Acórdão nº 50001691720138210120 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50001691720138210120
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001988920
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5000169-17.2013.8.21.0120/RS

TIPO DE AÇÃO: Estelionato (art. 171)

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

RECORRENTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

RECORRIDO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra MARCONDES BARROS DA SILVA JUNIOR, afirmando estar incurso nas sanções do artigo 171, caput, do Código Penal (CP), pela prática do seguinte fato descrito na denúncia (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC1, fls. 2/3):

"FATO DELITUOSO:

Entre os dias 23 e 24 de junho de 2010, entre às 09 horas até às 12 horas, em Sananduva/RS, o denunciado MARCONDES BARROS DA SILVA JUNIOR e uma pessoa não identificada nos autos, em comunhão de esforços e adição de vontades, obtiveram vantagem ilícita em prejuízo das vítimas Jeso Antonio Filipiak e Arquimino Filipiak mediante meio fraudulento, induzindo-o em erro.

Na oportunidade, o denunciado recebeu em sua conta bancária o depósito irregular no valor de R$ 920,00 (novecentos e vinte reais), em decorrência de um golpe praticado pelo denunciado e terceira pessoa. Ocorre que, uma pessoa não identificada nos autos, enviou uma mensagem de texto no celular da vítima Jeso Filipiak informando que este havia ganhado o valor de R$ 75.000,00 (setenta e cinco mil reais) e fornecendo-lhe uma senha para o acesso. Em ato contínuo, a vítima Arquimino Filipiak efetuou uma ligação telefônica para o telefone indicado na mensagem, na qual o interlocutor orientou-a a depositar o valor de R$ 920,00 (novecentos e vinte reais), a fim de retirar o prêmio. A conta bancária pertencia ao denunciado MARCONDES BARROS DA SILVA JUNIOR".

A denúncia foi recebida em 03/08/2016 (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC2, fl. 30).

No entanto, em 14/10/2020 (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC5, fl. 14), acolhendo-se pedido formulado pelo Ministério Público, determinou-se a intimação das vítimas para que, querendo, apresentassem representação, considerando a alteração legislativa introduzida no ordenamento jurídico pela Lei n. 13.964/2019, no que diz respeito à condição de procedibilidade quanto ao delito de estelionato.

Decorrido o prazo sem manifestação (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC5, fl. 21), declarou-se extinta a punibilidade do acusado nos seguintes termos (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC5, fl. 28):

"Considerando que o Juízo já havia acolhido a manifestação ministerial da fl. 157verso, no sentido da aplicação ao caso da nova disposição legal, não se mostra possível rever essa posição neste momento processual.
Diante deste cenário, tendo em vista que já decorreu o prazo conferido e não sobreveio manifestação da vítima, ainda que especificamente intimada (fl. 161), DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE do acusado Marcondes Barros da Silva Junior, conforme dispõe o artigo 107, inciso IV, do Código Penal.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Comunique-se a Polícia Judiciária para os devidos registros.

Com o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se.

Diligências legais".

O Ministério Público, então, ingressou com recurso em sentido estrito, sustentando, em síntese, que (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC5, fls. 30/42): (a) "o crime de estelionato se processava mediante ação pública incondicionada" (fl. 34); (b) "com o advento da Lei n.º 13.964/2019, denominada Pacote Anticrime, o delito passou a ser de ação penal pública condicionada à representação, com as exceções legais" (fl. 34); (c) "com o fim de dirimir a divergência, restou consolidado, com o julgamento do HC n.º 610201/SP, em 24 de março de 2021, o entendimento das turmas do Superior Tribunal de Justiça no sentido de definir que a exigência de representação da vítima como pré-requisito para a ação penal por estelionato não pode ser aplicada retroativamente para beneficiar o réu nos processos que já estavam em curso" (fl. 38); (d) "não se verifica fundamento legal para extinção da punibilidade do acusado na presente fase processual, na medida em que a exigência de representação da vítima no crime de estelionato não retroage aos processos cuja denúncia já foi oferecida (Informativo n.º 0693 do STJ), mostrando-se perfeitamente cabível o prosseguimento da ação penal" (fl. 41). Pediu, assim, o conhecimento e provimento do recurso, para o fim de reformar a decisão que declarou extinta a punibilidade do réu.

Em contrarrazões, a defesa postulou o não provimento do recurso (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC5, fls. 44/47).

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça lançou parecer, manifestando-se pelo provimento do recurso (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/TJRS, evento 6, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade (artigo 581, inciso VIII, do Código de Processo Penal - CPP), conheço do recurso e passo ao exame do mérito.

O Ministério Público pretende a reforma da decisão que reconheceu a extinção da punibilidade do réu MARCONDES BARROS DA SILVA JUNIOR, indicando, em suma, não ser aplicável ao caso a alteração legislativa que passou a exigir, como condição de procedibilidade, a representação do ofendido no delito de estelionato, salvo exceções legais.

Adianto, desde logo, que merece provimento o recurso.

Embora não se desconheça que a Lei n. 13.964, de 24/12/2019, passou a exigir a representação para o delito de estelionato (artigo 171, § 5º, do CP), no presente caso, a conduta delituosa teria ocorrido no mês de junho de 2010, sendo a denúncia oferecida em 04/04/2016 (processo 5000169-17.2013.8.21.0120/RS, evento 3, PROCJUDIC1, fls. 2/3), afastando-se, portanto, a possibilidade de retroatividade da lei.

Isto porque a orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal (STF) é no sentido de que a retroatividade da exigência de representação no delito de estelionato ocorre somente em hipóteses nas quais a denúncia ainda não tiver sido oferecida, conforme segue:

"HABEAS COUS. ESTELIONATO. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA A PARTIR DA LEI N. 13.964/19 ("PACOTE ANTICRIME"). IRRETROATIVIDADE NAS HIPÓTESES DE OFERECIMENTO DA DENÚNICA JÁ REALIZADO. PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA LEGALIDADE QUE DIRECIONAM A INTERETAÇÃO DA DISCIPLINA LEGAL APLICÁVEL. ATO JURÍDICO PERFEITO QUE OBSTACULIZA A INTERRUPÇÃO DA AÇÃO. AUSÊNCIA DE NORMA ESPECIAL A PREVER A NECESSIDADE DE...

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