Acórdão nº 50002990820208210105 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 14-06-2022

Data de Julgamento14 Junho 2022
Classe processualApelação
Número do processo50002990820208210105
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002129531
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000299-08.2020.8.21.0105/RS

TIPO DE AÇÃO: Seguro

RELATOR: Juiz de Direito FELIPE KEUNECKE DE OLIVEIRA

APELANTE: CARDIF DO BRASIL VIDA E PREVIDENCIA S/A (RÉU)

APELADO: DJESSICA RAABE (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação interposta por CARDIF DO BRASIL VIDA E PREVIDÊNCIA S/A em face da procedência da Ação Ordinária de Cobrança nterporta pela apelada DJESSICA RAABE contra BNP PARIBAS CARDIF DO BRASIL VIDA E PREVIDÊNCIA (evento 29, SENT1).

Em suas razões a apelalante, resumidamente, sustenta que há nos autos farta documentação para comprovar a má-fé da segurada na contratação. Refere que quando da assinatura da proposta de adesão, a segurada declarou estar em perfeitas condições de saúde, não possuir doença preexistente à contratação, fato que afasta a obrigação da Cia em solicitar exames prévios. Assim, requereu a reforma da sentença, para o fim de que seja julgada totalmente improcedente pelos fatos e fundamentos narrados no presente recurso, afastando a condenação imposta à seguradora (evento 45, OUT1).

A apelada apresentou contrarrazões de apelação. Nessas sustentou que a seguradora apelante sempre esteve ciente do estado de saúde do consumidor/contratante. A documentação comprabatória do estado de saúde do contratante/falecido foi apresentado por ele quando da contratação do financiamento/seguro. Assim, deveria a ré denegar a apólice e/ou rejeitar a contratação. Todavia, a ré, ora apelante, recebeu os valores do prêmio, negou a cobertura e se utiliza dos documentos apresentados pelo próprio falecido como causa furtiva ao comprimento de sua obrigação. Por fim, sustente que se Leo estivesse mesmo imbuído de má-fé teria financiando a maior parte do valor do veículo adquirido, e não pouco mais de 6 mil reais frente aos mais de 40 mil reais pagos pelo bem (evento 48, CONTRAZAP1).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso de Apelação.

Eminentes Desembargadores, conforme sumariamente exposto, trata-se de Apelação interposta por CARDIF DO BRASIL VIDA E PREVIDÊNCIA S/A, contra sentença que julgou procedente o pedido condenatório.

A sentença foi proferida pelo Juízo da Vara Judicial da Comarca de Ibirubá e assim restou fundamentada (Evento 29, SENT1 – processo originário):

"(...)

DJÉSSICA RAABE, já qualificada nos autos, ajuizou Ação Ordinária de Cobrança contra BNP PARIBAS CARDIF DO BRASIL VIDA E PREVIDÊNCIA, narrando que é irmã e única herdeira do falecido LEO GUSTAVO RAABE. Expôs que o “de cujus” Leo havia adquirido um veículo Ford, modelo New Fiesta Sedan 1.6, cor branca, ano/mod 2015, placas IWQ8558, pelo valor de R$ 43.000,00, efetuando o pagamento de 40.000,00 (quarenta mil reais) à vista e financiando o saldo de R$ 3.500,00. Referiu que por ocasião da contratação do Financiamento do saldo junto à BV Financeira, foi incluído no “pacote” do financiamento o “Seguro Prestamista” junto à Seguradora-ré, conforme Cédula de Crédito Bancário 420724419. Repisou que o SEGURO PRESTAMISTA foi contratado obrigatoriamente por Leo, junto com o financiamento, com o pagamento do prêmio único total, conforme Certificado nº 1389420501. Consignou que apesar de sua tenra idade e do contrato de financiamento ser de curta duração, ou seja, apenas 12 meses, Leo veio a falecer na data de 07/06/2018. Gizou que postulado administrativamente o pagamento do saldo devedor do financiamento na data do evento (óbito), este foi negado. Destacou que segundo o Certificado do Seguro, em caso de Morte, haveria o pagamento do saldo devedor das parcelas do financiamento que estivessem em aberto. Ressaltou que para não macular o nome/imagem do falecido irmão, efetuou o pagamento das parcelas em aberto do financiamento, ou seja, 11 (onze) parcelas de R$ 642,00 (seiscentos e quarenta e dois reais), cada parcela, totalizando R$ 7.062,00. Asseverou que propõe a presente ação para ser ressarcida dos pagamentos dessas parcelas que deveriam ser pagos pela ré junto à BV financeira. Enfatizou que o contrato em tela foi avençado entre Leo Gustavo Raabe e a seguradora-requerida com o objetivo de garantir o pagamento de indenização ou reembolso à própria segurada ou ao seu beneficiário caso ocorresse algum dos eventos cobertos pelas garantias específicas do plano contratado, decorrendo o pacto da livre manifestação de vontade. Mencionou que os artigos 757, e seguintes do Código Civil, disciplinam os contratos de seguro, dispondo sobre o pagamento de prêmio à seguradora, cuja contraprestação desta será a de indenizar o segurado ou seu beneficiário na hipótese de ocorrer, no futuro, acontecimento danoso incerto, mas possível de se verificar, o qual é garantido contratualmente. Invocou a Súmula nº 609, do STJ.

