Acórdão nº 50003039120198210101 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 29-01-2021

Data de Julgamento29 Janeiro 2021
Classe processualApelação
Número do processo50003039120198210101
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20000466906
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000303-91.2019.8.21.0101/RS

TIPO DE AÇÃO: Direito de Vizinhança

RELATOR: Desembargador GIOVANNI CONTI

APELANTE: MOACIR VARGAS RIBEIRO (AUTOR)

APELADO: MARIA BEATRIS VARGAS RIBEIRO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por MOACIR VARGAS RIBEIRO contrário à sentença que julgou extinta a ação demolitória ajuizada em desfavor de MARIA BEATRIS VARGAS RIBEIRO.

A fim de evitar tautologia, colaciono a decisão ora recorrida:

"Vistos.

Passo ao saneamento do feito.

1. Preliminares:

Não há preliminares a serem enfrentadas.

2. Mérito

2.1. Prefaciais: decadência e prescrição

Arguiu a parte requerida a decadência do direito postulado pela parte autora, com base no art. 1302 do CC, o que tenho por acolher.

Com efeito, dispõe o referido artigo que:

O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho.

Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado, igualmente, possui entendimento que o prazo decadencial para exercer a pretensão demolitória é de ano e dia.

A corroborar:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITOS DE VIZINHANÇA. AÇÃO DEMOLITÓRIA. ART. 1.302 CC. PRAZO DE ANO E DIA. NÃO OBSERVADO. SITUAÇÃO CONSOLIDADA HÁ 24 ANOS. DECADÊNCIA IMPLEMENTADA. IMPOSSIBILIDADE DE DESFAZIMENTO DA OBRA. PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL. TRANSCORRIDO. PROIBIÇÃO DE COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. POIS A PARTE ESTAVA PRESENTE E ANUIU COM A REGULARIZAÇÃO DA OBRA DURANTE ASSEMBLEIA GERAL CONDOMINIAL. - Na hipótese a parte autora, ora apelante, sustenta que as obras denunciadas foram erigidas sobre dutos de esgoto, o que é irregular e que há 24 anos vem manifestando inconformidade. - Da decadência: Não exercitada pretensão demolitória no prazo de ano e dia, não poderá mais a obra ser desfeita, conforme artigo 1.302 CC. No caso, a obra cuja demolição é perquirida, foi erigida há 24 anos. - Da prescrição: o entendimento desta Corte, acompanhando entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é de que a ação demolitória apresenta natureza real, diante de ofensa ao direito de propriedade, incidindo prazo prescricional decenal, com base no art. 205 do CC. (AG. em RESP Nº 1.070.371/RS). Houve decurso do prazo prescricional decenal. - Venire contra factum proprium: a parte autora estava presente na assembleia convocada em 2013 (fl.177) e nada opôs para que fossem regularizadas as construções em questão, permitindo concluir pelo comportamento contraditório da parte autora, que é vedado pelo ordenamento, porquanto não é razoável se admitir que uma pessoa pratique determinado ato ou conjunto de atos (no caso a anuência com a regularização da obra) e, em seguida, realize conduta diametralmente oposta. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME.

(Apelação Cível, Nº 70078762176, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em: 25-10-2018)

No caso em tela, conforme informações da própria parte requerente, a edificação da pousada ocorreu em 2002 e, em 2013, houve a ampliação do imóvel, que não havia sido averbado, sobre a divisa lateral do prédio sem respeitar o recuo exigido no PDDI do Município.

Desse modo, ultrapassado o prazo de ano e dia entre a data do término da construção e o ajuizamento da presente demanda, impondo-se a extinção do feito.

Isso posto, julgo extinto o pedido formulado por Moacir Vargas Ribeiro em face do Maria Beatriz Vargas Ribeiro Loesch, com resolução de mérito, forte no artigo 487, II, do Novo Código de Processo Civil.

Sucumbente, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios ao patrono da parte ré, que fixo 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, parágrafo 2º, do Novo Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Com o trânsito em julgado, baixe-se."

