Acórdão nº 50001715420168210096 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50001715420168210096
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001441503
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000171-54.2016.8.21.0096/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATORA: Desembargadora ISABEL DE BORBA LUCAS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Primeiramente, cumpre salientar que os nomes das partes envolvidas foram abreviados, inclusive em citações e trechos da sentença utilizados neste relatório e voto, por se tratar de feito que tramita em segredo de justiça.

A seguir, adoto o relatório da sentença (evento 3, DOC5, fls. 20/21):

O MINISTÉRIO PÚBLICO denunciou J.J.G. como incurso nas penas do art. 217-A, caput, do CP, porque:

No mês de setembro de 2015, em dia e horário não esclarecidos, na Rua Garibaldi, na localidade de Ribeirão, São João do Polêsine, o denunciado J.J.G. praticou atos libidinosos com a criança A.G., sua neta, de 10 anos de idade (certidão de nascimento de fls.)

Na oportunidade, o denunciado tirou a roupa da vítima, vindo a passar a mão em todo seu corpo, inclusive nos seios e nas nádegas, ameaçando-a de surrá-la caso contasse o fato para alguém. A vítima chorou enquanto era despida. A seguir, o denunciado tirou fotografias da vítima nua, as quais se encontravam armazenada no seu aparelho celular.

A denúncia foi recebida em 18.abr.2016 (fls. 45).

Citado, o réu apresentou defesa prévia através de defensor constituído (fls. 54).

Foi afastada a hipótese de absolvição sumária (fls. 55).

No curso da instrução foram ouvidas, a vítima, 06 testemunhas arroladas pela acusação, bem como ao final, interrogado o réu (fls. 66, 81, 10 e 115).
Encerrada a instrução, os debates orais foram convertidos em apresentação de memoriais.

O Ministério Público requereu a procedência da ação penal, com a consequente condenação do réu, uma vez que estão comprovadas a materialidade e a autoria delitiva (fls. 119/122).

A Defesa pediu a absolvição do acusado, por entender ausentes provas que o incrimine (fls. 123).

O julgamento foi convertido em diligência (fls. 124).

Aportou aos autos o Laudo Pericial nº 45864/2016, às fls. 129/130 (original, fls. 139/142).

O Ministério Público manifestou ciência do laudo e reportou-se aos memoriais já apresentados (fls. 131).

A defesa, por seu turno, sustentou ser o laudo inconclusivo e não idônea provar a culpa do acusado, requerendo seu desentranhamento e, reportando-se a defesa preliminar e ao memorais (fls. 132/133).

Do pedido de desentranhamento do referido laudo pericial, o Ministério Público manifestou-se pelo indeferimento às fls. 135, o qual restou acolhido pelo juízo às fls. 136.

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu aditamento à denúncia em face de J.J.G., por incorrer nas penas do art. 217-A, caput, do CP e art. 241-B da Lei nº 8.069/90, porque:

1° FATO

No dia 12 de setembro de 2015, por volta das 16h50min, na Rua Garibaldi, na localidade de Ribeirão, em São João do Polêsine, o denunciado J.J.G praticou atos libidinosos com a criança A.G., sua neta, de 10 anos de idade na época dos fatos (certidão de nascimento de fls.)

Na oportunidade, o denunciado tirou a roupa da vítima, vindo a passar a mão em todo seu corpo, inclusive nos seios e nas nádegas, ameaçando-a de surrá-la caso contasse o fato para alguém. A vítima chorou enquanto era despida.

2° FATO

Nas mesmas circunstancias de tempo e local, o denunciado armazenou, por qualquer meio, fotografia que contenha cena de pornografia envolvendo criança (laudo pericial das fls. 139/141).

Na ocasião, o denunciado tirou fotografias da vítima nua, as quais
encontravam armazenadas no seu aparelho celular.

O aditamento à denúncia foi recebido em 06.set.2018 (fls. 148).

Não houve interesse, pelo MP e pela defesa, na oitiva de novas testemunhas, sendo o réu novamente interrogado (fls. 155).

Encerrada a instrução, os debates orais foram convertidos em apresentação de memoriais.

O Ministério Público requereu a procedência da ação penal, com a consequente condenação do réu, uma vez que estão comprovadas a materialidade e a autoria delitiva dos delitos descritos no aditamento a denúncia (fls. 159/164).

A Defesa pediu a absolvição do acusado, por entender ausentes provas que o incrimine (fls. 165).

O réu, nascido em 10/11/1962, contava com 52 anos na data dos fatos.

Sobreveio a sentença, evento 3, DOC5, fls. 20/24, prolatada em 10/10/2019 (evento 3, DOC5, fl. 24), que julgou improcedente a denúncia, absolvendo o acusado com base no art. 386, VII, do CPP.

O Ministério Público apelou (evento 3, DOC5, fl. 26), acostando razões, fls. 155/158, postulando a condenação do réu como incurso nas sanções do art. 217-A, caput, do CP, e art. 241-B da Lei nº 8.069/90, como constou da denúncia.

