Acórdão nº 50002903020218210099 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50002903020218210099
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002002104
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000290-30.2021.8.21.0099/RS

TIPO DE AÇÃO: Direitos da Personalidade

RELATOR: Desembargador JOAO BARCELOS DE SOUZA JUNIOR

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo MUNICÍPIO DE GENERAL CÂMARA, em face da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na ação cominatória ajuizada por ALBA VALERIA FALEIRO DELAVALD em desfavor do ora recorrente e do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. O dispositivo da sentença restou assim definido (evento 41 dos autos originários):

Ante o exposto, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTES os pedidos para confirmar a antecipação de tutela de avaliação/internação, determinando a manutenção do acompanhamento/internação de Rogério Delavald enquanto necessário e adequado ao caso, tudo a cargo do Estado do Rio Grande do Sul e do Município de General Câmara.

O Estado do Rio Grande do Sul fica isento do pagamento das custas e da taxa judiciária, na forma do art. 11, da Lei Estadual nº. 8.121/85, e do art. 2º, da Lei nº 8.960/89 (em atenção ao julgamento da ADIN 70041334053 que declarou inconstitucional a Lei Estadual nº 13.471/2010).

O Município arcará com o pagamento das custas por metade (artigo 11, alínea a, da Lei nº. 8.125/85), mas com a totalidade da taxa judiciária e das despesas processuais (artigo 6º, "c", da Lei n.º 8.121/85).

O Município de General Câmara arcará com o pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 300,00, a ser revertido em prol do FADEP, observado o disposto no art. 85 do CPC (O Estado do Rio Grande do Sul não pagará honorários, nos termos da fundamentação).

Em favor do defensor dativo de Rogério, fixo honorários em R$ 150,00, a serem suportados pelo Estado do RS.

Com o trânsito em julgado, nada mais pendente, arquivem-se os autos com baixa.

Em suas razões (evento 56 dos autos de origem), a parte apelante sustentou que, nos termos do art. 196 da Constituição Federal, a responsabilidade do Estado do Rio Grande Sul é primária. Reputou que o Município não possui qualquer ingerência acerca das vagas disponibilizadas na Central de Leitos do Estado. Reputou estar afastada sua responsabilidade, considerando que sua competência é apenas para atendimentos de atenção básica. Argumentou que não cabe a condenação em custas, nos termos do art. 5º da Lei 14.634/14. Referiu que a verba honorária foi arbitrada em quantia elevada. Requereu o provimento do recurso, com a reforma da sentença hostilizada.

Foram apresentadas contrarrazões (eventos 61 e 63 dos autos originários).

O Ministério Público nesta Instância, em parecer (evento 13), opinou pelo parcial provimento do recurso.

Retornaram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Infere-se dos autos que Alba Valeria Faleiro Delavald ajuizou ação cominatória em favor de Rogério Delavald contra o Município de General Câmara e o Estado do Rio Grande do Sul, visando compelir os réus ao fornecimento de internação compulsória urgente.

A parte autora sustentou que Rogério Delavald é portador de Transtorno ansioso não especificado (CID F41.9), sofrendo de grave quadro de ansiedade, bem como rejeitando os tratamentos indicados, de modo que necessita internação psiquiátrica com urgência.

A ação foi julgada procedente e, desta decisão, recorre o Município.

A insurgência merece parcial acolhida.

Inicialmente cabe dizer que o direito à vida - e, por consequência, à saúde - é o maior e o primeiro dos direitos assegurados pela Constituição Federal. Trata-se de direito inviolável que pressupõe vida digna, saudável, amparada, física e moralmente íntegra e com assistência médico-hospitalar.

A responsabilidade para cuidar da saúde e da assistência pública é compartilhada entre a União, os Estados e os Municípios (art. 23, II, CF), sendo o sistema de saúde, instituído pelo SUS, administrado sob a forma de co-gestão, portanto, nada impede que o cidadão exija o cumprimento da obrigação de qualquer dos entes públicos.

Desnecessário se prolongar sobre a legitimidade passiva do réu, vez que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento de recurso que foi reconhecida repercussão geral, reafirmou seu entendimento no sentido de que a responsabilidade dos entes federados, nos casos envolvendo fornecimento de tratamento médico aos necessitados, é solidária (Tema nº 793):

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.

(RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015).

Não se está aqui a contrariar aos princípios da separação dos Poderes, da reserva do possível, da igualdade, da isonomia e da universalidade, vez que se está apenas reconhecendo direitos fundamentais constitucionalmente assegurados a todo cidadão, como é o caso do direito à vida, à saúde e à dignidade (artigos 1º, III, , caput e 6º, da CF/88).

A Constituição Federal estabelece ao Poder Público o cuidado com os idosos:

Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.

Compete, portanto, aos entes públicos a obrigação de assegurar aos cidadãos o recebimento de medicamentos/procedimentos, bem como realizar qualquer medida indispensável, caso seja necessária e imprescindível e não possam ser adquiridos por contra própria, independente da razão.

No caso, os documentos dos autos indicam que Rogério Delavald é acometido de transtorno de ansiedade grave associado a apneia do sono (CID 10 F41.9), e necessita de internação hospitalar especializada em psiquiatria (Evento 1 - LAUDO7 dos autos originários).

Além disso, restou comprovado igualmente que a parte não possui condições de arcar com os custos da internação postulada, já que percebe mensalmente proventos de aposentadoria no valor líquido de R$ 2.484,58 (Evento 1- OUT3).

Assim sendo, o que se extrai do caso é que, tendo por pressuposto a legislação aplicável à espécie e demonstrada a gravidade da situação, inequívoca a obrigação dos réus de providenciar a internação do autor em hospital psiquiátrico, haja vista que possui estado grave de saúde e se tratar de pessoa hipossuficiente.

Por outro lado, assiste razão ao recorrente no que tange à isenção das custas processuais.

A Lei Estadual nº 14.634/2014, a qual instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais, impõe o descabimento da condenação do ente público ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 5º, I, in verbis:

Art. 5.º São isentos do pagamento da taxa:

I - a União, os Estados, os Municípios, os Territórios Federais, o Distrito Federal e as respectivas autarquias e fundações;

Também deve ser observado o disposto no artigo 11, da lei nº 8.121/1985, que assim ressalva:

Art. 11 - As Pessoas Jurídicas de Direito Público são isentas do pagamento de custas, despesas judiciais e emolumentos no âmbito da Justiça Estadual de Primeiro e Segundo Graus.

Em assim sendo, descabe a condenação do ente público ao pagamento das custas processuais para as demandas ajuizadas após a vigência da lei estadual nº 14.634/2014, ressalvado o reembolso.

A jurisprudência desta Corte é neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICÍPIO DE PINHEIRO MACHADO. DAER/RS. DEMANDA PROPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBL...

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