Acórdão nº 50001904020218210143 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50001904020218210143
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001894173
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000190-40.2021.8.21.0143/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador JORGE MARASCHIN DOS SANTOS

APELANTE: BRONILDA DE FATIMA DOS SANTOS FIUZA (AUTOR)

APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por BRONILDA DE FATIMA DOS SANTOS FIUZA, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito c/c pedido de tutela antecipada e condenação em danos morais, que promove em desfavor de BANCO BMG S.A, em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos, com o seguinte dispositivo:

ISSO POSTO, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação, movida por Bronilda de Fátima dos Santos Fiuza em face de Banco Itaú S/A.

Em face da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono do requerido, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, considerando o trabalho realizado pelo profissional, o local da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, bem como o tempo que se desenvolveu a lide, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC.

Fica suspensa a exigibilidade dos ônus sucumbenciais em face da parte autora, tendo em vista ser beneficiária da gratuidade de justiça.

Interposto recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para contrarrazões e, após o prazo, com ou sem elas, remetam-se os autos ao e. Tribunal de Justiça, independentemente de conclusão para juízo de admissibilidade.

Publicada e registrada eletronicamente.

Intimem-se.

Após o trânsito em julgado e nada mais sendo requerido pelas partes, arquive-se com baixa.

(Dra. MARCIA RITA DE OLIVEIRA MAINARDI, Juíza de Direito do Juízo da Vara Judicial da Comarca de Arroio do Tigre/RS).

Em suas razões, a autora, ora apelante, argumentou que não realizou a contratação do referido empréstimo. Afirmou que a transferência dos valores para a sua conta corrente não traz licitude para a contratação. Alegou a necessidade da realização de perícia grafotécnica, a fim de demonstrar a autenticidade das assinaturas presentes no contrato. Referiu que o empréstimo possui como valor contratado R$ 1.285,00, com parcelas mensais descontadas diretamente de seu benefício no valor de R$ 52,25, sem previsão para término. Pugnou pelo provimento do recurso ou, alternativamente, seja desconstituída a sentença e determinada a realização da perícia grafotécnica.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 89).

Cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 935 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE.

O prazo para interposição de recurso de apelação pela parte autora encerrou em 17/02/2022 (evento 80), sendo o recurso de apelação interposto em 03/02/2022 (evento 86), sem preparo em razão da gratuidade judiciária concedida na origem (evento 3).

Assim, o recurso foi interposto dentro do prazo recursal previsto no artigo 1003, § 5º, do Código de Processo Civil, qual seja, de 15 dias.

RELATO DOS FATOS.

Trata-se de ação declaratória de inexistência de débito c/c pedido de tutela antecipada e condenação em danos morais, na qual a parte autora sustentou que anteriormente já havia celebrado um contrato de empréstimo pessoal junto ao banco demandado, porém percebeu que os descontos continuavam sendo realizados em seu benefício, mas desta vez, em valor menor do realmente devido. Afirmou que os descontos são referentes a um empréstimo na modalidade cartão de crédito com reserva de margem consignável - contrato nº 14118056, incluído em 07/07/2018, no valor de R$ 1.285,00. Alegou que não realizou a contratação do referido empréstimo. Referiu sobre a ilegalidade da conduta da parte ré, uma vez que o montante descontado já ultrapassa o valor disponibilizado, bem como da ilegalidade das cláusulas contratuais. Discorreu acerca do dever de indenizar. Requereu, em razão disso, a declaração de inexistência do contrato de cartão de crédito consignado, bem como de qualquer débito existente, com a condenação da ré à repetição do indébito, e ao pagamento de danos morais.

Em sede de contestação, o banco demandado referiu que, ao contrário do que alega a autora, houve pedido de emissão do cartão de crédito consignado pelo demandante, sendo os valores dos saques disponibilizados, conforme solicitação. Alegou que não se trata de empréstimo consignado com cláusula de cartão de crédito, mas de expresso contrato de cartão de crédito consignado, que não possui qualquer relação com empréstimo consignado. Discorreu acerca da diferenciação entre cartão de crédito consignado e empréstimo consignado. Requereu o julgamento de improcedência dos pedidos iniciais.

Sobreveio sentença de improcedência (evento 78).

Feito um breve relato dos fatos, passo à análise do mérito.

CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. AUSÊNCIA DE PROVA DA AUTENTICIDADE DO DOCUMENTO.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 3º, §2º, incluiu expressamente a atividade bancária no conceito de serviço, nos seguintes termos:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. - grifei.

Desta forma, não restam dúvidas de que é aplicável às operações bancárias o Código de Defesa do Consumidor, entendimento, inclusive, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula 297, in verbis:

Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Mais precisamente com relação ao contrato de cartão de crédito, da mesma forma, resta induvidoso que as empresas de cartão de crédito são prestadoras de serviços, não só ao titular, pelo credenciamento e abertura de crédito, como também ao fornecedor pelo agenciamento de fregueses.

Sérgio Cavalieri Filho (Programa de Responsabilidade Civil, 8ª edição, Editora Atlas, pg. 405 e 406), assim refere sobre o tema:

(...) Embora não exista lei específica disciplinando a atividade econômica exercida pelas empresas de cartão de crédito, estão elas enquadradas no Código de Defesa do Consumidor no que diz respeito aos limites das cláusulas do contrato que celebram com o titular do cartão, bem como pertinente à natureza de sua responsabilidade.

Portanto, a responsabilidade contratual do banco é objetiva, respondendo, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados a seus clientes por defeitos/falhas decorrentes dos serviços que lhes presta, conforme dispõe o art. 14 do CDC:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. – grifei.

Trata-se, assim, de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, fundada na teoria do risco do empreendimento, segundo a qual, consoante doutrina de Sérgio Cavalieri Filho “(...) todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, decorrendo a responsabilidade do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade e executar determinados serviços. Em suma, os riscos do empreendimento correm por conta do fornecedor (de produtos e serviços) e não do consumidor”.

Desta forma, os requisitos para a configuração da responsabilidade são: falha na prestação do serviço, dano e nexo causal.

Nesse tipo de responsabilidade, o fornecedor somente afasta o dever de reparar o dano se provar (ônus seu) a ocorrência de uma das causas que excluem o nexo causal, enunciadas no §3º do art. 14 do CDC, quais sejam, a inexistência do defeito (falha na prestação do serviço) e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Alegou a autora que não realizou qualquer nova contratação com a parte requerida no que se refere ao cartão de crédito com reserva de margem consignável.

O contrato foi acostado pela parte ré juntamente com a contestação (evento 12 - doc. 7).

Em contestação, o banco refere que o contrato está devidamente assinado pela parte autora, não havendo qualquer irregularidade na contratação.

Pois bem.

Em razão da negativa de autoria pela parte autora da assinatura no Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado Emitido pelo Banco BMG S.A. e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento, cabia ao banco comprovar sua autenticidade, nos termos do art. 429, II, do CPC.

Cito o referido dispositivo legal:

Art. 429. - Incumbe o ônus da prova quando:

I - se tratar de falsidade de documento ou de preenchimento abusivo, à parte que a arguir;

II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento.

- grifei

Nesse sentido, é o entendimento do STJ:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO PROFERIDO EM IRDR. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DOCUMENTO PARTICULAR. IMPUGNAÇÃO DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA. ÔNUS DA PROVA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
1. Para os fins do art. 1.036 do CPC/2015, a tese firmada é a seguinte: "Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em...

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