Acórdão nº 50002384920188210128 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002384920188210128
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001562457
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000238-49.2018.8.21.0128/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito Autoral

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: SIEMENS PRODUCT LIFECYCLE MANAGEMENT SOFTWARE INC. (AUTOR)

APELADO: MATRILAZ INDUSTRIA DE MATRIZES EIRELI (RÉU)

RELATÓRIO

SIEMENS PRODUCT LIFECYCLE MANAGEMENT SOFTWARE INC., qualificada nos autos, ajuizou Ação Indenizatória em face de MATRILAZ INDÚSTRIA DE MATRIZES EIRELI EPP., também qualificada, narrando fornecer softwares para auxílio de empresas em processos produção, planejamento, desenvolvimento e manufatura, sendo instalados em servidores próprios e que são acessados à distância por usuários. Disse que, em monitoramento de rotina, constatou acessos da ré aos programas nominados NX 11.0.0.33 e NX 11.0.0.33 MP3, não autorizados pela autora. Mencionou que contatou a ré para regularização da licença de software, o que não foi aceito. Discorreu sobre o direito que entendeu aplicável ao caso. Requereu a procedência do pedido, com a condenação da ré ao pagamento de indenização por uso indevido (fls. 02/07). Juntou documentos (fls. 08/20).

Sobreveio sentença que julgou improcedentes os pedidos. Sucumbente, a autora deverá arcar com a taxa judicial e demais despesas processuais. Fixo honorários advocatícios devidos aos procuradores do réu em 10% sobre o valor atualizado da causa, atentando ao trabalho desenvolvido pelos profissionais e à complexidade, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Os honorários deverão ser corrigidos monetariamente pelo IGP-M a partir desta decisão, com juros de mora de 1% ao mês a contar do trânsito em julgado.

Em suas razões a parte autora refuta a sentença, referindo que comprovou o ilícito praticado pela parte ré, através do e-mail juntado aos autos, onde a empresa requerida confessou que tão logo identificado o programa do autor no seu computador - instalado pela empresa terceirizada de TI, o removeu imediatamente ter sido notificado. Disse que o magistrado equivocou-se na distribuição do ônus da prova, referindo que cabia ao requerente a prova de que possuía as licenças devidas para uso do programa contrafado. Referiu que lhe seria impossível constituir prova negativa de que havia contratação de uso de software com o réu. Requereu a aplicação do art. 9 da Lei 9.609/98. Refuta a aplicação do art. 434 do CPC, alegando que os documentos do fato constitutivos de seu direito foram juntados com a inicial. Disse que a prova do ilícito está na confissão realizada pela parte ré e não na tela sistêmica juntada pela apelante com a inicial. Referiu que a tese da ré de que terceira empresa teria instalado o programa em seu computador não restou comprovado através de prova alguma, seja documental ou testemunhal, ou até mesmo com denunciação à lide, o que não fez, não passando de meras alegações. Disse que a realização de prova pericial seria inócua porque tão logo a requerida foi notificada, desinstalou o programa de seu computador. Requer a reforma da sentença com a condenação da requerida ao pagamento do valor equivalente a 10 vezes o valor das licenças.

A ré ofertou contrarrazões.

Os autos vieram-me conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação indenizatória por uso indevido de programa de computador (violação à propriedade intelectual), sem contratação para uso do software de propriedade da parte autora, julgada improcedente na origem.

A Lei nº 9.609/98, que dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador e sua comercialização no País, define no artigo 1º o conceito de programa de computador, in verbis:

Art. 1º Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.

Já a proteção da propriedade intelectual do programa de computador encontra previsão no artigo 2º da referida lei, sic:

Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.

Ainda, em seu artigo 9º dispõe sobre o uso de programa de terceiro somente através de contrato de licença, sic:

Art. 9º O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença.

Parágrafo único. Na hipótese de eventual inexistência do contrato referido no caput deste artigo, o documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento de cópia servirá para comprovação da regularidade do seu uso.

Da mesma forma, a Lei 9.610/98 em seu artigo 7º também dispõe sobre a proteção das obras intelectuais, sic:

Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:

(...)

