Acórdão nº 50001890520108210155 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 26-04-2022

Data de Julgamento26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001890520108210155
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002041451
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5000189-05.2010.8.21.0155/RS

TIPO DE AÇÃO: Usucapião da L 6.969/1981

RELATOR: Desembargador PEDRO CELSO DAL PRA

EMBARGANTE: IRINEU SCHULZ (AUTOR)

RELATÓRIO

IRINEU SCHULZ opõe embargos de declaração contra acórdão do evento 8 que, nos autos da ação de usucapião ajuizada em face de ARROZEIRA BRASILEIRA S.A. e INVENTARIANCA DA EXTINTA RFFSA - UNIDADES REGIONAIS, negou provimento ao recurso de apelação que interpôs.

O embargante defende, em suas razões (evento 16), que o acórdão é contraditório em relação à prova do preenchimento dos requisitos estabelecidos no art. 1.238 do Código Civil Brasileiro. Aponta que não prospera o entendimento professado no acórdão relativo à data em que se iniciou o exercício da posse sobre o imóvel, considerando, sobretudo, a prova produzida nos autos - notas de produtor rural, ligação de energia elétrica, testemunhas, contrato particular de promessa de cessão de direitos, declaração do antigo proprietário, ITR, certidão cível, notas promissórias, mapas, memoriais descritivos, ata notarial, etc. Assevera que deixou o imóvel somente após a arrematação pelo terceiro interessado Edio Hansen, ocorrida em 2016, e que o cômputo do prazo aquisitivo não é suspenso com a propositura da demanda. Prequestiona dispositivos. Pede o acolhimento dos embargos de declaração.

Contrarrazões nos eventos 25 e 27.

Após, vieram-me os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas:

Entendo não haver a alegada omissão no acórdão embargado, não se consubstanciando, assim, qualquer dos requisitos dispostos nos incisos I a III do art. 1.022 do CPC, a ensejar o provimento do recurso.

Primeiro porque os embargos de declaração não constituem remédio processual adequado à reanálise probatória, tampouco acerca de entendimento adotado por este Colegiado sobre determinada tese jurídica.

Ademais, a simples leitura do acórdão embargado permite concluir que o tema que perpassa o termo inicial do prazo aquisitivo, malgrado as alegações formuladas pela parte, foi suficientemente enfrentado, conforme é possível extrair do excerto abaixo:

"(...)

Entretanto, não há, no caso dos autos, demonstração escorreita de que o autor exerce posse com ânimo de dono e própria pelo período indicado na inicial, mais precisamente pelo prazo previsto no parágrafo único do art. 1.238 do Código Civil, que reza:

“Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.”.

O autor, em sua inicial, sustenta que ocupa o imóvel desde 1995.

Contudo, restou demonstrado nos autos (fato, aliás, reconhecido no recurso de apelação) que até a data de 31/03/2001 a sua ocupação dava-se em razão de contrato de arrendamento (instrumento contratual nas fls. 100 a 103).

Assim, não há falar em ânimo de dono até esta data.

Note-se que sequer há certeza no que tange a data de 31/03/2001 ser o termo inicial da posse própria pelo autor, diante das seguintes informações fornecidas na missiva enviada ao juízo de primeiro grau pela concessionária de energia elétrica (fl. 444): “que foi localizado em nosso cadastro de gestão comercial o fornecimento situado na Rua Fernando Ferraru, n. 4000, Bairro Vila Nova, Capela de Santana, onde o mesmo foi residido por Roque Daudt Cavalcante, CPF: 565.310.440-04 no período de 10/07/1995 até 12/08/2002. Após, foi residido por Ireineu Schulz, CPF: 277.388.090-00, no período de 12/08/2002 até 17/02/2016 onde o mesmo solicitou rescisão de contrato desta data. A troca de titular foi realizada pelo Call Center em 12/08/2002. Informamos ainda que não ficamos com cópias de documentos, os quais o cliente apresenta, gerando o pedido no sistema para ligar o fornecimento e após devolvemos os documentos ao cliente (...)”.

Somente em agosto de 2002 é que o autor solicitou, em seu nome, a ligação do fornecimento de energia elétrica no local, o que põe em dúvida até mesmo a tese de início de posse em março de 2001.

E entre agosto de 2002 e a data do ajuizamento da ação, ocorrida em março de 2010, não transcorreu o prazo de 10 anos a que alude a norma supra referida (sequer se considerado, como termo inicial, a data de março de 2001, houve o implemento do requisito temporal).

Malgrado entendimentos contrários (em especial julgados isolados da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – sem qualquer efeito vinculativo), entendo que descabe qualquer tentativa de implementar o tempo com aquele transcorrido após o ajuizamento da ação, por não ter fomento jurídico.

Tem-se, pois, como inadmissível, para o cômputo do prazo prescricional, o período havido entre o ajuizamento da ação e a prolação da sentença.

Tratando-se, pois, de ação declaratória, os requisitos devem estar implementados na data da propositura da demanda.

Não se pode perder de vista, ainda, que o art. 17 do CPC reza que, para se postular em juízo, faz-se necessário ter interesse e legitimidade, requisitos os quais são imprescindíveis para a própria propositura da ação.

No caso de ações de natureza declaratória, como é o caso da espécie que se aponta, o interesse jurídico para agir em juízo consubstancia-se na declaração de um estado de fato (aquisição da propriedade pelo decurso do tempo), já preexistente ao ajuizamento da ação. Há que se estar diante de um interesse declarável de imediato (ainda que a demonstração do preenchimento de seus requisitos se dê no transcorrer da instrução). E, em se tratando de requisito para a propositura da ação, o interesse jurídico deve existir no momento em que se propõe a ação e acompanhá-la até o seu final, não havendo como reconhecer a possibilidade de o implemento do interesse ocorrer no transcorrer da lide, após a propositura.

Assim, repito, o interesse processual é condição para o início da ação, sem o qual a lide sequer teria início.

Portanto, não há como conceber a ideia de implemento do requisito temporal após o ajuizamento da ação declaratória.

Veja-se, a propósito, os seguintes precedentes jurisprudenciais, os quais definem o entendimento majoritário do Augusto Superior Tribunal de Justiça...

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