Acórdão nº 50002004220148210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50002004220148210010
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001678064
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5000200-42.2014.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATORA: Desembargadora ROSAURA MARQUES BORBA

RECORRENTE: LUIZ BATISTA DA ROSA (ACUSADO)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Caxias do Sul, LUIZ BATISTA DA ROSA foi denunciado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inciso I, do CP, e do art. 12, caput, da Lei nº 10.826/03.

A peça acusatória, recebida em 06.11.2014, é do seguinte teor:

“1º Fato

No dia 25 de setembro de 2014, por volta da 01h15min, na Estrada São João da Mulada, s/n, na localidade de Criúva, em Caxias do Sul-RS, por motivo torpe, LUIZ BATISTA DA ROSA matou Sidinei Reichenbach com um disparo de arma de fogo (arrecadada), como evidenciado no auto de necropsia de fl. 28 e mapa das regiões anatômicas das fls. 29-30 que apontam hemorragia interna por lesão aórtica como causa da morte da vítima.

Na oportunidade, o denunciado, armado, dirigiu-se até o local onde a vítima se encontrava discutindo com sua filha. Ao se aproximar de Sidinei Reichenbach, o denunciado iniciou uma discussão, tendo, na sequência, desferido um disparo contra o ofendido.

O crime foi praticado por motivo torpe, uma vez que o denunciado agiu para se vingar, em razão da vítima, seu genro, seguidamente, agredir sua filha.

2º FATO:

Desde data não perfeitamente identificada até o dia 08 de outubro de 2014, na Estrada São João da Mulada, s/n, na localidade de Criúva, em Caxias do Sul-RS, o denunciado LUIZ BATISTA DA ROSA possuía e mantinha sob sua guarda uma espingarda, calibre 28, marca Boito, nº de série 11945701, apreendida, conforme auto da fl. 33 do IP incluso, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.

Na ocasião, o denunciado possuía e mantinha sob sua guarda a arma de fogo acima identificada, sem estar registrada em seu nome, no interior de sua residência.”.

Sobreveio sentença (evento 16 dos autos originários), publicada em 13.10.2021, para o fim de pronunciar LUIZ BATISTA DA ROSA como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, inciso I, do CP, e para impronunciá-lo do delito de posse de arma de fogo.

Irresignada, a defesa interpôs recurso em sentido estrito. Em suas razões, sustenta a excludente de ilicitude da legítima defesa. Subsidiariamente, requer a exclusão da qualificadora do motivo torpe (evento 33 dos autos originários).

Em contrarrazões (evento 37 dos autos originários), o Ministério Público manifestou-se pela manutenção da decisão hostilizada.

Mantida a decisão recorrida (evento 39 dos autos originários), vieram os autos.

Nesta instância, o parecer da Procuradoria de Justiça é pela confirmação da sentença.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, pois preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Não sendo arguidas preliminares, passo ao exame do mérito.

Primeiramente, urge relembrar que a fundamentação da decisão de pronúncia limita-se a um juízo de admissibilidade da acusação, pela verificação de indícios suficientes de autoria e materialidade do fato, evitando-se o aprofundamento na análise da prova até então produzida, preservando-se, por conseguinte, a imparcialidade dos jurados na formação do veredicto (artigo 413, § 1º, do Código de Processo Penal).

Vigora nesta fase o princípio in dubio pro societate em detrimento do princípio in dubio pro reo, o que significa dizer que cabe ao júri popular a análise mais aprofundada do quadro probatório, a fim de dirimir eventuais dúvidas existentes acerca do elemento subjetivo dos delitos. Tal questão encontra-se devidamente sedimentada na jurisprudência; segue o exemplo:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIMES DOLOSOS E CULPOSOS CONTRA A PESSOA. HOMICÍDIO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA (ARTIGO 121, § 2°, INCISO II, C/C O ARTIGO 14, INCISO I, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). INCONFORMISMO DEFENSIVO. QUALIFICADORA AFASTADA. (...) Na fase processual em que o presente feito se encontra - judicium accusationis -, não podemos olvidar que o magistrado deve se orientar pelo princípio do in dubio pro societate, ou seja, na dúvida, deverá pronunciar o acusado. Não se pode (nem deve) esperar do julgador singular um juízo de certeza, mas apenas que, caso pronuncie o réu, baseie sua decisão na existência de elementos que atestem a materialidade do delito e na presença de indícios suficientes de sua autoria. Há prova da materialidade e indícios suficientes de autoria. Existem elementos para não ser suprimida a análise dos fatos àqueles que constitucionalmente têm o direito/dever de julgar crimes dolosos contra a vida, qual seja o Conselho de Sentença. (...) RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70074307604, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em 10/08/2017) – grifei.

Na casuística, a materialidade do delito se encontra suficientemente demonstrada nos autos pelo registro de ocorrência (fls. 06/07 dos autos originários, INQ3), pelas fotografias de fl. 20 dos autos do inquérito, pelo auto de necropsia (fl. 31 dos autos do inquérito), mapa anatômico (fls. 32/33 dos autos do inquérito - INQ4), bem como pela prova oral colhida ao longo da instrução processual.

Os indícios de autoria remetem à necessária análise dos depoimentos das testemunhas inquiridas no processo e do interrogatório do réu, os quais foram bem sintetizados na decisão a quo, senão vejamos:

“Ao ser interrogado em juízo, o réu LUIZ BATISTA admitiu a autoria do delito, alegando ter agido em legítima defesa. Disse que na data do fato acordou com barulhos e ouviu sua filha pedindo socorro, momento em que foi até a casa em que ela vivia com o marido Sidinei. Pediu, então, para Sidinei ir embora de casa, pois só ia para casa para judiar de Taíse, e que poderia ajudar a sua filha a criar o neto. Sidinei disse que não iria embora pois teria parte na casa. Sidinei, então, disse que iria lhe matar, e foi em direção ao galpão onde estava a arma, momento em que Luiz conseguiu chegar primeiro e pegá-la, efetuando um disparo contra Sidinei. Afirmou que Sidinei sempre andava com a arma apreendida (evento 03).

(...)

A informante EVA DE CASTILHOS, esposa do acusado, em juízo, contou que na data do fato estava em sua residência que fica cerca de cinco minutos de distância da casa de sua filha, quando escutou os gritos de Taíse. Quando seu marido saiu de casa para ver a discussão entre sua filha e genro não viu ele pegar arma, acreditando que a arma utilizada seja de Sidinei. Quando chegou na casa de sua filha, Sidinei já estava morto e Luiz não estava mais no local. Referiu que as agressões de Sidinei contra sua filha eram comuns, mas ela...

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