Acórdão nº 50001224120208210106 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 25-05-2022

Data de Julgamento25 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001224120208210106
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002184265
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

7ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000122-41.2020.8.21.0106/RS

TIPO DE AÇÃO: União Estável ou Concubinato

RELATORA: Desembargadora VERA LÚCIA DEBONI

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por Clementina T.T., inconformada com sentença da Vara Judicial de Iraí, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação declaratória de nulidade de ato jurídico movida em face dos apelados, Amauri L.G., Maicon L.G. e Marivate A.G., para o fim de (evento 89):

(a) reconhecer a união estável havida entre a autora e Valdomiro G., de 2010 a 21/12/2018;

(b) reconhecer o direito de meação da demandante nos saldos de contas bancárias arroladas no processo, “descontadas as despesas com tratamento médico e funeral, conforme fundamentação” (sic);

(c) anular a partilha dos bens deixados por Valdomiro G., realizada por meio da Escritura Pública de Inventário n.º 02.450/007/2019, lavrada no Tabelionato de Notas de Iraí-RS, e determinar sejam “partilhados com a autora os saldos em conta poupança ouro e em conta corrente, ambas do Banco do Brasil, n. º 15.073-8, e ao saldo de conta capital, no Sicredi, associado n. º 49802-5 (item 3, subitens “b”, “c” e “d” da fl. 35), abatidas as despesas indicadas nas fls. 128 e 130”.

Em suas razões, aduziu a apelante, em síntese, que a sentença merece reforma no ponto em que deixou de reconhecer seu direito de meação em relação ao imóvel registrado sob a matrícula nº 2.797 do Livro nº 2 do Ofício de Registro de Imóveis de Iraí. Explicou que era casada com Mário V.T., de quem se separou em 22/09/2011, por meio do processo nº 1.06/1.06.0000329-9. Acrescentou que o aludido imóvel pertencia ao casal e foi objeto da partilha operada a partir da separação judicial. Explanou, por outro lado, que o de cujus, Valdomiro G., era casado com Rosa H.G., mas dela se divorciou, passando a conviver maritalmente com a autora/apelante. Asseverou que, já no curso dessa união, adquiriram de Mário V.T. a propriedade do imóvel objeto do litígio. Discorreu amplamente acerca de como se deu essa compra e venda, destacando que Valdomiro adquiriu o imóvel de seu ex-marido, Mário, e não dela própria. Ressaltou, ainda, que “tem certeza de que participou com 50% do valor na compra do imóvel rural em questão e, data venia, entende que o conjunto dos fatos demonstram essa sua participação” (sic). Pugnou, nesses termos, pelo provimento do recurso.

Aportaram contrarrazões (evento 101).

O Ministério Público declinou de intervir (evento 8).

Vieram os autos conclusos em 17/02/2022 (evento 9).

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas:

Inviável conhecer-se da apelação interposta pela parte autora, uma vez que a sentença recorrida é ultra petita, tendo resolvido questões acerca das quais não houve pedido, incorrendo, assim, em violação ao disposto nos artigos 1411, 4902 e 492, caput3, do Código de Processo Civil.

Com efeito, a autora ajuizou o que nominou de ação de declaratória de nulidade de ato jurídico com vistas à anulação de escritura pública de inventário e partilha extrajudicial dos bens concernentes ao espólio de Valdomiro G., falecido em 21/12/2018 (escritura pública de inventário e partilha lavrada em 14/03/2019).

Para tanto, a demandante afirmou que manteve união estável com o autor da herança, desde o início do ano de 2010 até a data do óbito (21/12/2018), asseverando que os filhos do de cujus não poderiam ter realizado o inventário extrajudicial e partilhado os bens, porque assim adentraram, indevidamente, em seu direito de meação.

Contudo, a petição inicial não contém pedidos de reconhecimento póstumo de união estável e de direito de meação, mas, tão somente, de anulação do ato jurídico extrajudicial por meio do qual foi realizado o inventário e a partilha dos bens deixados pelo de cujus.

