Acórdão nº 50001423520168210118 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001423520168210118
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001663229
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000142-35.2016.8.21.0118/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA - CEEE-D (RÉU)

APELADO: GERLEI SAMPAIO SARAIVA (AUTOR)

RELATÓRIO

GERLEI SAMPAIO SARAIVA ajuizou ação indenizatória em face de CEEE-D - COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA, alegando se fumicultor e que, em 13/12/2015, por volta das 05:00 horas, sofreu prejuízos materiais, consistente na perda de parte da qualidade do fumo que cultivou, em razão da falha na prestação de serviços fornecido pela ré. Referiu que secava 270kg de fumo de CO1 e 70kg de fumo XO1, avaliados em R$3.417,90 (...), e que a normalização da energia elétrica ocorreu apenas em 15/12/2015. Alegou que esta situação ocasionou a danificação do produto, o qual teve sua qualidade reduzida para 100kg da classe X03 e 180 kg da classe XR3, agora avaliados em R$1.068, 60 (...), gerando prejuízo de R$ 2.349,40 (...). Aduziu que, por esta razão, merece ser reparado pela ré, já que fora esta quem deu causa ao dano. Requereu, desse modo, a procedência da ação, com a condenação da ré ao pagamento de indenização no valor de R$ 2.349,30 (...), acrescido de juros e correção monetária.

Sobreveio sentença de procedência da ação, condenando a demandada ao pagamento da quantia de R$2.349,30 (...) em favor da parte autora, a título de reparação por danos materiais, atualizado pelo IGP-M e com juros de mora a partir do evento danoso. Sucumbente, a ré também foi condenada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, os quais foram fixados em 15% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2, do CPC (evento 3, doc.4, fls.40-47).

Irresignada, a ré interpôs apelação da decisão. Em suas razões, de forma preliminar, sustentou a necessidade de indeferimento da petição inicial, por inépcia, alegando que a falha na prestação do serviço não havia sido comprovada. No mérito, discorreu acerca da excludente de responsabilidade por sua parte, alegando que a interrupção na energia teria ocorrido por força maior, devido a ocorrência de um temporal. Ainda, sustentou ser ausente o dever de indenizar, defendendo a aplicação da teoria do risco e responsabilidade da parte autora, eis que não possuía sequer gerador de energia, assumindo o risco de prejudicar seu trabalho, tendo em vista que é notória a impossibilidade de continuidade plena e absoluta do serviço de energia elétrica. Postulou o reconhecimento de culpa concorrente. Dissertou quanto a inexistência de dano material, eis que não teria realizado qualquer cobrança ou conduta indevida, não sendo cabível a restituição de quaisquer valores. Sustentou culpa exclusiva por parte do consumidor. Ainda, requereu que os juros de mora incidissem a partir da citação, e não do evento danoso, bem como, pediu a redução honorários para 10% sobre o valor da condenação. Ao final, discorreu sobre a inaplicabilidade de inversão do ônus da prova. Requereu o provimento do recurso (evento 3, doc.5, fls.10-24).

A parte autora apresentou contrarrazões (evento 3, doc.5, fls.29-32 e doc.6, fls.1-6).

Os autos vieram-me conclusos em 29/10/2021.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação de indenização por danos materiais decorrentes de falha na prestação de serviço por parte da concessionária ré, que deixou a parte autora sem o fornecimento de energia elétrica no dia 13/12/2015, até o dia 15/12/2015, causando prejuízo na sua plantação de fumo, julgada procedente na origem.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso de apelação.

No tangente à alegação do recorrente de que a inicial da ação indenizatória é inepta, tenho que não merece guarida dita insurgência, na medida em que a inicial preenche todos os requisitos constantes do art. 319 do NCPC, bem como não se enquadra em nenhuma das hipóteses elencadas pelo art. 330 do mesmo diploma legal, na medida em que da narração dos fatos decorre logicamente a conclusão, e os pedidos finais decorrem logicamente dos argumentos de que a parte autora restou prejudicada em seu trabalho em face da falta de energia elétrica, por tempo considerável, em razão da falha na prestação de serviços fornecido pela recorrente.

