Acórdão nº 50002572420168210064 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002572420168210064
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003023107
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000257-24.2016.8.21.0064/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELANTE: DEIVID DENER OLIVEIRA DOS SANTOS (RÉU)

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia em desfavor de DAVID DENER OLIVEIRA DOS SANTOS, com 33 anos de idade à época dos fatos, dando-o como incurso nas sanções dos artigos 14 da Lei 10.826/03, 180, caput, do Código Penal, e 28, da Lei nº 11.343/06, na forma do artigo 69 do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

FATO 01:

No dia 09 de julho de 2016, às 04h23min, na Rua Dirceu Funks, nº 384, Bairro Vista Alegre, em Santiago, RS, em via pública, o denunciado DEIVID DENER OLIVEIRA DOS SANTOS portava um revólver, marca Taurus, calibre .32, nº 812929 (auto de apreensão da fl. 07 do I.P), de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Na oportunidade, após denúncia da existência de uma briga generalizada, os policiais militares chegaram ao local e visualizaram o denunciado com a referida arma em punho.

A arma foi apreendida e encaminhada para realização de exame pericial (fls. 46 do I.P).

FATO 02:

Nas mesmas circunstâncias descritas acima, o denunciado DEIVID DENER OLIVEIRA DOS SANTOS transportava e trazia consigo, sem autorização e em desacordo com a determinação legal e regulamentar, 0,6 gramas de Cocaína (laudo de constatação da natureza da substância de fls. 10), substâncias que causam dependência física e psíquica (auto de apreensão de fl. 05 do T.C).

Na oportunidade em revista pessoal no denunciado, foi localizada a substância entorpecente, pronta para uso, em poder do denunciado.

FATO 03:

Em data não suficientemente esclarecida, mas para fins de denúncia entre janeiro e julho de 2016, o denunciado DEIVID DENER OLIVEIRA DOS SANTOS adquiriu 01 (uma) arma de fogo, tipo revólver, marca Taurus, calibre .32, numeração 812929, em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime, em virtude da restrição do comércio de armas no Brasil.

Na oportunidade, o armamento havia sido furtado de ODIR FIORIN, na cidade de Jaguari/RS, entre os dias 15 a 18 de janeiro de 2016, conforme Ocorrência Policial n.º 361/2016 (fls. 33/35).

O denunciado foi preso em flagrante delito (auto de prisão em flagrante de fl. 62 do I.P).

A denúncia foi recebida em 07.11.2017 (evento 5, PROCJUDIC4, fls. 03/04).

Pessoalmente citado, o acusado apresentou resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública (evento 5, PROCJUDIC4, fls. 16/18).

Durante a audiência de instrução, foram ouvidas as testemunhas e interrogado o réu (evento 5, PROCJUDIC4, fls. 28/29 e evento 5, PROCJUDIC5, fls. 11/12). Encerrada a instrução, os debates orais foram convertidos em memoriais apresentados pelo Ministério Público (evento 5, PROCJUDIC5, fls. 24/36) e pela Defesa (evento 5, PROCJUDIC6, fls. 01/07).

Sobreveio sentença de lavra da Dra. Ana Paula da Silva Tolfo, julgando parcialmente procedente a ação penal a fim de:

a) condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 14 da Lei 10.826/03, à pena de 02 (dois) anos de reclusão em regime inicial aberto, bem como à pena de multa, fixada em 10 (dez) dias-multa à razão do mínimo legal vigente à época do fato. Foi substituída a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos;

b) declarar extinta a punibilidade pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado em relação ao delito previsto no artigo 28, da Lei nº 11.343/06, com base no artigo 107, inciso IV do Código Penal;

c) absolver o réu das sanções previstas no artigo 180, caput, do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (evento 5, PROCJUDIC6, fls. 11/27).

A sentença foi presumidamente publicada em 23.05.2022 (evento 5, PROCJUDIC6, fl. 28).

O Ministério Público apresentou recurso de apelação. Em razões, requereu a reforma parcial da sentença a fim de condenar o réu nas sanções do artigo 180, caput, do Código Penal (evento 5, PROCJUDIC6, fls. 29/36).

A Defesa interpôs recurso de apelação (evento 5, PROCJUDIC6, fl. 39). Em razões, preliminarmente requereu o reconhecimento da prescrição retroativa da pretensão executória pela pena em concreto e a extinção de punibilidade do condenado. No mérito, pugnou pela absolvição do réu de todas as imputações contidas na denúncia. Subsidiariamente, pleiteou a redução da pena pecuniária para 01 (um) salário-mínimo, a redução da prestação de serviços à comunidade para 01 (um) ano e a extinção ou redução da pena de multa. Por fim, prequestionou a matéria (evento 5, PROCJUDIC6, fls. 42/50 e evento 5, PROCJUDIC7, fls. 01/09).

A Defesa apresentou as contrarrazões (evento 5, PROCJUDIC7, fls. 10/27), e os autos foram remetidos a esta Corte.