Pediu a procedência dos pedidos da ação, com a condenação da Ré ao pagamento de R$ 7.062,00 devidamente, acrescidos dos consectários legais.

Juntou Procuração (fl. 15) e documentos (fls. 17-38).

Decisão à fl. 40, deferindo a gratuidade judiciária à autora.

A ré foi citada e contestou a ação (fls. 51-63), pugnando pela suspensão do feito até a regularização do pólo ativo da demanda, visto que a autora não comprovou ser inventariante dos bens deixados pelo “de cujus”. No mérito, invocou a preexistência da patologia que acometia o segurado. Ressaltou que o segurado tinha inequívoco conhecimento da patologia preexistente que o acometia. Afirmou que após análise da documentação fornecida pela parte-autora para regulação do sinistro, dentre ela prontuários médicos, restou constatada existência de risco excluído de cobertura pela preexistência da doença que levou o segurado a óbito, declarada na própria certidão de óbito – infarto agudo do Miocárdio, metásteses hepática/pulmonar, Neoplastia gástrica. Alegou que não há dúvidas quanto a preexistência da doença causa do óbito e da inequívoca ciência pelo segurado à época da contratação, que, no entanto, declarou perfeito estado de saúde, faltando com verdade para contratação de seguro que não correspondia ao risco efetivo.

Pediu a improcedência da demanda.

Juntou Procuração e documentos.

Houve réplica (fls. 86-89).

Despacho à fl. 105, determinando que as partes especificassem as provas que pretendiam produzir.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

Decido.

Merece prosperar a pretensão condenatória da autora.

De início, ressalto que a preliminar de defeito de representação restou sanada com a juntada do documento das fls. 91/92 e 94- 99, onde a ora autora foi nomeada Inventariante dos bens deixados pelo seu falecido irmão.

Feito esse destaque inicial, passo a julgar o mérito da lide submetida ao crivo judicial.

Constitui entendimento jurisprudencial consolidado no STJ (Súmula nº 609) e no TJRS o de que para que a seguradora possa se valer da alegação de doença pré-existente, com o fito de ser exonerada do pagamento da indenização securitária, esta deve exigir a realização de exames prévios ou comprovar a efetiva má-fé do segurado.

Nesse diapasão:

APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO DE VIDA PRESTAMISTA. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DOENÇA PRÉ-EXISTENTE SUPRIMIDA E MÁ-FÉ DO SEGURADO. INEXISTÊNCIA. APLICABILIDADE DA SÚMULA 609 DO STJ. SALDO DEVEDOR EM FAVOR DO BENEFICIÁRIO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA DEVIDOS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. Trata-se de ação indenizatória, na qual a parte autora pretende a condenação do demandado ao pagamento de indenização securitária, em razão do falecimento do segurado, julgada parcialmente procedente na origem. Da cobertura securitária - De acordo com a jurisprudência consolidada no egrégio STJ, para que a seguradora possa valer-se da alegação de doença pré-existente, com o fito de ser exonerada do pagamento da indenização securitária, esta deve exigir a realização de exames prévios ou comprovar a efetiva má-fé do segurado. Precedentes jurisprudenciais específicos. Consoante as regras contidas nos artigos 765 e 766 do Código Civil, determinam que tanto o segurado quanto a seguradora devem ser regidos pela boa-fé e veracidade no contrato, bem como que o segurado perde o direito ao seguro garantido se omitir informações que possam influir no contrato. Nos termos do recente enunciado do egrégio STJ –Súmula 609, restou consolidado que a recusa de cobertura securitária sob alegação de doença preexistente é ilícita se não houve a exigência de exames prévios à contratação ou à demonstração de má-fé do segurado. Nesse contexto, diante do enunciado consolidado, o qual me alinho, considerando no caso em concreto, que não houve a exigência de exames prévios à contratação, que demonstrasse tratar-se de doença preexistente, ou à suposta má-fé do segurado. Não se vislumbra, no caso em concreto, a má-fé do segurado em contratar seguro de vida, na intenção de receber a indenização securitária, pois supostamente seria portador de doença pré-existente, como pretende fazer crer a demandada. Por último, não posso olvidar que a atividade lucrativa é da empresa de crédito ou de seguro, de tal sorte que os riscos dessa atividade não podem ser debitados sobre o consumidor-segurado, mas ela própria responder se não se acautelou suficientemente. Essa é exatamente a situação dos autos, a seguradora, ora demandada, não se precatou de tal maneira a minimizar os riscos de seu próprio negócio, pois deveria ter exigido a realização de exames médicos prévios. Assim não fez, por isso deve arcar com o resultado e com o risco do negócio entabulado, mormente porque sempre recebeu o prêmio correspondente. Outrossim, impende referir que mesmo que admitida a existência de doença anteriormente à contratação do seguro, tal fato não tem o condão de comprovar a má-fé do...

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