Acórdão nº 50001904420208210056 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Primeira Câmara Cível, 04-02-2021

Data de Julgamento04 Fevereiro 2021
ÓrgãoVigésima Primeira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50001904420208210056
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000468961
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

21ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000190-44.2020.8.21.0056/RS

TIPO DE AÇÃO: ITBI - Imposto de Transmissão Intervivos de Bens Móveis e Imóveis

RELATOR: Desembargador ARMINIO JOSE ABREU LIMA DA ROSA

APELANTE: PALMA AGRICULTURA E PECUARIA LTDA (IMPETRANTE)

APELADO: MUNICÍPIO DE JÚLIO DE CASTILHOS (IMPETRADO)

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (INTERESSADO)

RELATÓRIO

PALMA AGRICULTURA E PECUÁRIA LTDA. apela da sentença que denegou a ordem no âmbito do mandado de segurança impetrado contra ato do SECRETÁRIO DA FAZENDA DO MUNICÍPIO DE JÚLIO DE CASTILHOS.

Nas razões recursais, argumenta com distinguish quanto ao Tema 796, STF, invocando o disposto no art. 489, § 1º, VI, CPC/15. Neste passo, aduz que a situação em comento não guarda similitude com o referido julgamento não sendo aplicável a tese ali fixada, já que ausente intuito de constituir capital de reserva como no precedente julgado pelo STF. Ocorre que os bens em questão foram avaliados pela Fazenda Municipal em soma muito superior à subscrita no capital social, derivando o excesso de mora do ente público. Alega que a Lei Complementar Municipal nº 16/06, ao tratar do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (artigos 129 a 154), em nenhum momento dispõe que, em caso de avaliação pelo Fisco Municipal dos imóveis destinados a integralização do capital social de pessoa jurídica em valor superior ao subscrito no contrato social, incidirá o aludido tributo. A seguir, aponta ofensa aos princípios da estrita legalidade tributária e do não confisco, previstos no art. 150, I e IV, CF/88. Menciona ter informado à autoridade fiscal municipal o valor dos imóveis a serem integralizados no seu capital social, com base nas declarações de Imposto de Renda de seus sócios, sobrevindo avaliação excessiva pelo Fisco Municipal, em conduta arbitrária e de natureza confiscatória. Discorre sobre a imunidade quanto ao pagamento de ITBI na integralização de capital social, reportando-se ao art. 156, II, § 2º, I, CF/88. Assinala que a regra constitucional se sobrepõe ao poder de tributar do Fisco Municipal, afirmando não ser devida a incidência do tributo nos moldes pretendidos pelo apelado, que avaliou os imóveis de matrícula nº 15.379 e nº 9.137 no montante de R$ 12.428.000,00, quando o valor subscrito quanto aos referidos imóveis foi de R$ 1.110.000,00, daí a diferença apurada com base na avaliação realizada na importância de R$ 11.318.000,00 sobre o qual incidente a tributação na alíquota de 2% correspondendo ao valor de R$ 226.360,00 a título de ITBI. Requer o provimento do apelo.

Em contrarrazões, o apelado sustenta que a imunidade prevista no art. 36, CTN não é irrestrita, devendo o imóvel ser integralizado ao capital pelo valor de avaliação. Destaca que se apenas parte do valor do imóvel servir para realização de cotas sociais, a diferença do valor, poderá sofrer a incidência do tributo. No mais, remete-se ao julgamento do RE nº 796.376 RG/SC (Tema 796, STF), pugnando pelo desprovimento da apelação.

Parecer ministerial é pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

A sentença, no que importa, assim raciocinou:

"Recentemente, no julgamento do RE 796.376 RG/SC, sob a égide da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal, por maioria, aprovou o Tema 796, segundo o qual "A imunidade em relação ao ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado"1, ainda pendente de publicação nesta data.

Segundo o relator para acórdão, Ministro Alexandre de Moraes, isso se dá, pois a imunidade deve ser interpretada restritivamente e admitir que ela abrange, também, imóveis transferidos para a sociedade com fim diverso da integralização de capital, como, por exemplo, a formação de reserva de capital, seria conferir à norma interpretação extensiva. Vejamos:

Assim, o argumento no sentido de que incide a imunidade em relação ao ITBI, sobre o valor dos bens incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica, em realização de capital, excedente ao valor do capital subscrito, não encontra amparo no inciso I, do § 2º, do art. 156 da CF/88, pois a ressalva sequer tem relação com a hipótese de integralização de capital.

Reitere-se, as hipóteses excepcionais ali inscritas não aludem à imunidade prevista na primeira parte do dispositivo. Esta é incondicionada, desde que, por óbvio, refira-se à conferência de bens para integralizar capital subscrito. Revelaria interpretação extensiva a exegese que pretendesse albergar, sob o manto da imunidade, os imóveis incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica que não fossem destinados à integralização do capital subscrito, e sim a outro objetivo - como, no caso presente, em que se destina o valor excedente à formação de reserva de capital.

