Acórdão nº 50002420320168210146 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
ÓrgãoDécima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50002420320168210146
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002037905
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000242-03.2016.8.21.0146/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATORA: Desembargadora THAIS COUTINHO DE OLIVEIRA

APELANTE: JOAO NESTOR HAHN (AUTOR)

APELANTE: MARA DENISE COELHO HAHN (AUTOR)

APELADO: DRSUL VEICULOS LTDA. (RÉU)

APELADO: RENAULT DO BRASIL COMERCIO E PARTICIPACOES LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Apelação apresentada pela parte autora da sentença que, nos autos da ação indenizatória por danos morais e materiais ajuizada por JOÃO NESTOR HAHN e MARA DENISE COELHO HAHN contra DRSUL VEICULOS LTDA. e RENAULT DO BRASIL COMERCIO E PARTICIPAÇÕES LTDA, julgou extinta a ação em relação à concessionária DRSul e improcedente quanto à fabricante Renault.

A sentença objurgada encontra-se veiculada no evento 3, processo judicial 8, fls. 29/40).

Em razões recursais, inicialmente destacaram que a concessionária DR Sul Veículos é parte legítima para a causa, nos termos da lei consumerista, merecendo reforma a sentença de extinção, no ponto. No mérito, asseveram que a colisão sofrida pela autora levou à perda total do veículo, inclusive arrancando um eixo do caminhão envolvido no acidente e que o fato de os airbags não terem funcionado em um acidente de grande magnitude revela falha do produto ou falha de informação no momento da venda do veículo, vez que era o esperado pelo consumidor que o equipamento funcionasse. Aduziram que o perito criou teses e referências que não lhes foram disponibilizadas, inclusive quanto à redução de velocidade do primeiro e do segundo impactos, bem como da desaceleração pelo fato de a autora ter tido um mal súbito ao conduzir o veículo. Afirmaram que houve uma colisão frontal/lateral e que, quando da aquisição do veículo, não houve informação de que o airbag seria acionado apenas com colisão frontal. Alegaram que a prova pericial é contrária à conclusão do engenheiro mecânico ouvido como testemunha, sendo este o único a vistoriar o veículo acidentado. E que a sentença não considerou o recall de airbags veiculado pela fabricante a demonstrar a falha no acionamento do equipamento. Requereram, ao final, a reforma da sentença para fins de (1) reformar a extinção do feito em relação à concessionária, mantendo-a no polo passivo; (2) julgar procedente a demanda (evento 3, processo judicial 8, fls. 43 e seguintes).

Apresentadas contrarrazões (evento 3, processo judicial 9, fls. 7/16).

Subiram os autos a esta Corte, onde foram integralmente digitalizados e cadastrados na plataforma E-Proc, vindo conclusos a julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas,

Conheço do presente recurso, vez que preenchidos os requisitos de admissibilidade.

A adentrar no mérito recursal, peço vênia para apresentar breve digressão fático-processual.

Relatam os autores que em dezembro/2013 adquiriram o veículo Renault/Duster, ano 2013 modelo 2014, junto à concessionária DR Sul Veículos, quando optaram pela inclusão de duplo air bag, tendo pago pelo veículo zero quilômetro o valor de R$ 61.859,00. Referem que em 13/01/2016 a autora Mara Denise se envolveu em um grave acidente, após ter tido um mal súbito enquanto dirigia o veículo, e que no momento do acidente os airbags não funcionaram. Asseveram tratar-se de vício oculto e que a finalidade do item de segurança não foi alcançada. Requerem indenização por danos morais pelo vício do produto (falha do sistema de acionamento de airbag).

Contestado e instruído o feito com prova documental, oral e pericial, sobreveio sentença de extinção do feito em relação à DR Sul Ltda (concessionária) e de improcedência quanto à Renault do Brasil Comércio e Participações Ltda (fabricante).

Apela a parte autora, devolvendo a integralidade da controvérsia a esta Tribunal ad quem. Em síntese, afirma que (1) a concessionária é parte legítima para a causa; (2) a colisão foi frontal e lateral, além de grave e de grande monta, inclusive com perda total do veículo; (3) a sentença se baseia unicamente na conclusão do perito e desconsidera o relato do eng mecânico que viu o carro acidentado; (4) o recall dos airbags dos veículos Duster não foi considerado na decisão.

Pois bem.

