Acórdão nº 50002757820138210087 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Oitava Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002757820138210087
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Oitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003316009
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

18ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000275-78.2013.8.21.0087/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança

RELATOR: Desembargador JOAO MORENO POMAR

APELANTE: CONDOMINIO PIO XII (RÉU)

APELADO: MARIA LORY HACK LAUER (AUTOR)

RELATÓRIO

CONDOMÍNIO PIO XII apela da sentença proferida nos autos da ação demolitória ajuizada por MARIA LORY HACK LAUER, assim lavrada:

I – RELATÓRIO
Vistos.

MARIA LORY HACK LAUER, devidamente qualificada nos autos, ajuizou ação demolitória c/c pedidos relativos à obrigação de fazer e indenização por dano moral em face de CONDOMÍNIO PIO XII, igualmente qualificado nos autos.
Narrou, em síntese, que reside em um imóvel residencial localizado ao lado de onde foi construído o Condomínio Pio XII, e que sua residência foi concluída no ano de 1982, período muito anterior ao início das construções do condomínio requerido. Alegou que o réu realizou obras em área construída pela autora, invadindo o imóvel da requerente e utilizando de área privativa pertencente à autora sem a respectiva autorização da demandante. Afirmou que buscou uma solução administrativa para o caso, objetivando a retirada das algerosas construídas pelo condomínio na propriedade da requerente, bem como a retirada de uma placa de publicidade que foi instalada em local que invade a propriedade da autora, além do recebimento de indenização pelos danos causados em seu imóvel, porém não obteve êxito em seu pedido. Indicou que o prejuízo material causado no imóvel da autora foi de R$ 10.800,00 (dez mil e oitocentos reais), conforme o menor dos três orçamentos realizados pela requerente. Comentou acerca do direito invocado e sustentou que a realização de obras pelo réu na área de propriedade da autora caracterizou danos morais indenizáveis. Requereu, então, a antecipação dos efeitos da tutela para que a requerida fosse compelida a providenciar a imediata retirada das algerosas do condomínio, sob pena de multa cominatória a ser fixada pelo juízo e, ao final, postulou pela procedência dos pedidos para o efeito de condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 10.800,00 (dez mil e oitocentos reais), bem como indenização por danos morais, no valor sugerido de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Pediu, ainda, a concessão da gratuidade de justiça (fls. 02/08). Juntou documentos (fls. 09/22).
Na decisão de fl. 23, foi concedido o benefício da gratuidade de justiça à parte autora, indeferido o pedido liminar e determinada a citação da parte demandada.

Citada (fl. 25), a parte ré apresentou contestação (fls.
26/28). Arguiu, em preliminar, a decadência da pretensão deduzida na inicial, com base no prazo estipulado pelo art. 1.302 do Código Civil. No mérito, destacou que os muros divisórios das propriedades pertencem a ambos os proprietários confinantes, nos termos do art. 1.297, § 1º, do Código Civil, motivo pelo qual ambos tem o dever de mantê-los e preservá-los, e que no caso dos autos, houve ajuste entre as partes no sentido de que a colocação de algerosas na parte superior do muro construído pela autora justamente visava a preservação do mesmo. Impugnou a alegação de que houve invasão da propriedade da autora, indicando que apenas houve a realização de manutenção externa do prédio limítrofe, devidamente comunicada à família da requerente. Controverteu o pedido indenizatório pelos supostos danos causados na residência da autora, destacando que eventuais respingos de tinta e o rompimento de uma antena de TV jamais chegariam ao valor indicado como necessário à manutenção da propriedade da requerente (R$ 10.800,00). Impugnou, também, a pretensão indenizatória por dano moral, bem como os laudos juntados aos autos pela requerente, sob a justificativa de que foram subscritos pela filha e pelo genro da autora. Requereu, ao final, a improcedência dos pedidos. Juntou documentos (fls. 29/31).
Houve réplica (fls. 33/41).
Durante a instrução, foram ouvidas duas testemunhas arroladas pela parte ré (termo de fl. 59), bem como expedido ofício ao Município de Campo Bom para que informasse a data em que foram edificados os imóveis objeto do litígio (fl. 54), tendo a resposta ao ofício sido aportada à fl. 63 dos autos, acerca da qual ambas as partes se manifestaram (autora, às fls.
66/67; ré, à fl. 68).
Na decisão de fl. 69, foi deferido o pedido de realização de prova pericial, sendo apresentados quesitos e assistente técnico às fls.
72/74 (autora) e 75 (ré).
O laudo pericial foi aportado aos autos às fls.
92/119, tendo a parte ré apresentado quesitos complementares às fls. 123/124, respondidos pela expert às fls. 130/151.
Encerrada a instrução (fl. 155), a parte ré apresentou suas respectivas razões finais escritas (fls.
161/166), enquanto a parte autora não manifestou-se no prazo legal que lhe foi concedido (certidão de fl. 168v).
Na decisão de fl. 169, foi determinada a intimação da parte autora para que se manifestasse acerca do interesse na realização de audiência de conciliação.

