Acórdão nº 50003044320168210049 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50003044320168210049
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002147350
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000304-43.2016.8.21.0049/RS

TIPO DE AÇÃO: Fornecimento de Energia Elétrica

RELATORA: Desembargadora MATILDE CHABAR MAIA

APELANTE: PROBON INDÚSTRIA DE ESTOFADOS LTDA (AUTOR)

APELANTE: RIO GRANDE ENERGIA SA (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

PROBON INDÚSTRIA DE ESTOFADOS LTDA e RGE - RIO GRANDE ENERGIA S/A interpõem recursos de apelação da sentença (evento 4, processo judicial 7, fls. 27-35, autos de origem) que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na demanda que a primeira move contra a segunda, nos termos que seguem:

Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para o fim de DECLARAR indevida a cobrança de valores resultantes da incorreta classificação tarifária, e CONDENAR a ré ao pagamento da repetição do indébito, de forma simples, dos valores cobrados em excesso no período de 10/08/2006 a 04/02/2013, acrescidos de correção monetária pelo IGP-M, desde a data dos respectivos pagamentos e com a incidência de juros de 1% ao mês, estes a contar da citação.

Face a sucumbência mínima, condeno a concessionária requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais vão fixados em 15% sobre o valor da condenação, com fulcro no art. 85, § 2º, do CPC.

Em suas razões (evento 4, processo judicial 8, fls. 15-23, autos de origem), alega que o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor prevê a devolução em dobro do indébito, devendo ser aplicada ao caso concreto. Menciona que o contido no referido dispositivo legal foi indevidamente afastado.

Informa que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que no caso de cobrança indevida de tarifa de energia elétrica a restituição dos valores cobrados a maior deve se dar em dobro.

Requer o provimento do recurso.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (evento 4, processo judicial 8, fls. 25-27 e fls. 38-39, autos de origem).

A RGE, por sua vez, recorre , arguindo, preliminarmente, a incidência da prescrição trienal - art. 206, IV, do Código Civil. Postula, sucessivamente, que seja aplicada a prescrição quinquenal prevista no artigo 76, II, da Resolução nº 456/00 da ANEEL.

Discorre sobre as modalidades de tarifa e informa que a Probon, assessorada por empresa especializada, requereu, em 2006, a migração de usa unidade consumidora para o Grupo A, apresentando projeto elétrico, que restou aprovado. Diz que houve instalação elétrica no Grupo A, no entanto, a cobrança permaneceu sendo realizada pela modalidade do Grupo B, baixa tensão, até 19-6-2007.

Refere que somente em 8-2-2013, a autora apresentou novo projeto elétrico requerendo o aumento da potência instalada - de 75kVA para 300kVA, além de alterar a tarifa de Baixa Tensão para Horo-sazonal Verde. Narra que a parte autora sempre foi assessorada por profissional especializado na área, optando por permanecer na Classe B, quando já poderia ser enquadrada na Classe A.

Argumenta caber ao consumidor informar a atividade desenvolvida na unidade consumidora e informa que a Resolução nº 456/00 da ANEEL, art. 5º, § 2º, I, da ANEEL é expressa quanto ao fato de que a alteração do regime tarifário deverá se dar quando o consumidor solicitar.

Aduz que a culpa pela escolha equivocada quanto ao enquadramento tarifário é da Probon, tendo em vista ser impossível à Concessionária aferir características específicas da unidade consumidora. Nega seja possível incluir nos valores a serem devolvidos à parte autora, as quantias pagas a título de tributos indiretos, pois não é a Concessionária a destinatária destes.

Requer o provimento do recurso (evento 4, processo judicial 8, fls. 42-50, e processo judicial 9, fls. 1-33, autos de origem).

Apresentadas contrarrazões recursais pela parte autora (evento 4, processo judicial 9, fls. 15-31), os autos foram remetidos a esta egrégia Corte de Justiça.

Em parecer (evento 8), o Ministério Público manifesta-se pelo improvimento dos apelos.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas.

Em fevereiro/2016, a Probon Indústria de Estofados Ltda ajuizou a presente demanda postulando a condenação da RGE à restituição em dobro das diferenças relativas ao equivocado enquadramento tarifário, alegando que, desde o início da relação contratual, fazia jus à tarifação horo-sazonal verde, que melhor atende aos seus interesses.

No caso vertente, verifica-se que a unidade consumidora em debate inicialmente pertencia à empresa Estofados Frizon Ltda – localizada na Rua Osvaldo Schwerz nº 113, em Frederico Westphalen. Referida empresa foi incorporada pela empresa Probon Indústria de Estofados Ltda - ora autora - conforme Sexta Alteração e Consolidação da Sociedade1, de 5-9-2013 (evento 4, processo judicial 1, fls. 28-38, autos de origem).