Irresignada, a parte autora interpôs recurso de apelação. Em suas razões (Evento 26), sustentou que o juízo a quo julgou extinta a ação por implemento do prazo decadencial. Aduziu que há pedido alternativo de compensação indenizatória, havendo a extinção da ação de forma prematura. Relatou que não há no presente caso a ocorrência de decadência ou prescrição, pois em 2013 efetuou denúncia junto ao Órgão Municipal, não ficando inerte. Mencionou que até o presente momento, o embargo não restou levantado, bem como que por diversas vezes se dirigiu ao órgão competente solicitando informações, lhe sendo repassado somente que o processo de embargo se encontra em andamento para regularização da construção. Explanou que pela inércia do ente público municipal, recorreu ao Ministério Público, que exarou manifestação no sentido de que o ato irregular não se consolida, ou seja, não há que se falar em prescrição ou decadência na presente situação. Informou não ter sido comprovado nos autos que a situação da obra foi regularizada. Discorreu sobre o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (AG. em RESP Nº 1.070.371/RS) de que a ação demolitória apresenta natureza real, diante da ofensa ao direito de propriedade, incidindo o prazo prescricional decenal, com base no art. 205 do Código Civil. Alegou que além do requerimento de desfazimento da obra, na peça inicial consta pedido indenizatório em razão dos danos suportados por consequência das irregularidade ocasionadas pelo réu. Postulou pelo afastamento da extinção da ação, com a desconstituição da sentença com o retorno dos autos ao primeiro grau para enfrentamento do pedido indenizatório com a produção de provas. Ao final, pugnou pelo provimento do recurso.

Intimada, a parte ré apresentou contrarrazões ao Evento 29.

Os autos vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

Conheço do recurso porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Trata-se de ação de demolição com indenização em face de construção de muro em linha divisória, sob o fundamento de desrespeito ao recuo lateral, cumulado com pedido indenizatório.

Em contestação a ré alegou decadência em relação à demolição da obra edificada parte em 2004 e parte em 2013, pois a presente ação foi ajuizada no ano de 2019. Pugnou ainda pela aplicação da prescrição quanto ao pedido de indenização por perdas e danos, postulando pelo reconhecimento da prescrição trienal do art. 206, §3º, V do CC.

O juízo a quo julgou extinta a ação acolhendo o requerimento de decadência do direito postulado pelo autor.

Por consequência, este interpôs o presente recurso postulando a reforma da sentença de primeiro grau.

Pois bem.

Da decadência.

Não exercitada pretensão demolitória no prazo de ano e dia, não poderá mais a obra ser desfeita, passando a incidir presunção absoluta de que o proprietário anuiu, ainda que tacitamente, com a obra do vizinho.

Isto é o que assegura o artigo 1.302 do CC:

Art. 1.302. O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho.

Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade.

Assim, superado prazo de ano e dia, não poderá a parte exigir o desfazimento da obra. Nesse mesmo sentido, Pablo Stolze1 leciona que:

"Permanece, na mesma linha, a possibilidade de se pleitear a demolição da obra irregular, desde que seja observado o prazo de “ano e dia após a conclusão da obra”, observando-se, também, as normas do procedimento comum. Uma vez ultrapassado o prazo, o proprietário não poderá mais exigir o desfazimento, e, se pretender construir, deverá respeitar a distância mínima prevista em lei."

No caso dos autos, o conjunto de provas demonstra que parte do imóvel foi edificado no ano de 2004 ocorrendo uma reforma no ano de 2013, e a demanda foi ajuizada em 2019.

À vista disto, evidente o transcurso de mais de ano e dia do término da obra quando do ajuizamento da presente ação, estando correta a sentença de primeiro grau neste tocante.

Neste mesmo sentido é o entendimento desta Colenda Câmara Cível:

"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITOS DE VIZINHANÇA. AÇÃO DEMOLITÓRIA. ART. 1.302 CC. PRAZO DE ANO E DIA. NÃO OBSERVADO. SITUAÇÃO CONSOLIDADA HÁ 24 ANOS. DECADÊNCIA IMPLEMENTADA. IMPOSSIBILIDADE DE DESFAZIMENTO DA OBRA. PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL. TRANSCORRIDO. PROIBIÇÃO DE COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. POIS A PARTE ESTAVA PRESENTE E ANUIU COM A REGULARIZAÇÃO DA OBRA DURANTE ASSEMBLEIA GERAL CONDOMINIAL. - Na hipótese a parte autora, ora apelante, sustenta que as obras denunciadas foram erigidas sobre dutos de esgoto, o que é irregular e que há 24 anos vem manifestando inconformidade. - Da decadência: Não exercitada pretensão demolitória no prazo de ano e dia, não poderá mais a obra ser desfeita, conforme artigo 1.302 CC. No caso, a obra cuja demolição é perquirida, foi erigida há 24 anos. - Da prescrição: o entendimento desta Corte, acompanhando entendimento do Superior Tribunal de Justiça, é de que a ação demolitória apresenta natureza real, diante de...

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