A autora manifestou desinteresse na realização de audiência conciliatória, em razão de sua dificuldade de locomoção para comparecimento ao ato, em razão da avançada idade, mas propôs que a parte requerida peticionasse nos autos com proposta para pagamento de indenização por danos materiais e morais (fl. 171).

A parte ré não apresentou proposta de acordo no prazo de 60 (sessenta) dias que lhe foi concedido (certidão de fl. 174v).

Vieram os autos conclusos para sentença.

Relatei. Decido.
O feito transcorreu normalmente e não há nulidades a serem sanadas.
Analiso, de início, uma questão prejudicial de mérito suscitada pela parte demandada pendente de análise.

1. Prejudicial de mérito.
1.1. Da decadência.

A parte ré alegou, em preliminar de contestação, a decadência da pretensão deduzida na inicial, com base no prazo estipulado pelo art. 1.302 do Código Civil, sob o fundamento de que a ação tem como objeto pretensão demolitória de obra que teve sua construção finda muitos anos antes do ajuizamento da demanda.
O Código Civil assegura ao proprietário de bem imóvel o direito de construir, nos seguintes termos:

“Art. 1.299. O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.”

Por outro lado, o lesado só pode exigir o desfazimento de janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio quando reclama no lapso de ano e dia do término da construção, conforme dispõe o art. 1.302 do Código Civil, de seguinte redação:

“Art. 1.302. O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho.
Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade.”

Anteriormente, o art. 576 do Código Civil de 1916 previa o seguinte:

"O proprietário, que anuir em janela, sacada, terraço, ou goteira sobre o seu prédio, só até o lapso de ano e dia após a conclusão da obra poderá exigir que se desfaça"

Com efeito, a Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça1 firmou entendimento no sentido de que:

“O prazo decadencial de ano e dia para a propositura da ação demolitória previsto no art. 576 do Código Civil/1916 é limitado às espécies nele mencionadas: janela, sacada, terraço, goteira ou similares”

No caso dos autos, conforme se depreende do item nº “2.2.)” dos pedidos petição inicial (fl. 08), a autora objetiva a “demolição e/ou retirada de todas as algerosas instaladas indevidamente e ilicitamente, pois não estava presente qualquer autorização prévia para utilização da área privativa da requerente.” (fl. 08).
Segundo informação extraída do site “www.engenhariacivil.com.br”2, algerosa é o “Termo utilizado no Brasil para designar os elementos impermeáveis, geralmente metálicos, utilizados para escoar a água das chuvas proveniente da cobertura de um edifício, impedindo a infiltração pelas paredes e laje de cobertura.”
.
Logo, por se tratar de uma edificação suspensa, tenho que o prazo decadencial previsto no art. 1.302 do Código Civil incide na situação em concreto.

Cumpre, então, verificar qual foi a data da conclusão da edificação que é objeto da pretensão demolitória veiculada na petição inicial.

Segundo a informação prestada pelo MUNICÍPIO DE CAMPO BOM na resposta do Ofício nº 348/2015, o CONDOMÍNIO PIO XII, situado na Rua João XXIII, nº 90, foi edificado em 30.09.1981 e recebeu Carta de Habilitação em 24.02.1983, enquanto a casa pertencente à autora, situada na Rua João XXIII, nº 80, foi edificada em 15.02.1978 e recebeu Carta de Habilitação em 17.02.1982 (fl. 63).

Logo, por se tratar de obra edificada mais de 30 (trinta) anos antes do ajuizamento da ação, seria o caso, em princípio, de acolhimento da prejudicial de mérito suscitada pela parte ré e, consequentemente, extinção do processo com resolução de mérito (art. 487, II, do CPC) em relação ao pedido demolitório, em razão do transcurso do prazo decadencial de que trata o artigo 1.302 do Código Civil.

Contudo, a parte autora alega que a edificação objeto da pretensão demolitória (algerosas instaladas em cima do muro de propriedade da autora) foi finalizada em agosto de 2012, motivo pelo qual não houve o transcurso do prazo de ano e dia previsto no Código Civil.

O laudo pericial produzido em juízo, por sua vez, não especifica o ano em que foi concluída a construção do muro existente na propriedade da autora, tampouco a
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