XII - os programas de computador;

A legislação dispõe que o uso de programa de computador no Brasil será objeto de contrato de licença, e, no caso de eventual falta de contrato, o documento fiscal de aquisição ou licenciamento de cópia servirá para a comprovação da regularidade de seu uso.

No caso telado, não se tem a notícia de contratação, ao contrário, é fato incontroverso nos autos que a empresa autora é a titular do direito autoral do software e que não formalizou contrato de licença de uso de programa com a requerida, em especial os programas denominados NX 11.0.0.33 e NX 11.0.0.33 MP3.

O documento juntado na fl. 17 (email trocado entre as partes, ainda na esfera administrativa), evidencia a confissão da empresa requerida quanto à instalação de programa de computador da autora em seus computadores sem sua autorização.

Portanto, considerando que a legislação pátria proíbe o uso ilegal de programas de computador, está configurada a chamada contrafação, sustentada pela empresa autora e demonstrada pela prova documental, conforme previsão nos artigos 5º, inciso VII, e 29, I e IX, ambos da Lei 9.610/98.

Art. 5º Para os efeitos desta Lei, considera-se:

(...)

VII - contrafação - a reprodução não autorizada;

Art. 29. Depende de autorização prévia e expressa do autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como:

I - a reprodução parcial ou integral;

(...)

IX - a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero;

Destarte, merece prosperar o pedido de indenização pelo simples fato de a empresa ré ter armazenado em sua base de dados de seus computadores programa de computador desenvolvido pela parte autora sem a sua devida licença, o que restou confessado no email acima mencionado.

A alegação da ré de que a instalação dos programas teria sido realizada pela empresa de TI que lhe presta serviço não é o suficiente para eximir sua responsabilidade, pois sequer trouxe aos autos qualquer indicativo de prova (documental-testemunhal) a amparar tal alegação, tampouco denunciou a lide a referida empresa, a fim de comprovar sua tese.

Desta feita, comprovado o ilícito consistente no armazenamento indevido de programa alheio sem licença configurado está o dano moral, pois evidenciada a prática da confratação.

Nesse sentido são os precedentes jurisprudenciais, in verbis:

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZATÓRIA. PRELIMINARES DE IRREGULARIDADE DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL DA AUTORA E DE AUSÊNCIA DE PROPOSITURA DA AÇÃO PRINCIPAL NO PRAZO LEGAL. REJEIÇÃO. MÉRITO. PROPRIEDADE INTELECTUAL. DIREITO AUTORAL. SOFTWARE. UTILIZAÇÃO SEM LICENÇA. INDENIZAÇÃO. VALOR. 1. A utilização de software sem licença de uso ou nota fiscal de aquisição, configura a contrafação ou reprodução não autorizada e a violação dos direitos autorais, dando ensejo à indenização nos termos da lei. Diz a Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XVIII, que "aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar". Por sua vez, a Lei nº. 9.609/98, que dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programas de computador, dispõe que o uso dos programas de computador será objeto de contrato de licença (art. 9º), autorizando, ainda, em seu parágrafo único, que, no caso de eventual inexistência do contrato, a regularidade do uso poderá ser comprovada por meio de nota fiscal de aquisição ou licenciamento de cópia. 2. O art. 103 da Lei 9.610/98 limita a responsabilidade daquele que comercializa programas sem a devida licença, ao pagamento do preço alcançado pela venda. Apenas quando não se lograr quantificar as cópias ilegais vendidas, é que a lei impõe o pagamento de valor equivalente ao de 3.000 exemplares, como forma de não permitir o locupletamento do infrator. DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. MANUTENÇÃO. PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÕES DESPROVIDAS.” (Apelação Cível Nº 70040248650, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 29/06/2011) - grifei

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÒRIA CUMULADA COM AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE PRÁTICA DE ATO. CONTRAFAÇÃO. SOFTWARE. UTILIZAÇÃO SEM LICENÇA. CONTRAFAÇÃO. OCORRÊNCIA. O artigo 9º da Lei nº 9.609/98 tutela os direitos autorais relativos a programa de computador e prevê a necessidade de contrato de licença. Hipótese em que não há comprovação da autorização da licença de uso, incorrendo o réu na prática...

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