Acórdão nº 50002925220148210064 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50002925220148210064
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003229722
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000292-52.2014.8.21.0064/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por dano material

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO SCHREINER PESTANA

APELANTE: ODAIR LIBERATO RODRIGUES DE BITENCOURT (AUTOR)

APELADO: RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

A princípio, adoto o relatório da sentença, in verbis:

ODAIR LIBERATO RODRIGUES DE BITENCOURT ajuizou a AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS em face de AES SUL DISTRIBUIDORA GAÚCHA DE ENERGIA SA, ambos qualificados nos autos, alegando, em síntese, que nos dias 18 e 19 de novembro de 2012, na localidade denominada 1º Distrito Taperinha – Santiago, houve uma sobrecarga na rede que alimenta a sua residência, levando a ocorrência de um curto circuito na luminária do teto de um dormitório, ocasionando uma faísca que caiu sobre a cama que veio a incendiar, queimando móveis e danificando janelas e a pintura local. Disse que em razão da incidência de raios, o transformador teve uma sobrecarga e “estourou”. Salientou que sua residência era guarnecida por móveis antigos de grande valia. Afirmou que em decorrência do incêndio teve os seguintes danos materiais: queima parcial da rede elétrica interna da residência, queima total de uma janela de madeira com veneziana medindo 1,25x2,0, queima total dos móveis que guarneciam o quarto onde ocorreu a explosão do curto elétrico, queima de dois colchões de casal, mapeamento completo do reboco de todas as paredes do dormitório, danificação da pintura de toda a peça, corredor e dormitório adjacentes e destruição da luminária do dormitório. Afirmou que os danos foram avaliados em R$ 23.465,76 (vinte e três mil, quatrocentos e sessenta e cinco reais, setenta e seis centavos). Disse que requereu, administrativamente, o ressarcimento pelos danos ocasionados pelo sinistro, todavia, não obteve êxito. Reiterou que o incêndio não decorreu de sobrecarga de energia na rede elétrica que abastece sua residência. Salientou que além do prejuízo econômico sofreu dano moral que merece ser indenizado. Requereu a condenação da ré no pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 23.465,76 (vinte e três mil, quatrocentos e sessenta e cinco reais, setenta e seis centavos) e dano moral em valor a ser arbitrado pelo Juízo. Postulou a inversão do ônus da prova e a concessão da AJG. Anexou documentos (fls. 15/33, 37).

Intimado para comprovar a necessidade da AJG, o autor recolheu as custas do processo, fls. 34, 36.

Recebida a inicial à fl. 38.

Citada a ré ofereceu contestação alegando que não existem nos autos os requisitos necessários para que configurasse o dever da concessionária de indenizar. Discorreu sobre a impossibilidade de inversão do ônus da prova. Descreveu o regime de responsabilidade da AES Sul. Ressaltou que não há nenhuma prova que indique que o incêndio pode ter sido causado em razão da prestação dos serviços da empresa ré. Frisou que cabe à parte autora o ônus da prova. Disse que a responsabilidade pela adequação técnica e segurança das instalações elétricas são do proprietário e que, portanto, não há nenhum ato ilícito passível de ser indenizado. Contestou o pedido de indenização por dano material em face a ausência de falha na prestação dos serviços. Disse inexistir dano moral indenizável. Requereu a improcedência da ação. Anexou documentos (fls. 59/78).

Houve réplica (fls. 81/88).

Manifestações das partes e documentos anexados aos autos.

Na decisão de fl. 227 foi determinada a retificação do polo passivo passando a constar a RGE.

Laudo pericial juntado aos autos (fls. 245/282).

Durante a instrução do processo foram ouvidas 03 (três) testemunhas (fls. 295/296).

As partes ofereceram memoriais (fls. 299/303, 304/318).

Sem mais, vieram os autos conclusos para sentença.

Sobreveio decisão:

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos ajuizados por ODAIR LIBERATO RODRIGUES DE BITENCOURT em face da RGE SUL DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A, nos termos do artigo 487, inciso I1 do CPC.

Condeno a parte demandante ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, o que faço com base no que dispõe o artigo art. 85, § 2º, incs. I, II, III e IV do CPC2.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Apela o autor sustentando ter demonstrado o nexo de causalidade entre os danos e o agir da ré. Refere que toda a prova constante nos autos embasa a tese inicial, com exceção da perícia a qual pugna seja desconsiderada. Diz que a prova técnica foi realizada muito tempo depois do incêndio, não sendo apta a evidenciar as origens do problema. Vergasta as respostas vagas do perito. Destaca as fotografias e o laudo técnico juntados com a inicial, pois realizados logo após o infortúnio. Reclama do adiamento da prova técnica em razão da desídia da ré que não juntou a documentação necessária, com objetivo procrastinatório. Diz que sempre zelou por sua propriedade, inexistindo qualquer problema na rede elétrica, sempre adequada com fios novos e disjuntores corretos. Afirma que o julgador não está adstrito às conclusões do laudo pericial e destaca os depoimentos testemunhais. Pugna pela reforma da sentença no sentido da procedência da ação.