A empresa Estofados Frizon Ltda postulou extensão de rede de AT, em 9-8-2006, apresentando Memorial Técnico Descritivo, realizado pela COSERO - Comércio, Serviços e Projetos Ltda, bem como levantamento de carga e relação nominal dos consumidores. Referido pedido foi incluído no sistema informatizado da Concessionária (evento 4, processo judicial 3, fls. 37-42, autos de origem).

Em junho/2007, a Probon Indústria solicitou a ligação de energia elétrica à unidade consumidora objeto da demanda (evento 4, processo judicial 3, fl. 44, autos de origem).

E, em 4-2-2013, houve pedido de aumento de carga, passando de 75kVA para 300kVA. Juntamente com o pedido foi acostado Memorial Técnico Descritivo, com levantamento de carga (evento 4, processo judicial 4, fl. 3-10, autos de origem).

O contrato de fornecimento de energia elétrica nº 5354193/01, firmado em 19-3-2013, estabeleceu que o fornecimento se daria na modalidade tarifária Horária Verde, com início em 14-6-2013 (evento 4, processo judicial 4, fls. 11-23, autos de origem).

Não foi acostado ao feito, como bem referido em sentença, um único documento a demonstrar que a Concessionária ofertou à parte autora opções tarifárias "possíveis de adoção pelo consumidor, a fim de garantir sua ciência sobre a existência de outros enquadramentos mais vantajosos do que aquele inicialmente classificado para a unidade."

Registrados os documentos existentes no feito, saliento que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça aponta para a aplicação do prazo decenal previsto no art. 205 do Código Civil para a cobrança de tarifas de serviços essenciais tais como o de energia elétrica, nas hipóteses em que existe discussão acerca do adequado enquadramento tarifário.

Nesse sentido, ilustro:

ADMINISTRATIVO. ENERGIA ELÉTRICA. ENQUADRAMENTO. TARIFÁRIO. PRESCRIÇÃO. DEVER DE INFORMAÇÃO. SÚMULAS 5 E 7/STJ. 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.113.403/RJ, de relatoria do Min. Teori Albino Zavascki (DJe 15.9.2009), submetido ao regime dos recursos repetitivos do art. 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução STJ 8/2008, firmou o entendimento de que se aplica o prazo prescricional estabelecido pela regra geral do Código Civil, ou seja, de 20 anos, previsto no art. 177 do Código Civil de 1916 ou de 10 anos, nos termos do art. 205 do Código Civil de 2002. Observar-se-á, na aplicação de um e outro, se for o caso, a regra de direito intertemporal estabelecida no art. 2.028 do Código Civil de 2002. Também se adota tal orientação em relação à repetição de indébito por questão relativa ao enquadramento tarifário na prestação de serviço de energia elétrica.2. Sobre as obrigações de informação da concessionária no que se refere a regime de tarifas aplicadas, o Tribunal amparou-se em elementos fático-probatórios dos autos e no exame interpretativo de cláusulas do contrato, cuja reapreciação é inviável no âmbito do Recurso Especial, razão pela qual incidem, na espécie, as Súmulas 5 e 7/STJ. 3. Agravo Regimental não provido.

(AgRg no AREsp 122.128/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/05/2012, DJe 15/06/2012) [grifei]

Assim, relativamente às parcelas devidas decorrentes do consumo faturado a maior devido à incorreta classificação da tarifa, incide o prazo decenal previsto na regra geral do art. 205 do Código Civil.

Considerando que a demanda foi ajuizada em fevereiro/2016 e que a sentença fixou o termo inicial da revisão a data de 10-8-2006, inexistem parcelas prescritas.

Registro que a parte autora é pessoa jurídica de direito privado, no ramo de atividade comercial, e afirma que somente no ano de 2013 foi enquadrada na tarifa horo-sazonal verde.

Ressalto que a jurisprudência firmou orientação de que a relação existente entre a concessionária e o usuário final dos serviços de energia elétrica é consumerista, já que induvidosa a caracterização da primeira como fornecedor e o segundo como consumidor (arts. e do CDC)2, incidindo, por conseguinte, as regras de proteção específicas para relações de consumo.

A controvérsia, no mérito, diz respeito ao dever de informação ao consumidor, por parte da concessionária de energia elétrica, acerca da melhor opção de enquadramento tarifário quando da contratação. Sobre o tema, assim prevê o Código de Defesa do Consumidor, com a redação anterior à Lei nº 12.741/2012:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.

A Lei de Concessões (nº 8.987/95) prevê que toda a concessão pressupõe a adequada prestação de serviço, assegurado o pleno atendimento dos usuários, devendo satisfazer as condições de “regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade...

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