da causa, condição para que se possa chegar a uma solução justa para o litígio. Partindo-se da perspectiva de ônus da prova como regra de instrução é que se pode falar em dinamização do ônus da prova e em inversão do ônus de provar. ”

Como visto, de regra, ao autor incumbe o ônus da prova do fato constitutivo de seu direito, recaindo sobre o réu a prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do demandante.

Note-se que, inobstante tratar-se de relação de consumo e embora tenha reconhecido ao consumidor o direito de facilitação da sua defesa (art. 6º, VIII, do CDC), exige-se do réu a prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Relativamente ao ônus probatório ensina Paulo de Tarso Vieira Sanseverino2 o seguinte:

Como, nas demandas que tenham por base o CDC, o objetivo básico é a proteção ao consumidor, procura-se facilitar a sua atuação em juízo. Apesar disso, o consumidor não fica dispensado de produzir provas em juízo. Pelo contrário, a regra continua sendo a mesma, ou seja, o consumidor, como autor da ação de indenização, deverá comprovar os fatos constitutivos do seu direito. O fornecedor, como réu da ação de reparação de danos, deverá demonstrar os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do consumidor, bem como aqueles cujo ônus probatório lhe for atribuído pela lei ou pelo juiz.

(...)

No Brasil, o ônus probatório do consumidor não é tão extenso, inclusive com possibilidade de inversão do ônus da prova em seu favor,... Deve ficar claro, porém, que o ônus de comprovar a ocorrência dos danos e da sua relação de causalidade com determinado produto ou serviço é do consumidor.

Assim, tratando-se de ação de cobrança de prestação de serviço educacional privado, incumbe à instituição de ensino o ônus da prova da contratação e da disponibilização dos serviços ao consumidor, recaindo ao consumidor a demonstração de fato modificativo ou extintivo da cobrança pretendida.

Nesse sentido, transcrevo jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL. ENSINO SUPERIOR. UNISINOS. AÇÃO DE COBRANÇA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EDUCACIONAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. ÔNUS DA PROVA. SENTENÇA REFORMADA. PRELIMINAR CONTRARRECURSAL. PRESCRIÇÃO: Argui a parte demandada, em contrarrazões, a prescrição da pretensão de reembolso de valores postulada na exordial. Inviável a análise do pleito, porquanto a prescrição foi analisada e afastada na sentença, não tendo sido objeto da apelação interposta pela demandada, razão pela qual está coberta pela preclusão. Preliminar contrarrecursal rejeitada. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EDUCACIONAL. ÔNUS DA PROVA: Malgrado a relação seja de consumo, advinda da prestação de serviço, não é possível invocar a regra do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, justificando a apelante desconhecer o débito, quando a relação contratual restou demonstrada, bem como a colação de grau pelo requerido. Comprovada a relação jurídica entre as partes e a parte ré não se desincumbiu de seu ônus probatório, seja demonstrando o pagamento, seja demonstrando que solicitou a rescisão contratual, deve ser julgado procedente o pedido de cobrança das mensalidades escolares. Dessa forma, a versão apresentada pela parte apelante não confere com a prova dos autos. E mesmo aplicando as regras do Código de Defesa do Consumidor, isso não exonera a parte fazer prova mínima de suas alegações. SUCUMBÊNCIA: Invertida e de total responsabilidade do requerido. REJEITARAM A PRELIMINAR CONTRARRECURSAL E DERAM PROVIMENTO AO APELO.(Apelação Cível, Nº 50014892620198210142, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 08-04-2022)

No que tange à exigência de notificação, consoante o caput do art. 397 do CCB “o inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor”.

Ao contrário da mora ex persona (parágrafo único do art. 397 do CCB), tratando-se de mora...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT