Acórdão nº 50003378920138210032 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Câmara Criminal, 24-05-2023

Data de Julgamento24 Maio 2023
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Número do processo50003378920138210032
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003656530
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Recurso em Sentido Estrito Nº 5000337-89.2013.8.21.0032/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio Simples (art. 121 caput)

RELATORA: Desembargadora JANE MARIA KOHLER VIDAL

RECORRENTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

RECORRENTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

RECORRIDO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Inicialmente, adoto o relatório lançado na sentença (evento 19, SENT1):

O Ministério Público, com base no Inquérito Policial nº 50/2008/151901/A, autuado fisicamente sob o n. 032/21300006472, oriundo da Delegacia de Polícia Civil de São Jerônimo/RS, denunciou:

MANOEL LUIZ CENTENO CABRAL, RG nº 8037706408, brasileiro, branco, solteiro, com 43 anos de idade na data do fato (02/09/1964), natural de São Jerônimo/RS, filho de Wilson Flores Cabral e Maria Luiza Centeno Cabral, residente nos Fundos da Serraria, n. 01, bairro Olaria, em Triunfo/RS; e

CRISTIANO FERRARI SOUZA, alcunha “Biribiti”, RG nº 5091386135, brasileiro, branco, solteiro, com 25 anos de idade na data do fato (14/06/1982), natural de São Jerônimo/RS, filho de Darci da Silva Souza e Ana Cláudia Ferrari, residente na Rua Rafael Athanáseio, n. 584, Cidade Baixa, em São Jerônimo/RS;

Como incursos nas sanções do art. 121, caput, (duas vezes), cumulado com o artigo 14, II, e artigo 71, todos do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1º fato:

No dia 09 de janeiro de 2008, por volta das 13h e, posteriormente, às 15h05min, na rua Rafael Athanásio, 584, na Vila Juventus, em São Jerônimo/RS, o denunciado MANOEL LUIZ CENTENO CABRAL, com o uso de arma de fogo (não apreendida), tentou matar as vítimas Cristiano Ferrari Souza e Aline Ferras de Souza, o que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, não tendo os disparos lhes acertado.

Na ocasião, pelas 13h, as vítimas se encontravam em frente ao "Bar da Aline" quando os elementos Manoel, Felipe de Araújo Furtado, Daniel de Araújo Furtado e Kelvin Cabral Machado apareceram na esquina da rua armados com arma de fogo, disparando em sua direção. A Brigada Militar foi chamada, mas o grupo já tinha se retirado quando da chegada.

2º fato:

Posteriormente, no mesmo dia, pelas 15h05min, o grupo no local novamente, liderado pelo réu MANOEL LUIZ CENTENO CABRAL, o qual teria tentado matar as vítimas Cristiano Ferrari Souza e Aline Ferraz de Souza, o que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, já que os disparos de arma de fogo efetuados pelo réu não lhes acertaram.

3º fato:

No dia 09 de janeiro de 2008, por volta das 13h, na rua Rafael Athanásio, 584, na Vila Juventus, em São Jerônimo/RS, em frente ao “Bar da Aline”, o denunciado CRISTIANO FERRARI SOUZA tentou matar a vítima Manoel Luiz Centeno Cabral com cinco disparos de arma de fogo (apreendida), não tendo se consumado o delito por circunstâncias alheias à sua vontade, pois os disparos não lhe acertaram.

No momento dos fatos, a vítima passava no local de bicicleta, tendo o réu efetuado os disparos em sua direção.

4° fato:

Na mesma data, por volta das 15 horas, na rua Harry Kuplích, em São Jerônimo, novamente o denunciado CRISTIANO FERRARI SOUZA tentou matar a vítima Manoel Luiz Centeno Cabral com dois disparos de arma de fogo (apreendida), o que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, pois somente um dos tiros atingiu o pescoço da vítima, causando-lhe lesão superficial na epiderme (escoriação).

Na ocasião, a vítima evitou passar em frente do "Bar da Aline", na rua Rafael Athanásío, 584, na Vila Juventus, em São Jerônimo/RS em face de desavença anterior, tendo seguido pela rua Harry C. Kuplich, porém, o réu teria lhe avistado e corrido em sua direção, desferindo-lhe mais dois disparos de arma de fogo, sendo que um deles lhe acertou superficialmente no pescoço.”

Recebida a denúncia em 10.06.2013, ev. 3, PROCJUDIC2, fl. 18, mesma oportunidade em que determinado o arquivamento do delito de ameaça.

O réu Cristiano foi citado na fl. 25, do evento 3, PROCJUDIC2. Já Manoel, na fl. 45.

Adveio aos autos o laudo pericial balístico da arma de fogo apreendida quando do cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência do réu Cristiano, fl. 13 e ss do ev. 3, PROCJUDIC3, o que ocorreu nos autos do processo físico 032/2080000311-3.

