Acórdão nº 50003316320228210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 09-06-2022

Data de Julgamento09 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50003316320228210001
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002191260
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5000331-63.2022.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Ameaça (art. 147)

RELATOR: Juiz de Direito MAURO CAUM GONCALVES

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos pelas partes, em face da sentença que, nos autos da representação ajuizada pelo Ministério Público, em desfavor de L. S. C., M. V. B. L. e M. S. D. G. L., pela prática de atos infracionais equiparados a dano e ameaça, com base nos artigos 147, caput, e 163, parágrafo único, inciso III, ambos na forma do artigo 29, caput, todos do Código Penal, julgou parcialmente procedente o pedido, cujo dispositivo restou assim redigido:

ISSO POSTO, julgo parcialmente procedente a representação para aplicar aos representados L. S. C., M. V. B. L. e M. S. D. G. L. a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade, pelo prazo de quatro meses, quatro horas semanais, nos termos do artigo 117 do Estatuto da Criança e do Adolescente, por considerar suas condutas ajustadas ao disposto no artigo 147, caput, do Código Penal, absolvendo-os da imputação remanescente, com base no art. 189, IV, do ECA.

Em suas razões, pugnou a defesa dos representados, pela reforma da sentença proferida. Sustentaram a insuficiência probatória a ensejar a procedência da representação no tocante ao reconhecimento da prática do ato infracional de ameaça, afirmando que a palavra da vítima, além de não ter sido corroborada pelos depoimentos dos guardas municipais, cujos testemunhos não podem ser examinados como imparciais pelo Juízo, não se reveste de segurança jurídica capaz de, por si só, fundamentar a responsabilização dos adolescentes. Referiram a existência de sentimentos de ordem pessoal entre os envolvidos, destacando, ainda, não ter havido seriedade nas ameaças proferidas contra o monitor do abrigo. Mencionaram que, no momento dos fatos, com a chegada da guarda municipal, saíram do quarto e desceram tranquilamente as escadas, sem oferecer resistência, impondo-se, assim, sua absolvição e a improcedência da representação, por força da aplicação do princípio do in dubio pro reo, nos termos do artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, e artigo 189, inciso IV, do ECA. Teceram considerações acerca da prova produzida. Subsidiariamente, em sendo mantido o decisum recorrido, pugnaram pela necessidade de redimensionamento da medida socioeducativa imposta, aplicando-se, em substituição, a medida de advertência. Colacionaram jurisprudência ao sufrágio de seus argumentos, prequestionaram dispositivos legais e, ao final, pugnaram pelo integral provimento do apelo e a reforma da sentença.

Por sua vez, o Ministério Público, em suas razões recursais, insurgiu-se contra a absolvição dos representados pela prática do ato infracional equiparado ao crime de dano qualificado, bem como em relação à não inclusão da medida de liberdade assistida ao adolescente L. e à aplicação da medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade aos adolescentes M. e M. V., sustentando não ter o Juízo singular conferido a solução mais adequada para o caso. Referiu, contrariamente à conclusão adotada na fundamentação sentencial, haver restado suficientemente comprovada a prática do ato infracional de dano qualificado através dos depoimentos da vítima e das testemunhas, descrevendo os danos na cadeira e nas portas, que foram corroborados pelos relatórios fotográficos e pelo auto de avaliação indireta. Asseverou a desnecessidade de elaboração de laudo pericial direto. Mencionou que a medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade é demasiadamente branda e desproporcional aos atos infracionais praticados – danos no interior do abrigo e ameaças aos monitores –, bem como considerando a reiteração infracional apresentada pelos representados, que ostentam inúmeros registros de envolvimento em atos dessa natureza. Defendeu a necessidade de imposição de medida socioeducativa mais severa, aplicando-se ao adolescente L., em conjunto com a prestação de serviços à comunidade por quatro meses, à razão de quatro horas semanais, a medida de liberdade assistida, por, no mínimo, seis meses, considerando-se a tendência à elevação na prática de atos infracionais e a necessidade de que seja acompanhado e orientado para que se ressocialize e impeça sua escalada no mundo do crime. Quanto aos adolescentes M. e M. V., por já possuírem, à época dos fatos, sentenças condenatórias, pugnou pela aplicação da medida de internação, sem a possibilidade de atividades externas. Colacionou jurisprudência ao sufrágio de seus argumentos e, ao final, com base em tais aportes, requereu o provimento do recurso e a reforma da sentença.

