Acórdão nº 50002711920138210062 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002711920138210062
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002084688
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5000271-19.2013.8.21.0062/RS

TIPO DE AÇÃO: Apropriação indébita (art. 168, caput)

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

APELANTE: NILVO RODRIGUES LOBELL (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra NILVO RODRIGUES LOBELL e ANTÔNIO AUGUSTO CHAGAS DA SILVA, afirmando estarem incursos, respectivamente, nas sanções dos artigos 168, § 1º, inciso III, e 180, caput, ambos do Código Penal (CP), pela prática dos seguintes fatos descritos na peça inicial (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 2/4):

"1º FATO DELITUOSO:

Entre os meses de novembro e dezembro de 2009, na Rua João da Silva Júnior, n° 2349, bairro Centenário, em Rosário do Sul, RS, o denunciado, NILVO RODRIGUES LOBELL, apropriou-se de coisa alheia móvel, de que tinha a posse ou a detenção, em razão de emprego ou profissão.

Na oportunidade, os denunciado, apropriou-se do veículo Brasília, placas IEA 5584, pois a vítima havia deixado o referido veículo na oficina do denunciado para conserto.

O veículo foi avaliado em R$ 800,00 (oitocentos reais), conforme o Auto de Avaliação Direta da fl. 22 do Inquérito Policial, sendo que esta avaliação foi realizada com o veículo desmanchado e em partes com a lataria recortada.

2º FATO DELITUOSO:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar aos do 1º fato delituoso, o denunciado, ANTONIO AUGUSTO CHAGAS DA SILVA, recebeu em proveito próprio, coisa que sabia ser produto de crime.

Na oportunidade, o denunciado recebeu o objeto descrito no 1º fato delituoso, proveniente da apropriação indébita contra Cristiano Teixeira Correia, quando pediu para o denunciado Nilvio Rodrigues Lobell para levar o referido veículo para a sua residência, assim desmanchou o veículo para utilizar as peças".

Recebida a denúncia em 15/10/2013 (evento 3, PROCJUDIC1, fls. 38/39) e produzida a prova, a pretensão, nos seguintes termos, foi julgada parcialmente procedente (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 10/16):

"Assim, comprovadas materialidade e autoria, e ausentes causas de exclusão da tipicidade, ilicitude, ou que isentem o réu de pena, a condenação de NILVIO é medida que se impõe quanto ao primeiro fato delituoso.

Acenado isso, passo à dosimetria da pena somente quanto ao primeiro fato delituoso (réu NILVIO).

O delito em tela comina pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa.

[...]

Antes tais comemorativos, fixo a PENA-BASE em 02 (dois) anos de reclusão.

Aumento a pena em um terço (oito meses), em razão do réu ter recebido o veículo da vítima em razão de sua profissão - mecânico (art. 168, § 1º, inciso III do Código Penal), restando a pena em 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, a qual torno DEFINITIVA, em razão da inexistência outras causas de aumento e diminuição de pena.

Fixo a pena de multa abstratamente cominada no preceito sancionador em 30 (trinta dias-multa), à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo mensal vigente na época do fato.

DIANTE DO EXPOSTO, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido contido na denúncia para:

I. CONDENAR NILVIO RODRIGUES LOBELL, à pena de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, além de 30 (trinta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo mensal vigente na época do fato, por infração ao disposto no art. 168, § 1º, inciso III do Código Penal; e

II. DECLARAR extinta a punibilidade de ANTONIO AUGUSTO CHAGAS DA SILVA, fulcro no art. 107, IV do CP, quanto ao segundo fato delituoso descrito na denúncia.

Considerando a quantidade de pena privativa de liberdade aplicada, bem como tendo em vista que o réu preenche as condições do art. 44 do CP, SUBSTITUO A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS, quais sejam, prestação pecuniária (art. 43, inciso I, do Código Penal) e prestação de serviços à comunidade (art. 43, inciso IV, do Código Penal).

Quanto à prestação pecuniária, levando em conta as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, bem como as condições econômicas do réu, deverá ela entregar à entidade cadastrada junto ao Juízo da execução o valor equivalente a 01 (um) salário mínimo vigente na época do pagamento, de acordo com o art. 45, § 1.°, do Código Penal.

Com relação à prestação de serviço à comunidade (art. 43, IV, do CP), esta deverá ser cumprida pelo prazo total da pena privativa de liberdade aplicada, com carga horária semanal e em entidade a serem definidas pelo juízo da execução, com observância do disposto no parágrafo 3º, do art. 46, do Código Penal.

Inaplicável a suspensão condicional da pena, pois cabível sua substituição (art. 77, inciso III, do CP).

O regime inicial de cumprimento da pena do réu NILVIO será o aberto, forte no que prevê o art. 33, §2°, alínea b, do Código Penal, considerando o quantum de pena aplicado e a primariedade do acusado.