Com as contrarrazões recursais (evento 3, DOC5, fls. 41/42), pelo desprovimento do apelo, vieram os autos.

Nesta Corte, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Glenio Amaro Biffignandi, opinou pelo provimento do apelo da acusação (evento 6, DOC1).

Esta 8ª Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, atendido o disposto no art. 609 do Código de Processo Penal, bem como o art. 207, II, do RITJERGS.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de apelo promovido pela acusação, que pugna pela condenação de J.J.G., nos termos da inicial acusatória (art. 217-A do CP e artigo 241-B da Lei 8.069/90).

A denúncia veio vertida no sentido de J.J.G. ter constrangido sua neta, A.G., na data de 12/09/2015, quando esta contava com dez anos de idade, a atos libidinosos diversos da conjunção carnal, tocando lascivamente o corpo da criança (primeiro fato), ocasião em que também fotografou o corpo da menina e armazenou as imagens no seu aparelho celular (segundo fato). A tia-avó da infante, enquanto auxiliava o acusado, limpando alguns dados do celular dele, viu uma fotografia e, juntamente com outra familiar, indagou à criança, que revelou ter sido tocada e fotografada pelo avô, o qual manteve seu silêncio, por meio de ameaças de mal grave. O Conselho Tutelar foi acionado e a bisavó da menina, que detinha sua guarda fática, efetou o registro policial da fl. 06, doc.1, evento3.

Com efeito, compulsando detidamente os autos e pedindo vênia ao entendimento esposado na origem, conclui-se que o pleito condenatório deve ser acolhido, pois os elementos reunidos no processo revelam que J.J.G. praticou os fatos, como narrados na denúncia.

E tanto a AUTORIA quanto a EXISTÊNCIA DOS FATOS restaram inequívocos diante da prova coligida aos autos.

Impende notar que o crime versado no primeiro fato, ora em análise, consistente na prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, não deixou vestígios, razão pela qual assume relevo a versão da vítima, além do relato dos adultos que detiveram contato com a criança, acompanhando todos os fatos que decorreram após a revelação dos abusos.

Neste contexto, merece reprodução o parecer do ilustre Procurador de Justiça, Dr. Glenio Amaro Biffignandi, ora adotado como razões de decidir, rebatendo as teses defensivas e concluindo pela condenação, por conter o equacionamento da matéria com a fundamentação precisa advinda da análise dos fatos ocorridos e todos os testemunhos relevantes ao desiderato da questão, evitando desnecessária tautologia (evento 6, DOC1):

O recurso desafia juízo de provimento.

Subsumir um fato a uma norma penal requer, por vezes, muito mais do que uma simples análise do conjunto probatório; a depender da situação, deverá implicar exame minucioso de cada uma das elementares previstas na figura típica correspondente, sopesando-se todas as circunstâncias que envolvem vítimas e autores da conduta, a fim de que seja perscrutada, em todos os seus aspectos, a forma de violação ao bem jurídico tutelado pela norma penal.

Feitas essas ponderações, como questão óbvia inicial, convém apontar que numa ação penal sempre será possível verificar a apresentação de duas realidades. Realidades distintas, que abarcam as ideias de acusação e de defesa, e que reclamam, por isso mesmo, sensibilidade apurada e visão que guarde amplitude, nunca adstrita aos interesses que envolvem apenas uma das partes.

Assim é que a lógica empregada em matéria probatória, nos delitos contra a dignidade sexual pressupõe – de regra – um juízo de valoração especial à palavra da vítima, dada a clandestinidade com que costumam ser praticados. Crimes como o dos autos, onde a vítima se vê subjugada não só fisicamente, mas também em sua psique, exige do julgador especial atenção no cotejo com o restante da prova produzida antes de exarar provimento definitivo a respeito.

Na situação em tela, da análise das provas coletadas exsurge como única solução possível, a procedência da denúncia.

De pronto há que se ter em conta que a imputação é de prática de ato libidinoso diverso da conjunção carnal, sendo oportuno que não se perca de vista que se trata de fato que não deixa vestígios materiais, o que agrega maior importância à prova oral.

Na espécie, a prova angariada atesta que o réu, avô da vítima, valeu-se desta condição para abusar de A.G., então com onze (11) anos de idade.

Segundo a menina, na oportunidade, o avô a chamou até seu quarto e lá determinou que se despisse. Ante sua relutância, o réu a ameaçou e, ele próprio, despojou-a de suas vestes, e acariciou todo seu corpo.

Além disto, A.G. afirmou que, na mesma ocasião, enquanto nua, foi fotografada pelo réu.

Os fatos foram revelados inicialmente à tia – Maria Angélica Ribas Borges – e, na sequência, à bisavó – Maurília Francisca Rodrigues Ribas -, em companhia de quem residia à época.

A partir daí, os fatos foram levados ao conhecimento do Conselho Tutelar e das autoridades policiais.

A versão acusatória também é corroborada por Maria Suzana Ribas Gonçalves - avó da vítima e ex-esposa do réu –; Roselaine Ribas avôm –...

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