Em sede de contrarrazões, as partes limitaram-se a refutar os argumentos da parte contrária, em sede recursal, reforçando os argumentos para fins de reforma do decisum.

O Ministério Público, neste grau recursal, ofereceu parecer opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso defensivo, e pelo conhecimento e provimento do recurso ministerial.

Os autos ascenderam a esta Corte, sendo a mim distribuídos.

É o relatório.

VOTO

Para a comprovação da materialidade delitiva ato infracional de ameaça, tem-se, nos autos, registro de ocorrência; o auto de avaliação indireta; as fotografias; e a prova oral carreada ao feito.

Já no que tange ao ato infracional equiparado a dano, não se mostra mostra presente a materialidade.

Segundo Cesar Roberto Bitencourt1, no delito de dano, o bem jurídico tutelado pela norma é o patrimônio, público ou privado, tanto sob o aspecto da posse quanto da propriedade. Ao contrário da maioria das infrações contra o patrimônio, não existe o animus lucrandi, que apenas eventual e excepcionalmente pode existir, desde que seja indireto ou mediato. O objeto material do crime de dano é coisa alheia, móvel ou imóvel e corpórea, já que somente esta pode ser fisicamente danificada, e deve ser alheia, pois, tratando-se de patrimônio, tem natureza de bem disponível, e dele o proprietário pode dispor, usar e gozar.

Quanto à consumação e tentativa, explica o autor2:

Consuma-se o crime com o efetivo dano causado, isto é, com a destruição, inutilização ou deterioração da coisa alheia. O dano é crime material, que só se configura quando há prejuízo para a vítima, decorrente da diminuição do valor ou da utilidade da coisa destruída, inutilizada ou deteriorada. Por isso faz-se necessária a comprovação pericial do resultado danoso, sob pena de não se tipificar a figura delituosa. Mesmo que a destruição seja parcial, desde que torne imprestável a coisa ou a inutilize, é suficiente para consumar o crime que a intenção do agente fosse a destruição total.

Assim, o dano, por ser infração que deixa vestígios, precisa ser comprovado mediante prova pericial, na forma do art. 158 do Código de Processo Penal, que ateste o prejuízo da vítima ou a diminuição do patrimônio, ainda que parcial, sob pena de não se configurar a figura delitiva.

No caso dos autos, não foi realizada perícia, impossibilitando a verificação da materialidade da figura delitiva em questão.

Note-se que as fotografias juntadas aos autos e o laudo indireto realizado, não afastam a necessidade de realização de perícia, imprescindível por expressa determinação legal.

As fotografias e o laudo indireto somente poderiam ser aceitos na impossibilidade justificada de realização do laudo, o que não ocorreu no caso concreto.

Nesse sentido:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. DANO QUALIFICADO. MANTIDA A DECISÃO QUE REJEITOU A DENÚNCIA. 1. MATERIALIDADE NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE PERÍCIA VÁLIDA. O delito é daqueles que deixa vestígios (art. 158 do CPP), sendo indispensável a perícia nos moldes estabelecidos pelo art. 159 do CPP. No caso dos autos, o auto de constatação de dano não preenche os requisitos legais, além de ter sido realizado de forma indireta. Em casos onde a perícia for singela, mostra-se possível a flexibilização das exigências contidas no art. 159 do CPP. Todavia na hipótese dos autos, o laudo pericial foi realizado de forma indireta sem...

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