Manoel apresentou resposta a acusação por meio de defensor dativo, fls. 30 e ss. Cristiano, por sua vez, nas fls. 10 e ss, ev. 3, PROCJUDIC4.

Durante a instrução, foram ouvidas as testemunhas arroladas e interrogado o réu Cristiano, tendo sido decretada a revelia de Manoel (fls. 37, ev. 3, PORCJUDIC5, fls. 15 e ss, ev. 3, PROCJUDIC7, fls. 31 e ss, ev. 3, PROCJUDIC10, fls. 17 e ss, ev. 3, PROCJUDIC11, e fls. 24 e ss).

Encerrada a instrução processual, os debates orais foram convertidos em memoriais escritos.

Adveio aos autos a certidão judicial criminal dos acusados, fls. 27 e ss.

Em alegações finais, o Ministério Público pugnou pela pronúncia dos réus, fls. 43 e ss.

Já a defesa de Cristiano, ev. 3, PROCJUDIC12, fls. 03 e ss, preliminarmente, alegou a inconstitucionalidade do princípio in dubio pro societate; ao final, requereu a impronúncia do réu por insuficiência de provas quanto aos fatos 03 e 04.

Manoel apresentou memoriais no ev. 17, requerendo a rejeição da denúncia por ausência de justa causa. No mérito, a impronúncia do réu, face a insuficiência de provas.

Sobreveio sentença que julgou procedente a pretensão estatal a fim de pronunciar os acusados Cristiano Ferrari Souza e Manoel Luiz Centeno Cabral, como incursos nas sanções do art. 121, “caput”, (duas vezes), c/c o artigo 14, inc. II, e art. 71, todos do CP, submetendo-os ao julgamento pelo Conselho de Sentença do Tribunal do Júri, com fundamento no art. 413 do CPP.

Inconformado, o réu Cristiano apresentou recurso em sentido estrito. Em suas razões (evento 38, RAZRECUR1), a despeito de reconhecer o consolidado entendimento pretoriano, alegou, preliminarmente, a inconstitucionalidade do princípio do in dubio pro societate, porque a CRFB prevê que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatório. No mérito, alegou não haver prova suficiente para encaminhar o réu Cristiano a julgamento pelo Conselho de Sentença (fatos 03 e 04). Teceu considerações acerca das provas produzidas e da dinâmica dos fatos, alegando a impossibilidade de ocorrência simultânea dos fatos 03 e 04, com os fatos 01 e 02. Afirmou não ser possível a pronúncia com base apenas em elementos do inquérito, por violação ao art. 155 do CPP. Requereu a AJG e o provimento do recurso, a fim de despronunciar o réu Cristiano.

O réu Manoel também interpôs recurso em sentido estrito. Em razões (evento 40, RSE1), ponderou acerca da vulnerabilidade da prova, não havendo indícios suficientes de autoria, aptos a submeter Manoel ao julgamento pelo Tribunal do Júri. O conjunto probatório reúne meras suposições, pois não foi ouvida sequer uma testemunha presencial, apenas declarações que não apontam de forma segura e convincente a autoria delitiva. Efetuou análise do princípio do in dubio pro societate, argumentando que, em caso de dúvida acerca da autoria, deve o juiz impronunciar o réu. Ao final, requereu o provimento do recurso e a despronúncia do acusado Manoel.

As contrarrazões foram apresentadas (evento 49, CONTRAZ1).

O juízo de origem manteve a decisão de pronúncia (evento 61, DESPADEC1)

Neste grau de jurisdição, o Ministério Público apresentou parecer, opinando pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (evento 8, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos.

Pretendem as defesas dos acusados, em síntese, a inconstitucionalidade do princípio do in dubio pro societate e, no mérito, a despronúncia por insuficiência probatória.

As inconformidades não prosperam.

Inicialmente, destaco que, no procedimento relativo aos processos da competência do Tribunal do Júri, a fase do sumário da culpa funciona como juízo de prelibação. A cognição restringe-se à verificação da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

Oportuno transcrever o disposto no art. 413 do Código de Processo Penal:

Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

§ 1o A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.

§ 2o Se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória.

§ 3o O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.

Segundo dispõe o art. 5°, inciso XXXVIII, alínea 'd', da Constituição Federal, é reconhecida a competência do conselho de sentença para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Por essa razão, na decisão de pronúncia, não cabe fundamentação que evidencie juízo de convencimento acerca da autoria, sob pena de excesso de linguagem. Dessa forma, dá-se a valoração racional da prova em instrução preliminar.

Além disso, por se tratar de mera admissibilidade da ação penal para encaminhamento ao juízo natural, constitucionalmente previsto, não há falar em quebra da presunção de inocência ou inconstitucionalidade do princípio do in dubio pro societate, pois não se está fazendo...

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