Acórdão nº 50001634220218210148 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quinta Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001634220218210148
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003111858
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

15ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000163-42.2021.8.21.0148/RS

TIPO DE AÇÃO: Troca ou permuta

RELATOR: Desembargador VICENTE BARROCO DE VASCONCELLOS

APELANTE: ALAN PROVENZI (AUTOR)

APELANTE: CARLOS OTAVIO STEIN PENA (RÉU)

APELANTE: CLAUDIO FERNANDO STEIN PENA (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas por ALAN PROVENZI e por CARLOS OTAVIO STEIN PENA e CLAUDIO FERNANDO STEIN PENA contra a sentença (Evento 33) que, na ação de cobrança ajuizada por Alan, assim decidiu, "verbis":

"Isso posto, com espeque no art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE o pedido deduzido por ALAN PROVENZI na presente ação de cobrança que move em face de CLAUDIO FERNANDO STEIN PENA e CARLOS OTAVIO STEIN PENA.

"Porque sucumbente, condeno o autor ao pagamento das custas e dos honorários devidos ao procurador dos demandados, ora arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, conforme parâmetros do art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC, restando suspensa a exigibilidade em razão do benefício da AJG concedido ao requerente."

Em suas razões (Evento 48), sustenta o primeiro apelante: a) a implementação da condição suspensiva relativa à Carta de Adjudicação; b) a natureza de contrato aleatório, não se caracterizando como condição o recebimento dos créditos relativos aos honorários; c) a necessidade de observância dos riscos assumidos de forma deliberada pelos réus; d) a ausência de transferência, pelos requeridos, do produto da alienação dos imóveis, nos termos do contrato de permuta; e) a procedência da ação de cobrança.

Por sua vez, em suas razões (Evento 50), sustentam os segundos apelantes a necessidade de revogação do benefício da gratuidade judiciária concedido ao autor.

Sem preparo do primeiro apelo, ante a concessão da gratuidade judiciária, com preparo do segundo apelo e com contrarrazões, subiram os autos.

Registro, por fim, que foi observado o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/15, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

Primeiramente, quanto aos pedidos, apresentados nas petições dos Eventos 19 e 20 destes autos, para retirada deste processo da pauta da sessão virtual de julgamento designada para 15/02/2023, indefiro as postulações, por se tratar de continuidade do julgamento iniciado na sessão por videoconferência realizada em 14/12/2022, oportunidade em que ambas as partes já apresentaram as suas sustentações orais, de modo que não há falar em ofensa à ampla defesa e ao contraditório.

Conforme o STJ, "a realização do julgamento por meio virtual, mesmo com a oposição pela parte, não acarreta, em regra, prejuízo nas hipóteses em que não há previsão legal ou regimental de sustentação oral, sendo imprescindível, para a decretação de eventual nulidade, a comprovação de efetivo prejuízo na situação concreta" (REsp 1.995.565/Nancy Andrighi).

Assim, preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos apelos e passo ao exame de ambos.

Na questão de fundo, observo que, em junho de 2014, o autor celebrou "contrato de permuta" (Evento 01, "CONTR2") com a empresa Expotrade e com os réus (estes, na qualidade de garantidores/devedores solidários).

Por meio do instrumento, ajustaram a permuta de 50% dos direitos de crédito, de titularidade do autor, decorrentes de "contrato de serviços jurídicos prestados à COOPERATIVA TRITÍCOLA REGIONAL SANTO ÂNGELO LTDA. - COTRISA", a partir do ajuizamento da ação n. 5002507-65.2013.404.7105, pela propriedade dos imóveis de matrículas n. 9.808 e 35.716, do Cartório do Registro de Imóveis de Santo Ângelo, denominados "UNIDADE PARQUE INDUSTRIAL", como se extrai das Cláusulas Terceira e Quarta da avença:

No feito de origem, alega o demandante, ora primeiro apelante, que, em fevereiro de 2018, recebeu ligação telefônica, solicitando autorização de um dos advogados da Expotrade para alienar tais imóveis. Refere que, tendo autorizado a operação, teve a promessa de recebimento do valor que lhe cabia pela venda dos bens em até trinta dias após lavrada a respectiva escritura pública. Contudo, concretizada a alienação em 13 de março de 2018 (vide matrícula constante do Evento 01, "MATRIMÓVEL3"), não teria, até a data do ajuizamento da demanda (08 de março de 2021), recebido os valores a que teria direito em razão do contrato de permuta.