Fixo o valor mínimo para a reparação dos danos (art. 387, inc. IV), acrescidos de correção monetária pelo IGP-M e juros legais a contar da data do fato, conforme Auto de Avaliação Indireta da fl. 24, em R$ 800,00 (oitocentos reais), conforme previsão do art. 387, IV do CPP.

Autorizo o réu a recorrer em liberdade, tendo em vista que assim permaneceu durante todo o curso da instrução, salvo se por outro motivo não estiver preso".

Intimado (evento 3, PROCJUDIC5, fl. 26), o réu NILVO RODRIGUES LOBELL ingressou com apelação (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 37/38), alegando, em síntese (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 43/50, e evento 3, PROCJUDIC6, fls. 1/3): (a) insuficiência probatória, destacando haver somente a palavra da vítima e não existir o dolo necessário à configuração do delito de apropriação indébita; (b) que era imperioso o redimensionamento da pena privativa de liberdade e a isenção ou a redução da multa. Pediu, então, o provimento do recurso, com sua absolvição ou acolhimento das demais pretensões.

Em contrarrazões, o Ministério Público postulou o não provimento do apelo (evento 3, PROCJUDIC6, fls. 6/12).

Nesta instância recursal, a Procuradoria de Justiça lançou parecer, manifestando-se pelo parcial provimento do recurso (evento 6, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso de apelação, porquanto atendidos os requisitos previstos no artigo 593 do CPP.

No que tange à materialidade e à autoria do delito, reproduzo o declinado na sentença (evento 3, PROCJUDIC5, fls. 10/16), inclusive como razões de decidir, evitando desnecessária tautologia:

"Com efeito, a materialidade do delito desponta da Ocorrência Policial n.º 3659/2010 (fl. 06/08), Auto de Apreensão (fl. 09), Procuração (fl. 22), Auto de Avaliação Direta (fl. 24), além da prova oral colhida no curso da persecução.

A autoria, da mesma forma, restou transparente dos autos.

A vítima Cristiano Teixeira Correia, em juízo, declarou que mandou arrumar sua camioneta (Brasília azul) na oficina do réu NILVO. Contudo, disse que o acusado ficou lhe 'enrolando', e não consertava. Disse que, em um sábado de manhã, passou na oficina e o veículo não estava mais no local. Relatou que um vizinho lhe disse que a camioneta tinha saído, mas não revelou onde. Com isso, saiu a procura, encontrando-a no pátio da casa do réu ANTONIO AUGUSTO, toda cortada. Disse que ANTONIO AUGUSTO lhe falou que trocou a camioneta por uma televisão e nem sabia que a camioneta tinha dono. Disse que registrou a ocorrência e os policiais lhe orientaram a contratar um caminhão e levar os pedaços do veículo para o guincho, onde ainda está. Referiu que o veículo era seu há mais de três anos, mas não estava em seu nome, mas tem uma procuração. Relatou que ficou no prejuízo, não recebendo nenhum valor de NILVO nem de ANTONIO AUGUSTO.

O réu ANTONIO AUGUSTO CHAGAS DA SILVA, em Juízo, declarou que, no dia dos fatos, trocou o veículo, que estava com o acusado NILVO por uma televisão. Disse que o estado do veículo era 'precário' (muito ruim). Disse que desmanchou a camioneta. Referiu que o dono do veículo esteve em sua casa, encontrando o veículo. Disse que não sabia que o veículo era oriundo de ilícito; contudo, não pediu nenhum documento a NILVO, quando este lhe repassou o veículo.

O réu NILVIO RODRIGUES LOBELL não compareceu à audiência de instrução, tendo sido decretada sua revelia.

Com relação ao primeiro fato delituoso (apropriação indébita), acerca da ação nuclear do tipo, leciona Nucci:

Apropriar-se significa apossar-se ou tomar como sua a coisa que pertence a outra pessoa. Cremos neste caso, protege-se tanto a propriedade, quanto a posse, dependendo da situação concreta. (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 4. ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2008, p. 723)

Em que pese a revelia do acusado, conforme se depreende dos depoimentos colhidos, a vítima confirmou o fato.

Disse que deixou o veículo na oficina do réu NILVIO para conserto, tendo este lhe 'enrolado' e não consertado. Após, descobriu que o veículo estava na casa do réu ANTONIO AUGUSTO, que lhe disse que tinha trocado por uma televisão.

Ainda, em que pese o veículo não estar em nome da vítima Cristiano, este detinha sua posse, conforme seu depoimento.

Não obstante, não há nos autos documentação que mostre, no mínimo, indícios de uma possível venda do automóvel da vítima para o acusado NILVIO.

Sendo assim, não há qualquer dúvida, no tocante à comprovação da materialidade do fato e da autoria, recaindo certa esta na pessoa do imputado, sendo afastada a tese defensiva de insuficiência probatória.

Quanto à tipicidade, o que se extrai dos elementos de prova colacionados, é que o acusado apropriou-se de coisa alheia móvel, qual seja, o veículo da vítima (Brasília, placas IEA 5584), de que tinha a posse, uma vez que estava o veículo em sua oficina para conserto,...

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