Além disso, a petição inicial não está dirigida à sucessão de Valdomiro G., mas apenas aos outorgantes da escritura pública que se pretende ver anulada.

Sucede que a sentença não só examinou a relação jurídica subjacente e seus efeitos patrimoniais como efetivamente decidiu a respeito de todos esses pontos, repito, sem que houvesse pedido, motivo por que é nitidamente ultra petita, o que constitui nulidade processual.

Destaco que o reconhecimento de união estável não opera apenas efeitos patrimoniais, mas também outros que lhe são próprios, indisponíveis, intimamente ligados ao direito de família, como é o caso das relações de parentesco e todo o regramento que delas decorre.

Portanto, não se pode prescindir da iniciativa da parte para provimento dessa amplitude.

Há que se destacar, ademais, que os demandados controverteram a existência da união estável, pois aduziram que se tratava de simples namoro, bem como que o interregno informado na exordial não correspondia à realidade.

Além disso, pelo que se depreende dos documentos juntados ao processo, foi reconhecida a união estável da autora com Valdomiro G. abrangendo período no qual ele ainda era casado, haja vista que a sentença que decretou o divórcio do de cujus com Rosa H.G. só transitou em julgado no dia 16/12/2014. É o que se infere da certidão de casamento juntada no evento 2, CONT E DOCS3, fl. 48).

Conquanto exista alegação da autora no sentido de que o falecido já se encontrava separado de fato da ex-esposa quando iniciada a convivência marital, o exame dessa matéria não poderia ser validamente operado sem que Rosa H.G. fosse regularmente citada para, querendo, manifestar-se a respeito.

Convém anotar-se, quanto ao ponto, que o artigo 1.723, § 1º4, do Código de Processo Civil é de teor claro ao estabelecer a impossibilidade de reconhecimento de união estável entre pessoas que se encontrem impedidas de casar, salvo, quanto às pessoas casadas, se estiverem separadas de fato ou judicialmente.

Mas se não houve separação judicial, tampouco partilha dos bens porventura amealhados no casamento anterior, então é necessária a citação do cônjuge, mesmo em caso de separação fática, como vem entendendo, de maneira uniforme, o Superior Tribunal de Justiça.

A esse respeito, confira-se:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL. Em ações de reconhecimento de união estável concomitante ao casamento, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem entendido pela necessidade de participação do cônjuge no processo. Por tal motivo, impositivo reconhecer a nulidade do processo por falta de citação do cônjuge mulher. DESCONSTITUÍDA A SENTENÇA EM DECISÃO MONOCRÁTICA. (Apelação Cível, Nº 70081348799, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em: 08-05-2019)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL. Em ações de reconhecimento de união estável concomitante ao casamento, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem entendido pela necessidade de participação do cônjuge no processo. Por tal motivo, impositivo reconhecer a nulidade do processo por falta de citação do cônjuge mulher. DESCONSTITUÍDA A SENTENÇA EM DECISÃO MONOCRÁTICA. (Apelação Cível, Nº 70078516101, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em: 22-04-2019)

APELAÇÃO. DIREITO DE FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL. Em ações de reconhecimento de união estável, concomitante ao casamento, o Egrégio STJ disse ser de rigor a participação do cônjuge no processo. Por tal motivo, impositivo reconhecer a nulidade do processo, em decorrência da falta de citação da cônjuge do apelado. DESCONSTITUÍDA A SENTENÇA. (Apelação Cível, Nº 70077367621, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em: 14-11-2018)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL COM DIVISÃO DE PATRIMÔNIO E INSTITUIÇÃO DE ALIMENTOS. CONTROVÉRSIA DE UNIÃO ESTÁVEL EM CONCOMITÂNCIA COM CASAMENTO. EFEITOS DA COISA JULGADA. NECESSIDADE DE INTEGRAÇÃO DO CÔNJUGE INTERESSADO NA LIDE.
1. Nos termos do art. 472 do Código de Processo Civil de 1973, nas causas relativas ao estado de pessoa, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros se todos os interessados houverem sido citados no processo.
2. Sendo o réu casado, em regra deve a esposa ser citada da demanda em que postulado o
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