Acórdão nº 50001118420208210082 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50001118420208210082
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002017896
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000111-84.2020.8.21.0082/RS

TIPO DE AÇÃO: Bens Públicos

RELATOR: Desembargador LEONEL PIRES OHLWEILER

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELADO: DEPARTAMENTO AUTÔNOMO DE ESTRADAS DE RODAGEM - DAER/RS (RÉU)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pelo DEPARTAMENTO AUTÔNOMO DE ESTRADAS DE RODAGEM - DAER/RS e o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL contra a sentença proferida nos autos da ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, nos seguintes termos:

Diante do exposto, forte no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e julgo PROCEDENTES os pedidos formulados por MINISTÉRIO PÚBLICO em face de ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL e DAER – DEPARTAMENTO AUTÔNOMO DE ESTRADAS DE RODAGEM DO RIO GRANDE DO SUL, para o fim de, confirmando a antecipação de tutela, determinar que os requeridos procedam na recuperação total da pista de rolamento e na recuperação da sinalização horizontal e das placas de sinalização às margens da Rodovia ERS 332 com a apresentação de cronograma de obras e inclusão de dotação orçamentária suficiente para execução das obras decorrentes do estudo realizado, bem como promovam a limpeza de vegetação às margens da rodovia e da pista.

Tratando-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público, sem custas e honorários.

Sentença sujeita a reexame necessário (Súmula nº 490 STJ).

Sobrevindo apelação (artigo 1.009, CPC), intime-se o recorrido para que apresente contrarrazões e, caso haja apresentação de recurso adesivo, deve a parte recorrida (na apelação adesiva) ser intimada para apresentar suas contrarrazões. Após, ao Tribunal de Justiça, conforme o art. 1.010, §3º, CPC.

Com o trânsito em julgado, nada sendo requerido, baixe-se.

Opostos embargos declaratórios pelo Estado e pelo DAER, foram acolhidos (evento 62), com a seguinte redação:

Vistos.

O Estado do Rio Grande do Sul e o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem opuseram embargos de declaração da decisão do Evento 39, a qual julgou procedente a ação.

Em vista, o Ministério Público manifestou-se pelo acolhimento dos embargos.

Decido.

Recebo os aclaratórios, pois tempestivos e adequados à espécie.

No mérito, adianto que assiste razão aos embargantes.

Sabe-se que o presente recurso tem como finalidade suprir omissão de ponto ou aclará-lo quando presente obscuridade ou eliminar contradição, assim como para corrigir erro material, conforme determina o artigo 1.022 do CPC/2015.

No caso dos autos, alegam os réus que a decisão está omissa, pois não constou no dispositivo sentencial a reforma da decisão do Evento 12, a qual reduziu o valor da multa diária establecida pelo juízo de primeiro grau.

Compulsando os autos, denota-se que no curso do feito restou deferida a fixação de multa em caso de descumprimento da decisão que concedeu a tutela de urgência. Em decisão proferida pelo TJRS, as astreintes foram reduzidas e, portanto, fixadas no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), questão essa que não restou expressa no decisium.

Diante do exposto, CONHEÇO os embargos declaratórios na forma da fundamentação supra e DOU-LHES PROVIMENTO para que conste no dispositivo sentencial a reforma parcial da decisão proferida no Evento 12, consistente na redução do valor da multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais) para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em caso de descumprimento da decisão proferida em sede de tutela de urgência.

Intimem-se.

Diligências Legais.