Em parecer, a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Dirce Soler, opinou pela prescrição da pretensão punitiva em relação ao 1º fato, e pela declinação da competência para apreciação do apelo ministerial, que versa exclusivamente sobre o 3º fato (receptação) objeto da imputação ao réu (evento 7, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Os recursos de apelação são cabíveis e tempestivos.

No caso em julgamento, o réu foi condenado pelo crime do artigo 14 da Lei 10.826/03, absolvido pelo crime do artigo 180 do Código Penal, sendo declarada a extinta a punibilidade do crime do artigo 28 da Lei 11.343/06.

PRELIMINAR

Prescrição (1º fato)

Em preliminar, o recorrente sustentou a ocorrência da prescrição retroativa quanto ao crime pelo qual restou condenado - artigo 14 da Lei de Armas -, em vista da pena aplicada.

Assiste-lhe razão.

E a fim de evitar indevida tautologia, reproduzo o parecer de lavra da eminente Procuradora de Justiça Dra. Dirce Soler, no que pertinente:

A pretensão punitiva do Estado, no entanto, resta fulminada pelo advento da prescrição, no que pertine ao primeiro fato objeto da imputação.

Narra a denúncia que o delito pelo qual restou condenado o apelante foi praticado no dia 09.07.2016 (fl. 10).

A denúncia foi recebida em 07.11.2017 (fls. 160/161)

Após regular tramitação do feito, adveio a sentença, sendo o réu condenado, pela prática do crime de porte ilegal de arma de fogo e munição de uso permitido3 (1º fato), a penas de 02 anos de reclusão, substituída por duas restritivas de direitos, e multa (fls. 268/284).

A sentença foi publicada em 23.05.2022 (fl. 285), e, no que se refere especificamente ao 1º fato da denúncia, contra ela, apenas a Defesa recorreu.

Ocorre que o prazo prescricional retroativamente considerado, à luz do artigo 109, inciso V, combinado com o artigo 110, § 1º, ambos do Código Penal, é de 04 anos, tendo em vista a pena privativa de liberdade aplicada, de 02 anos de reclusão, transitada em julgado para a Acusação.

E, entre o recebimento da denúncia (07.11.2017) e a data da publicação da sentença condenatória recorrível (23.05.2022), segundo marco interruptivo da prescrição (inciso IV do artigo 117 do Código Penal), transcorreu lapso temporal superior a 04 anos.

Dessarte, há de ser declarada extinta a punibilidade do 1º fato imputado ao apelante, pelo advento da prescrição da pretensão punitiva do Estado, forte no disposto no artigo 107, inciso IV; combinado com os artigos 109, inciso V; e 110, § 1º, todos do Código Penal.

Prejudicado, por conseguinte, o enfrentamento das insurgências de mérito esgrimidas pelo apelante referente ao 1º fato da denúncia, conforme pacífica jurisprudência do Excelso Supremo Tribunal Federal (e.g., HC 115.098, Relator Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 07/05/2013).

Assim, está extinta a punibilidade do acusado quanto ao crime do artigo 14 da Lei 10.826/03, pela prescrição retroativa, restando prejudicado, portanto, o exame de mérito no ponto.

Cumpre dizer que não foram apresentadas as contrarrazões em face do apelo defensivo. No entanto, tendo em vista a extinção da punibilidade, que prejudica o mérito do apelo, tenho por despicienda a apresentação da contradita, por questão de celeridade.

Declinação da competência

Na sequência, a ilustre Procuradora de Justiça, tendo em vista a extinção da punibilidade do crime de competência deste órgão fracionário, opinou pela declinação da competência em prol das Câmaras Altas, para apreciação do pedido da acusação quanto ao crime de receptação.

De efeito, no caso vertente, a distribuição deste expediente no âmbito da competência da 4ª Câmara Criminal ocorreu em razão da previsão do artigo 30, caput e parágrafo único, do RITJRS.

Isso porque, em face da idêntica gravidade dos crimes de porte ilegal de arma de fogo e receptação dolosa, o critério de desempate resulta na competência deste órgão fracionário, pois integrante do 2º Grupo Criminal.

Anoto:

Art. 30. Nas hipóteses de conexão entre crimes pertencentes à competência de Câmaras diversas, preponderará aquele ao qual for cominada pena mais grave.

Parágrafo único. Sendo as infrações da mesma gravidade, prevalecerá a competência das Câmaras integrantes dos 1º e 2º Grupos Criminais.

E, no caso concreto, com a devida vênia da doutra Procuradora de Justiça, entendo ser caso de prorrogação da competência deste órgão julgador tanto para exame do recurso ministerial.

Justifico a medida em face do que disposto no artigo 81, caput, do Código de Processo Penal, segundo o qual:

Art. 81. Verificada a reunião dos processos por conexão ou continência, ainda que no processo da sua competência própria venha o juiz ou tribunal a proferir sentença absolutória ou que desclassifique a infração...

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