Com contrarrazões, subiram os autos digitalizados.

É o relatório.

VOTO

Colegas.

Da prova pericial.

Com efeito, cabe ao julgador determinar a produção das provas que entenda pertinente para o deslinde do feito e indeferir aquelas inaptas à solução do litígio, conforme disposto no art. 370, caput, e parágrafo único, do CPC.

In casu, a perícia foi realizada nos autos de forma regular, por profissional habilitado, com a observância do contraditório. Houve análise de todos os elementos e respostas a diversos quesitos.

O fato de o expert realizar vistoria no local do incêndio anos depois do ocorrido não denota qualquer nulidade ou carência na prova. O profissional responde às questões com base no aspecto técnico, justificando, inclusive, os pontos que não podem ser afirmados pela decorrência do tempo.

Tal prova técnica, somada às demais provas apresenta-se suficiente ao deslinde da controvérsia, inexistindo nulidade tão somente a partir da discordância da parte com o seu resultado.

Friso que assiste razão ao apelante quando diz não estar o julgador adstrito ao laudo pericial. Efetivamente, tenho que todo o acervo probatório deve ser sopesado. Sob esse prisma é que analiso o caso em comento.

Do mérito.

Cuida-se de pedido reparatório por danos materiais e morais escorado na ocorrência de incêndio na residência do autor, fato cuja responsabilidade é atribuída à concessionária do serviço de energia elétrica.

De pronto, cabe assentar que a despeito de a concessionária demandada, na condição de pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, ter os limites de sua responsabilidade civil estabelecidos no artigo 37, § 6° da Constituição Federal, tratando-se, pois, de responsabilidade objetiva, ao consumidor subsiste a incumbência de evidenciar o dano e o nexo de causalidade entre a ação ou omissão do fornecedor de serviços e os prejuízos experimentados.

Sobre o tema, é da jurisprudência desta Corte:

Ementa: Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação indenizatória. Incêndio em imóvel. Alegação de que o incêndio teria sido causado por falha na prestação do serviço de distribuição de energia elétrica. Concessionária de serviço público. Embora tratar-se de responsabilidade objetiva, não restou demonstrado o nexo de causalidade entre os danos suportados e a suposta falha na prestação de serviço. Conjunto probatório insuficiente para amparar a responsabilidade das requeridas pelos danos suportados pelos autores. Inteligência do art. 373, I, do Código de Processo Civil. Sentença reformada. Apelos providos. Recurso adesivo prejudicado. (Apelação Cível Nº 70070258793, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em 27/10/2016) - grifei.

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. INCÊNDIO. QUEDA DE POSTE. AUSÊNCIA DE PROVA DO NEXO CAUSAL. FATO CONSTITUTIVO. 1. A concessionária responsável pelo fornecimento de energia elétrica responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor, independentemente de culpa, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Consumidor. Desde que comprovada a ocorrência do fato, do prejuízo dele advindo e do nexo causal, impõe-se o dever de indenizar. 2. A parte autora não se desincumbiu do ônus de comprovar o fato constitutivo do seu direito, pois não demonstrado que o incêndio em sua residência tenha sido originado pela queda do poste em área próxima. Perícia que não alcança essa conclusão e prova testemunhal pouco esclarecedora. 3. Sucumbência recursal. Honorários advocatícios devidos pela parte autora majorados, nos termos do art. 85, §11, do NCPC. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70071858096, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em 29/03/2017) - grifei.

E da doutrina a respeito do nexo de causalidade, vale referir:

O nexo causal é o segundo pressuposto da responsabilidade civil a ser examinado. Trata-se de noção aparentemente fácil, mas que, na prática, enseja algumas perplexidades. A rigor, é a primeira questão a ser enfrentada na solução de qualquer caso envolvendo responsabilidade civil. Antes de decidirmos se o agente agiu ou não com culpa teremos que apurar se ele deu causa ao resultado.

(...)

Em suma, o nexo causal é um elemento referencial entre a conduta e o resultado. É através dele que poderemos concluir quem foi o causador do dano.

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