Essa extensão interpretativa em termos de imunidades não é aceita por nossa SUPREMA CORTE, por constituir exceção constitucional à capacidade tributária

(...)

Disso decorre, logicamente, que, sobre a diferença do valor dos bens imóveis que superar o valor do capital subscrito a ser integralizado, incidirá a tributação pelo ITBI, pois a imunidade está voltada ao valor destinado à integralização do capital social, que é feita quando os sócios quitam as quotas subscritas.

Por outro lado, nada impede que os sócios ou os acionistas contribuam com quantia superior ao montante por eles subscrito, e que o contrato social preveja que essa parcela será classificada como reserva de capital. Essa convenção se insere na autonomia de vontade dos subscritores.

O que não se admite é que, a pretexto de criar-se uma reserva de capital, pretenda-se imunizar o valor dos imóveis excedente às quotas subscritas, ao arrepio da norma constitucional e em prejuízo ao Fisco municipal.

Ainda que o preceito constitucional em apreço tenha por finalidade incentivar a livre iniciativa, estimular o empreendedorismo, promover a capitalização e o desenvolvimento das empresas, não chega ao ponto de imunizar imóvel cuja destinação escapa da finalidade da norma. (...)2

Nesse mesmo sentido, já vinha decidindo o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. ITBI. IMÓVEIS INTEGRALIZADOS AO CAPITAL DA EMPRESA. REQUISITOS AUTORIZADORES DA TUTELA ANTECIPADA NÃO PREENCHIDOS. 1. O Supremo Tribunal Federal, por maioria, reconheceu a existência de repercussão geral na controvérsia alusiva ao alcance da imunidade quanto ao imposto de transmissão nos casos de imóveis integralizados ao capital social da empresa, cujo valor de avaliação ultrapasse o da cota realizada, considerando o preceito do art. 156, § 2°, inciso I, da Constituição Federal (RE n. 796.376/SC). Observe-se que esse é o exato caso dos autos. 2. O fisco municipal entendeu que o fato gerador da previsão de lançamento do ITBI tem por base o excedente do valor das cotas integralizadas, destacando que somente o valor constituído para a realização de cotas sociais não possui incidência do ITBI. Tal compreensão está amparada em precedente do Supremo, no qual foi reconhecida a imunidade somente sobre o valor do imóvel necessário à integralização da cota do capital social. 3. Por tudo isso, neste momento processual, no qual o juiz deve-se convencer de que o direito é provável para concedê-lo em sede liminar, não há como taxar a conduta da autoridade como ilegal, de modo a restar salvaguardada a pretensão. A compreensão dada pelo Município, no sentido de que a imunidade tributária impediria a incidência de ITBI somente sobre o valor do imóvel necessário à integralização da cota do capital social, não pode ser tida como ilegal, incompatível com o ordenamento jurídico ou mesmo desproporcional. Por isso, em sede de juízo provisório que antecede a análise de mérito, não resta configurado o fumus boni iuris. 4. Outrossim, o oferecimento de caução não elide a controvérsia jurídica apresentada no caso, não existindo efetivo risco de dano irreparável ou de difícil reparação em decorrência da demora na prestação jurisdicional definitiva. Não há prova nos autos de qualquer prejuízo à atividade econômica pela simples não emissão de guia para quitação do ITBI. Manutenção da decisão atacada. NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNÂNIME.(Agravo de Instrumento, Nº 70076932078, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laura Louzada Jaccottet, Julgado em: 14-11-2018) [grifo nosso]

No caso dos autos, pretende-se a integralização do capital social mediante transmissão dos imóveis de matrículas nº 15.379 e nº 9.137, no montante de R$ 1.110.000,00.

No entanto, a Fazenda Municipal avaliou os imóveis no valor de R$ 12.428.000,00, sendo expedida guia para o recolhimento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis sobre o valor excedente da integralização do capital.

Assim, considerando que não houve impugnação do valor de avaliação do imóvel - o que sequer poderia ser objeto de mandado de segurança - e que, de fato, está sendo realizada a transferência de imóvel cujo valor é muito superior ao capital a se integralizar, não há qualquer irregularidade no ato municipal.

Afinal, o objetivo da imunidade conferida à transmissão da propriedade é garantir a livre iniciativa, já assegurada pelo montante que se pretende integralizar. Não há, então, justificativa para sua incidência sobre valor dez vezes maior que servirá apenas como reserva de capital."

Com razão.

Diga-se, desde logo, inexistir o alegado distinguish pretendido pela recorrente.

A definição do Tema 796 pelo Supremo Tribunal Federal é clara em estabelecer a incidência do ITBI relativamente ao valor dos bens que superar o capital subscrito a ser integralizado, não...

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