Em razões de apelação (evento 70), o Estado suscita preliminar de ilegitimidade passiva, considerando que o DAER, sendo uma autarquia, possui personalidade jurídica própria, razão pela qual deve responder isoladamente pelos seus atos/omissões, sem que haja a necessidade de formação de litisconsórcio passivo com o Estado do Rio Grande do Sul, nos termos da competência delimitada pelo art. 1º da Lei Estadual nº 750/37, alterada pela Lei Estadual nº 11.090/98. No mérito, sustenta que não é competência do Poder Judiciário decidir o que melhor convém ao interesse público, obrigando o ente público a realizar determinada obra, em afronta à independência dos poderes prevista no art. 2° da Constituição Federal de 1988. Menciona que a reconstrução do trecho da rodovia objeto do litígio não é o único projeto que não foi realizado por falta de verbas, havendo outros nessa mesma situação, o que não autoriza o Poder Judiciário a compelir o ente público a implementá-los, até porque, se tal fosse permitido, correr-se-ia o risco de se extirpar do ordenamento a discricionariedade dos administradores. Alude ao art. 22 da LINDB, que prevê que “serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo”, pois sendo o ente público estadual carecedor de recursos públicos em meio a grande crise econômica que assombra a gestão pública, deve o julgador considerar todas essas peculiaridades do caso em concreto, não podendo decidir (como decidiu) determinando que se faça algo ligado essencialmente e diretamente ao Poder Discricionário que lhe pertence, sem a observância do cronograma orçamentário a que este se vincula, razão pela qual improcede a presente demanda. Alega que, conforme informações apresentadas pelo setor técnico, os trechos mencionados da Rodovia ERS-332, embora não apresentem as melhores condições, estão livres de buracos (Evento 21, PROCADM2, Página 5). Cita a ausência de inércia administrativa, consoante o "Plano de Obras 2019", que prevê o investimento de R$ 1.700.000,00 em recursos para serviços de conservação da ERS-332. Destaca que, quando da liberação de empenhos para a ERS-332 e da conclusão dos reparos nas rodovias ERS-411 e ERS-423, antes mencionados, serão iniciados os serviços na ERS-332, a qual tem sido mantida com operações tapa buracos por administração direta. Giza que os serviços de sinalização horizontal são executados após a execução dos serviços de recuperação dos pavimentos das rodovias, quando a pista não sofre intervenções, de modo que não podem ser executados concomitantemente com os serviços de recuperação do pavimento. Argumenta que, a partir do PLANO DE OBRAS 2019, anunciado pelo Governo do Estado, o DAER terá recursos para emitir nota de serviços para os serviços de roçadas na rodovia, não havendo inércia, portanto, do ente público, que está concentrando esforços para a execução do contrato de conservação da referida rodovia, conforme exposto. Lembra a incidência do princípio da reserva do possível. Pede o afastamento da multa diária, pois, como exposto, não há omissão imputável ao ente público, não estando demonstrada a inação estatal nem a ilegalidade na escolha das prioridades estatais, de modo que a decisão atacada, como posta, caracteriza indevida intervenção nos critérios de conveniência e oportunidade. Pede o provimento do recurso.

Em contrarrazões (evento 85), o Ministério Público sustenta que as vias públicas estaduais compõem o patrimônio do Estado, que é quem detém o poder-dever de fiscalização da atuação (ou omissão) de sua autarquia no gerenciamento e manutenção de tal patrimônio, não podendo, por força disso, omitir-se sob a simples alegação de quais funções competem exclusivamente ao órgão descentralizado. Alude que o Estado do Rio Grande do Sul, quando descentralizou as atividades de estruturação das estradas de sua responsabilidade à autarquia, não deixou de ter todo o controle sobre o ente, uma vez que escolhe todos os seus dirigentes, e que as verbas destinadas ao departamento autônomo são provenientes de caixa único do Estado, sendo o próprio Governo Estadual que determina as prioridades no planejamento das obras a serem implementadas. Diz que não há falar em violação ao poder discricionário, tampouco afronta ao princípio da separação dos poderes, mas em legítimo controle judicial diante da violação de direito fundamental - condições mínimas de segurança da rodovia - e inércia dos apelantes. Assevera que a omissão dos apelantes implica insegurança no trânsito no trecho compreendido na inicial, situação de extrema gravidade, que atenta contra a segurança e a vida de um número indeterminado de pessoas, sendo que os próprios apelantes reconhecem a precariedade da rodovia. Refere que, ao contrário da alegação de que a rodovia não apresenta buracos, a situação é outra, conforme consignado na sentença, que concluiu pela total falta de reparos e manutenção da ERS-332, sendo as condições de trafegabilidade extremamente precárias, ensejando em riscos graves e iminentes a motoristas e pedestres, situação que se arrasta há anos, demonstrando a omissão e a desídia da administração. Defende o cabimento das astreintes, com base no art. 537 do CPC. Requer o desprovimento do apelo.

O Ministério Público, em parecer da Procuradora de Justiça Elaine Fayet Lorenzon Schaly, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 9).

VOTO

I – PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo e está isento de preparo em virtude de lei. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo.

II - PRELIMINAR

O Estado suscita preliminar de ilegitimidade passiva, ao fundamento de que o DAER, sendo uma autarquia, possui personalidade jurídica própria, devendo responder isoladamente pelos seus atos/omissões, sem que haja a necessidade de formação de litisconsórcio passivo com o Estado do Rio Grande do Sul, nos termos da competência delimitada pelo art. 1º da Lei Estadual nº 750/37, alterada pela Lei Estadual nº 11.090/98.

Todavia, como referido pelo em. Des. Nelson Antonio Monteiro Pacheco no julgamento da Apelação Cível nº 70065392938, j. em 23/06/2016, o...

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