Não há dúvidas de que o contrato de permuta (Evento 01, "CONTR2"), na espécie, consiste em verdadeiro contrato aleatório. Isso se extrai dos "Considerandos" que integram o contrato, premissas nas quais mencionaram as partes que a avença se fundava, para além do art. 533 do Código Civil (relativo à troca/permuta), no art. 458, que rege especificamente os contratos aleatórios.

Da alocação de riscos delineada pelas partes, observo que o contrato está, efetivamente, em consonância com o disposto no art. 458 do Código Civil. As partes assumiram o risco de que o crédito do autor, em razão da atuação na demanda n. 5002507-65.2013.404.7105, sequer viesse a existir. Não há, portanto, obrigações que sejam recíprocas, mas ajuste que se ancora essencialmente no conceito de álea. Nesse sentido, e tratando-se de contrato aleatório, descabe falar na aplicação da exceção de contrato não cumprido, nos termos alegados pelos réus, visto que jamais previram as partes a comutatividade de suas obrigações.

Como preleciona Adalberto Pimentel, "os contratos aleatórios são, por excelência, contratos de risco. Neles, o resultado econômico esperado pelas partes é incerto. A álea, ou incerteza quanto à assunção de lucro ou prejuízo, a depender de evento incerto, constitui traço marcante e distintivo desses contratos. Nos contratos aleatórios, os contratantes perseguem um resultado patrimonial incerto, o qual depende necessariamente de um evento previamente estipulado. (...). Os sujeitos contratantes projetam e calculam o risco a que estão sujeitos nos contratos aleatórios, bem como a influência em seu patrimônio caso ocorram as variáveis que podem ocorrer no decurso do contrato. Arriscam, por vontade própria, de acordo com as regras pactuadas, a incerteza de benesse ou perda econômica"1.

Porém, verifico que as partes submeteram os efeitos do contrato à condição suspensiva, consubstanciada na perfectibilização do registro da Carta de Adjudicação nas matrículas dos imóveis pela COTRISA em favor da Expotrade, vide Cláusula Primeira do contrato:

Como se constata das matrículas juntadas ao Evento 01, "MATRIMÓVEL3", houve o registro da Carta de Adjudicação em ambas as matrículas - de modo que, em tese, estaria preenchida a condição a permitir a plena produção de efeitos do contrato.

Implementada tal condição, percebe-se que seria desnecessária, inclusive, a formalização de cessão de crédito para fins de transferência dos direitos creditórios do autor, uma vez que, nos termos da Cláusula Sexta do instrumento, disciplinaram as partes que a efetivação do ato ocorria pela mera entrega do instrumento em sua via original. De igual modo, a Cláusula Sétima da avença dispôs que os direitos exercidos sobre a metade dos imóveis também se encontravam transferidos pelo próprio ato de ajuste da permuta.

Nesse contexto, a Expotrade estava impedida de "alienar, indicar à penhora, transferir e/ou dispor de 50% do bem imóvel", exceto com autorização expressa do autor. O registro dos imóveis na propriedade do demandante consistia, nesse arranjo contratual, em direito a ser exercido pelo demandante segundo a sua discricionariedade, não tendo o contrato previsto prazo ou data para tanto. Assim dispôs a Cláusula Oitava do instrumento:

Observo, de tal disposição contratual, que, ao decidir promover o registro de sua propriedade, o autor deveria proceder à notificação da Expotrade, que, no prazo de quinze dias, deveria realizar as diligências necessárias para tanto, inclusive sob pena de multa.

No caso vertente, porém, não restou comprovada a ocorrência de tal notificação. Em outros termos, não há prova de que, entre os anos de 2018 (quando realizada a alienação dos imóveis) e 2021 (data de ajuizamento da ação), tenha o autor...

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