1) LEGITIMIDADE PASSIVA DA CONCESSIONÁRIA

É incontroverso dos autos - e sequer objeto de irresignação recursal - que a relação entre as partes é de consumo, atraindo a incidência das disposições consumeristas ao caso.

Nesse pensar, o Código de Defesa do Consumidor é claro ao determinar que a responsabilidade na relação de consumo é solidária entre aqueles que fazendo parte da cadeia de fornecedores, nos termos do que preceitua o art. 18 do CDC:

Na hipótese, mesmo que identificado o fabricando do produto, há responsabilidade solidária entre este (fabricante) e a concessionária, conforme orientação do E. STJ:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONSERTO DE VEÍCULO. ATRASO EXACERBADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS INTEGRANTES DA CADEIA DE FORNECIMENTO DO SERVIÇO. SÚMULA 83/STJ. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Tratando-se de uma relação de consumo, impõe-se a responsabilidade solidária perante o consumidor de todos aqueles que tenham integrado a cadeia de prestação de serviço, em caso de defeito ou vício. Precedentes.
2. Na hipótese, as instâncias ordinárias concluíram que o autor comprovou o fato constitutivo do direito alegado, ficando demonstrado que a demora excessiva no conserto do veículo causou transtornos que extrapolam o mero aborrecimento, uma vez que o veículo era utilizado para fins laborais. A modificação de tal entendimento demandaria o reexame do substrato fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1849074/RJ, Rel.
Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 16/08/2021, DJe 16/09/2021)

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. REPARO DE VEÍCULO. DEMORA ANORMAL E INJUSTIFICADA. DANO MORAL. VÍCIO DO PRODUTO. FORNECEDOR E FABRICANTE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE.
SÚMULA N. 284/STF. 1. O atraso injustificado na reparação de veículo pode caracterizar dano moral decorrente da má prestação do serviço ao consumidor. Precedentes. 2.
A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que são solidariamente responsáveis o fabricante e o comerciante que aliena o veículo automotor, e a demanda pode ser direcionada contra qualquer dos coobrigados.

3. Não se conhece do recurso especial quando a deficiência de sua fundamentação impedir a exata compreensão da controvérsia (Súmula 284 do STF).
4. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 490.543/AM, Rel.
Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 06/04/2017, DJe 18/04/2017)

Isto porque a concessionária corré DR Sul Veículos é autorizada da fabricante para comercializar veículos da marca Renault, sendo a responsável direta pela colocação no mercado, ou seja, pela comercialização do produto alegadamente defeituoso.

De tal modo, no ponto, estou por reformar a sentença e por manter a corré no polo passivo da demanda, vez que solidariamente responsável por eventuais prejuízos causados ao consumidor.

2) ALEGADA FALHA NO SISTEMA DE AIR BAG E DEVER DE INDENIZAR

A controvérsia posta nos autos cinge-se à análise da (in)existência de responsabilidade das rés pelos danos ocasionados aos autores, decorrente de alegado fato do produto, consubstanciado no não acionamento do componente airbag em acidente de trânsito que a autora Mara Denise se envolveu enquanto conduzia veículo produzido e comercializado pelas rés.

Tratando-se de relação de consumo, a responsabilidade do fabricante pelo fato do produto está prevista no art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, sendo objetiva, ou seja, independe da existência de culpa, eximindo-se o produtor do dever de indenizar quando evidenciar caso fortuito ou força maior, ou ainda quando demonstrar uma das excludentes previstas no § 3º do aludido Diploma Legal, quais sejam:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

§ 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Quanto à dinâmica do acidente bem de ser pontuado que ocorreu em 13/01/2016, por volta do km 11 da estrada RS 452. O veículo Renault Duster dirigido pela autora, com pouco mais de 23 mil km de uso, colidiu com outros dois veículos que trafegavam em sentido contrário, quais sejam: o caminhão Mercedez Bens 710 e o Ford Cargo 1119.

Conforme fotografia vinda aos autos, o veículo ficou danificado e teve perda total:

A condutora do automóvel teve lesões na cabeça e na coluna, necessitando socorro médico (sem sequelas permanentes), muito disso devido a ausência de acionamento dos airbags do carro, como alega.

A corroborar com sua tese, a parte autora acostou laudo técnico datado de 25/01/2016, firmado por engenheiro mecânico - também ouvido como testemunha -, que concluiu que "os airbags tanto do motorista quanto do carona não foram acionados, não obstante a violência do impacto frontal/lateral" (evento 3, processo judicial 2, fl. 9).

Com...

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