Ademais, a ausência de riqueza de detalhes da inicial, que não se verifica no caso, não inviabilizou a ampla defesa da ré, que apresentou contestação defendendo-se dos fatos que lhes foram imputados, não tendo qualquer prejuízo em decorrência disso.

Dessa feita, rejeito a prefacial de inépcia da inicial e passo a analisar o mérito.

Inicialmente, cumpre salientar que a responsabilidade da empresa requerida, na condição de concessionária de energia elétrica e prestadora de um serviço público, é objetiva, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, pelo que, responde pelos danos que seus agentes derem causa, seja por ação ou omissão.

Artigo 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

(...)

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A colenda Corte Superior possui este entendimento, sic:

AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. MUNICÍPIO DE SÃO SEPÉ/RS. DEZEMBRO DE 2012. PERÍODO DE INTERRUPÇÃO ALÉM DO RAZOÁVEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEMORA NO RESTABELECIMENTO DO SERVIÇO. ALEGAÇÃO DE CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO PELA CORTE LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

1. A Corte local concluiu não estar configurado caso fortuito, pois, não obstante de ter ocorrido fato natureza de grande impacto, não justificou a demora de restabelecimento do serviço de fornecimento de energia elétrica, a ponto de excluir a responsabilidade da concessionária pelos prejuízos causados ao demandante.

2. Alterar tais conclusões para afirmar como configurada a excludente de responsabilidade caso fortuito demanda reexaminar conjunto fático probatório dos autos, atividade não realizável nesta via especial. Incidência da súmula 7/STJ.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1084345/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 10/10/2017, DJe 18/10/2017)

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA EM RAZÃO DE TEMPORAL. DEMORA NA RELIGAÇÃO ACIMA DOS PRAZOS ESTABELECIDOS PELA ANEEL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. REVOLVIMENTO DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. ARTS. 186 E 393 DO CÓDIGO CIVIL,ARTS. 6º, §3°, E 29, I, DA LEI FEDERAL 8.987/1995 E ART. 2º DA LEI 9.427/1996 NÃO PREQUESTIONADOS. SÚMULA 211/STJ. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL PREJUDICADA.

1. Trata-se de ação em que busca a recorrente desconstituir acórdão que não reconheceu a ocorrência de caso fortuito/força maior na interrupção do fornecimento de energia elétrica.

2. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando os artigos tidos por violados não foram apreciados pelo Tribunal a quo, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento. Incide, na espécie, a Súmula 211/STJ. 3. O acórdão, objeto do Recurso Especial, somente poderia ser modificado mediante o necessário revolvimento dos aspectos fáticos-probatórios da causa, o que é obstado, no âmbito do Recurso Especial, pela Súmula 7 do STJ.

4. Fica prejudicada a análise da divergência jurisprudencial quando a tese sustentada já foi afastada no exame do Recurso Especial pela alínea "a" do permissivo constitucional.

5. Recurso Especial não conhecido.

(REsp 1685858/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/09/2017, DJe 09/10/2017)

A concessionária de energia elétrica apenas se exime do dever de indenizar os prejuízos suportados pelos consumidores quando comprovar a inexistência de deficiência no fornecimento de energia ou algumas das excludentes do dever de indenizar (culpa exclusiva do consumidor, caso fortuito ou força maior), tendo em vista ser obrigada a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e contínuos, o que não restou comprovado nos autos. Inteligência do artigo 22 do Código Consumerista, in verbis:

Artigo 22 - Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único - Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

No caso em comento, o conjunto fático-probatório colacionado aos autos comprovou o dano material suportado pelo autor, consistente no fumo danificado, conforme se depreende do parecer técnico de fl. 14 e da perícia judicial (fls.123-126) dos autos digitalizados, desincumbindo-se o requerente do ônus que lhe recaia, conforme o disposto no artigo 373, inc. I, da legislação processual.

A parte requerida não trouxe qualquer...

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